domingo, 1 de julho de 2018

Governo timorense à espera que PR dê posse a restantes membros na próxima semana


Díli, 30 jun (Lusa) - O Governo timorense, está sem se reunir formalmente em Conselho de Ministros à espera que o Presidente da República dê posse aos restantes membros do executivo ou clarifique o motivo pelo qual não os nomeia, segundo fontes do executivo.

Fontes da Aliança de Mudança para o Progresso (AMP) - a coligação que apoia o VIII Governo liderado por Taur Matan Ruak - explicaram à Lusa que a expectativa é que possa haver uma nova cerimónia de tomada de posse antes do chefe de Estado, Francisco Guterres Lu-Olo, partir, a 10 de julho, para visitas a Portugal e Cabo Verde.

"A expectativa é de que toda a lista de nomeados seja aceite", disse uma fonte, admitindo, porém, que "alguns nomes" podem, pelo menos para já, não vir a tomar posse.
"Nesse cenário é importante perceber exatamente quais os motivos, quais os critérios do senhor Presidente", insistiu a mesma fonte.

Recorde-se que o VIII Governo começou a trabalhar quando ainda não estava completo e depois do Presidente da República não ter dado posse a 11 dos 41 membros propostos por Taur Matan Ruak.

Entre os nomes excluídos contam-se elementos centrais dos partidos da AMP e do organigrama do executivo, incluindo o ministro de Estado e Coordenador dos Assuntos Económicos e o ministro das Finanças.

A decisão de Lu-Olo levou Xanana Gusmão, líder da AMP, a informar que não tomava posse como ministro de Estado e Conselheiro do primeiro-ministro, tendo estado também ausente da cerimónia o ministro do Petróleo e Minerais, Alfredo Pires.

Em vez de reuniões formais do Conselho de Ministros, fontes da AMP explicaram que "todos os membros do executivo", tanto os que já tomaram posse como os restantes, estiveram reunidos durante toda a semana a preparar o arranque do executivo.

Os encontros não decorreram no Palácio do Governo, mas na residência do líder da AMP, Xanana Gusmão - que se recusou a tomar posse como ministro Conselheiro do primeiro-ministro em protesto pela decisão do chefe de Estado de não dar posse a todo o executivo.

Nessas reuniões foi concluída a orgânica do executivo, preparado o Programa do Governo - "está a ser agora afinado em preparação para levar ao parlamento" - e começou a ser trabalhado o Orçamento Geral do Estado para 2018.

Dionísio Babo, ministro dos Negócios Estrangeiros, disse à Lusa em Jakarta - durante a visita de Estado do Presidente da República, que o Governo "está todo reunido a preparar todos os documentos necessários, incluindo orgânica e orçamento, com base na lista da estrutura governamental apresentada".

O processo orçamental - que está, para já, a ser conduzido pela vice-ministra das Finanças, Sara Brites - é essencial para o país, que está a viver com duodécimos e praticamente já sem dinheiro desde 01 de janeiro.

A previsão é que o primeiro-ministro e o Presidente - que regressou hoje de uma visita de Estado à Indonésia - se encontrem na próxima semana para tentar resolver o impasse.

Para Babo, o Presidente da República está a agir "com muita cautela" para garantir que "haja um Governo que ao longo dos cinco anos, durante o período do mandato, trabalhe, sem algum peso ou alguma implicação que possa prejudicar" o seu funcionamento.

Outras fontes da AMP questionam os motivos do chefe de Estado, recordando que todos os membros do Governo propostos e ainda não aceites pelo Presidente da República se apresentaram durante a campanha eleitoral e, em alguns casos, foram mesmo eleitos deputados.

"Trata-se, em alguns casos, de figuras de topo dos partidos que deram a cara pela AMP na campanha. Estavam nas listas. As pessoas votaram neles conscientes de que iriam estar no Governo", afirmou uma das fontes.

"Foram os eleitores que, com o seu voto, deram credibilidade a estes elementos", sublinhou.

Em entrevista à Lusa na quinta-feira, o Presidente da República insistiu que é essencial que a AMP e, "principalmente, o senhor primeiro-ministro, ponderem a escolha desses elementos".

"Devo dizer muito claramente que dessas pessoas que foram escolhidas para se integrarem no elenco governamental, algumas das pessoas foram já acusadas definitivamente pelos órgãos judiciais", afirmou.

"Simplesmente chamei a atenção ao senhor primeiro-ministro, para ponderar a escolha desses elementos para se integrar no Governo", insistiu.

Admitindo que possa haver um impasse, se os partidos do Governo mantiverem a lista proposta, Lu-Olo recordou "experiências do passado" em que "alguns membros [do Governo] foram acusados definitivamente pelos tribunais e não cooperam, e escudaram-se atrás da imunidade".

"Isso não pode ser. O senhor primeiro-ministro tem que ponderar bem as coisas. Ele disse isso várias vezes: que não aceita pessoas envolvidas com a corrupção para estarem no Governo. Disse isso na altura", afirmou Lu-Olo.

