A avó Kalumbwambwa veio do tempo das máscaras ornamentadas com grandes bagos de ginguba e cresceu num mundo de adivinhas. Aprendeu caminhos antes mesmo que eles fossem abertos e pisou o chão que ninguém viu. Quando era criança ainda as lebres e as gazelas falavam. As tulhas estavam sempre cheias de milho e o tempo não envelhecia os rostos nem a força dos braços.
Um dia, avó Kalumbwambwa, ainda mulher forte e com seis filhos pequenos, foi à lavra e encontrou a Lebre Saltadora e a Gazela Corredora à conversa. Logo se apercebeu que as maçarocas de milho que ia dar aos seus filhos tinham sido remexidas.
- Ene wanani epungu lyange! Disse a avó com voz ríspida.
- Etu, Hetuko! Responderam as duas amigas.
Mas a avó, muito furiosa, disse que só elas podiam ter comido as maçarocas que queria assar para os filhos. Houve grande discussão na lavra e a avó pronunciou uma sentença terrível:
- Na próxima investida dos caçadores sereis mortas e atiradas para o caldeirão como conduto!
Foi isso mesmo que aconteceu. As duas amigas encontraram-se numa lavra de jimboa.
Kamdimba wamala yu wangwalako, eti:
- Mba! Wosalipo?
Mbambi eti:
- Etjyo!
Depois dos cumprimentos as duas amigas começaram a comer rama tenrinha. Nem deram pela chegada dos caçadores e foram abatidas. Avó Kalumbwambwa, desde então, ficou afamada de adivinha.
Os filhos cresceram e chegaram os netos. Kuku waf’ale k’ovaso. A avó já tinha os órgãos reprodutores mortos e passava a vida contando aos netos histórias do passado e do futuro. E também, conhecia muitas adivinhas:
- Tjyawala etongola? – Perguntava a avó com ar misterioso. Uma coisa que tem o cinto acima da cintura?
E os meninos que sabiam, entusiasmados respondiam:
- Olweyo! É a vassoura.
Avó Kalumbwambwa ia envelhecendo e até perdeu os dotes de adivinhar o futuro. Com o tempo, mal a noite cobria a aldeia com o seu manto silencioso ela começava a dormir, ameaçando cair para cima da fogueira. Os netos estavam sempre atentos, para que não acontecesse nenhum desastre com ela. As histórias rareavam. A sua boca mal se abria.
Até que um dia, rodeada pelos filhos e netos, quando o fogo crepitava no jango, avó Kalumbwambwa disse num fio de voz:
- Sinto saudades só de pensar
E deixou cair a cabeça para a frente, adormecendo de mansinho.
Foi então que meninos e adultos decifraram o último enigma da avó. Ongeva é saudade. E está sempre associada ao coração. Se não estiver, é um enjoo e grande mal-estar.
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