domingo, 27 de fevereiro de 2022

RÚSSIA AMEAÇA ATACAR EM TODAS AS DIREÇÕES

A ordem para o "planeado" aconteceu. A recusa de Kiev em ir a Minsk negociar em pleno conflito obteve resposta rápida de Putin. Britânicos e norte-americanos relatam "frustração" dos comandantes russos que enfrentam problemas logísticos. Alemanha quebra regra do pós-guerra e envia armas para a Ucrânia.

Em Dnipro (sudeste), cidade que ainda não foi atacada, Sarah Rainsford, jornalista da BBC, encontrou nas ruas dezenas de mulheres - professoras, donas de casa, advogadas - a fazer cocktails Molotov com garrafas de cerveja e de refrigerantes. As grades cheias, espalhadas pelo chão, os trapos rasgados, o combustível são as armas de "mulheres aterrorizadas" e "preparadas para tudo".

O hospital já tem as 400 camas ocupadas com soldados feridos que foram chegando. A população está mobilizada porque "não tem alternativa".

Do lado de lá da fronteira moldava, o que se vê "é um país de mães, filhas e avós" que deixaram maridos, filhos e netos a conter a invasão russa. Quase 30 mil já chegaram a esta zona. No total, garante Kelly Clements, vice-alta comissária do ACNUR, em entrevista à CNN, "mais de 150 mil pessoas foram para todos os países vizinhos, nas últimas 48 horas, e a receção que estão a ter das comunidades locais, das autoridades locais, é tremenda, mas é uma situação dinâmica, e estamos muito devastados, obviamente, com o que vem a seguir".

A fuga, assegura o ACNUR, tem como principais destinos a Polónia, a Moldávia, mas também a Roménia, Eslováquia e Hungria.

Os deslocados, na maioria mulheres, não são somente ucranianos. Há estrangeiros de diversas nacionalidades. Alguns tinham escapado, em agosto do ano passado, de uma guerra em Kabul, e estão agora, de novo, na mesma situação: no meio de uma guerra. Haidar Seddiqi, 36 anos, não sabe para onde ir, que destino ter. Talvez alcançar a fronteira polaca. A única certeza é que não podia ficar no campo de refugiados em Lviv, disse à BBC. Do ACNUR não conseguiu respostas. Haidar Seddiqi faz parte do grupo de 5.000 afegãos que fugiram da guerra e encontraram refúgio na Ucrânia.

O recolher obrigatório, que entrou em vigor, ontem às cinco da tarde, avisa que quem for encontrado na rua até às oito da manhã será "considerado membro dos grupos de sabotagem e tratado como inimigo". A nova medida procura conseguir identificar, mais facilmente, militares russos que ontem "falharam a entrada em Kiev". A esperança , diz Zelensky, que prometeu "lutar até ao fim para termos o nosso país livre", reside em coisas pequenas: "Se crianças estão a nascer durante o ataque dos mísseis inimigos [nasceu um bebé no metropolitano de Kiev] é um sinal de que não nos vão vencer. Glória à Ucrânia".

As diferentes narrativas da guerra, impossíveis de verificar - a propaganda é uma arma, crescem a cada hora. Combates nos arredores de Kiev, em Sumy (nordeste), Carcóvia (leste), Chernigov (norte), Melitopol (perto do Mar de Azov), Odessa (Sul) ou como garante Volodymyr Zelensky, o presidente ucraniano, "mantivemos a nossa posição e repelimos com sucesso os ataques inimigos. Os combates continuam em muitas cidades e regiões do país, mas... é o nosso exército que controla Kiev e as principais cidades ao redor da capital".

Segundo as autoridades locais ucranianas, forças aerotransportadas russas já terão aterrado num aeródromo em Vasilkov, a menos de 40 quilómetros de Kiev. Os habitantes da cidade foram aconselhados a permanecer em abrigos, ou, se estiverem em casa, a não se aproximarem das janelas.

O exército ucraniano também alertou para "combates violentos" a 30 quilómetros a sudoeste da capital, onde os russos "estavam a tentar largar paraquedistas" e anunciou ter destruído uma coluna de cinco veículos militares russos, incluindo um blindado, perto da estação de metropolitano Beresteiska, na avenida da Vitória, uma das principais ruas na zona noroeste de Kiev.

