A Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN) lançou mais uma proposta de medidas da «fiscalidade verde», apoiada nos nada rigorosos e ainda menos científicos estudos da multinacional Deloitte.
AbrilAbril | editorial
Na linha de outros pacotes, este prossegue basicamente objectivos de classe, promovendo formas de aumentar a cobrança de impostos sobre os trabalhadores para permitir as isenções sobre o grande capital e as classes economicamente mais favorecidas.
Desde logo, a APREN propõe-nos um aumento de impostos, já que defende que as suas propostas permitirão arrecadar mais 1100 milhões de euros em 8 anos. A coisa faz-se assim, por fases: primeiro criam-se impostos indirectos por «boas causas»; depois, porque a carga fiscal aumenta, reclama-se a redução dos impostos sobre o rendimento.
Se os impostos indirectos (ligados ao consumo) já são por si próprios muito mais injustos que os impostos directos (ligados ao rendimento), neste caso a injustiça ainda é mais potenciada pelo tipo de medidas propostas, que provocariam um tal aumento da carga fiscal sobre as famílias de menores rendimentos, que esse aumento permitiria cobrar mais impostos e ainda oferecer um conjunto de reduções de impostos às famílias mais ricas.
Dois exemplos sobre a proposta agora apresentada:
- Propõe criar um imposto sobre a compra de electrodomésticos de baixa eficiência energética (A++: +10%, A+: +15%, B e menor: +25%). Este imposto implicaria que os electrodomésticos mais baratos teriam o maior aumento. Não deve ser difícil perceber que os electrodomésticos mais baratos, que são os de pior eficiência energética, são aqueles que são comprados pelas famílias de menores rendimentos. E que o fazem, não por falta de vontade em ajudar a melhorar o mundo, mas por falta de dinheiro!
- Propõe modificar o imposto sobre veículos, de forma a que os veículos antigos, mais poluentes, paguem ainda mais que os novos. Em paralelo, defendem isentar deste imposto os veículos eléctricos. Ou seja, na compra de um carro eléctrico, a maioria dos quais são de gama alta ou média alta, adquiridos pelas famílias de maiores rendimentos ou por empresas, haveria uma isenção. Para os carros mais baratos disponíveis no mercado, haveria um agravamento do imposto. Podem pintar-se de verde, mas isto espremido só dá um resultado: os trabalhadores com menores rendimentos a ajudarem a pagar os carros de luxo das pessoas com maiores rendimentos.
É que a razão por que um trabalhador com o Salário Mínimo Nacional, ou até com o Salário Médio, ou até com mais, não compra um Tesla Model 3 (o carro eléctrico mais vendido do momento) não é porque não quer. É porque não pode. É porque não tem 50 mil euros para comprar um automóvel. Se o preço baixar para 45 mil euros continua a não ser uma opção. Da mesma forma que a primeira razão por que alguém compra um carro eléctrico não é porque escolhe fazê-lo por razões ecológicas ou porque, seja qual for a razão, o quer fazer. É antes de mais porque pode!
A fiscalidade verde, como este exemplo bem ilustra, é só uma forma de usar as questões ambientais para continuar a agravar as injustiças fiscais e para perpetuar as injustiças económicas e sociais. E para fingir que se está a mudar o mundo sem nada fazer para o mudar.
Sem comentários:
Enviar um comentário