Conferência
de imprensa reuniu familiares e advogados dos 15+1 no Teatro Elinga. Quatro dos
detidos estão em greve de fome.
Miguel
Gomes – Rede Angola
A
defesa dos 15+1 presos políticos, detidos desde 20 de Junho, em diversos
estabelecimentos prisionais das províncias de Luanda e Bengo, admite recorrer
para o Tribunal Constitucional para garantir a liberdade imediata dos seus
clientes. Passados mais de 90 dias de reclusão, de 85 dias em solitária sem
acusação formada e de oito dias de greve de fome (quatro dos detidos) ficamos
também a saber que o processo está na 14.ª secção do Tribunal Provincial de
Luanda, que fica em Cacuaco.
A
conferência de imprensa, realizada ontem no Teatro Elinga, em Luanda, juntou
advogados e familiares dos presos políticos com o objectivo de esclarecer a
opinião pública. Foi um desfiar de relatos trágicos, apesar de os detidos terem
sido entretanto retirados das celas solitárias. Neste momento estão na
companhia de outros presos.
Walter
Tondela, um dos causídicos que faz parte da equipa de defesa, explicou que
esteve na passada quinta-feira, 24, em Cacuaco, para tentar obter mais
informações sobre o processo mas o procurador de serviço não o quis receber. “A
única coisa que nos disse foi: este é um processo conduzido por ordens
superiores”, contou o advogado. A estratégia da defesa passa por esgotar todos
os recursos possíveis para, em última instância, recorrer ao Tribunal Constitucional
e requerer (pelo menos) a liberdade provisória ou a liberdade mediante caução.
As
arbitrariedades ao longo do processo, segundo os advogados e as famílias dos
detidos, são de toda a ordem. Não se cumprem os prazos legais de prisão
preventiva (já ultrapassados), os advogados queixam-se das enormes dificuldades
que enfrentam para falar com os seus constituintes, a Procuradoria Geral da
República demorou cerca de dois meses a analisar o pedido de habeas corpus,
as mulheres são revistadas com agressividade e, em alguns casos, obrigadas a
tirar a roupa para a revista (sob pena de não poderem aceder ao estabelecimento
prisional).
Para
além disto, e ao contrário do que está plasmado na Constituição (que garante o
direito a visitas por parte de amigos e dos advogados, para além dos parentes
directos), as famílias lamentam que as regras para as visitas mudem consoante o
oficial que está de serviço. E que sejam diferentes entre os estabelecimentos
prisionais.
Esperança
Gonga, mulher de Domingos da Cruz (jornalista e autor de diversas obras sobre
direitos humanos), explica que o “sofrimento e o descontentamento é muito
grande. O corpo deles começa a dar sinais de que não está a aguentar todas
estas privações. Só de os olhar ficamos logo com a moral em baixo. Apresentam
um semblante de grande sofrimento – e apenas perguntam: o prazo de prisão
preventiva já acabou? O que se diz lá fora sobre o nosso caso?”, conta
Esperança Gonga.
“Nós
precisamos de respostas. Eles estavam a construir mentes, juntavam-se para
trocar ideias e falar de política, nunca utilizaram violência para nada e já
demonstraram que não são agressivos. Exigimos paz, amor, democracia e liberdade
já!”, reforçou Esperança Gonga.
Depois
tomou a palavra Pedro Beirão, irmão do músico e activista Luaty Beirão
(conhecido nas lides artísticas como Ikonoclasta). “O meu irmão está há oito
dias em greve de fome, depois de ter ficado 85 dias em solitária, sem acusação
formada. Fiquei chocado com o peso que ele perdeu nos últimos dias. Acredito
que, se nada mudar na sua alimentação, o Luaty vai deixar de ter forças para
andar”, explicou.
António
Ventura, membro e ex-presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD),
lembrou que “os funcionários do Estado, seja qual for a sua função, têm o dever
de respeitar a Constituição e a legalidade e devem rejeitar a participação em
actos contrários a estes princípios. Neste sentido, a greve de fome é uma forma
legitima de pressionar os órgãos de justiça, para que se dignem a dar resposta
aos anseios dos detidos. É uma forma de pressionar o cumprimento da lei”,
defende o dirigente associativo e activista dos direitos humanos.
“Decorrido
o prazo legal de 90 dias de prisão preventiva, que pode ser prorrogado mediante
justificação do Ministério Público (MP) – o que não aconteceu – é obrigatória a
libertação dos detidos. É obrigatória. Não há outra hipótese”, defende o
advogado Luís Nascimento.
“No
dia 21 de Setembro, depois de se completarem os tais 90 dias de prisão,
enviamos um requerimento dirigido ao procurador junto do Serviço de
Investigação Criminal (SIC), que foi recebido no mesmo dia, a exigir a
libertação provisória dos detidos mediante constituição de termo de identidade
e residência. Não houve resposta, até agora. No dia 24 de Setembro, repetimos a
diligência, mas agora dirigida ao próprio Procurador Geral da República. Também
estamos sem qualquer resposta”, explica Luís Nascimento.
Nascimento
frisa que todo o processo “é uma violação extrema e flagrante da Constituição,
quer do lado da Procuradoria Geral da República, quer do Ministério Público”.
Os
15+1 detidos são suspeitos de preparar um acto de rebelião ou um atentado
contra o Presidente da República, José Eduardo dos Santos. O crime está
tipificado no âmbito dos crimes contra a segurança do estado. A maioria foi
detida no dia 20 de Junho (nos dias seguintes o SIC concretizou mais detenções
em vários pontos da capital), numa casa do bairro Vila Alice, em Luanda, quando
preparava-se para analisar e discutir um livro do autor norte-americano Gene
Sharp.
Neste
momento, os presos estão repartidos por quatro estabelecimentos prisionais:
Viana (4), Hospital-Prisão de São Paulo (devido a complicações de saúde),
Kalomboloca (7) e Kakila (4).
Foto
Ampe Rogério/RA
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