Martinho Júnior | Luanda
1- Os fenómenos de aquecimento
global, que se reflectem no degelo acelerado na Antárctida e no Atlântico Sul,
confluem para que a Corrente Fria de Benguela, que borda a costa africana
incidindo desde a cidade do Cabo ao sul do Golfo da Guiné (abrangendo toda a
costa angolana), tenha também um aumento de temperatura de tal forma que a
extensão do deserto quente mais antigo do mundo (formado há 55 milhões de
anos), o deserto do Namibe, se expanda.
A cidade do Cabo, na África do
Sul (e toda a península circundante), está a ser declarada como “a
primeira a ficar sem água” à escala global.
Essa expansão poderá ser avaliada
quer no Cabo Ocidental, quer na Província de Benguela (expansão ao longo do
litoral), mas também na compressão que os cursos de água interior estão já a
assistir, pois o deserto do Namibe expande-se também para leste.
Na Namíbia os dois desertos
(Namibe e Kalahári), podem em breve juntar-se dentro do planalto central.
Bacias hidrográficas de curso
permanente como a do Orange (na fronteira entre a África do Sul e a Namibia) e
a do Cunene (na fronteira entre Angola e a Namíbia), estão a sofrer compressões
com a tendência para o avanço do deserto quente do Namibe, compressões que se
prolongarão ao longo do seu curso em direcção às suas nascentes.
Por um lado perdem água porque
chove menos, por outro com a expansão do deserto há maior evaporação, pelo que
perdem cubicagem a partir do momento que os seus cursos abandonam o planalto.
Em Angola, a bacia subterrânea do
Cuvelai que alimenta o Etosha Pan no norte da Namíbia, tende a diminuir também
de caudal, com implicação em ambos os lados da fronteira e as afectações
envolverão a bacia do Cubango, chegando à bacia do Zambeze (fazendo alastrar a
mancha de savana semi-desértica, Cuando Cubango e sul de Moxico adentro).
2- Tenho vindo a sustentar a
necessidade dos angolanos projectarem a sua vida (incluindo a vida económica)
associando-a intimamente aos recursos hídricos do interior, começando por
dominar a REGIÃO CENTRAL DAS GRANDES NASCENTES, que coincidem com o centro
geográfico do país, implementando uma GEOESTRATÉGICA PARA UM DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL capaz de alicerçar uma cultura de inteligência nacional cientificada
e alimentada de permanente pesquisa, de modo a que a SEGURANÇA NACIONAL seja
estimulada numa LÓGICA COM SENTIDO DE VIDA a partir dessa plataforma de saber e
acção, a fim de melhor enfrentar os imensos desafios que surgirão nos próximos
séculos.
Essa minha perspectiva
contrapõe-se à perspectiva que tem norteado Angola desde a independência, que
corresponde ainda à visão de quem chegou há séculos por mar e distende a
concepção infraestrutural e estrutural do colonialismo até aos nossos dias, ou
seja, proponho, com essa GEOESTRATÉGIA PARA UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, a
abertura dum novo conceito finalmente resultante de nossa independência e
soberania, que implica uma revolução nos aspectos de concepção das linhas
mestras da implantação infraestrutural e estrutural, com implicação
antropológica na gestação da própria identidade nacional, esbatendo de vez as
assimetrias existentes.
Isso vai implicar que as imensas
regiões que são consideradas de áreas de intervenção (em função da baixíssima
densidade demográfica e da malha muito larga de ocupação humana e
político-administrativa) recebam impactos de programas indexados aos planos
inseridos numa GEOESTRATÉGIA PARA UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, com vista a
que com um maior povoamento humano, se distendam as áreas de diversificação
económica em função dos aproveitamentos agrícolas, piscícolas e de criação de
gado.
Com o tempo, programas dessa
natureza responderão também à necessidade de fazer sair do triângulo do litoral
em direcção ao interior, de capacidades humanas e materiais, assim como de
recursos que se vão inscrever nessa GEOESTRATÉGIA PARA UM DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL.
É evidente que o combate à
desertificação se inscreve nesse modelo de concepções, o que vai motivar a uma
outra visão em relação à desertificação no sudoeste e no sul de Angola, algo
que obriga a alianças específicas de conhecimento e de projecção prática desse
conhecimento com a Namíbia, a África do Sul e mesmo o Botswana.
Há grupos de cientistas de
reconhecido valor internacional, que apontam para o colapso da civilização
humana num horizonte de dois ou três séculos, pelo que a implementação dessa
coerência, no que toca às responsabilidades de Angola não só em relação ao seu
próprio povo, era para ontem!
Stephen Hawking chega mesmo a
afirmar que o horizonte é de apenas 200 anos!... (https://actualidad.rt.com/actualidad/259655-stephen-hawking-muerte-tierra-200-a%C3%B1os).
3- Alguns se interrogam como
poderemos levar por diante o sentido histórico e antropológico do movimento de
libertação em África e tenho respondido que ao ser necessário lutar contra o
subdesenvolvimento a fim de levarmos por diante os resgates que conduzem o povo
angolano à plataforma justa e equilibrada de relacionamentos com outros povos,
há que estabelecer os parâmetros civilizacionais que vão orientar os esforços
em relação ao futuro, até por que a juventude precisa de ser mobilizada para programas
nacionais de largo espectro e de alcance nos termos dum horizonte de séculos.
É a juventude que melhor se pode
mobilizar e dispor a ser o motor dessas transformações civilizacionais que são
além do mais um repto nacional de carácter patriótico enquanto exercício de paz
duradoura e também por que é a ponte entre um passado em que as interpretações
sobre os mesmos fenómenos de relacionamento físico-geográfico-ambiental com os
fenómenos humanos, sustentaram a subversão e a barbárie, quando deveriam e
devem sustentar a paz!
Nesse sentido a mobilização e a
implicação prática da juventude angolana influenciará num caminho que a vai
orientar, fora das ingerências e contradições manipuladas por aqueles que estão
motivados pela aristocracia financeira mundial ,, num projecto de dimensão
nacional e patriótico que se estenderá pelos próximos séculos adentro.
Os planos economicistas que
resultam dos impactos do capitalismo neoliberal que têm atingido Angola, que
obrigam a visões de muito curto prazo, em alguns casos “espontâneos”, tenderão
a ficar rarefeitos, por que uma GEOESTRATÉGIA PARA UM DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL da natureza que proponho, inscreverá desafios de especialidade
inseridos nessa ampla avenida pejada de perspectivas, que é aliás também
impulsionada pelo papel fulcral reservado ao conhecimento investigativo e
científico dos angolanos (cultura inteligente e de segurança nacional), no
muito que há a conhecer sobre Angola e sobre si próprios.
Martinho Júnior - Luanda, 18 de Janeiro de 2018
Imagens:
- Mapa das correntes oceânicas à
escala global – http://afmata-tropicalia.blogspot.com/2012/03/blog-post_28.html;
- Mapa da pluviosidade em Angola – https://pt.slideshare.net/DevelopmentWorkshopAngola/allan-cain-alteracoes-climaticas-e-assentamentos-costeiros-dw-debate-18072014;
- A cidade do Cabo, na África do
Sul, poderá ser a primeira a ficar sem água (imagem e notícia difundida pela
Euronews – http://pt.euronews.com/2018/01/17/cidade-do-cabo-podera-ser-a-primeira-a-ficar-sem-agua.
1 comentário:
O blog teria mais ênfase se mencionasse a fonte do mapa-mundi das correntes marítimas, o autor agradecia. Obrigado
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