Mas, apesar da resistência "a verdadeira batalha por Kiev continuou (...) O inimigo usou de tudo contra nós: combatentes, grupos de sabotagem e tropas de desembarque. Os invasores atingiram áreas residenciais, procurando eliminar as instalações energéticas. As suas táticas são muito vis (...) Os ocupantes queriam bloquear o centro do país e colocar fantoches (pró-russos) aqui, como em Donetsk. Desviámos a sua intenção e eles não obtiveram nenhuma vantagem sobre nós".

Norte-americanos e britânicos sustentam a mesma teoria. O avanço militar russo está a sofrer "atrasos", o que está a provocar "frustrações" em Moscovo. Fontes militares dos Estados relatam o "desânimo dos comandantes russos" que enfrentam problemas logísticos: falta de combustível, soldados a menos e falta de alimentos. Há imagens de tanques parados, nas estradas, sem combustível, e portanto inoperacionais.

A resposta russa surgiu pelo porta-voz do Ministério da Defesa, Igor Konashenkov, em comunicado: "Todas as unidades receberam ordens para expandirem a sua ofensiva em todas as direções, de acordo com o plano ofensivo".

A explicação? "O presidente russo ordenou uma paragem no avanço das principais forças de Moscovo. Uma vez que o lado ucraniano recusou as negociações, o avanço das forças russas será em todas as direções", explicou o porta-voz presidencial russo Dmitry Peskov.

A Rússia afirma ter proposto conversações em Minsk, a capital da Bielorrússia. Washington disse que a abertura russa não podia ser considerada credível. Horas mais tarde, Vladimir Putin descreveu o seu homólogo ucraniano Volodymyr Zelensky e a sua comitiva como "um grupo de toxicodependentes e neonazis".

O plano ofensivo, revelado por Igor Konashenkov, porta-voz do Ministério da Defesa, terá atacado 821 instalações militares ucranianas com mísseis de cruzeiro, "armas de alta precisão". Segundo Konashenkov, foram ainda destruídos sete aviões ucranianos, sete helicópteros e de nove drones, e ainda da aniquilação de oito barcos de combate, de 87 tanques e veículos blindados, 28 lançadores múltiplos e 118 veículos e equipamentos militares.

O porta-voz acusou navios ucranianos de terem atacado navios de guerra russos no Mar Negro, dizendo ser "altamente provável" que drones de observação dos Estados Unidos os tivessem "guiado".

Indicou ainda que os separatistas pró-russos no leste, apoiados pelos militares russos, estão a registar "sucessos".

O Ministério da Defesa ucraniano afirmou, por seu lado, que aumentaram as perdas de tropas inimigas: 14 aviões e de oito helicópteros abatidos, bem como a destruição de 102 tanques e de 536 veículos blindados.

A agência Efe adianta que, segundo a entidade militar ucraniana, os russos teriam perdido mais de 3.000 soldados nos combates.

O ministro da Saúde da Ucrânia, Viktor Lyashko, numa recente estimativa disse que o número de vítimas mortais desde que começou a invasão russa ascende a 198, incluindo três crianças, havendo ainda a contabilizar mais de 1.000 feridos.

O reforço militar da Ucrânia, garantem fontes do Reino Unido, conta com a ajuda de 25 países. E até a Alemanha que recusava o envio direto de armas letais - no caso concreto mil armas antitanque e 500 mísseis Stinger - contornou a objeção através de países terceiros, nomeadamente os países baixos e Estónia.

O chanceler alemão, ​​​​​​​Olaf Scholz, justificou o quebrar de uma política restrita, desde o pós-guerra, com um ataque russo que é "uma mudança de era, uma ameaça à ordem estabelecida".

Artur Cassiano | Diário de Notícias | Imagem: © Sergei SUPINSKY / AFP

Ler em Diário de Notícias:

Moscovo ordena expansão da ofensiva acusando Kiev de recusar negociar

"Precisamos da ajuda de todos, os ucranianos querem vir para Portugal e é muito difícil"

Sem comentários:

Mais lidas da semana