domingo, 13 de setembro de 2015

Moçambique. ORÇAMENTO DE ESTADO É POUCO TRANSPARENTE E MAL FISCALIZADO




Orçamento do Estado é pouco transparente, tem pouca participação do povo e não é bem fiscalizado pelo Parlamento em Moçambique

Adérito Caldeira  - Verdade

O Orçamento do Estado moçambicano, apesar das reformas implementadas pelo Governo na gestão das finanças públicas, continua a ser pouco transparente, com fraca participação dos cidadãos durante a sua elaboração e não é devidamente fiscalizado pelo Parlamento, constata o Índice do Orçamento Aberto 2015 realizado pelo Centro de Integridade Pública (CIP) em parceria com o International Budget Partnership (IBP). O empréstimo de 850 milhões de dólares contraído pela empresa estatal de Atum (EMATUM), avalizado pelo Estado sem a aprovação da “Casa do Povo”, é apenas um dos casos mais evidentes.

Avalizando a operação da EMATUM - empresa estatal que tem como accionistas o IGEPE (Instituto de Gestão das Participações do Estado), a Emopesca (Empresa Moçambicana de Pesca) e, a GIPS (Gestão de Investimentos, Participações e Serviços, Limitada), uma entidade unicamente participada pelos Serviços Sociais da polícia secreta de Moçambique, o SISE (Serviço de Informação e Segurança do Estado) - o Executivo, na altura da governação de Armando Guebuza, violou o limite do valor que, por força da Lei Orçamental, possui como máximo para a concessão de garantias pelo Estado e ainda realizou a operação financeira fora da Conta da Geral do Estado(CGE).

“Na CGE de 2013 não consta qualquer informação dos avales e garantias concedidos pelo Estado, cujo limite foi fixado em 183.500 mil meticais para os avales e garantias do Estado, pelo artigo 11 da Lei n.º 1/2013, de 7 de Janeiro, que aprova o Orçamento do Estado de 2013”, escreve o Tribunal Administrativo (TA) no seu Relatório sobre a Conta Geral do Estado de 2013 e que observa que “o Governo, sem a devida autorização, emitiu avales e garantias no valor total de 28.346.620 mil meticais”.

Também contribuiu para a nota negativa o facto de o Parlamento efectuar “um controlo fraco durante a fase de planeamento do ciclo orçamental e nenhum controlo durante a fase de implementação do ciclo orçamental. Por um lado, o poder legislativo não fiscaliza permanentemente o Orçamento e, por outro, os deputados do partido Frelimo usam a ditadura do voto da maioria para aprovar sem questionar as Contas Gerais do Estado”.

“Nem todas as instituições que arrecadaram receitas próprias as canalizaram às DAF´s (Direcções de Áreas Fiscais) das suas áreas de jurisdição e destas para a CUT (Conta Única do Tesouro), em violação do estatuído no n.º 1 do artigo 12 da Circular n.º 1/GAB-MF/2010, de 6 de Maio, do Ministro das Finanças, que define os conceitos e procedimentos relativos à inscrição, no Orçamento do Estado, cobrança, contabilização e recolha de receitas consignadas e próprias”, detectou o relatório do Tribunal Administrativo sobre a Conta Geral do Estado de 2013 aprovada pelo voto maioritário da bancada do partido do Governo.

Mesmo que a Assembleia da República tivesse um “gabinete especializado de pesquisa do orçamento”, como sugere o CIP, para monitorar regularmente o Orçamento do Estado, a verdade é que, enquanto o partido do Governo tiver a maioria dos deputados, os Governos do partido Frelimo continuarão a gerir as contas públicas a seu bel-prazer.

Orçamento para cidadão não ver

A directora nacional adjunta de planificação e orçamento, Sharmila Ali, presente no acto de lançamento do Índice do Orçamento Aberto 2015 não se quis pronunciar sobre a questão da EMATUM nem sobre as operações realizadas por instituições do Estado fora da Conta Geral do Estado.

“(...)Nós temos um sistema que é a CUT(Conta Única do Tesouro) em que todos os recursos públicos, toda a receita que entra para o Governo passa por esta via, e toda informação que é pública em termos de recursos internos e recursos externos de princípio ela tem que entrar para o Orçamento”, afirmou Sharmila Ali que no entanto não desmentiu a falta de transparência que ensombra a gestão do dinheiro do erário.

Procurando contrariar um dos resultados do Índice, que indica que “o Governo de Moçambique fornece ao público informações mínimas sobre o orçamento”, a directora nacional adjunta de planificação e orçamento destacou a publicação do Orçamento Cidadão. “(...)Nós começámos em 2013 e de lá para a frente o que temos estado a fazer é disponibilizar a informação do Orçamento de Estado numa versão simplificada, numa versão acessível em que qualquer um tem a possibilidade de ter acesso a esta informação”.

Porém, confrontada pelo @Verdade sobre como os moçambicanos podem ter acesso a este Orçamento Cidadão, Sharmila Ali reconheceu que o documento está apenas disponível no sítio da Internet da Direcção Nacional de Orçamento e é publicado em dois jornais que são vendidos em Maputo e em algumas capitais provinciais.

Relativamente à forma como um cidadão, que tivesse acesso ao Orçamento, pode dar os seus comentários e sugestões a representante do Governo a nossa interlocutora disse que “nós actualmente não temos esse espaço”.

Efectivamente apenas os chamados parceiros de cooperação e as organizações da sociedade civil que estão baseadas em Maputo, ou conseguem meios para se manterem na capital do país, têm a oportunidade de participar na elaboração do Orçamento através da sessão plenária do Observatório de Desenvolvimento.

Os Orçamentos Cidadão publicados acabam por ser um instrumento de propaganda do Governo, pois omitem deliberadamente vários detalhes relevantes. A título de exemplo, o Orçamento Cidadão de 2015 mostra apenas os valores que o Governo se propõe a gastar com a protecção social, com educação, saúde, infra-estruturas, agricultura e justiça, mas não revela quando vai ser gasto pelas Forças Armadas ou pelo Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE).

Recomendações para melhorar a transparência, participação e controlo

O Centro de Integridade Pública recomenda, para melhorar a transparência orçamental, “Publicar a revisão semestral e o relatório de fim de ano de forma atempada e consistente” e “Aumentar a abrangência da proposta de orçamento do Executivo, apresentando, por exemplo, informações mais abrangentes sobre a classificação de despesas de anos futuros e a classificação de despesas de anos anteriores.”

Para melhorar a participação o CIP sugere: “Estabelecer mecanismos credíveis e eficazes (p.e. audiências públicas, inquéritos, grupos focais) para recolher uma variedade de perspectivas do público sobre o orçamento público; Realizar audiências públicas sobre os orçamentos de ministérios específicos e sobre relatórios de auditoria onde o público possa apresentar as suas posições; e Criar mecanismos formais para que o público auxilie a instituição suprema de auditoria a formular o respectivo programa de auditoria e participe em investigações de auditoria”.

Para Moçambique reforçar o controlo orçamental, a organização não-governamental recomenda: “Criar um gabinete especializado de pesquisa do orçamento para o corpo legislativo; Tanto em termos legislativos como em termos práticos, garantir que o corpo legislativo é consultado antes da transferência de fundos do orçamento promulgado, antes de se gastarem quaisquer receitas não esperadas e de se gastarem fundos de contingência que não foram identificados no orçamento promulgado; e Assegurar que a instituição suprema de auditoria tem recursos adequados para desempenhar as suas funções, como determinado por um órgão independente (p.e. legislativo ou judiciário)”.

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