Na última semana, São Tomé e
Príncipe, registou a última sessão plenária da Assembleia Nacional nesta
legislatura de 4 anos, que termina com as eleiçoes legislativas de 7 de Outubro
próximo.
10 pontos fizeram parte da ordem
do dia da sessão plenária. Mas, a última sessão plenária ficou marcada por
aceso debate do ponto número 5, que se refere ao projecto de resolução que
autoriza o interrogatório do deputado Delfim Neves da bancada parlamentar do
partido PCD, na qualidade de arguido nos autos de instrução preparatória da
secção criminal C da procuradoria da República.
Ao contrário da desinformação
feita pela TVS, em nenhum momento a Assembleia Nacional votou ou agiu no
sentido do levantamento da imunidade parlamentar do deputado em causa.
O debate parlamentar em torno
deste ponto trouxe à ribalta a preocupação dos deputados de todas as bancadas
parlamentares no que concerne ao respeito pelas leis e, sobretudo pelo Estatuto
dos deputados.
Tudo porque o deputado Delfim
Neves foi convocado pelo Ministério Público para se apresentar na qualidade de
arguido, por causa de um litígio que envolveu a empresa do referido deputado, e
um banco da praça financeira são-tomense, no ano 2016.
A empresa do deputado teria
solicitado um serviço ao banco, e segundo ele, tal serviço não foi executado.
As negociações entre o Banco e a empresa do deputado fracassaram. O banco pediu
ao tribunal o pagamento dos serviços prestados, por via da penhora de alguns
bens da empresa do deputado.
Numa primeira decisão a juíza do
processo indeferiu a penhora por falta de elementos. No entanto alguns dias
depois, o deputado foi surpreendido com a presença de oficial de justiça e o
advogado do banco.
O oficial de justiça que estava
de serviço, abordou o deputado exigindo a penhora da viatura que estava na sua
posse. Mas a matrícula da viatura que o Tribunal mandou penhorar, era outra.
O deputado explicou que entrou no
seu carro e pôs-se em marcha rumo a sua residência. O oficial de justiça
acompanhado pela advogada do banco, segui-o sob ordem da advogada que dizia«pega
homem….pega homem….»
Quando chegou no portão da sua
residência, sentiu o calor de um tiro perfurando a sua viatura. «Cheguei em
casa abrir o portão, o oficial de justiça faz um tiro contra a viatura. Ele
desceu do carro com a pistola em punho, e me pediu encarecidamente para não
entrar em casa, porque se eu entrasse ele perderia a cabeça. Respondi-lhe que
não vou entrar, mas que não sairia de lá enquanto meu advogado não estivesse
presente…», detalhou o deputado na última sessão plenária.
Instantes depois, chegou ao local
uma equipa de oficiais de justiça incluindo um escrivão, que reprovou o
trabalho do oficial de justiça que acompanhava a advogada do banco. « A
primeira palavra do escrivão para eles, foi : vocês cometeram uma
burrada, porque quando saiam do tribunal perguntei para que
diligência iam, e não responderam. Ele perguntou ao oficial de justiça,
qual é a matrícula do carro que vocês deveriam prender? Como vês não é essa
viatura», precisou o escrivão.
O artigo 85 da Constituição
Política de São Tomé e Príncipe, diz que o deputado não pode ser perseguido, ou
preso por crimes praticados fora do exercício das suas funções. O deputado
Delfim Neves, apresentou ao Ministério Público uma queixa crime contra o
oficial de justiça que disparou contra si. Também apresentou uma exposição
sobre o ocorrido à mesa da Assembleia Nacional. «Até hoje nem o ministério
público nem a mesa da Assembleia Nacional reagiram», afirmou.
No entanto, na última sessão
plenária da Assembleia Nacional, a maioria parlamentar, num total de 29 votos,
aprovou a resolução que autoriza Delfim Neves a ser presente no ministério
público na qualidade de arguido, no âmbito da queixa que foi feita pelo oficial
de justiça que disparou na execução da penhora. O regimento da Assembleia
Nacional, obriga que antes de ser presente à justiça, e em função do pedido
feito pelo ministério público, o deputado deve ser ouvido em primeiro lugar
pela comissão competente da Assembleia Nacional. Nada disso aconteceu.
No contexto da contenda
comercial, segundo o deputado a penhora foi executada. Ainda no ano 2016, cerca
de 30 dias depois da acção armada do oficial de justiça, a sua residência foi
assaltada por homens enviados pelo Tribunal, que arrebentaram a sua garagem e
retiraram a viatura que queriam penhorar a favor do banco.
Sensação de injustiça e de
perseguição dominou a intervenção dos deputados no debate parlamentar. Delfim
Neves, faz parte de figuras políticas são-tomenses problemáticas.
Problemática, porque o seu nome
esteve presente em alguns escândalos comerciais ocorridos no país, como o caso
STP-Trading, ou seja, a empresa criada pelos comerciantes são-tomenses, para
importação através de uma linha de crédito concedida pelo Brasil, de produtos
alimentares oriundos do mercado brasileiro, e que resultou num fracasso.
Acusado pelos seus adversários políticos de prática de corrupção, nunca a
justiça são-tomense confirmou com provas a prática de tais crimes de corrupção,
ou seja, nunca foi julgado ou condenado pela justiça são-tomense.
Figura problemática, também
porque é forte na campanha eleitoral. Continua a gozar de popularidade em
circulos eleitorais da ilha de São Tomé, e a sua popularidade reflecte-se nos
resultados eleitorais do seu partido o PCD.
Resistiu a forte acção de asfixia
dos últimos 4 anos. Ao invés do seu desaparecimento comercial e
consequentemente político, que poderia realizar o plano em curso de “acabar”
com o seu partido PCD, Delfim Neves, conseguiu construir uma infraestrutura de
valor turístico, que dá emprego a muitos são-tomenses.
Uma resistência problemática, que
nas vésperas das eleições legislativas de 7 de Outubro, deverá ser renovada,
uma vez que na última sessão plenária da Assembleia Nacional, foi entregue a
Justiça como arguido, num caso problemático em que foi alvo de um disparo a
queima-roupa.
Os deputados das bancadas da
oposição, condenaram a onda de perseguição, lançada contra o deputado do PCD
nos últimos 4 anos. A bancada da ADI que sustenta o Governo rejeitou as
acusações de perseguição.
Para provar que não há
perseguição do poder contra o deputado do PCD, uma deputada da ADI, contou a
sua história com os oficiais de justiça. Ela foi abordada pelos oficiais de
justiça, mesmo na casa parlamentar, onde foram penhorar e a força um bem
seu. Ainda nesta legislatura, houve um deputado que foi detido pela
polícia. Foi outro caso, relatado na última sessão plenária da Assembleia
Nacional.
Todos os deputados sentiram que
não estão seguros. Perceberam que o seu estatuto especial, está a ser sistematicamente
violado.
Resta saber se a próxima
legislatura, que começa após as eleições legislativas de 7 de outubro, traga à
Assembleia Nacional, novos deputados capazes de cumprir e fazer cumprir as
leis. Capazes de recuperar o Estatuto da Assembleia Nacional, como o segundo
órgão de soberania do Estado, efectivamente autónomo, como ordena o sistema de
governação em vigor, semi-presidencialista de pendor parlamentar.
Abel Veiga | Téla Nón
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