Depois de mais de um ano de
tensão política e dois meses após as eleições antecipadas em Timor-Leste, os
solavancos políticos continuam por resolver. O impasse entre o Presidente da
República e o primeiro-ministro timorenses sobre a nomeação de nove membros do
VIII Governo permanece.
De um lado Francisco Guterres
Lu-Olo, Presidente da República e ainda presidente da Fretilin (agora na
oposição), do outro a Aliança de Mudança para o Progresso (AMP), formada pelo
Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT) – de Xanana Gusmão – o Partido
Libertação Popular (PLP) – de Taur Matan Ruak, primeiro-ministro – e o Kmanek
Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO).
Francisco Guterres Lu-Olo tem
recusado dar posse a alguns dos membros nomeados pelo primeiro-ministro Taur
Matan Ruak, por terem “o seu nome identificado nas instâncias judiciais
competentes” ou possuírem “um perfil ético controverso”.
A decisão tem estado a causar
tensão entre a Presidência e o Governo e a AMP, particularmente Xanana Gusmão,
líder da coligação, que já foi nomeado duas vezes e ainda não tomou posse.
O impasse mantém-se em relação a
nove nomes, sete dos quais do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense
(CNRT): Francisco Kalbuadi Lay, Virgílio Smith, Tomás do Rosário Cabral,
Jacinto Rigoberto Gomes de Deus, Hélder Lopes, Amândio de Sá Benevides, Sérgio
Gama da C. Lobo.
Os dois outros são António
Verdial de Sousa e José Manuel Soares Turquel de Jesus, ambos do KHUNTO.
Numa primeira cedência do
Governo, o primeiro-ministro eliminou da lista de nomeados dois dos nomes
inicialmente propostos – que estão atualmente envolvidos em processos já nos
tribunais: Gastão de Sousa, proposto como ministro do Planejamento e
Investimento Estratégico (MPIE) – cuja responsabilidade será assumida por
Xanana Gusmão – e Marcos da Cruz, vice-ministro da Agricultura e Pescas, que
foi substituído por Rogério Mendonça de Aileu.
Mas quase um mês depois do
primeiro grupo de ministros ter tomado posse, continua sem haver fumo branco
que indicie como se resolverá o impasse. E a tensão de um lado e de outro só
tem vindo a aumentar, apesar de, publicamente, chefe de Estado e Governo
manterem uma aposta no diálogo.
Lu-Olo, foi eleito com o apoio do
CNRT – na altura em que CNRT e Fretilin votavam quase em conjunto no parlamento
e membros dos dois partidos dividiam o executivo.
Hoje CNRT e Lu-Olo – ou pelo
menos Xanana Gusmão e Lu-Olo – estão mais distantes do que noutros tempos, com
o líder histórico timorense a escrever ao presidente com duras críticas sobre a
sua posição relativamente à tomada de posse.
Numa dura carta, Xanana Gusmão,
ameaçou desencadear um processo de destituição do Presidente da República se
mantiver a “rejeição sistemática e não fundamentada” de membros do Governo
propostos pelo primeiro-ministro.
A ameaça é, pelo menos para já,
de difícil concretização já que a medida dificilmente teria o apoio de dois
terços dos 65 deputados, ou seja, 43: número que as bancadas que apoiam o
Executivo não alcançam.
Mesmo que se unissem todas as
bancadas do parlamento contra a Fretilin – partido do Presidente da República e
que controla 23 lugares no parlamento – ficariam aquém desse número, somando
apenas 42 cadeiras.
Ainda assim, o texto causou mossa
à relação e fez aumentar a tensão, especialmente depois de Xanana Gusmão juntar
à ameaça críticas irónicas à ação de Lu-olo.
“Permita-me, Excelência, que
comece por o cumprimentar, desejando-lhe tudo de bom”, escreve Xanana Gusmão na
carta.
“Expresso-lhe este sentimento,
porque estou extremamente preocupado com a sua saúde mental, psicológica e
política, neste conturbado processo onde se impõe medirem-se as competências, à
luz de uma Constituição que os Senhores é que escreveram, entendem com mestria
e interpretam com uma sagacidade incomum, inacessível a vulgares cidadãos como
eu”, escreve Xanana Gusmão.
Um texto que suscitou duras
críticas e que em nada ajudou a resolver o impasse. Lu-Olo mantém a sua posição
que não mudou depois de várias reuniões com Taur Matan Ruak e que levou mesmo
as bancadas da AMP a negarem um pedido de autorização de Lu-Olo para uma visita
de Estado a Portugal – que a Constituição exige – por o responsabilizarem pelo
impasse.
Xanana Gusmão voltou à carga e considerou
inaceitável que dirigentes do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense
(CNRT), e das restantes forças políticas da coligação governamental Aliança de
Mudança para o Progresso (AMP) estejam a ser acusados de “ladrões e corruptos”.
“Sentimos isto sobretudo no CNRT.
Sentimo-nos totalmente afetados e, por isso, não fui duas vezes à posse, em
solidariedade com os meus quadros do partido, já que nos conhecemos”, afirmou
Xanana Gusmão.
O CNRT enviou também ao
presidente certidões criminais de todos os membros que não fossem empossados,
emitidas pelo Tribunal Distrital de Díli, que mostram que nenhum é arguido em
qualquer processo.
As certidões narrativas detalham
todos os registos de processos em que os sete estiveram envolvidos, confirmando
que nenhum é atualmente arguido em qualquer processo judicial “pendente ou
arquivado”.
Com o país em duodécimos desde
janeiro, a pressão para que o impasse se resolva continua a aumentar. O Governo
já teve que solicitar um levantamento extraordinário do Fundo Petrolífero para
financiar as contas do Estado até agosto – sobravam nos cofres apenas 20
milhões – e continua sem ministro de Finanças – é um dos nove por empossar –
para ‘assinar’ o Orçamento para o resto do ano.
E enquanto a situação persiste a
economia do país – que depende quase na totalidade do Estado – vai definhando,
com os investidores externos preocupados com a situação e os nacionais
preocupados sobre o quanto terão que fazer para esticar a liquidez.
António Sampaio-Exclusivo
Lusa/Plataforma Macau - 20.07.2018
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