domingo, 8 de dezembro de 2013

William Tonet: "Presidente não seria alheio a um eventual assassinato da minha pessoa"

 

Deutsche Welle
 
O jornalista e jurista angolano William Tonet escreveu uma carta aberta ao Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, onde lhe agradece pela "maldade e perseguição" a que está sujeito.
 
Na missiva, William Tonet tece duras críticas ao Governo do MPLA, no que diz respeito, por exemplo, à atuação do Ministério do Ensino Superior, que invalidou o seu certificado académico, do isolamento de que é alvo o seu jornal, o Folha 8, e o impedimento de exercer a função de advogado de defesa em pleno processo.

DW África: Porque escreveu esta carta?

William Tonet (WT): Em democracia, é normal quando os cidadãos não têm outro recurso para chegar aos centros de decisão, publicitarem uma carta que poderia ser fechada. Mas acontece um conjunto de situações anormais, de perseguições que não lembram nem ao diabo. Portanto, em princípio podendo parecer atitudes isoladas de alguns governantes que querem mostrar serviço, a forma recorrente e quase mensal de campanhas contra William Tonet não pode passar, no atual quadro constitucional, à margem do Presidente da República, até porque todos os membros do seu gabinete são meros auxiliares. Logo, ele está por trás de tudo isso.
 
DW África: Há ilegalidades e irregularidades cometidas pelo governo do MPLA, como cita na sua carta aberta. Há possibilidade de as mesmas serem executadas sem o conhecimento ou aval do Presidente?

WT: À luz da Constituição, é muito difícil. Penso que o Presidente, ao nível do MPLA, tem competências das quais se podia acercar, tem pessoas que não precisam de o bajular para mostrar competência e fidelidade ideológica. O problema é que queremos fazer um país só com bajuladores. E este é que é o grande problema de Angola. E o que se passa em relação à minha pessoa é, de facto, uma perseguição para a qual não vejo razão de ser e o único responsável é o Presidente da República.

DW África: E porque é que acha que o Presidente da República o quer “aniquilar”?

WT: São todas estas evidências. Ao nível da Constituição, é ele que nomeia tudo. Ao nível do Governo, é ele que nomeia tudo. Não é possível que o Governo, que tem reuniões regulares, consiga perseguir, quer ao nível do Executivo, quer ao nível do partido, um cidadão como William Tonet, porque eu quero continuar a pensar pela minha cabeça. O Presidente não é alheio a toda essa perseguição e não o será a um eventual assassinato da minha pessoa e essa é a minha mais forte convicção.

DW África: Queixa-se do isolamento a que o Folha 8 está submetido, da anulação dos seus certificados académicos, da vandalização dos seus bens. Como é que consegue viver e trabalhar dentro deste contexto?
 
WT: As revoluções fizeram-se sempre em contextos diferenciados. Em processos em que havia discriminação, a humilhação de uns sobre outros. Sobrevivemos assim porque temos também a solidariedade de algumas pessoas que, efetivamente, não estão de acordo com esse tipo de práticas que estão a macular o nosso país. O nosso exercício não é fácil, mas temos a plena convicção: se todos nos ajoelharmos perante as injustiças, estaremos cada vez mais a cavar um fosso que nos levará de novo a uma guerra fratricida. Temos de fazer alguma coisa, continuar a resistir, esperar pela bala assassina, mas de pé, na verticalidade dos nossos ideiais.

DW África: O que espera com esta carta que dirigiu ao Presidente? Mudanças? Ou trata-se de gesto de revolta, de desabafo, no contexto da liberdade de expressão?

WT: Eu gostava que nós todos, incluindo o Presidente, refletíssemos. É possível que todos estejamos a cometer excessos, de alguma forma. Mas que é preciso diálogo entre os angolanos, isso é certo. Que há um mal-estar, uma insegurança do regime, isso também é verdade. Se não, o regime não compraria todos os órgãos de comunicação social.
 
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