Os sem-abrigo e a miséria
em Portugal. Uma realidade inconveniente... que muitos se acostumaram
a presenciar com indiferença.
quinta-feira, 24 de dezembro de 2015
NATAL DOS POBRES... DE ESPÍRITO
Mário Motta, Lisboa
Neste natal há novidades que parecem não interessar, talvez por não serem novidades. Este é um natal como os anteriores, dos quatro anos anteriores, um pouco pior que os anteriores, certamente. De ano para ano a quadra tem vindo a agravar-se. E agrava-se para quem? Para aqueles que antes tinham um natal pobre mas, mesmo assim, um natal. Para aqueles que na quadra e na noite, para a consoada, conseguiam ter casa, ter a família reunida à volta da mesa, crianças a correrem pela casa, uma árvore de natal, um pequeno presépio, aconchego e a casa a cheirar a bacalhau e couves que pareciam estar em ebulição por simbiose com a azáfama e alegrai da família. Afinal, apesar de pobre, era natal em que havia alguma coisa para comer e uma casa para os acolher, principalmente uma família para se reunir.
Neste natal a novidade é que nem esse natal pobre existe. Nem a casa existe, nem a família reunida, nem o bacalhau, nem as couves, nem a árvore de natal enfeitada com tufos de algodão por ser "mais em conta". O pequeno presépio, como quase tudo o resto de mobiliário, foi-se no arresto. Alguns da família, neste natal, são sem-abrigo. Outros sobrevivem por favor e solidariedade em casas de amigos que já estão a ficar fartos e também eles a empobrecerem...
Quantos são que estão nestas circunstâncias em Portugal? E por partes do resto do mundo dito cristão? Cristão?
Neste natal, como em tantos outros, a hipocrisia está esparramada nas palhinhas. Não o Menino Jesus.
Já repararam? Já pensaram? E então? Que se lixe?
Neste natal não escrevo mais por aqui estas coisas enfadonhas que nos puxam para a triste realidade e nos obrigam a olhar além dos nossos umbigos. Que até nos dão vontade de mudar, de sermos humanos, autênticos, justos, solidários, exigentes connosco e com aqueles que fazem do natal mais um motivo de exploração, de ilusão, de grande hipocrisia. Para assim camuflarem a miséria que causam, sempre tirando vantagens, tirando as vidas, a dignidade a que todos nós temos direito - ainda mais que um bom natal. Porque natal devia ser todos os dias. Mesmo natal, não este natal dos pobres... de espírito.
Portugal. BANQUETE BANIF
Miguel
Guedes – Jornal de Notícias, opinião
[Nota
prévia à ementa: quando António Costa referia, em meados de Outubro, ter
conhecimento de questões de grande gravidade económica (que apelidou de
"surpresas desagradáveis") nos dias de negociação pós-eleições com a
coligação de direita, estava a referir-se às "omissões gravíssimas sobre a
real situação financeira do país" ou a algo mais concreto que, como disse,
"infelizmente os portugueses hão-de saber"? Convinha esclarecer se,
nessa altura, a situação do Banif já foi abordada.]
Antecipando
o Natal, sentaram-se à mesa do banquete Banif uns quantos apóstolos e vários
Judas. Desde que, há três anos, foram injectados 1100 milhões de euros do
erário público no banco, Judas Iscariotes incarnou em vários protagonistas de
um quadro dantesco pintado antes da última ceia. Se a comida requentada -
servida nas últimas eleições pelo voto popular - alimentou dúvidas demagógicas
e patéticas sobre o vencedor e a legitimidade do poder, sabemos agora quem
perdeu: uma vez mais, a esmagadora maioria dos portugueses, excluídos das
transacções bancárias e das comissões, aqueles que não sonhavam ser possível
que um presidente, primeiro-ministro, ministra da Finanças e governador do
Banco de Portugal, todos refugiados nos seus interesses particulares, pudessem
ocultar a situação catastrófica de um banco que, à sua velocidade, mais se
assemelhava ao lugar do morto de um veículo para abate.
