Eunice Lourenço, editora de política | Expresso (curto)
Bom dia
Foi uma noite de nervos e muitos
silêncios. A anunciar meses (ou anos) vividos à beira de não saber quanto tempo
vai durar o governo ou com quem vai Montenegro aprovar os instrumentos para a
governação. A noite ditou uma vitória à tangente da AD e o regresso
do PS à oposição, lugar que há oito anos não conhece. Foi uma noite longa,
O grande vencedor, contudo, é André Ventura, que quadruplicou
a sua bancada parlamentar e ficou com uma das chaves para manter ou destruir
qualquer maioria. Declarou a morte do bipartidarismo e desafiou Luís Montenegro e Marcelo Rebelo de Sousa a
perceberem o sinal dado nestas eleições e aceitarem o resultado que, do seu
ponto de vista, implica abrir ao Chega as portas da governação.
À esquerda e à direita houve quem cantasse vitória a tentar encobrir derrotas. Bloco de Esquerda e Iniciativa Liberal até podem ter resistido ao voto útil:
conseguiram manter as bancadas parlamentares exatamente com o mesmo número de
deputados que já tinham e ficaram muito contentes por terem crescido em número
de votos, como se esse crescimento não fosse uma consequência direta do grande
aumento de votantes. A verdade é que falharam as metas - a do Bloco era
recuperar deputados em distritos como Braga, Aveiro ou Coimbra, a da IL era
aumentar de 8 para
Um objetivo que Rui Tavares parece querer manter. O Livre foi,
aparentemente, um vencedor da noite: cresceu muito, conseguiu eleger no Porto,
Lisboa e Setúbal e passou de ter um deputado único a ter um grupo parlamentar
do mesmo tamanho da bancada comunista. Mas a sua vitória é também a derrota do
campo político com que há anos sonha governar e a medida do seu crescimento
pode ter sido o que faltou ao PS para ter o tal voto a mais suficiente para
ganhar. O porta-voz do Livre ainda vai tentar que o Presidente aceite a sua
tese de que a minoria de esquerda é mais consistente do que a minoria de
direita, mas nem Pedro Nuno Santos lhe dá razão. “Não nos compliquemos”, disse
o líder do PS.
A vitória mais derrota da noite foi, contudo, do PAN, que manteve a sua deputada única, Inês Sousa Real, que até foi capaz de dizer que o partido está numa “rota de crescimento”. A líder do PAN criticou o Presidente da República por ter convocado eleições e por ter, assim, aberto as portas ao crescimento da direita radical.
E é de facto para Marcelo que agora passa a responsabilidade de voltar a tomar decisões e tentar equilibrar o sistema num calendário e perante uma realidade com muitas limitações. Já tivemos vários governos minoritários e alguns até conseguiriam fazer aprovar orçamentos e até durar uma legislatura, mas nunca nenhum tão minoritário como o que sai desta realidade com que acordamos esta manhã.
Outras notícias
Óscares. Além de noite de eleições, foi noite de Óscares e aqui tem a lista dos vencedores e os momentos que marcaram a
noite.
Bola. E além de eleições e de Óscares, foi também noite de futebol, com o Benfica a vencer o Estoril e o Sporting a ganhar ao
Arouca.
Ramadão. Este domingo, 10, foi mesmo um dia cheio de acontecimentos. Para os
muçulmanos, foi o início do Ramadão, um tempo de jejum e de oração, mas também de
festa, que este ano tem “um início triste e tenso”.
Pão. Em Gaza, há fome e desespero, há bebés a morrer à fome e alimentos que não
chegam a porto seguro. Para acompanhar aqui.
Guerra e paz. Sobre a guerra na Ucrânia ainda ressoa a polémica sobre as
palavras do Papa Francisco que apelou à paz e disse que Kiev deve levantar uma
bandeira branca e negociar.
Frases
“Só se vê uma solução. Difícil. Complicada. Complexa. Mas a única capaz de segurar o barco: o bloco central, a coligação, escrita, contratada, entre o PSD e o PS. Será que os seus líderes têm a grandeza suficiente?”
António Barreto, no Público
“A alternância é boa para o país e para a democracia; já o populismo não lhe
faz bem nenhum.”
Henrique Monteiro, no Expresso
O que ando a ler
Entre as muitas publicações que têm saído e muitas outras que vão continuar a
ver a luz dos leitores nos próximos tempos a propósito dos 50 anos do 25 de
Abril, há um livrinho - pequeno, fácil de ler, com escrita escorreita de quem
está habituado a escrever notícias - sobre o que não mudou apesar de tanta
mudança. “Revolução Inacabada”, do jornalista João Pedro Henriques, ajuda-nos a
identificar duas vertentes da nossa vida comum que ainda não tiveram a mudança
que o desenvolvimento - o terceiro D de Abril - prometia: o domínio da política
pelas elites e o machismo na justiça. A propósito deste último, ainda na
sexta-feira, o Expresso trazia os mais recentes números divulgados
pela Associação de Apoio à Vítima (APAV) e, além dos números, a constatação de
que as queixas aumentam, mas as “condenações continuam a ser poucas”. E nem a
entrada de tantas mulheres para o meio judicial veio mudar o panorama: bastaram
menos de mil carateres para mudar a lei permitindo às mulheres serem juízes,
mas 50 anos ainda não foram suficientes para mudar o olhar.
Caro leitor, por agora fico por aqui, mas no seu Expresso tem ainda várias análises
e opiniões sobre os resultados eleitorais e atualização permanente do país e do
mundo. Até já.
Imagem: Henrique Monteiro | HenriCartoon
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