Artur Queiroz*, Luanda
Marcolino Moco, tu dizes que eu escrevo por encomenda. Se dizes que o Presidente da República e titular do Poder Executivo dá ordens ao Poder Judicial, também podes afirmar que me vendo à primeira encomenda. Se afirmas que a veneranda juíza que preside ao Tribunal Constitucional aceita ordens de outros poderes, também podes afirmar que eu sou dos que fogem ao primeiro tiro da UNITA. Ou que vivo confortavelmente em Portugal.
Se o engenheiro à civil Adalberto da Costa Júnior acusar o Presidente da República de violar a separação de poderes interferindo nos Tribunais não é um insulto, de forma nenhuma. É apenas mais um dislate do pobre diabo que atiraram para a frente da seita do Galo Negro. Se Abílio Camalata Numa afirmar que a juíza presidente do Tribunal Constitucional recebe ordens seja de quem for, não é um insulto. É apenas o estilo dos nazis da Jamba e o discurso dos que estão saudosos do troar das armas.
Marcolino Moco foi secretário-geral do MPLA. Foi primeiro-ministro de um Governo do MPLA. Já tinha sido ministro num Governo da República Popular de Angola. Foi secretário executivo da CPLP, indicado pelo MPLA. É doutorado em Direito e professor universitário. Se diz que o Presidente da República dá ordens aos juízes é um insulto. Se acusa a presidente do Tribunal Constitucional de estar às ordens seja de quem for é um insulto. Assumo inteiramente a responsabilidade desta opinião.
Marcolino Moco está entre o restrito número das pessoas de quem sou amigo. Vou repetir: Amigo. Também foi meu camarada do MPLA. E companheiro de luta pela Independência Nacional, pela Liberdade, pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial. Acima de tudo, sou amigo. Pelos vistos ele não é meu amigo. Bastou que discordasse das suas opiniões para me chamar vendido e covarde. Nada de novo.
Lopo do Nascimento, João Lourenço, Kundi Paiama e Marcolino Moco lideraram um projecto político no seio do MPLA que teve grande sucesso. Refiro-me à estrondosa vitória eleitoral do partido, em 1992. João Lourenço tinha nessa época uma relação fraterna, muito próxima, com Marcolino Moco. Fez tudo para que ele tivesse visibilidade política e condições para liderar o primeiro governo saído de eleições multipartidárias. O que eu disse no meu texto foi isto: A amizade e a cumplicidade do passado entre ambos, não podem ser postas em causa devido a divergências políticas que não podem ser assim tão profundas.
Moco quer o calar das armas para sempre. João Lourenço igualmente. Moco quer construir uma ponte para a outra margem. João Lourenço, durante o seu mandato, mostrou que quer o mesmo. E tomou medidas que, na prática, permitem construir solidamente essas pontes. Não compreendo o que separa os dois e sobretudo não percebo que as divergências (existem mesmo?) ponham em causa uma amizade. Divergências e profundas com o poder tenho eu.
Meu caro Moco. A primeira vez que
andei de avião, em 1961, fui atirado para dentro da aeronave amarrado, depois
de uma fuga mal sucedida na pista da Base Aérea do Negage. O meu herói da
infância era o senhor Gorila, mecânico mágico. Ficava horas a vê-lo sujar as
mãos em óleo queimado, mudando velas, reparando feixes de molas, mudando
amortecedores ou reparando rolamentos gripados. Senhor Gorila, lá em cima tem
oficinas? Não rapaz! Então se o avião avaria fazemos como? Morremos, rapaz!
Andar de avião só mesmo obrigado. De Helicóptero nem pensar! Uma coisa é não
existirem oficinas lá
Não tenho ambições políticas ou económicas. Já fui tudo o que queria ser na vida. Já fiz tudo o que a minha consciência me ditou, pela Pátria Angolana. A direcção do MPLA está a seguir por caminhos que eu não trilho. Mas se estou fora da militância activa, não tenho o direito de criticar quem no activo dirige a política partidária. O que os meus camaradas esperam de mim é que dê o meu melhor para que eles tenham sucesso. É isso que farei em consciência.
Caro Moco, achas mesmo que sou um vendido e escrevo por encomenda? Achas mesmo que ao primeiro tiro da UNITA fujo logo com o rabo entre as pernas? À luz alfabetizada das palavras isso é tanga. Sabes muito bem que estás a delirar. Remite-me a um exílio voluntário exactamente porque não sou dos que se vendem seja qual for o preço.
Por fim quero dizer-te que tu não estás na Barra do Cuanza e eu no Chitembo, deliciando-me com as primeiras cataratas que encontrei. Que eu saiba, tu estás no Bairro de Alvalade, numa mansão. Eu tinha em Luanda um apartamento, na Avenida do Hospital agora Avenida do Primeiro Congresso do MPLA. Quando os fraccionistas me perseguiram e ameaçaram de morte fiquei sem condições para exercer o Jornalismo no meu país.
Como não sei fazer mais nada, andei por aí, de repórter. Quando voltei a Luanda, depois do golpe de estado militar, o meu apartamento onde tinha ficado o comandante Eurico Gonçalves, foi ocupado por familiares ou amigos do tenente Ambrósio Narciso, a quem o meu amigo “China” tinha dado as chaves. Como sabes, sou contra a propriedade privada e apesar do Narciso se ter prontificado a devolver-me o apartamento, não aceitei. E aqui estou. Feliz por saber que tu tens ambições políticas e vives numa mansão. Seria o homem mais feliz do mundo se todas as angolanas e angolanos tivessem uma casa digna, comida na mesa, escola, trabalho, saúde. Está claro que vou morrer infeliz.
Finalmente, quero que leias
melhor o meu texto. Nunca escrevi que és um traidor. Nem podia fazê-lo. O que
eu digo é que alguns gestos teus atraiçoam a velha amizade e camaradagem que tinhas
com João Lourenço e provavelmente outros camaradas do MPLA. Eu na vida fiz
muita merda mas não sou um cagão. Fiz sete filhos em seis relações amorosas e
não sou um mulherengo. Gasto todo o dinheiro que ganho e não sou milionário.
Por favor, não te compares ao Chipenda e ao Savimbi por muito que sejas levado
pelas punções tribais. Esses foram mesmo traidores e as suas traições fizeram
milhões de vítimas
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