A
ex-coligação de Passos Coelho perdeu a legitimidade para acertos de contas.
Acabou-se o tempo para os bicos de pé e para caminhar com a cabeça levantada.
Varreram o lixo para debaixo do tapete sem sacudir uma ponta. O caminho foi
trilhado sem direcção assistida, sem pudor, num dispendioso embuste colectivo,
sem-vergonha, criminoso pela acção e pela omissão. Assinaram, assim, o período
de tréguas eleitorais de que o Governo PS até aqui não dispunha.
Se
os contribuintes irão pagar, uma vez mais, a inqualificável gestão danosa de
mais um banco privado, que não paguem "apenas" mais 2200 milhões de
euros. Os contribuintes podem desembolsar mais uns trocos e patrocinar uma
acção do Estado contra quem caminhou durante anos na cortina de fumo. Como é
evidente, ninguém morre pelo susto, até porque já há tipicidade. Da mesma forma
e com semelhantes contornos e protagonistas: BPN, BES, BPP, BANIF, uma só casa-de-jogo
ou casino de especulação, burla, abuso e gestão danosa. Se há quem defenda que
parte do sector público gere mal a economia, todos estamos cansados de saber
como parte do sector privado gere as finanças: com a assinalável eficácia de
quem liquida para ganhar.
Portugal. Assassinos de colarinho branco. Morte de David Duarte pode ser julgada como homicídio
Tragédia
que culminou com a morte do jovem de 29 anos teve lugar no Hospital de São
José, em Lisboa, durante o último fim de semana.
David
Duarte, de 29 anos, esperou dias para ser operado a um aneurisma na cabeça. A
intervenção era urgente, mas como o hospital de S. José não tem equipa de
neurocirurgia a trabalhar ao fim de semana, o jovem teve de esperar por
segunda-feira. Contudo, não resistiu e morreu antes de chegar à mesa de
operações, na madrugada de domingo para segunda-feira.
O
caso está a gerar polémica e já levou a Procuradoria-Geral da República a abrir
uma investigação ao sucedido. O presidente da Administração Regional de Saúde
de Lisboa e Vale do Tejo, Luís Cunha Ribeiro, e os administradores hospitalares
Teresa Sustelo (Lisboa Central) e Carlos Martins (Lisboa Norte) demitiram-se.
Fonte
do Ministério Público revelou ao Diário de Notícias que, se da investigação se
concluir que David Duarte morreu por falta de meios hospitalares, então o caso
passará a ser tratado como homicídio negligente, negligência médica ou omissão
de auxílio. Porém, o mais provável é que a acusação seja de crime por homicídio
negligente.
E
quem serão os culpados? Explica o DN que os arguidos poderão ser os médicos, a
administração do hospital, a Administração Regional de Saúde e até o Ministério
da Saúde.
Ao
que o Diário de Notícias apurou, o Hospital de S. José não só não tem equipas
de neurocirurgia escaladas para trabalhar ao fim de semana, como também não
tentou entrar em contacto com o Hospital de Santa Maria a fim de perceber se
esta unidade hospitalar teria médicos disponíveis para levar a cabo a operação
que tinha carácter urgente.
Indica
também o Expresso que este não foi o primeiro caso mortal a ocorrer no S. José.
Este ano já tinha morrido uma mulher também na sequência de uma hemorragia
cerebral. O ano passado foram três as vítimas mortais que não resistiram ao
rebentamento de aneurismas por terem de esperar que houvesse uma equipa médica
disponível para levar a cabo as respetivas cirurgias.
“Eram
todos menos jovens, com familiares menos proativos, tendo, por isso, passado
despercebidos”, disse ao Expresso fonte do hospital que acrescentou que todos
os pacientes que acabaram por morrer tinham grande probabilidade de sobreviver
se tivessem sido operados a tempo.
Notícias
ao Minuto - Título PG
Portugal. COSTA É AMIGO DOS BANCOS
A
ajuda dos contribuintes ao BANIF não é só ao BANIF, é a todos os outros bancos
e isto não nos foi explicado por quem decidiu a operação. Costa, chame-se ele
primeiro-ministro António ou governador Carlos, tem de se explicar melhor.
