REGIME
BRINCA COM COISAS SÉRIAS E TRANSFORMA ASSEMBLEIA NACIONAL EM TEATRO
O Orçamento Geral
do Estado, na versão rectificada, é só por si uma brilhante peça, dir-se-ia que
é mesmo uma obra-prima, do anedotário internacional. Mas como é para matumbos,
siga a farra que o bordel precisa de bobos que animem a corte.
Oswaldo Calonda e Kuiba Afonso - Folha 8 (ao) Digital - 28 fevereiro 2015
A bancada
maioritária do MPLA, como era de esperar, no cumprimento das orientações
expressas e expressivas do Titular do Poder Executivo, José Eduardo dos Santos
e, na prática, o verdadeiro Presidente da Assembleia Nacional, cumpriu a rigor
o previsto e sem pestanejar aprovou, na generalidade, o rectificado Orçamento
Geral do Estado, fundamentado na crise da baixa do preço do petróleo, no
mercado internacional.
Este acto, para
desgraça colectiva não tem nenhum significado, nem relevância, para a melhoria
da vida da maioria dos angolanos, pelo contrário, uma vez ser mero regabofe,
porquanto, diferentemente, do normal em qualquer parlamento democrático, a
Assembleia Nacional de Angola é incompetente para fiscalizar os actos do
Executivo.
Se assim é, que
interesse tem este exercício, senão o de se assemelhar a um “teatro de
fantoches”, que aprova algo relevante, mas que não pode fiscalizar, nem
questionar, pelo facto de uma engenharia “gabinetal constitucional de cariz
partidocrata”, com a chancela do Tribunal Constitucional colocar o Presidente
da República como órgão de soberania, quando nunca foi nominalmente eleito,
pelo povo soberano e o sistema de governo a luz da actual constituição ser
parlamentar, pois os eleitores elegem a lista dos partidos políticos ou coligação
de partidos, que têm um cabeça de lista...
Mas essa é a
postura do MPLA e, com este partido, toda batota ou interpretação fraudulenta
da norma, parece valer a justificação dos meios, para atingir os fins.
Desta forma o OGE
retificado, prevê, para as despesas com os “serviços públicos gerais”, na
visão dos peritos do regime, uma reserva de 15,32% do orçamento, sendo que para
os “órgãos executivos” estão previstos 11,02% e para os “órgãos legislativos”
a colossal cifra de 0,38%. No caso dos “serviços gerais da administração
pública não especificados”, a percentagem é de 0,81%, a quarta maior fatia desta
rubrica.
A
“defesa militar” conta com 7,79%, acima da “segurança e ordem pública” para
que estão reservados 7,59% do OGE. Anote-se, contudo, que só os “serviços de
segurança e ordem pública não especificados” contam ainda com uma percentagem
de 7,11%.
Em
matéria dita de “educação”, o OGE prevê 8,59% e 1,18% para o “ensino superior”.
O “ensino primário” é o principal privilegiado com 5,79%, estando previsto
para o “ensino pré-escolar” a enorme percentagem de 0,02%.
Quanto
à “saúde”, sector onde o país não enfrenta – na versão do governo – problemas
especiais, o orçamento aponta despesas de 4,95%. A prova de que tudo está bem
nesta matéria é que aos “serviços de saúde ambulatórios” toca 0,03%.
Relativamente
à “protecção social”, o OGE prevê despesas de 12,97%, cabendo a maior fatia
(7,12%) aos ditos “serviços de protecção social não especificados”.
De
acordo com o OGE, a “habitação e serviços comunitários” conta com 4,67%,
cabendo ao “desenvolvimento comunitário” a importante percentagem de… 0,01% e
de 0,06% ao “saneamento básico”.
Para
a rubrica de “recreação, cultura e religião” o Executiva aponta 0,84%, cabendo
a fatia de leão aos “serviços de difusão e publicação” com 0,39%.
Mostrando
uma rara valentia, os peritos do regime apostam forte (à sua medida, é claro)
nos “assuntos económicos”, com 10,72%. Revela-se, aliás e de forma clara, a
decisão paradigmática feita na agricultura, sector para o qual o OGE prevê
nada mais nada menos do que… 0,45%.
E
na previsão do “boom” da agricultura, o Governo atribui ao sector dos
“transportes” 1,26%.
Na
mesma linha, a rubrica dos “combustíveis e energia” terá à sua disposição
3,07%.
Os
“assuntos económicos gerais, comerciais e laborais” são dotados com 4,94%,
sendo 4,79% para os “assuntos económicos e comerciais em geral”, 0,05% para os
“assuntos laborais em geral” e 0,10% para o “turismo”.
Outra
grande e decisiva aposta do Governo é nas “comunicações e tecnologias da
informação”, sector para o qual o OGE aponta 0,30% das despesas. Igualmente
relevante é a “protecção ambiental” que conta com 0,49%, tendo – a título de
exemplo – a rubrica “gestão de águas residuais” orçamentada despesas de 0,01%.
Por
último, o OGE prevê para as “operações da dívida pública interna” 12,70% e
13,23% para as “operações da dívida pública Externa”.
O
OGE, revisto devido à quebra da cotação do petróleo no mercado internacional,
implicará um corte de um terço nas despesas totais. O documento define que a
previsão da cotação do barril de crude para exportação, necessária para a
estimativa das receitas fiscais, desce de 81 para 40 dólares. Esta revisão
fará reduzir o peso do petróleo nas receitas fiscais angolanas de 70% em 2014
para 36,5% este ano.
Em
resultado da quebra do preço do petróleo, as dificuldades
sentem-se, designadamente, no envio de divisas em moeda estrangeira para fora
de Angola, num contexto de acentuada diminuição das receitas fiscais e da
escassez de divisas estrangeiras, nomeadamente dólares.
A
proposta fixa um défice orçamental de 7% do Produto Interno Bruto (PIB), face
aos 7,6% do documento que entrou em vigor a 01 de Janeiro. O “buraco” nas
contas públicas angolanas de 2015 está agora avaliado em 806,5 mil milhões de
kwanzas (6,7 mil milhões de euros). O limite da receita e da despesa do OGE
desce de 7,251 biliões de kwanzas (60,7 mil milhões de
euros) para 5,454 biliões de kwanzas (45,6 mil milhões de euros), na versão
revista (corte de 25% nas despesas correntes).
A
previsão da taxa de crescimento do PIB angolano é reduzida de 9,7 para 6,6%,
enquanto a inflação estimada sobe de 7 para 9%.
A
bancada parlamentar da CASA-CE, a segunda força da oposição, diz-se excluída
de participar no debate, por ter sido convocado para um período que coincide
com as suas jornadas parlamentares.
Já
a UNITA acusou o Governo, liderado pelo MPLA, de “não aprender a lição” da
crise petrolífera de 2009 e que a revisão que agora chega ao parlamento
confirma as críticas de “falta de realismo” que o partido lançou aquando da
discussão do Orçamento ainda em vigor.
A
suposta discussão do novo OGE tinha a aprovação garantida à partida, desde
logo porque o presidente do MPLA é também, para além de Presidente da
República, Titular do Poder Executivo e, bem vistas as coisas, Presidente da
Assembleia Nacional, já que esta não tem sequer capacidade de fiscalizar os
actos do executivo, por o seu titular se chamar, nada mais nada menos que o cidadão
super especial, José Eduardo dos Santos.
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