sexta-feira, 3 de março de 2023

TAP | HÁ UM PRENÚNCIO DE MORTE

Miguel Guedes* | Jornal de Notícias | opinião

Uma companhia aérea destas atreve-se a ser má companhia. Depois de arrastar o ministro e putativo líder Pedro Nuno Santos para uma travessia do deserto, a TAP conduziu o poder político para o descrédito.

Esta TAP é um avião em queda a pique e morte lenta, não fosse património, bandeira e viveiro de trabalhadores desconsiderados em nome próprio, sistemática e vergonhosamente, por anos a mais de gestão danosa com o alto patrocínio de quem decide. No momento em que se considera a reintegração de Alexandra Reis ou a devolução de parte da indemnização que lhe foi atribuída ao sair pelo próprio pé, a piada faz-se sozinha. O poder que teima em dar tiros nos pés está em rota livre de colisão e faz-se à pista.

Infelizmente, aqui nada acaba em bem quando tão mal começa. O que se sabe sobre a saída de Alexandra Reis da TAP não configura fundamentação alguma para uma indemnização que só poderia ter lugar por cessação unilateral e forçada. Isso será evidente no parecer da Inspecção-Geral de Finanças e, pela reacção de Christine Ourmières-Widener, já fez soar os alarmes na administração da companhia aérea que promete uma reacção em conformidade. Sabendo-se que Alexandra Reis já prometera repor tudo o que tivesse recebido indevidamente, criam-se condições para que tudo acabe em bem. Ou em mais uma indemnização, agora à CEO da TAP.

A aterragem fora de pista de Marcelo Rebelo de Sousa pedia consequências entretanto esclarecidas: apenas jurídicas, não políticas. O esclarecimento do presidente da República (PR) surge em tempo, até porque sabe não poder desencadear um prenúncio de crise política com a demissão de Fernando Medina. A demissão de Medina seria, neste contexto, um abalo fatal para o Governo e, caso o Governo caísse, a oposição de Luís Montenegro ainda não se encontra requalificada para vencer.

Num cenário de crise política, em sinergia de aliança negativa, as forças à direita do PSD iriam crescer, nomeadamente a extrema-direita. Marcelo não quer ficar com esse ónus. Por outro lado, as forças à esquerda do PS tenderiam a ter voto útil em António Costa, como sucedeu nas últimas eleições perante a ameaça da aliança do PSD com a extrema-direita. Mais do que Rui Rio, Luís Montenegro só reforçou, incompreensivelmente, essa "certeza".

E, depois, o fantasma de Passos Coelho. Marcelo dá sinais de esperar por Passos Coelho como antes se esperava por D. Sebastião. "Vale a pena fixar este dia", extraordinária sentença adivinhatória do PR. Não será por acaso que o PS anunciou querer investigar o contrato de venda da TAP a David Neeleman, da responsabilidade do Governo de Passos Coelho. O PS a fazer oposição ao futuro, de braço dado com Luís Montenegro. Sente-se, onde quer que seja, um prenúncio de morte.

*Músico e jurista

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