Paulo
Baldaia – TSF, opinião
O
desastre provocado pela inactividade do anterior governo no caso BANIF está à
vista de todos. Agora é tempo de olhar para a resolução que compromete o actual
governo e o Banco de Portugal. O preço a pagar pelos contribuintes é
estranhamente elevado, tendo em conta a dimensão do banco. Não houve um português
que fosse que não estranhasse o valor a pagar pelos contribuintes (pode
ultrapassar os três mil milhões de euros). Surpresa total para todos? Para o
Santander não terá sido, porque foram eles a impor as condições do negócio.
Como
o Santander só quis o "filet mignon", no anúncio da resolução ficámos
com a sensação de que poderíamos recuperar algum dinheiro quando vendêssemos a
entremeada, os tais activos que por serem desinteressantes transitaram para o
"veículo". É, aliás, esclarecedor que o próprio ministro das
finanças, falando para portugueses que chumbam no mais simples teste de
literacia financeira, nos procure explicar sem tradução esta operação
apressada. Veículo, explica qualquer dicionário, é um meio de transporte. Ora,
este veículo a que chamaram Navigest foi pago pelos contribuintes e devia
transportar os rendimentos da venda dos activos directamente para os cofres do
Estado. Pois, mas segundo nos disse ontem Jorge Tomé, em entrevista à
SIC-Notícias, a Navigest é do Fundo de Resolução e é para lá que vai o
dinheiro. Tomé disse mais, disse que foi tudo vendido a preço de saldos e que
haverá mais-valias garantidas. Para o Fundo!
O
Fundo de Resolução é um organismo autónomo que pertence ao Estado, mas deve ser
financiado pelos bancos do sistema. O tal sistema a que os contribuintes têm
sido chamados a ajudar. O que o dito "veículo" vier a fazer de
receita será contabilizado como receita do Estado, porque o Fundo é do Estado
mas vai desonerar os bancos que o deviam financiar. Tão simples como isto. A
ajuda dos contribuintes ao BANIF não é só ao BANIF é a todos os outros bancos e
isto não nos foi explicado por quem decidiu a operação. Costa, chame-se ele
primeiro-ministro António ou governador Carlos, tem de se explicar melhor.
Portugal. FALTA DE EQUIPAS MÉDICAS EM SÃO JOSÉ JÁ CAUSOU CINCO MORTES
O
jornal Expresso conta que desde abril de 2014, altura em que foi tomada a
decisão de não ter equipas de neurocirurgia vascular de prontidão ao fim de
semana, mais quatro doentes com ruturas de aneurisma.
Antes
de David Duarte, já este ano, morreu uma paciente de 60 anos, e no ano passado
mais três doentes com o mesmo problema.
Uma
fonte do Hospital de São José, citada pelo Expresso, conta que os casos não
tiveram tanta visibilidade como o de David Duarte porque as famílias foram
menos proativas.
Em
comum, os outros quatro casos tinham o facto de a idade ser mais avançada que
David Duarte, que morreu dia 14, com 29 anos.
A
recusa das equipas em trabalhar ao fim de semana, aconteceu em 2014, quando
lhes foi proposto receber apenas metade da compensação pelo trabalho
extraordinário.
Os
enfermeiros recusaram integrar escalas de prevenção de 24 horas quando lhes foi
proposto receber apenas metade da compensação pelo trabalho extraordinário aos
fins de semana. O Expresso adianta que a indisponibilidade partiu dos
enfermeiros, que rejeitaram o corte para 130 euros. Seguiu-se idêntica atitude
dos médicos, cuja compensação proposta, e recusada, era de 250 euros.
A
morte de David Duarte terá provocado o regresso aos valores que tinham sido
cortados pelo anterior Governo.
Ontem
o ministro da Saúde considerou que nalguns casos, a restrição financeira foi
longe demais, mas Adalberto Campos Fernandes insistiu também que neste caso não
se trata apenas de um problema financeiro.