ASP // ATR | Publicado em TIMOR AGORA

Apesar de melhorias, “Guiné-Bissau nunca processou nenhum traficante”, diz o Departamento de Estado


Relatório recomenda as autoridades guineenses a “investigar e processar vigorosamente crimes de tráfico" humano

Apesar de esforços, o Governo guineense não cumpre os padrões mínimos para a eliminação de tráfico humano, diz o relatório do Departamento de Estado.

A Guiné-Bissau, que melhorou a classificação para o grupo de países em observação, registou, segundo o estudo, avanços ao iniciar “a sua primeira investigação desde 2015, identificação de primeiras vítimas em 10 anos e referir as vítimas à ONGs (Organizações Não-governamentais) para cuidados”.

O país é também distinguido por ter feito parcerias com ONGs para elevar a consciencialização sobre a situação de crianças forçadas a mendigar nas comunidades fronteiriças e tráfico de crianças para o sexo no sector de turismo.

Apesar desse avanço, diz o Departamento de Estado, a Guiné-Bissau não alocou recursos e não revelou contínuo engajamento a alto nível para travar as acções de tráfico.

Prova disso é que a Polícia Judiciária não teve do Governo orçamento, o que impediu a investigação de casos de tráfico fora de Bissau, incluindo casos de turismo sexual infantil em Bijagos; o comité interministerial continuou sem fundos suficientes para as actividades de prevenção, além de que casos com indicações credíveis não foram investigados.

“Guiné-Bissau nunca processou ou condenou nenhum traficante”, denuncia o relatório.

Mais investigação e recursos

Face à situação, o Departamento de Estado recomenda as autoridades guineenses no sentido de “investigar e processar vigorosamente crimes de tráfico; condenar e punir os traficantes”.

Tal deverá incluir os casos dos que forçam meninos a mendigar e os hotéis que facilitam o turismo sexual infantil nos Bijagós

Por outro lado, as autoridades deverão alocar fundos para facilitar as operações da Polícia Judiciária e aprovar a abertura de um segundo escritório em Bijagós.

Outras acções recomendadas incluem a formação de profissionais de lei e ordem em procedimentos para identificação de vítimas de tráfico, melhoria de comunicação entre as entidades que combatem o tráfico e mais financiamento para as ONGs para permitir a assistência adequada às vítimas.

VOA - Voz da América

São Tomé | MLSTP denuncia Presidente da República e Aurélio Martins


Numa nota de protesto, o MLSTP denuncia a forma maquiavélica e ardilosa como o poder tem manipulado a comunicação social para denegrir a imagem do partido.

Segundo o maior partido da oposição, prova mais evidente da tal acção maquiavélica, aconteceu na última terça – feira, quando o Presidente da República no quadro da auscultação as forças políticas com vista a marcação das eleições, reuniu-se com Aurélio Martins, um militante sancionado com suspensão, pelo conselho nacional do MLSTP, que também ordenou a realização do Congresso Extraordinário para este sábado dia 30.

«Considerando que o Presidente da República no âmbito do contacto prévio com os partidos políticos para marcação da data eleitoral preferiu receber Aurélio Martins ao invés da delegação legítima do partido MLSTP/PSD apresenta publicamente o seu mais veemente protesto ao Presidente da República por participar desta farsa numa clara manifestação de ingerência nos assuntos internos do MLSTP/PSD», diz o MLSTP na nota de protesto.

Para o MLSTP, Aurélio Martins está ao serviço do actual poder, liderado pelo partido ADI. «O MLSTP / PSD lamenta profundamente as recentes iniciativas de Aurélio Martins que com clara conivência e cobertura do poder, coloca-se objectivamente ao serviço daqueles que pretendem por em causa o bom nome do MLSTP/PSD e da realização do seu congresso», pontua a nota de protesto.

Abel Veiga | Téla Nón

Angola | Ex-militares dizem-se discriminados


Os acordos de paz, a desmobilização dos antigos exércitos: FALA (UNITA), FAPLA (MPLA) e ainda de alguns militares das FAA, levou à promessa de enquadramento de uma força de 3200 jovens soldados com experiência, nos efectivos da Polícia Nacional.

No entanto, chegada a fase de transição, eis que surge um empecilho, os Recursos Humanos da Polícia Nacional, segundo os visados, alegam, indisponibilidade na recepção, por, nos testes médicos, terem sido considerados, portadores, uns de Hepatite B e, outros de HIV. Os jovens ficaram estupefactos, principalmente por a comunicação lhes ter sido dada, em plena parada, quando deveria ser sustentada em relatório médico.

“É uma ofensa, abuso de poder e discriminação”, denunciam os lesados, que se consideram atirados para o desemprego, depois de terem servido, com bravura o país. “Nós depois dessa exclusão, recorremos ao Hospital Militar, onde fizemos outros exames médicos, que provam o contrário”, logo, estão saudáveis.

