Paulo Baldaia * | Jornal de
Notícias | opinião
O voto útil da Esquerda no PS ou
da Direita no PSD morreu, mas pode vir aí o voto útil do centrão e uma eventual
maioria absoluta de António Costa pode ser conseguida assim.
Há um eleitorado moderado,
receoso de uma excessiva influência da Esquerda no Governo do PS, votante
tradicional no PSD ou no CDS, que pode aparecer disponível para contribuir para
uma maioria absoluta dos socialistas. Não é possível saber ainda quanto vale
esse eleitorado, mas é certo que ele existe e mais se fará notar com a expectativa
de que a Direita está muito longe de conseguir formar uma maioria. Um voto útil
para muitos eleitores sociais-democratas, sem vontade de votar no PSD por causa
da permanente guerrilha em que vive o partido, ou mesmo para eleitores mais à
Direita que não ouvem o canto de sereia de Assunção Cristas, com promessas de
vitória, e que preferem uma maioria de Costa a uma maioria com o Bloco e o PCP
lá dentro.
Na convenção do Bloco de
Esquerda, Catarina Martins recordou a morte do voto útil e desejou paz à sua
alma. Com a solução parlamentar encontrada à Esquerda em 2015, viabilizando o
Governo de um partido que não tinha ganho as eleições, tornou-se evidente, de
facto, que deixou de fazer sentido o voto útil à Esquerda no PS para impedir um
Governo de Direita ou no PSD para impedir um Governo do PS. Mas, se esse voto
útil morreu, as campanhas do Bloco e PCP podem fazer crescer um outro voto útil
nas próximas eleições. Um voto que só é possível depois de desfeito o tabu
sobre a possibilidade de Bloco e PCP fazerem parte de uma solução governativa.
Agora com mero apoio parlamentar, no futuro com a expectativa de integrarem
esse Governo.
A diferença em relação aos
socialistas, que o Bloco e o PCP quiserem mostrar em campanha, será tão mais
eficaz quanto mais estes partidos estiverem perto do seu ADN político. Para
captarem a atenção deste eleitorado de Esquerda, bloquistas e comunistas vão
ter de regressar a alguma radicalização das propostas com que viveram antes de
dar a mão ao PS. Dizer que a política do BE "é incompatível com o Tratado
Orçamental", como lembrou Marisa Matias, ao mesmo tempo que Joana Mortágua
garante que o Bloco quer "um Governo de Esquerda, com um programa de
Esquerda", serve para segurar eleitorado à Esquerda mas também empurra
eleitores do centro para o PS, procurando dar-lhe uma maioria absoluta que o
liberte de uma radicalização no Governo.
Em campanha, Catarina Martins vai
ter de repetir que "a política mudou porque o PS não teve maioria
absoluta". É uma faca de dois gumes, porque com isso lembrará aos
eleitores de Esquerda que uma maioria socialista traz o perigo de uma deriva à
Direita e essa mesma perceção servirá para muitos dos eleitores de
Centro-Direita procurarem evitar a repetição de uma "geringonça",
dando ao PS mais força do que tem hoje. Afinal, quando o Bloco de Esquerda,
como já antes tinha feito o PCP, diz que o atual acordo das esquerdas não é
repetível e acrescenta estar pronto a ir para o Governo, para esses eleitores
que temem uma radicalização de Esquerda, o que importa é saber o que querem os
bloquistas fazer no Governo. Ouvir Catarina Martins, na convenção deste fim de
semana, clamar que "a urgência é derrotar o Tratado Orçamental",
porque "quando os tratados atacam o povo, é preciso mudar os tratados",
assusta os eleitores mais moderados, que podem querer evitar chatices com a
União Europeia. Dar uma maioria absoluta ao PS pode parecer, para esses
eleitores do centrão, a melhor forma de evitar um reforço da Esquerda no poder.
O voto útil está morto. Longa
vida ao voto útil!
*Jornalista
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