TSF
O FIM DA ERA BUSH EM ANGOLA
Martinho Júnior, Luanda
1
– O ano de 2015 em Angola é cronologicamente um marco muito sensível: com ele
acaba a nefasta influência da “era Bush”, que azotou os destinos do país
desde 2002, enquanto cesta de impactos dum quadro de globalização obsoleto,
alienante e gerador de desequilíbrios de toda a ordem.
Anunciam-se
grandes transformações para a humanidade e no que diz respeito ao seu
posicionamento em relação ao planeta, pelo que para Angola o renascimento
africano estará mais livre da contaminação provocada pela geo estratégia
dominante que utilizava o petróleo como paradigma de sua própria arquitectura e
engenharia, prendendo à sua influência perniciosa os produtores do crude e a
própria OPEP.
O
fim dos encantos, o tragar final da amarga “cenoura” norte-americana
em relação ao petróleo, está a marcar agora o ambiente psicológico e
sócio-político do país, obrigando os principais partidos a reverem (e a
reverem-se) em suas ideologias, aptidões e estratégias, enquanto o estado
angolano implementa uma nova orientação no sentido da diversificação da
economia!
Angola,
depois de vencer os obstáculos da guerra imposta por via de Savimbi, (é preciso
não esquecer a “guerra dos diamantes de sangue” que dilacerou mais
que as precedentes a sociedade angolana e todo o país), viu-se obrigada a “colar-se” à “doutrina
Bush” (tal era a vulnerabilidade em 2002).
Entre
outras coisas, chegou-se ao ponto de, em função dos impactos de toda a ordem
por si gerados, axabou por surgir um inusitado “apartheid social” (os “condomínios” murados
e com arame farpado que se foram construindo, são reveladores do desequilíbrio
social que assolou Angola neste período).
Há,
na leitura dos últimos trinta anos obrigatoriamente a fazer-se, um registo
necessariamente muito crítico em relação aos destinos do Movimento de
Libertação em África, no que a Angola diz respeito: houve uma pressa demasiada
(e drástica) em pôr fim, antes mesmo da implosão do socialismo real na Europa e
o colapso da URSS (em 1985), ao modelo centralizado de economia, ao Partido do
Trabalho e ao rigor nos termos de gestão do estado angolano, comparativamente
ao facto de ter sido tão lento chegar-se à conclusão da urgência em se começar
a diversificação da economia, respeitando o rigor e a responsabilidade que o
estado angolano merece por parte de todos os cidadãos.

O
estado angolano entre muitas outras iniciativas precisa não só de ser
desburocratizado… precisa dum novo corpo de leis que se adapte à nova
orientação, precisa de implementar responsabilidade e rigor sobre a sua própria
gestão, precisa de eliminar “gorduras” contraproducentes…
Colocar
de parte o materialismo dialéctico tem sido um lapso completamente avulso:
nunca a alienação teve um campo de manobra tão vasto e tão nocivo ao Movimento
de Libertação como hoje (a situação do espectro doutrinário, ideológico e
sócio-político em Angola é prova disso), pelo que recuperar os termos justos do
socialismo enquanto doutrina intrinsecamente de paz, é um desafio mais que
evidente e necessário!
3
– Desde que os relacionamentos de Angola com os Estados Unidos, nos precisos
termos da“doutrina Bush” foram lançados em 2002, que eu tenho sido sempre
muito crítico em relação à sua“densidade”, tendo em conta os nocivos impactos
na esfera sócio-política, para além do grau de alienação que provocou, que
entre outras coisas possibilitou o campo de manobra em África para a tácita
disseminação do fascismo islâmico, como para o lançamento de ingerências e
manipulações de toda a ordem, conforme entre outras acções, o quadro das “revoluções
coloridas” e “primaveras árabes”.
