domingo, 22 de novembro de 2015

A GUILHOTINA E A FORCA: UMA CONTRADIÇÃO DA ATUAL ECONOMIA-MUNDO



Rui Peralta, Luanda

O actual panorama da economia-mundo assume as seguintes características: a) abrandamento do crescimento mundial, nomeadamente nas denominadas “economias emergentes” (excepto a India); b) queda dos preços das matérias-primas; c) abrandamento do comércio internacional; d) a “flexibilização monetária” alimenta a bolha de activos (em detrimento do investimento produtivo, que estancou á escala mundial). Debrucemo-nos um pouco sobre esta ultima característica (flexibilidade monetária).

A “flexibilização monetária” permite aos Bancos Centrais adquirirem títulos, criando moeda, que injectada na economia pode contribuir para esta “descolar”. No entanto estas medidas têm efeitos colaterais, responsáveis pela ineficácia a longo-prazo das políticas monetárias. A “injecção de dinheiro” não garante que a liquidez seja utilizada para favorecer os investimentos produtivos. Bem pelo contrário, a experiência demonstra que a “injecção” termina por alimentar a especulação e aumentar o preço dos activos, formando bolhas financeiras, enquanto em simultâneo, provoca uma redução do investimento. As empresas, devido á instabilidade sentida no mercado e á incerteza, não investem, preferindo restabelecer as suas margens, distribuírem dividendos, assistindo-se neste cenário á multiplicação de fusões e aquisições. Ao mesmo tempo a injecção de moeda conduz á inflação dos preços dos activos, mas não ao aumento de todos os preços.

Juros baixos, inflação débil, combinam-se e geram uma mistura explosiva. Os juros nominais adquirem o zero como base (zero lower bound). Este limite é o resultado da estagnação, caracterizada pelo aumento das taxas de poupança e pela aversão ao investimento de risco, além da fraca disponibilidade para o investimento produtivo, de uma forma geral. Para restabelecer a situação e relançar a actividade produtiva seriam necessários juros reais negativos, o que não acontece. A tendência para a recessão torna-se, assim, visível no horizonte, com a agravante que as autoridades monetárias não têm instrumentos para a resolução do problema. Aliás não será a política monetária a relançar o crescimento, uma vez que os bancos centrais tacteiam, tentando encontrar certezas na actual situação, perguntando-se se estarão perante uma débil recuperação pós-crise.

O resultado será, assim, uma enorme acumulação de dívidas privadas e públicas, que já representam cerca de 286% do PIB mundial (segundo um estudo recente do McKinsey Global Institute), contra os 269% de 2007. Esta tendência é reflectida na divida das empresas não-financeiras dos países “emergentes”, que quadruplicou entre 2004 e 2014.

Este panorama conduz a dois cenários: 1) a existência de bolhas financeiras em torno das dívidas públicas e dos mercados financeiros alienados pelos juros muito baixos levará a uma recessão profunda do sector bancário; 2) um aumento das taxas de juro da Reserva Federal dos USA, o que representará uma explosão das bolhas nas economias “emergentes”, com grandes repercussões na economia-mundo.

Qualquer um destes cenários evidencia o falhanço das políticas monetárias e a incapacidade das instituições internacionais em identificarem a actual situação. Desenrole-se a crise nas economias centrais (como em 1), ou inicie-se nas economias periféricas (como em 2), o resultado será o mesmo: recessão. No fundo é como escolher entre a guilhotina e a forca. Em ambos a morte é certa! Num caso perde-se a cabeça mas mantém-se o resto do corpo, intacto e sem marcas. No outro a cabeça fica no sítio, o corpo intacto, mas o pescoço marcado….

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