Domingos de Andrade* | Jornal de Notícias | opinião
Se houve, ao longo dos últimos anos, capital político conquistado pelo Partido Socialista foi o da confiança dos reformados e pensionistas, eleitores que fugiram do PSD depois dos cortes impostos pela troika. São esses, como o provam os atos eleitorais desde 2015, que têm garantido as vitórias folgadas a António Costa.
São sobretudo esses votos que, segundo os últimos estudos de opinião, começam a fugir, baixando mês após mês a popularidade do Governo e do primeiro-ministro. E não há nada pior do que ficar instalada a perceção de que o Governo procedeu a truques de ilusionista, como acusa a Oposição, quando apresentou as oito medidas para fazer face à crise que vivemos. Porque, de facto, os reformados não vão receber nenhum cheque extra do Estado em outubro, mas apenas uma antecipação do aumento que teriam em 2023, com eventuais, e de dimensão ainda não totalmente clara, prejuízos nos valores a receber nos anos seguintes.
Até se percebe a contenção e a prudência nas medidas de apoio às famílias, num país mais pobre e sem a capacidade de muitos parceiros europeus. Bem como, no limite, se percebe que se persiga o objetivo de manter contas públicas sãs, mesmo que o programa seja financiado à custa das receitas geradas pela inflação e ainda sobre mais do que uma pequena almofada financeira. Percebe-se ainda que paire o fantasma do regresso do espartilho económico, como sucedeu com a crise das dívidas soberanas depois da injeção de dinheiro na economia.
O que não se percebe, de todo, é que o Governo pudesse acreditar que uns quadros, com uns números e um cheque-cenoura, fossem engodo suficiente. Não é esse o contrato geracional que se espera e menos ainda quando se preparam novas regras nas pensões de reforma, sem se saber bem quais.
Somar incerteza à incerteza é levar um país para a rua. E não é bonito ver os mais velhos a ostentar cartazes a gritar "ladrão" a quem nos governa.
*Diretor-geral Editorial
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