Fazer
hoje o ponto de situação por via de “O Laboratório AFRICOM” é para
mim inventariar com consciência crítica a nocividade da “era Bush”, de que
Obama não se conseguiu ver completamente livre em relação a África e por isso
uma obrigação cívica no quadro da lógica com sentido de vida, da paz e das
possibilidades do renascimento africano.
A
espectativa de que o ano de 2016 é inaugural em Angola duma era mais digna,
justa e equilibrada em termos humanos e mais respeitadora para com o planeta, é
legítima de minha parte, enquanto “velho camelo” cuja única “performance” tem
sido a aptidão de atravessar tão largos desertos… de mais de trinta anos!
Reorientar
a identificação para com todo o povo angolano (em benefício da identidade
nacional) e cuidar muito melhor dos relacionamentos com as minorias (quantas
vezes culturalmente e socio-politicamente marginalizadas, ou mesmo
hostilizadas) são reptos que se colocam ao próprio estado angolano, que está
ainda muito cru em outra equação: no necessário balanço entre a segurança
colectiva e a liberdade individual.
Uma
geo estratégia tendo em conta a questão da vida, ou seja uma geo estratégia
assente na interpretação físico-geográfica-ambiental em relação aos recursos
hídricos, levando em conta a sustentabilidade da própria vida humana, é indispensável
quando se pensa começar a agir em termos de diversificação económica.
De
qualquer modo julgo que a partir de agora os constrangimentos da “era
Bush” começam a ser finalmente ultrapassados aqui em Angola, para bem do
povo angolano, de toda a região, de África e de toda a humanidade!
Num
momento em que a tensão entre os processos e factores de hegemonia unipolar são
confrontados com a emergência multipolar, há que saber optar!
ZIMBABWE ADOTA USO DA MOEDA CHINESA
Roger
Godwin – Jornal de Angola, opinião
A
braços com uma grave e prolongada crise económica, fruto da continuada
aplicação de sanções por parte da União Europeia e dos Estados Unidos, o
Zimbabwe decidiu adoptar o uso interno, de forma gradual, da moeda oficial
chinesa.
Esta
decisão, que resulta do encontro recentemente mantido em Harare entre os
presidentes dos dois países, é uma forma do Zimbabwe aumentar o fluxo de
circulação de moeda no circuito oficial onde, até agora, o dólar
norte-americano e o rand eram senhores absolutos, mas insuficientes para suprir
as necessidades do mercado.
O ministro das Finanças, Patrick Chinamasa, em declarações aos jornalistas, reconheceu que esta medida pode revitalizar a economia do país e sublinhou o facto de, ao mesmo tempo, o governo chinês ter aceite cancelar o pagamento de 40 milhões de dólares que o Zimbabwe deveria fazer até finais de 2015 como parte da amortização da dívida global, cujo valor total se negou a divulgar.
A China é desde há largos anos o principal investidor no Zimbabwe, país que em 2009 foi obrigado a abdicar da sua moeda nacional, passando a ter o dólar norte-americano como referência no circuito cambial.
Nos últimos cinco anos, o Zimbabwe recebeu cerca de mil milhões de dólares da China que, desse modo, se tornou no segundo parceiro comercial do país, apenas sendo superado pela África do Sul.
O yuan passa, pois, a ser aceite no circuito monetário zimbabweano lado a lado com o dólar norte-americano, a libra esterlina e o rand da África do Sul.
Outras moedas, como o euro e o dólar australiano, podem também ser usadas como moedas de pagamento, ainda que não tenham a mesma abrangência que as outras atrás referidas e tendo a sua valoração anexada ao dólar norte-americano.
No início da circulação oficial do yuan apenas os turistas chineses poderão fazer os seus pagamentos directos com esta moeda havendo, como contrapartida, a possibilidade do Zimbabwe pagar com a mesma divisa os juros da sua dívida à China.
Aos poucos, o yuan passará a ser introduzido no circuito cambial em moldes que estão a ser estudados pelas autoridades dos dois países, num processo que deverá estar concluído até finais do próximo ano.
Desta forma, a China consegue mais um espaço de penetração no continente africano graças à sua política de ajuda e de investimento, com base naquilo que são as reais necessidades dos países com quem se relaciona.
