sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Portugal - Eleições | Verdade de quem mente


Miguel Guedes* | Jornal de Notícias | opinião

Durante os debates relâmpago, sobram os argumentos polígrafo. Como modelo, o toca e foge. Um “kiss and tell” no espaço de 30 minutos para fazer a diferença em modo monólogo com altercações várias e pedidos de defesa da honra à mesa. Como notas em subtítulo, as juras sobre o que é verdade numa campanha política repleta de demagogia onde essa verdade, se interessa, não é reconhecida como elemento fundamental. Mais do que interessados na verdade, os eleitores e alguns comentadores parecem apresentar-se no pelotão da frente daqueles que só querem saber sobre quem mente. A verdade interessa pouco quando a perseguição a quem não diz a verdade já ganhou e as notas artísticas não têm a mentira como ponderação.

Esgotaram-se os debates entre candidatos a primeiro-ministro, líderes de audiência no segmento político, e a campanha segue nos moldes tradicionais que conduzirão às tradicionais arruadas. Poderá especular-se se uma segunda ronda de debates poderia minorar a abstenção nas urnas ou se restabeleceria o mesmo grau de cansaço nos telespectadores que se tem feito sentir nos eleitores em eleições sucessivas. Os bravos do pelotão em feiras poderão voltar à tradicional forma de fazer política que garanta os votos dos mesmos, mas haverá, certamente, arruadas bem diferentes e extremadas no momento em que se comemoram os 50 anos do 25 de Abril.

Às voltas com a verdade, Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro digladiam números que dificilmente sustentam ou entendimentos reversíveis sobre o que pode ser a governabilidade do país. O líder do PSD atira com números errados sobre o corte a todos os pensionistas, enquanto o líder do PS atira certeiramente que a perda em impostos do programa da AD, em quatro anos, ascende a 16,5 milhões de euros. Mas é o mesmo Pedro Nuno Santos que acerta e o que afirma viabilizar um governo minoritário do PSD para a seguir se desobrigar. A sua grande afirmação no debate, claramente vitorioso, esvai-se em poucas horas. No momento em que os portugueses se revêem ao espelho numa crise de afirmação, é estranho que os políticos lhe entreguem falsas certezas em ritmo expresso.

O momento da verdade está para chegar e servirá António Costa como protagonista. Será ele o dínamo do desempate, o factor de equilíbrio de um veículo socialista que parece agora estar a realinhar-se depois de tantos debates em que Pedro Nuno Santos se anulou. Até às eleições, como nas motas com sidecar, Pedro Nuno Santos viajará sempre com António Costa ao lado.

* Músico e jurista

(O autor escreve segundo a antiga ortografia) 

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