Orçamento
do Estado é pouco transparente, tem pouca participação do povo e não é bem
fiscalizado pelo Parlamento em Moçambique
Adérito
Caldeira - Verdade
O
Orçamento do Estado moçambicano, apesar das reformas implementadas pelo Governo
na gestão
das finanças públicas, continua a ser pouco transparente, com fraca
participação dos cidadãos durante a sua elaboração e não é devidamente
fiscalizado pelo Parlamento, constata o Índice do Orçamento Aberto 2015
realizado pelo Centro de Integridade Pública (CIP) em parceria com o
International Budget Partnership (IBP). O empréstimo de 850 milhões de dólares
contraído pela empresa estatal de Atum (EMATUM), avalizado pelo Estado sem a
aprovação da “Casa do Povo”, é apenas um dos casos mais evidentes.
Avalizando
a operação da EMATUM - empresa estatal que tem como accionistas o IGEPE
(Instituto de Gestão das Participações do Estado), a Emopesca (Empresa
Moçambicana de Pesca) e, a GIPS (Gestão de Investimentos, Participações e
Serviços, Limitada), uma entidade unicamente participada pelos Serviços Sociais
da polícia secreta de Moçambique, o SISE (Serviço de Informação e Segurança do
Estado) - o Executivo, na altura da governação de Armando Guebuza, violou o
limite do valor que, por força da Lei Orçamental, possui como máximo para a
concessão de garantias pelo Estado e ainda realizou a operação financeira fora
da Conta da Geral do Estado(CGE).
“Na
CGE de 2013 não consta qualquer informação dos avales e garantias concedidos
pelo Estado, cujo limite foi fixado em 183.500 mil meticais para os avales e
garantias do Estado, pelo artigo 11 da Lei n.º 1/2013, de 7 de Janeiro, que
aprova o Orçamento do Estado de 2013”, escreve o Tribunal Administrativo (TA)
no seu Relatório sobre a Conta Geral do Estado de 2013 e que observa que “o
Governo, sem a devida autorização, emitiu avales e garantias no valor total de
28.346.620 mil meticais”.
Também
contribuiu para a nota negativa o facto de o Parlamento efectuar “um controlo
fraco durante a fase de planeamento do ciclo orçamental e nenhum controlo
durante a fase de implementação do ciclo orçamental. Por um lado, o poder
legislativo não fiscaliza permanentemente o Orçamento e, por outro, os
deputados do partido Frelimo usam a ditadura do voto da maioria para aprovar
sem questionar as Contas Gerais do Estado”.
“Nem
todas as instituições que arrecadaram receitas próprias as canalizaram às DAF´s
(Direcções de Áreas Fiscais) das suas áreas de jurisdição e destas para a CUT
(Conta Única do Tesouro), em violação do estatuído no n.º 1 do artigo 12 da
Circular n.º 1/GAB-MF/2010, de 6 de Maio, do Ministro das Finanças, que define
os conceitos e procedimentos relativos à inscrição, no Orçamento do Estado,
cobrança, contabilização e recolha de receitas consignadas e próprias”,
detectou o relatório do Tribunal Administrativo sobre a Conta Geral do Estado
de 2013 aprovada pelo voto maioritário da bancada do partido do Governo.
Mesmo
que a Assembleia da República tivesse um “gabinete especializado de pesquisa do
orçamento”, como sugere o CIP, para monitorar regularmente o Orçamento do
Estado, a verdade é que, enquanto
o partido do Governo tiver a maioria dos deputados, os Governos do partido
Frelimo continuarão a gerir as contas públicas a seu bel-prazer.
Orçamento
para cidadão não ver
A
directora nacional adjunta de planificação e orçamento, Sharmila Ali, presente
no acto de lançamento do Índice do Orçamento Aberto 2015 não se quis pronunciar
sobre a questão da EMATUM nem sobre as operações realizadas por instituições do
Estado fora da Conta Geral do Estado.