Ao rivalizar com o dólar norte-americano num país da África Austral, neste caso o Zimbabwe, a China reforça também o seu poder político no continente, colocando-se numa posição de forte concorrência em relação aos Estados Unidos, seu grande rival económico na região.
Estes desenvolvimentos acontecem numa altura em que, no Zimbabwe, já se começa a falar – e muito – nas eleições gerais já marcadas para decorrerem em 2018.
Neste momento, a antiga vice-presidente, Joice Mujuro, e o líder do principal partido da oposição, Morgan Tsvangirai, tentam um entendimento para apresentarem um projecto conjunto capaz de rivalizar com a ZANU-PF de Robert Mugabe.
Depois de ter sido afastada da cúpula da ZANU-PF, acusada de liderar uma purga interna contra Robert Mugabe, Joice Mujuro esteve uns meses afastada da cena política, chegando a admitir-se a possibilidade dela ter decidido viver no estrangeiro.
Contudo, com o assentar da poeira, Mujuro voltou à ribalta política unindo-se ao líder da oposição que, é bom recordar, já perdeu quatro votações para o Presidente Mugabe, três em eleições e uma outra em referendo à Constituição.
A ZANU-PF, que acaba de realizar mais uma conferência extraordinária, continua tranquilamente com o seu processo de reorganização interna para defender, em 2018, as posições de liderança nacional amplamente conquistadas em 2013.
Nessa conferência, que decorreu em Victoria Falls, Robert Mugabe advertiu o partido para não embarcar em aventuras perigosas “alimentadas pelos saudosistas do passado colonial”.
Mugabe aconselhou também os militares a não se meterem na política e disse que será ele a decidir quando e como sairá da política, sublinhando que não terão êxito os que escolherem a “calúnia” como “arma de arremesso contra as suas decisões”.
Depois de ter resistido a todos aqueles que o queriam ver fora da liderança do MDC-T, por ter perdido quatro vezes para Mugabe, Tsvangirai continua a ser muito contestado pelos seus pares que não lhe reconhecem capacidade política para um dia poder chegar a Presidente da República.
Essa mesma falta de liderança está agora a empurrá-lo para os braços de Joice Mujuro que, por sua vez, ainda está a tentar recuperar dos efeitos da sua pesada derrota no confronto político verbal que manteve há um ano com Grace Mugabe.
A esposa do actual Presidente, por diversas vezes, tem dito que não aspira ao lugar que o marido agora ocupa, mas a verdade é que tem crescido no país o número de pessoas que a apoiam nalguma ainda discreta rivalidade que agora mantém com Emmerson Mnangagwa, um dos dois Vice-Presidentes da República.
Embora as eleições estejam ainda a três anos de distância, o facto é que o assunto começa a estar na ordem do dia, ocupando as primeiras páginas dos jornais e sendo tema obrigatório nas conversas de bastidores mantidas por todos quantos acompanham a evolução do país.
Em política, três anos é já amanhã mas, no caso do Zimbabwe, esse lapso de tempo é demasiado lato para que se possa ter, agora, um panorama do que poderá suceder em 2018.
Foto: EPA / Aaron Ufumeli
SUDÃO: UM EXEMPLO DE TRELA CURTA
Rui Peralta, Luanda
A
desastrosa campanha militar da Arábia Saudita no Iémen demonstrou a sua
incapacidade em lidar com as complexas dinâmicas internas da sociedade
iemenita. Para tapar o sol com a peneira a petro-monarquia saudita dirigiu-se
ao Sudão e a outros Estados africanos para que apoiem a intervenção no Iémen
com tropas no terreno.
A capacidade saudita de conseguir um compromisso por parte das Forças Armadas
do Sudão parte do pressuposto de que este país encontra-se em plena bancarrota
económica e financeira. Desde 1997, as sanções impostas pelos USA ao Banco
Central do Sudão dificultaram o acesso do país aos mercados financeiros
internacionais. Por sua vez, os conflitos internos – que em finais dos anos 90
agudizaram-se - entre as autoridades sudanesas e os movimentos rebeldes de
Darfur, nas províncias do Cordofão e do Nilo Azul, drenaram recursos e
quebraram a confiança dos investidores internos e externos.
