# Publicado em português do Brasil
Chamado por Lénin de “forma superior do capitalismo” ele é mais que inovações de marines: guerras híbridas, “cooperação jurídica” e fake news. Entendê-lo, inclusive em escalas regionais, é crucial à complexa geopolítica do século XXI
Bruno Lima Rocha*| Outras Palavras
Uma das tarefas mais difíceis na análise do Sistema Internacional e em especial de algumas áreas mais sensíveis como a economia política internacional é dialogar com a história contemporânea e aplicar uma correta periodização. Minha pesquisa mais recente foi iniciada com a intenção de fazer um relevo do período que seria verificável no capitalismo mundial pós-2008 e anterior à pandemia do novo coronavírus, segundo a classificação da Organização Mundial da Saúde (que decretou pandemia em 11 de março de 2020). Embora não seja necessariamente um objeto de polêmica ou o ponto central para interpretar a virada e perda de poder do mundo ocidentalizado durante e logo após o desastroso governo de Donald Trump, esse debate é necessário por algumas razões.
A mais sensível é porque os conceitos são reais ou, ao menos, têm a intenção de interpretar o real, vivido como experiência concreta, e não apenas o universo imaginário (que também forma o real vivido). Ou seja, parto da premissa de que existe imperialismo e existem potências com capacidade de agendas imperiais, incluindo avanços em escalas regionais. A outra situação bem concreta e em diálogo com a primeira é que o poder global não impede o jogo regional ou mesmo continental, mesmo que este seja muito heterodoxo e fira interesses múltiplos simultaneamente. Um exemplo disso é o caso da Turquia na Era Erdogan, ainda dentro do guarda-chuva da OTAN e com política externa extremamente agressiva e contrariando várias potências regionais e globais simultaneamente. Podemos afirmar estas mesmas capacidades para outras potências médias do G20 e países com capacidades semelhantes, como Irã, Paquistão e Malásia.
Embora a presença militar em escala planetária seja ainda exclusiva dos Estados Unidos, algumas outras potências também são herdeiras do colonialismo do século XIX e da Era das Navegações, tais como França e Reino Unido. Também existem impérios tardios que alastrando na esteira do Império matriz, tal é o caso dos EUA. Este país é classificado como promotor do imperialismo na maior parte dos estudos de pós-Segunda Guerra e, em especial, ao final da Guerra Fria e Bipolaridade.
Outra razão prática do debate sobre o imperialismo é reconhecer suas formas contemporâneas (saindo da caricatura). Imperialismo não é apenas uma invasão de fuzileiros navais estadunidenses, mas também uma forma superior do capitalismo, e nisso Lênin estava correto (ao menos na classificação), mas não só. Antigos impérios muitas vezes obedecem a lógicas geopolíticas e étnico-territoriais muito anteriores da formação moderna destes Estados. Por exemplo, na tradição russo-bizantina, a União Soviética agiu de forma imperialista no Afeganistão, seguindo a trajetória da disputa imperial anglo-russa nesta mesma região (conhecido como o Grande Jogo). A relação da China com o Vietnã recém-unificado e liberto da invasão dos EUA (guerra sino-vietnamita de 1979) foi semelhante também. Obedecia a uma lógica de rivalidade milenar, ainda que sob os novos formatos dentro da etapa final da guerra fria ou o mundo bipolar. De forma genérica, o jogo de poder na Ásia pode ser assim classificado, com exceção do Grande Oriente Médio (Mundo Árabe e boa parte do Mundo Islâmico), onde incide a luta contra o colonialismo sionista e as perversas tratativas com o fim do Império Otomano, como no “acordo” Sykes-Picot.