domingo, 21 de setembro de 2014

DESNUTRIÇÃO ATINGE “APENAS” 3,9 MILHÕES DE PESSOAS EM ANGOLA



Norberto Sateco – O País (ao)

Angola reduziu o número de pessoas que padecem de má nutrição para a metade, durante os últimos 25 anos, diz relatório do Fundo das Nações Unidas para a Alimentação (FAO), publicado nesta Quarta-feira, 17, em Roma. Enquanto isso, especialistas comunitários angolanos manifestam dúvidas quanto à fiabilidade destes dados

No mais recente relatório do Fundo das Nações Unidas para a Alimentação (FAO), relativo à Insegurança Alimentar no Mundo, Angola aparece com indicadores bastantes animadores.

O documento a que OPAÍS teve acesso, refere que o nosso país registou uma redução “acentuada” de pessoas que enfrentam diariamente o paradigma da desnutrição.

As mais de 6 milhões de pessoas que viviam nesta condição nos anos de 1990/1992 (aquando do fim do conflito armado) baixou para os actuais 3,9 milhões, tendo assim reduzido para metade da sua população desnutrida em apenas 25 anos. Ainda no mesmo documento apresentando pelo director-geral da FAO, José Graziano da Silva, Angola conta actualmente com 3,9 milhões de pessoas sub-nutridas, que implica estarem relegados à condição de má alimentação 18% de toda a população do país.

“Até 1992, a taxa de pessoas subnutridas era de 63,3% do total da população, enquanto neste ano fixouse em 18%, colocando Angola, desta forma, no ranking de países que alcançaram progressos face ao Objectivo de Desenvolvimento do Milénio traçado para 2015”, refere o relatório.

Entretanto, estes dados colocam Angola num lugar confortável ao nível do mundo, em consequência das políticas implementadas pelo executivo no apoio aos pequenos e médios agricultores, com destaque para a agricultura familiar que representa 75 por cento da produção nacional, segundo afirmou, recentemente, na região da Kibala, Kuanza-Sul, o titular da pasta da Agricultura, Afonso Pedro Canga.

Entretanto, em Janeiro deste ano, a Organização Não Governamental (Oxfam) avaliou a situação alimentar de 125 países e colocou Angola entre os três países com maior índice de sub-nutrição do mundo.

Moçambique e a Guiné-Bissau também figuram na lista dentre os 30 piores colocados. Segundo a argumentação de Deborah Hardoon, pesquisadora da Oxfam, não é a falta de comida que atira o país para o fim da tabela mas são essencialmente os preços elevados que se praticam sobre os produtos alimentares.

Dezasseis por cento das crianças angolanas, por exemplo, estão abaixo do peso ideal, segundo o estudo da mesma ONG Internacional. Contudo, destaca a pesquisadora que é o factor da volatilidade dos preços da comida que atira Angola para as piores posições.

“Em Angola assistimos valores muito altos de venda de comida e um recorde de instabilidade no preço dos alimentos”, explicou, tendo acrescentado um outro problema relacionado com o acesso a água potável.

Reacções

De acordo fontes do Ministério da Agricultura a que O PAÍS teve acesso, são vários os projectos que têm sido levados a cabo ao nível das comunidades rurais, em parceria com a FAO, para se atingir esta cifra, tomando como exemplo as escolas de campo nas províncias do Bié e Huambo, onde os camponeses são sensibilizados para novas práticas e técnicas de cultivo com vista a maximizar a produção e melhorar a sua condição económica.

As inquietações que são recorrentemente apresentadas pelos pequenos e médios agricultores, de falta de apoios financeiros do Estado, têm estado a agudizar-se segundo O PAÍS apurou junto da fonte, que disse bastar um olhar para a verba destinada ao sector da agricultura familiar estimada num valor de 1,3 mil milhões de Kwanzas, montante que no ano seguinte manteve-se quase inalterável com 1,4 milhões de Kwanzas.

O responsável do Departamento de Segurança Alimentar do Ministério da Agricultura, contactado para ajudar a compreender estes números disse não estar ao corrente do referido relatório, tendo prometido pronunciar-se numa próxima oportunidade.

Relatório deixa dúvidas

Já para o activista comunitário, Pio Wakussanga os números apresentados pela FAO deixam muitas dúvidas, uma vez que o levantamento estatístico que na maior parte das vezes é feito não tem sido abrangente e inclusivo nas comunidades mais afectadas pela fome.

Para o também sociólogo, olhando para os últimos anos em que o país viveu a seca, várias pessoas ficaram relegadas à condição de má nutrição, daí não intender estes dados apresentados pelo Fundo das Nações Unidas para a Alimentação. “Eu não sei onde a FAO foi buscar estes dados.

Ao nível do interior de Angola a população vive fome e sede devido à falta de água. A situação já existe em algumas zonas há mais de três anos e não tem evoluído, antes pelo contrário, tem piorado”, esclareceu o entrevistado.

O também clérigo católico apontou um outro problema que “até hoje não tem tido pernas para andar”, relativo à sexta básica das famílias afectadas pela fome devido à seca no Cunene e na região dos Gambos, na Huíla.

As 800 mil famílias afectadas pela crise, na última região citada, subiram drasticamente embora reconheça a intenção do Executivo construir diques para reservar água com o fito de implementar culturas resistentes e dar de beber ao gado. Este especialista comunitário manifestou também preocupação quanto ao êxodo rural que se regista nas comunidades.

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