Quando, em 2011, o Sudão do Sul separou-se, o Sudão perdeu 1/3 do território e
a maior parte do seu petróleo. A quebra do preço do petróleo em 2015 teve
resultados catastróficos na enferma economia sudanesa, agravando ainda mais a
situação interna. Cartum procurou ajuda financeira nas monarquias do Golfo Pérsico
e estas, através do Conselho de Cooperação do Golfo proporcionaram um
salva-vidas financeiro a Cartum.
Mil milhões de USD foram depositados no Banco Central do Sudão, por parte dos
sauditas, depois do Qatar ter depositado mil, duzentos e vinte milhões de USD.
O banco Islâmico do Dubai, o Banco Islâmico de Abu Dabi e o Banco Islâmico de
Sharja tornaram-se os principais accionistas do Banco de Cartum. Mas este apoio
ao Sudão não é gratuito e Cartum pagará essa divida combatendo no Iémen.
Nas últimas semanas centenas de oficiais e soldados sudaneses reforçaram o
contingente sudanês, composta por mil militares que já se encontravam no
terreno desde Outubro. O ministro da Defesa do Sudão, Awad bin Auf declarou que
as Forças Armadas do Sudão têm seis mil homens prontos a intervir, se o comando
saudita solicitar e que se for necessário poderão duplicar os efectivos.
No contexto geopolítico da região, o Irão, que apoia os Hóssis, é o alvo a
abater. Apesar de durante anos as relações Sudão / Irão serem fortes (em 2008
foi assinado um acordo de cooperação militar e em 2013 o Irão intensificou a
construção de bases navais e logísticas em Porto Sudão), a NATO, Israel e os
Estados do Golfo nunca viram o reforço desses laços com bons olhos (chegando ao
ponto de, em 2013, Riade impediu a delegação presidencial sudanesa de
atravessar o espaço aéreo saudita para comparecer á tomada de posse do
presidente iraniano, obrigando esta a regressar a Cartum). Pressionado o Sudão
inverteu a situação de bom relacionamento com o Irão e em Setembro de 2014 o
governo sudanês encerrou os centros culturais iranianos em Cartum e noutras
cidades do país, alegando que o Irão pretendia difundir o xiismo no Sudão.
A minoria xiita no Sudão não representa qualquer ameaça para o governo sudanês,
pelo que o encerramento dos centros culturais apenas pode ser explicado no
contexto internacional e geopolítico, representando a aproximação forçada entre
o Sudão e a Arábia Saudita. Um mês depois do encerramento dos centros culturais
iranianos o presidente sudanês acusou o Irão nunca apoiou materialmente o Sudão
e que apenas fez promessas que nunca cumpriu.
Em
Agosto de 2013 Cartum forneceu aos rebeldes sírios armas de fabrico chinês,
através do Qatar e participa na coligação liderada pelos USA contra a Síria.
Nesse mesmo ano o Tribunal Penal Internacional acusou o presidente sudanês de
crimes de guerra, genocídio e terrorismo de Estado, pelos actos cometidos em
Darfur, Nilo Azul e Cordofão por parte das forças de segurança e militares
sudanesas. O “chapéu-de-chuva” dos Estados do Golfo e da NATO abriu-se e
protege o presidente sudanês, que até agora ainda não compareceu perante o
tribunal. Por milagre as tensões anteriormente verificadas (como o apoio
de Cartum ao Hamas, em Gaza, e á Irmandades Muçulmana no Egipto, ou as
acusações de apoio ao “terrorismo fundamentalista”) dissiparam-se. O Sudão é,
agora, um actor importante, membro da Liga Árabe e da União Africana, presente
no Mar Vermelho e próximo do médio-Oriente.
