O Supremo Tribunal e o Governo
são-tomense estão de costas voltadas devido à exoneração de juízes
conselheiros. Presidente exonerado pede mediação internacional. Oposição e
funcionários dos tribunais estão solidários.
O presidente exonerado do
Supremo Tribunal de Justiça de São Tomé e Príncipe, Silva Gomes Cravid,
diz que a destituição dos três juízes conselheiros do órgão é ilegal.
"O que está a acontecer
neste momento é uma atrocidade, uma aberração, é algo nunca antes visto num
Estado de Direito democrático. Vamos agir em conformidade com as disposições
legais que temos, porque somos aplicadores da lei", afirma Gomes Cravid em
entrevista à DW África.
A exoneração foi anunciada na
última sexta-feira (04.05), depois da aprovação no Parlamento de uma resolução
com 30 votos dos deputados do partido no poder, Acão Democrática Independente
(ADI), um voto do Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe/Partido Social
Democrata (MLSTP/PSD) e seis contra.
Gomes Cravid diz, no entanto,
que, sozinha, a Assembleia Nacional não tem competência para nomear e
exonerar os juízes conselheiros - deve basear-se em propostas apresentadas
pelo Conselho Superior dos Magistrados Judiciais, composto por
representantes de juízes de direito, representantes de juízes conselheiros,
representante do Presidente da República e representante da Assembleia Nacional.
Cervejeira Rosema no centro da
polémica
A decisão de exonerar os três
juízes conselheiros do Supremo Tribunal veio na sequência do acordão
divulgado a 28 de abril que devolveu a cervejeira
Rosema ao seu antigo proprietário, o angolano Melo Xavier.
Em declarações à imprensa no
sábado, o primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada, considerou a
aprovação da resolução parlamentar como uma decisão para "atacar
o cancro" no sistema judiciário do país.
O juiz Silva Gomes Cravid frisa,
porém, que não tem dúvidas que a decisão tomada sobre a devolução da
cervejeira ao seu proprietário tenha sido a mais acertada: "Eu
gostaria de pedir a qualquer país que quisesse vir a São Tomé e
Príncipe fazer uma auditoria, uma inspeção ao processo Rosema, que viesse
pegar no processo e analisar a nossa decisão, e analisasse folha por folha se
há algum ato menos lícito", afirmou.
Juiz teme pela vida
Gomes Cravid acrescenta que teme
pela sua vida. Por isso, iniciou contactos para que haja uma mediação
internacional sobre este caso.
"Falámos com alguns colegas
de outros países, no âmbito do fórum dos presidentes do Supremo Tribunal de
Justiça dos países da língua oficial portuguesa, para tomarem parte desta
ocorrência. Eu, enquanto presidente do Supremo, tenho a minha vida em risco. Já
me ameaçaram de morte várias vezes. Sei que há grande vontade de porem termo à
minha vida", diz Gomes Cravid.
Oposição e funcionários defendem
Supremo
Esta segunda-feira, partidos com
e sem assento parlamentar mostraram-se solidários com o Supremo
Tribunal. Jorge Bom Jesus, vice-presidente do MLSTP/PSD, disse à DW África
que os direitos fundamentais estão em declínio no arquipélago.
"A nossa democracia está em
perigo", afirmou. "Não podemos, de forma nenhuma, estar a assistir,
impávidos e serenos, ao desmoronamento de todo esse edifício democrático -
sobretudo porque há uma tendência para uma deriva totalitária no sentido de
todos os ovos estarem na mesma cesta."
O dirigente dos
sociais-democratas sublinha que existe um clara intenção "de todo o
poder estar nas mãos de único homem e isto nós não podemos de forma nenhuma
aceitar. A Assembleia Nacional não tem competências para proceder como fez.
Portanto, é uma usurpação do poder."
Por seu turno, Olegário Tiny,
membro da comissão política do Partido da Convergência Democrática, classificou
esta decisão do Parlamento como sendo um golpe institucional.
"Adotaram um plano
devidamente orientado e arquitetado para a captura e concentração de todos
os poderes de todos os órgãos de soberania na esfera do partido do Governo. Não
tenho dúvidas em afirmar-lhe de que, sim, o Estado de Direito democrático está
em perigo iminente."
Descontentes com a situação
reinante em São Tomé e Príncipe, os funcionários dos tribunais decidiram
paralisar os trabalhos por tempo indeterminado até que a situação seja
clarificada.
Ramusel Graça | Deutsche Welle
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