“(...)Nós
temos um sistema que é a CUT(Conta Única do Tesouro) em que todos os recursos
públicos, toda a receita que entra para o Governo passa por esta via, e toda
informação que é pública em termos de recursos internos e recursos externos de
princípio ela tem que entrar para o Orçamento”, afirmou Sharmila Ali que no
entanto não desmentiu a falta de transparência que ensombra a gestão do
dinheiro do erário.
Procurando
contrariar um dos resultados do Índice, que indica que “o Governo de Moçambique
fornece ao público informações mínimas sobre o orçamento”, a directora nacional
adjunta de planificação e orçamento destacou a publicação do Orçamento Cidadão.
“(...)Nós começámos em 2013 e de lá para a frente o que temos estado a fazer é
disponibilizar a informação do Orçamento de Estado numa versão simplificada,
numa versão acessível em que qualquer um tem a possibilidade de ter acesso a
esta informação”.
Porém,
confrontada pelo @Verdade sobre como os moçambicanos podem ter acesso a este
Orçamento Cidadão, Sharmila Ali reconheceu que o documento está apenas
disponível no sítio da Internet da
Direcção Nacional de Orçamento e é publicado em dois jornais que são
vendidos em Maputo e em algumas capitais provinciais.
Relativamente
à forma como um cidadão, que tivesse acesso ao Orçamento, pode dar os seus
comentários e sugestões a representante do Governo a nossa interlocutora disse
que “nós actualmente não temos esse espaço”.
Efectivamente
apenas os chamados parceiros de cooperação e as organizações da sociedade civil
que estão baseadas em Maputo, ou conseguem meios para se manterem na capital do
país, têm a oportunidade de participar na elaboração do Orçamento através da
sessão plenária do Observatório de Desenvolvimento.
Os
Orçamentos Cidadão publicados acabam por ser um instrumento de propaganda do
Governo, pois omitem deliberadamente vários detalhes relevantes. A título de
exemplo, o Orçamento Cidadão de 2015 mostra apenas os valores que o Governo se
propõe a gastar com a protecção social, com educação, saúde, infra-estruturas, agricultura
e justiça, mas não revela quando vai ser gasto pelas Forças Armadas ou pelo
Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE).
Recomendações
para melhorar a transparência, participação e controlo
O
Centro de Integridade Pública recomenda, para melhorar a transparência
orçamental, “Publicar a revisão semestral e o relatório de fim de ano de forma
atempada e consistente” e “Aumentar a abrangência da proposta de orçamento do
Executivo, apresentando, por exemplo, informações mais abrangentes sobre a
classificação de despesas de anos futuros e a classificação de despesas de anos
anteriores.”
Para
melhorar a participação o CIP sugere: “Estabelecer mecanismos credíveis e
eficazes (p.e. audiências públicas, inquéritos, grupos focais) para recolher
uma variedade de perspectivas do público sobre o orçamento público; Realizar
audiências públicas sobre os orçamentos de ministérios específicos e sobre
relatórios de auditoria onde o público possa apresentar as suas posições; e
Criar mecanismos formais para que o público auxilie a instituição suprema de
auditoria a formular o respectivo programa de auditoria e participe em
investigações de auditoria”.
Para
Moçambique reforçar o controlo orçamental, a organização não-governamental
recomenda: “Criar um gabinete especializado de pesquisa do orçamento para o
corpo legislativo; Tanto em termos legislativos como em termos práticos,
garantir que o corpo legislativo é consultado antes da transferência de fundos
do orçamento promulgado, antes de se gastarem quaisquer receitas não esperadas
e de se gastarem fundos de contingência que não foram identificados no
orçamento promulgado; e Assegurar que a instituição suprema de auditoria tem
recursos adequados para desempenhar as suas funções, como determinado por um
órgão independente (p.e. legislativo ou judiciário)”.
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