No
entanto a situação interna é cada vez mais insustentável. Alta inflação, alta
taxa de desemprego (sobretudo entre as camadas jovens urbanas, onde os índices
de desemprego são muito elevados) e a pobreza generalizada, alimentam a
crescente oposição ao governo de Cartum. Em Setembro de 2013 milhares de
manifestantes que protestavam contra as medidas de austeridade enfrentaram as
forças de segurança, Estes confrontos provocaram cerca de uma dezena de mortos,
centenas de feridos e de detenções. Desde aí as manifestações foram suspensas,
embora por todo o país (e com especial incidência em Cartum) se façam sentir
protestos de rua, greves e comícios.
O
regime sudanês, acusado pelo Tribunal Penal Internacional, gere uma economia em
bancarrota (situação que foi causada, curiosamente, pelos seus actuais aliados
do Golfo Pérsico e pelos seus novos amigos dos USA e NATO) não hesita em enviar
os sudaneses como carne para canhão para os campos de intervenção militar dos
seus credores. Mas para quem tem as mãos manchadas de sangue, esta é apenas
mais uma mancha….
RADICAIS DO ESTADO ISLÂMICO PERDEM TERRITÓRIOS OCUPADOS
O
Estado Islâmico (EI) perdeu “nos últimos meses” 14 por cento do território que
controlava na Síria e no Iraque, diz um estudo do Centro de Estudos Militares e
de Defesa IHS Jane’s, com sede em Londres, divulgado ontem.
O
levantamento, “à base de informações de redes sociais e de testemunhas na Síria
e no Iraque”, revela que as áreas ocupadas pelo Estado Islâmico
diminuíram este ano até 14 de Dezembro em 12.800 quilómetros quadrados, o
que faz com que aquela organização controle 78 mil quilómetros quadrados.
O EI perdeu, entre outras posições, o controlo da zona da fronteira norte entre Turquia e Síria, região de Tal Abyad, dos principais pontos de passagem do grupo na fronteira do primeiro daqueles países.
“Os aviões provocaram avultados prejuízos financeiros ao Estado Islâmico após a perda do controlo da zona de fronteira de Tal Abyad, que se soma à recente intensificação dos ataques aéreos às áreas de produção petrolífera detidas pelo grupo”, referiu Columb Strack, analista da Jane\'s “especializado em questões do Médio Oriente ”. O relatório da Jane’s menciona como “outras perdas significativas” do Estado Islâmico a cidade iraquiana de Tikrit, parte do complexo da refinaria de Baiji e trechos da principal estrada entre Raqa e Mossul, “o que afecta o trânsito de armas e provisões entre as duas principais cidades” controladas pela organização.
“O EI, apesar destas perdas, conquistou este ano territórios no oeste da Síria, como a histórica cidade de Palmira e o centro de Ramadi, em Maio”, lembrou Columb Strack.
O especialista disse que a análise às actividades do EI revela que os rebeldes estão “fortemente concentradas à volta de Bagdade e Damasco” e que os curdos sírios ampliaram a zona sob seu controlo em 186 por cento, para 15.800 quilómetros quadrados. O Governo controla cerca de 30 mil quilómetros quadrados, mas Columb Strack garante que Damasco “conseguiu recuperar a partir de Setembro parte do território com o apoio militar russo”.
O levantamento mostra que o Governo do Iraque aumentou o território em 6 por cento, os curdos iraquianos 2 por cento e que os rebeldes sírios sunitas tiveram neste ano “ganhos territoriais de 1 por cento”.
No mesmo dia, as forças iraquianas anunciaram a entrada no centro da cidade de Ramadi, que era controlada desde Maio pelo EI.
A Austrália avisou que o EI quer estabelecer um califado na Indonésia, depois da detenção de alguns indivíduos suspeitos de estarem a preparar atentados no país asiático nas comemorações da passagem do ano. Disparos de vários projécteis contra uma escola, no nordeste da Síria, atribuídos ao EI, causaram nove mortes e 12 feridos, a maioria crianças, noticiaram órgãos de comunicação social daquele país.
Jornal
de Angola – Foto AFP
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