Em
Moçambique, o Presidente Nyusi endurece o seu discurso sobre a crise política
com a RENAMO e manda recados à oposição. Em entrevista à DW África, o
especialista Adelson Rafael comenta a posição do Presidente.
Quando
assumiu o poder, Filipe Nyusi manifestou abertura para o diálogo com o líder da
RENAMO, Afonso Dhlakama. Porém, o Presidente de Moçambique diz agora que não
gostaria de se ajoelhar diante de outro moçambicano em nome da paz.
Nyusi
declarou ainda que quer reformar o sistema de governação do país, para que se
torne mais científico e não apenas baseado em "simples esperteza".
É
caso para se falar sobre radicalização de posições por parte do novo
Presidente? A DW África entrevistou o especialista em boa governação Adelson
Rafael acerca deste assunto.
Adelson
Rafael (AR): Não diria que haja um recuo do posicionamento do Presidente,
antes pelo contrário. Nyusi demonstrou que deixou cada poder trabalhar de
maneira independente. A reprovação do antigo projeto das regiões autónomas não
fecha em si este processo. Existe mérito em termos das questões tratadas na
proposta, mas pode ser que por questões de legalidade ou de constitucionalidade
elas estejam erradas. O que agora tem de se acentuar e o que é incontornável é
que tem que se abrir espaço para um debate específico sobre o mérito existente
na proposta. O segundo aspeto que tem de se tomar em consideração é que, apesar
de o Presidente ter dito que não se irá ajoelhar, também não pretende governar
um país com uma crise como aquela que Moçambique vive atualmente. Nunca antes o
país passou por uma crise como a de agora durante tanto tempo depois de umas
eleições. O Presidente diz que não se deve ajoelhar e que não se vai submeter a
pressões, mas não refere que fecha as possibilidades de diálogo para encontrar
uma solução para a paz.
DW
África: No entanto, Filipe Nyusi endureceu o seu discurso com este
pronunciamento.
AR: O
primeiro sinal de endurecimento do Presidente da República veio após a visita
que efetuou ao Estado Maior General das Forças Armadas, onde solicitou
contenção da reação das tropas perante qualquer intenção de alteração da
situação do país que fosse para além das questões da eleição, embora pouca
importância lhe tenha sido dada. Agora este momento foi para gerar coerência
perante o seu primeiro discurso.
DW
África: Depois de 100 dias de governação, Filipe Nyusi falou sobre o que
constatou na visita aberta que fez pelo país, e também terá deixado uma espécie
de “recado” ao dizer que a governação se educa, e que se deve tornar mais
científica e não simples “esperteza”. Há alguma mensagem subjacente a este
pronunciamento?
AR: Sim.
Essa é uma mensagem explícita, muito por conta do que ele pretende dos outros
intervenientes políticos, com destaque para a RENAMO. Ele pretende que o
processo da política não seja um processo de mera imposição pela força e de
questões que privilegiem apenas a adesão à chantagem, e por isso tem de se
aprender. O Presidente pretende aqui passar a mensagem de que sendo a
governação uma coisa que se ensina, há que aprender com base em pressupostos, e
não meramente para tirar proveito de uma situação, como a RENAMO ultimamente
tem feito, em função do desgaste que a governação da FRELIMO tem criado na
população.
DW
África: Não se pode então dizer que as constatações e pronunciamentos que estão
a ser feitos representem um radicalizar de posição por parte do Presidente?
AR: Não,
de maneira alguma. Não vejo aqui um radicalismo, mas sim o trazer à realidade
as questões que já num passado recente foram deixadas para trás sem ter sido
tomada uma posição firme. Estamos num Estado de direito democrático em que há
que seguir o que é definido pela lei, mas também sem fechar qualquer porta de
diálogo ou qualquer porta para uma constante inclusão dos demais intervenientes
políticos.
DW
África: Antevê algum retorno de confrontos depois desta reprovação no
Parlamento?
AR: Não
diria retorno dos confrontos, mas não se pode pôr de lado que vão existir focos
de medo, como ocorreram agora a nível de Inhambane e em Guijá, porque a RENAMO
tem muitos homens armados. Quando falamos no processo da militarização não
podemos somente associar esse processo ao desarmamento, porque o desarmamento
consiste em retirar as armas, mas a mente do militar ainda está na RENAMO. Se
eles tiverem acesso a instrumentos de criar desestabilização, os confrontos
podem voltar.
O
líder do maior partido da oposição, Afonso Dhlakama, apelou à FRELIMO para que
reconsidere e viabilize o projeto de criação de autarquias provinviais,
deixando o aviso de que "a RENAMO e o povo não vão recuar", e de que
o partido não quer ser obrigado a governar à força.
Nádia
Issufo – Deutsche Welle
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