quarta-feira, 30 de junho de 2021

A Hora dos Traficantes de Armas na Política

Artur Queiroz*, Luanda 

A cimeira entre os presidentes Biden e Putin foram ver, estava morta. Mas aconteceu algo que interessa a Angola e muito. Os dois líderes falaram na possibilidade de “trocarem” prisioneiros, e um deles é o russo Viktor Bout que também assina Butt, Bont, Buttee, Boutov ou Sergitov Vitali. Um relatório da ONU denuncia, com provas evidentíssimas, que ele foi o fornecedor de armas e munições à UNITA, entre 1991 e 2002. Isto quer dizer que ainda não tinha secado a tinta nas assinaturas do Acordo de Bicesse, já Jonas Savimbi comprava armamento a um traficante, para esconder nas bases secretas do Cuando Cubango.

Viktor Boutov tinha como intermediário dos negócios na UNITA, Marcial Dachala ou N’Dachala quando quer ser mais próximo da autenticidade mobutista. Mas era amigo tu cá, tu lá, com o criminoso de guerra Jonas Savimbi. Um tribunal de Nova Iorque condenou o traficante de armas a 25 anos de prisão, por ter fornecido armas às FARC, que por sua vez mataram em combate soldados e outros “agentes” norte-americanos na Colômbia. Foi preso em 2000, ano em que Savimbi começou a ficar sem o “combustível da guerra” como refere na ONU ao armamento vendido por Bout à UNITA.

Os negócios eram feitos com Marcial Dachala, hoje porta-voz da UNITA e deputado. A base do “tráfico da morte” estava na cidade de Lomé, capital do Togo. Viktor Boutov era amigo do presidente Étienne Eyadéma e de seu irmão, chefe máximo das forças armadas togolesas, que facilitava as operações do tráfico de armas. No primeiro encontro com o chefe militar, Marcial Dachala ofereceu-lhe um saco de diamantes “das minas da UNITA”.

O traficante Viktor Boutov está preso numa penitenciária do Illinois e se não for “trocado” só sai do cárcere em 2030. Jonas Savimbi perdeu o fornecedor de armas e munições e em 22 de Fevereiro de 2002 terminou a sua aventura belicista, no Lucusse. Marcial Dachala pavoneia-se em Luanda, tem um lugar certo na Assembleia Nacional e recentemente disse isto: “Um compromisso do nosso presidente é a constituição de uma Frente Democrática e Patriótica para a alternância do poder (...) Há conversações que avançam todos os dias um pouco mais, com o Bloco Democrático, com o doutor Abel Chivukuvuku e muito mais personalidades do país estão trabalhando connosco na perspectiva da efectivação da frente.”

Marcial Dachala é um traficante de armas, parceiro de Viktor Boutov. Esteve atolado no “negócio da morte” até ao pescoço. Mas Adalberto da Costa Júnior também faz parte do gangue. Na parte final do fornecimento de armas à UNITA, Dachala teve de recuar, porque a ONU decidiu reprimir o tráfico dos “diamantes de sangue” da UNITA e ele estava referenciado pelos inspectores. Avançou o “embaixador” Adalberto da Costa Júnior que montou com o traficante russo um engenhoso esquema para continuarem os negócios a partir do Uganda e Ruanda. No Lomé, Viktor Boutov e a UNITA decidiram criar uma fábrica de lapidação de pedras preciosas, para escaparem ao rastreio internacional dos “diamantes de sangue”, que apenas é possível se as pedras estiverem em bruto.

O traficante russo criou uma companhia de aviação, a Air Cess, que na parte final da traficância com a UNITA já tinha 50 aviões de transporte com capacidade de voo intercontinental. Quando avançaram as sanções da ONU contra os dirigentes da UNITA, Adalberto da Costa Júnior abriu brechas em Portugal, que se tornou o paraíso dos traficantes e belicistas da UNITA.

Viktor Boutov reforçou a sua frota com aviões de passageiros e pelo menos duas aeronaves ficaram ao serviço da direcção da UNITA, que assim escapavam ao controlo internacional, pois voavam a partir de aeródromos secundários, onde não chegava o controlo apertado das autoridades. O pagamento era feito em diamantes roubados aos angolanos. Nesta fase, o ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, Peter Hein, veio a público denunciar o “negócio da morte” do traficante de armas russo. Porque ele era amigo íntimo do presidente Charles Taylor, da Libéria, que também deu grande contributo ao tráfico de armas para a UNITA. Taylor foi declarado criminoso de guerra e condenado a 50 anos de prisão.

Adalberto da Costa Júnior, parceiro de negócios destes bandidos internacionais, é deputado, líder da Oposição em Angola e está a preparar, segundo outro traficante, Marcial Dachala, uma “Frente Democrática e Patriótica para a alternância do poder”. E já tem parceiros ajuramentados: Bloco Democrático e o antigo agente da BRINDE (serviços de extermínio da UNITA) Abel Chivukuvuku. Onde Justino Pinto de Andrade e Filomeno Lopes já vão! Começaram por se declarar à esquerda do MPLA e ultrapassaram Chivukuvuku pela direita. Ainda acabam nos braços de um qualquer Bolsonaro.

Viktor Boutov ajudou a matar em Angola mais de um milhão e meio de angolanos, por isso é chamado o “mercador da morte”. Era agente do KGB soviético e nessa condição trabalhou em Angola, conhecia muitos segredos. Amigo íntimo de Jonas Savimbi, recebeu deste criminoso de guerra milhares de milhões de dólares em diamantes roubados nas minas angolanas. Foi condenado a prisão perpétua em Nova Iorque. Uma juíza federal converteu a pena em 25 anos e agora está prestes a ser libertado. Porque Washington lhe deu “carta branca” para fornecer a UNITA de armas oriundas da Europa de Leste, lavando daí as suas mãos e emendando assim o crime cometido pelo presidente Reagan ao dar a Savimbi/Pretória os mísseis FIM-92 Stinger.

No Tribunal de Nova Iorque, Viktor Boutov estava sozinho no banco dos réus. Faltaram a seu lado Marcial Dachala, Adalberto da Costa Júnior e outros dirigentes da UNITA. Vamos ver se os angolanos querem alternar o poder com assassinos, ladrões de diamantes e traficantes de armas.

*Jornalista

Fotos:

1- Viktor Bout o “traficante da morte”, traficante de armas  associado a todas as “guerras de diamantes de sangue” em África, a de Savimbi incluída – extraída do “dossier” sobre Bout do jornal “The Guardian” – https://www.theguardian.com/world/viktor-bout;  https://www.theguardian.com/film/2014/aug/17/the-notorious-mr-bout-review-transforming-merchant-of-death;

2- Marcial Dachala, deputado da UNITA na Assembleia Nacional Angolana e enlace de Savimbi nos expedientes com o “traficante da morte” Viktor Bout – extraída da página KUP – https://kwachaunitapress.com/;  https://kwachaunitapress.com/2021/03/25/unita-diz-campanha-de-difamacao-nao-vao-impedir-a-alternancia-democratica-em-2022/secretario-nacional-da-comunicacao-e-marketing-marcial-dachala/;   

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