Felipe
Amorim, São Paulo – Opera Mundi
Sob
o pretexto de participar de programas sociais, latino-americanos foram bancados
por agência do governo Obama para localizar potenciais dissidentes
Um
programa secreto do governo norte-americano de Barack Obama tentou por quase
cinco anos fabricar uma revolta política em Cuba usando jovens
latino-americanos, enviados à ilha sob o falso pretexto de participarem de
programas sociais e de saúde no país.
Com
base em documentos, reportagem publicada nesta segunda-feira
(04/08) pela agência de notícias AP revela que a Casa Branca não só
bancou a ida de jovens peruanos, venezuelanos e costa-riquenhos a Cuba, como os
colocou em perigo, já que não havia uma rede segura para ajudá-los caso fossem
capturados.
O
projeto dos "viajantes" foi lançado em outubro de 2009 pela Usaid
(Agência dos EUA para o Desenvolvimento Humanitário), escritório do governo
norte-americano que gerencia a verba bilionária que os EUA destinam a programas
sociais e de ajuda humanitária ao redor do mundo. É a mesma agência que havia
criado, também sigilosamente, a plataforma online "ZunZuneo",espécie de "Twitter cubano", visando
estimular agitação e dissidência política que desestabilizassem o governo do
presidente cubano, Raúl Castro.
Segundo
a investigação da AP, as autoridades norte-americanas acreditavam que os
"jovens espiões" ajudariam a provocar rebeliões em Cuba, viajando
pelo país para recrutar pessoas que julgassem ser potenciais ativistas
políticos.
Um
dos casos incluiu a formação de um grupo de trabalho para a prevenção da Aids,
célula que os memorandos da Usaid classificaram como "a desculpa
perfeita" para atingir os objetivos políticos da investida. Não é a
primeira vez que os EUA tentam, por meios escusos, se aproveitar de programas
humanitários de saúde para obter vitórias no campo da geopolítica: quando
tentava localizar no Paquistão Osama bin Laden, líder da Al Qaeda e autor dos
ataques de 11 de Setembro, a CIA chegou a criar uma falsa campanha de vacinação
contra a pólio para pôr as mãos em material genético que confirmasse o
paradeiro do terrorista — prática que foi duramente condenada e posteriormente abolida.
Táticas
de defesa
A
investigação da AP também detalha como os membros do programa faziam
para se comunicar entre si e evitar serem descobertos. Além de cartões de
memória criptografados, usados para esconder arquivos e enviar mensagens
cifradas, os viajantes também preenchiam seus laptops com "conteúdo
inocente" para tentar ludibriar as autoridades cubanas em caso de
suspeita.
Quando
escreviam "estou com enxaqueca", queriam comunicar a suspeita de que
o governo cubano estivesse monitorando suas atividades. "Sua irmã está
doente" significava que tinham vontade de terminar prematuramente a viagem.
As
medidas, entretanto, não impediram que os jovens espiões quase fracassassem na
sua tarefa de "identificar potenciais atores de mudança social". De
acordo com um dos agentes latino-americanos, eles receberam apenas uma palestra
de 30 minutos para aprender como burlar o serviço de inteligência cubano. Além
disso, não havia redes de segurança confiáveis para os inexperientes membros do
programa caso fossem capturados.
"Embora
não haja certeza absoluta, confiamos que as autoridades não tentarão
machucá-los fisicamente, apenas assustá-los", relata um memorando obtido
pela AP. E acrescenta: "Lembrem-se de que o governo cubano prefere
evitar repercussões negativas na imprensa, então um estrangeiro machucado não é
conveniente para eles".
De
acordo com a AP, a Usaid — e sua empresa privada prestando serviços
terceirizados no projeto, a Creative Associates International — continuou com o
programa mesmo depois de Alan Gross, também funcionário terceirizado dos EUA, ter
sido preso em 2009 sob acusações de espionagem.
Posição
da Usaid
"A
Usaid e o governo Obama estão comprometidos com o apoio ao desejo do povo
cubano de determinar livremente seu próprio futuro", respondeu a agência
dos EUA, procurada pela AP.
"A
Usaid trabalha com grupos independentes de jovens em Cuba nos projetos de serviço
comunitário, saúde pública, artes e outras oportunidades de engajar-se
publicamente, consistentes com programas democráticos mundo afora",
completa a declaração da agência norte-americana.
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