Todos
os membros do Tribunal de Contas de Cabo Verde estão fora de prazo. A começar
pelo seu presidente, José Carlos Delgado, que cessou funções desde Julho do ano
passado. Idem para o juiz José Pedro da Costa Delgado e para a juíza Sara Boal.
O caso mais gritante é o do juiz conselheiro Horácio Dias Fernandes que há três
anos está sem mandato. Mas apesar do estado anómalo em que vive uma das
instituições mais importantes deste país – compete-lhe controlar e julgar as
contas do Estado –, os magistrados permanecem nos seus postos, o que levanta
dúvidas sobre a legalidade das suas decisões.
Colocado
frente a este facto, o Procurador-Geral da República, Óscar Tavares, lembra que
os princípios que regem a prestação de serviço público determinam que os juízes
do Tribunal de Contas devem manter-se em funções até à tomada de posse dos
novos designados, pelo que todas as decisões do TC são válidas. Só que juristas
ouvidos por A Semana contrapõem dizendo que falta legitimidade democrática ao
TC, daí defenderem a sua recomposição urgente, para que também tenha
legitimidade moral para julgar os outros.
No
momento em que há fumo branco quanto à composição dos órgãos externos ao
Parlamento – Tribunal Constitucional, Comissão Nacional de Eleições, Comissão
Nacional de Protecção de Dados Pessoais (CNPDP) e Alta Autoridade da
Comunicação Social (AACS) –, a situação do Tribunal de Contas destoa.
É
que este órgão, uma das instituições mais importantes de Cabo Verde, tem todos
os seus membros com mandato expirado. O presidente do TC, José Carlos Delgado,
foi empossado a 20 de Maio de 2004 e reconduzido ao cargo a 29 de Junho de 2009
para mais um mandato de cinco anos. Mas cessou funções desde Junho de 2014, não
foi reconduzido nem se tem notícia de nenhum despacho a prorrogar a sua estadia
no TC.
O
trio de Juízes Conselheiros que integra o TC está na mesma situação. José Pedro
da Costa Delgado, investido no cargo a 20 de Maio de 2004, viu renovada a sua
comissão de serviço a 29 de Junho de 2009. O seu mandato de cinco anos terminou
desde o ano passado.
Sara
Maria Boal tomou posse a 17 de Outubro de 2003, foi reinvestida a 2 de
Fevereiro de 2009 para mais cinco anos de mandato, o que quer dizer que o seu
mandato caducou há um ano.
O
caso de Horácio Dias Fernandes é o mais gritante, há quem diga que, inclusive,
já terá partido para a reforma, sem que seja nomeado o seu substituto. Tomou
posse a 14 de Março de 2002 e foi reconduzido ao cargo a 16 de Julho de 2007.
Ou seja, o seu mandato no TC expirou há cerca de três anos.
Legalidade
em causa
Apesar
disso, o Governo ainda não decidiu se vai renovar os mandatos dos “passados de
prazo” ou indicar outros nomes para recompor o Tribunal de Contas. Entretanto,
o TC continua a funcionar, o que levanta dúvidas sobre a sua legalidade. “Não
existe um vazio de poder jurisdicional, mas há um problema de legitimidade,
pois num Estado de Direito Democrático não deve haver cargos de duração
indeterminada”, analisa Amadeu Oliveira.
Ademais,
“todas as funções, sobretudo as de nomeação ou de eleição, possuem um mandato
que é determinado por um período. Portanto, o que está em causa é a legitimidade
democrática e não um caso de vazio de poder”, reitera o advogado.
O
causídico explica que a lei prevê que o titular de qualquer cargo público deve
manter-se nas suas funções até à posse dos seus substitutos, mas isso deve ser
uma medida de carácter temporário. “A manutenção no cargo é transitória e não
pode ser regra, pelo que ninguém devia ser mantido no posto por mais de um ano
em regime transitório”, defende.
O
jurista Agnelo Martins lembra, por seu lado, que o Princípio dos Titulares de
Cargos Públicos dá poder ao TC. “O tribunal tem que julgar porque segundo o
Princípio de Titulares de Cargos Públicos eles não podem abandonar o posto até
serem nomeados os seus substitutos. Mas é preciso exigir aos órgãos competentes
que designem novos juízes e presidente do TC, sob pena dos actuais continuarem
lá por tempo indeterminado”.
Um
ponto de vista com que concorda o actual Procurador-Geral da República, Óscar
Tavares. “Independentemente do tempo decorrido desde o início de funções dos
actuais juízes do Tribunal de Contas, todas as decisões tomadas no exercício
das suas funções são válidas – porquanto as normas e os princípios que regem a
prestação do serviço público, designadamente as que compõem o estatuto dos
juízes do TC, suas remissões, bem como o princípio da continuidade da prestação
de serviços públicos, determinam que os seus juízes se mantenham em funções até
à tomada de posse de novos designados para os respectivos lugares”, remata
Óscar Tavares.
A
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