quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Passado neonazista assombra partido populista na Suécia


Pesquisas apontam que legenda anti-imigração Democratas Suecos pode obter até 20% dos votos em eleição legislativa. Com raízes em movimento neonazista, agremiação tenta se afastar de imagem de racista.

Instantes depois que Jimmie Akesson, o líder de 39 anos do partido populista Democratas Suecos (SD, na sigla em sueco), pegou no microfone em Malmö, o público começou a entoar gritos como "Não aos racistas em nossas ruas!". Manifestantes seguravam cartazes com os dizeres "Cale a boca, seu racista maldito" ou "SD: nazistas em 1988, nazistas em 2018".

A esmagadora maioria daqueles que saíram de casa para assistir ao discurso de Akesson são o que ele chamaria de "helt vanligt folk", ou "povo completamente comum".

Os antifascistas que compareceram ao local do discurso do político não são os únicos que chamam o partido de nazista. O primeiro-ministro sueco, Stefan Lofven, descreveu a legenda como "um partido neofascista de tema único", com "raízes nazistas e racistas". E os apoiadores do partido admitem: o estigma é um problema.

"Pode ser difícil com algumas pessoas", disse "UC" Nilsson, de 16 anos e que apoia o SD. Ele foi ao evento com colegas de escola. "Recebemos reações negativas muito fortes porque algumas pessoas não gostam da política do partido. Mas acho que isso é bom para a Suécia: não podemos acolher tantos imigrantes", disse.

"Nacionalismo cultural"

Ideologicamente, os Democratas Suecos são menos extremos do que outras legendas populistas europeias, pregando um "nacionalismo cultural" aberto a todos, não importando onde nasceram ou a cor de sua pele.

Ao mesmo tempo, o partido defende uma imigração altamente restrita. A legenda quer que o país aceite apenas refugiados da Dinamarca, da Noruega e da Finlândia, e também defende um sistema de vistos de trabalho bem mais rígido do que o vigente.

O que faz com que o SD se destaque é que, de fato, o partido tem raízes no movimento neonazista sueco. Até Mattias Karlsson, líder parlamentar e arquiteto ideológico da legenda, reconhece que muitos membros fundadores vieram do grupo "Bevara Sverige Svenskt" ("Mantenha a Suécia Sueca", em tradução livre), abertamente racista.

"Mas essa organização foi desmantelada em 1986, e o SD foi formado em 1988", destaca Karlsson. "Então, o SD não é uma continuação daquela organização."

O primeiro tesoureiro do partido, Gustaf Ekstrom, é ex-membro da Waffen-SS (tropa de elite nazista). O primeiro líder do SD, Anders Klarstrom, atuou no partido nazista Reino Nórdico ("Nordiska rikspartiet").

A questão é se essas origens ainda mancham o partido, apesar dos esforços de Akesson de reformá-lo desde que assumiu sua liderança, em 2005.

"Somos muito firmes e não cedemos em relação a esses temas", disse Karlsson à DW. "Se há algum sinal de xenofobia ou racismo, expulsamos esses representantes imediatamente", explicou.

Julia Kronlid, a mulher com o mais alto posto na liderança do partido, diz que o estigma hoje é menor do que quando ela "se assumiu" como apoiadora do SD, há dez anos.

"Na igreja, quando meu marido e eu dissemos que estávamos entrando para o SD, as pessoas quase se engasgaram com seu café", lembra. "Mas, agora, reconhecem o que eu fiz, e algumas querem entrar para o partido."

No entanto, Cecilia Bladh, outra política do SD oriunda da classe média, reclama que ativistas locais ainda correm o risco de serem afastados por seus empregadores.

"Espero que isso mude, porque, se temos um quinto da população sueca nos apoiando não dá para continuar assim", considera, referindo-se a pesquisas de intenção de voto, em que o SD aparece com cerca de 20%.

Sombra do nazismo

Parte do motivo pelo qual a situação não mudou é que muitos membros do SD claramente ainda são racistas. Na semana passada, o jornal Expressen revelou que um político local escreveu sobre "a praga dos judeus" num grupo fechado do Facebook, e argumentou que "Hitler não estava errado sobre os judeus".

David Baas, autor da reportagem, diz que é normal ativistas do SD postarem comentários racistas como esse em fóruns fechados e no site d mídia social russa VK. "Eles têm duas caras: em seus perfis públicos do Facebook, não escrevem essas coisas. Mas na VK, escrevem algo muito diferente", detalha.

Juntamente com a revista antiextremista Expo, o Expressen também revelou que pelo menos oito atuais candidatos do SD à eleição legislativa do próximo domingo (09/09) são ex-membros de grupos neonazistas, com um deles pagando mensalidades para o Movimento de Resistência Nórdico até 2016.

Andreas Olofsson, que faz campanha para os Democratas Suecos em Klippan, cidade que antigamente abrigava uma fábrica de papel, a uma hora de Malmö, liderou a filial local da neonazista Frente Nacional-Socialista ("Nationalsocialistisk front") no final dos anos 1990.

"Foi um período muito triste para mim", relata Olofsson. "Eu era jovem e burro. Sou uma pessoa completamente diferente agora", afirma.

Tolerância zero com o racismo?

O partido diz vetar todos os candidatos, mas o passado de Olofsson é do conhecimento de todos na cidade, onde também é amplamente perdoado.

Jonathan Leman, pesquisador da Expo e que trabalhou nas investigações, diz que suas descobertas são provas de que a política de tolerância zero "não está enraizada no partido".

"Eles passaram mais tempo contando às pessoas que têm essa política do que a explicando a integrantes do partido e garantindo que ela é ensinada e praticada", coloca.

Em Malmö, o apoiador do SD Ricky Lowenborg começou a perder a paciência com os slogans que se sobrepõem ao pronunciamento de Akesson. "Nazistas? São os social-democratas que são nazistas", disse.

"Meu dinheiro dos impostos vai para essa escória ali. Por isso é que estou furioso", afirmou, referindo-se aos imigrantes, que, segundo ele, querem "construir complexos de mesquitas gigantescos, com minaretes enormes, em todo lugar".

"Não somos nazistas", diz, firme. "Eles pensam que nós somos nazistas, mas não somos, absolutamente não. Eu não sou racista, espero que você escreva isso. Sou casado com uma filipina. Amo estrangeiros", declara.

Richard Orange (de Malmö/rk) | Deutsche Welle

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