Com esperança renovada, empreendem uma descida à Polícia Nacional, mas, aqui chegados, recebem informação de só valerem resultados feitos no Laboratório Central de Criminalística ou outros afectos ao Ministério do Interior.

Foi como o deflagrar de uma bomba, denunciam, não descartando a existência de uma rede de tráfego e corrupção na polícia, que “vendeu os nossos lugares a outros”, daí o lamento. “Somos militares descontentes com o processo de transição das Forças Armadas para a Polícia Nacional, iniciado com base num Decreto Presidencial, assinado à época, pelo Comandante-em-Chefe, José Eduardo Dos Santos”, afirmam, adiantando, constar no mesmo, “que doravante os militares do quadro, após cumprimento do serviço militar obrigatório (três anos), estariam habilitados para uma transição formal para a Polícia”.

Questionados sobre quantos ex-militares estariam nessa condição, foram peremptórios: “aproximadamente, 3200 efectivos oriundos das FAA (Forças Armadas Angolana), dum total de seis mil efectivos. Os outros integraram-se, mesmo na Policia Nacional, mas nós não, daí a nossa presença no Folha 8, para, não só, expressar o nosso descontentamento como denunciar essa discriminação”.

Mas, na realidade, o que pretendem estes militares, que podem ser forçados a integrar o “longo braço” da delinquência urbana, cada vez mais reforçada com homens com experiência no manuseio de armas de fogo e de guerrilha? Atentemos à sua visão. “Cumprimos o serviço militar obrigatório de 3 anos, sem nenhum problema de saúde. Fizemos testes e formação básica de 90 dias, mas incluindo a capacitação de especialidade, durou um ano. Depois deste tempo todo, sem nenhuma intervenção médica e ida aos consultórios. Como, agora, para nos descartarem surge a história de estarmos doente com SIDA, Hepatite B e outras doenças? Ora, se fossemos portadores, não cumpriríamos missões militares de alto risco, praticamente em toda Angola”, alegam, adiantando, “nós temos o Hospital Militar que responde pelos serviços médicos dos militares, que confirmaram não sermos portadores de nenhuma doença venérea”.

Contundente é ainda a acusação de ter havido corrupção, na inviabilização do seu alistamento, substituído por civis. “Sim, é claro que a Polícia Nacional ficou a meter muitos civis e a pedirem dinheiro, com estes a pagarem Kwz: 400.000,00 (quatrocentos mil kwanzas) e alguns militares licenciados, o valor de Kwz: 150.000,00 (cento e cinquenta mil Kwanzas).“

Mas nisso a maioria dos enquadrados militares eram desertores, muitos só agora denunciados e vão responder em vários processos criminais, na Polícia Judiciária Militar.

O objectivo do Decreto Presidencial era o de garantir, aos agentes policiais um preparo militar, para reduzir os custos de formação policial. “Mas o que se passou neste processo”, denunciam os ex-militares, foi que “as Direcções da Saúde e dos Recursos Humanos da Polícia Nacional, banalizaram o decreto envolvendo civis que estavam a dar montantes elevados”.

Com base no acima referido, os efectivos reivindicam, “enquadramento na Polícia Nacional o mais rápido possível, uma vez sermos jovens e termos muito a dar. A Polícia quer combater a criminalidade e, nós estamos prontos para isso. Agora estão a pôr-nos de parte, quando cumprimos o serviço militar obrigatório, excedendo o tempo estipulado por lei, fazendo 7 a 8 anos”.

Por tudo isso apelam o Titular do Poder Executivo para “orientar os Ministérios do Interior e da Defesa a reverem a nossa situação, uma vez sermos, a maioria, jovens com uma idade média de 20 a 25 anos de idade, que não podemos ser postos na rua, sem emprego, uma vez que já tínhamos um emprego no Estado”.

Moçambique | A morte de recém-nascidos deixa pensar que o crime compensa


Moçambique comporta vários crimes públicos em que as autoridades com obrigações de fazer cumprir as leis e punir os criminosos fecham os olhos e assobiam para o lado, apesar de com todo o descaramento declararem que estão em ação contra esses crimes, denunciados na imprensa nacional e internacional.

“Grávidas que não pagam subornos ficam sem serviços de maternidade” é uma denúncia já com algum tempo, acontece em Lichinga, segundo a notícia, mas sabe-se que há mais maternidades onde isso acontece.

Desta vez a Deutsche Welle veicula a notícia de casos que vem acompanhando há algum tempo. E em Moçambique o que foi feito para acabar de vez com este processo absolumente ilegal e criminosos? Nada. Ou quase nada. O que não invalida que digam que sim, que estão a procurar resolver o assunto, a repor a legalidade e permitir o cumprimento dos direitos das mulheres grávidas moçambicanas. Ficamos à espera, e bem podemos esperar. A corrupção e os crimes abundam nas barbas das autoridades e nada é feito para repor a legalidade. Muitas vezes os principais criminosos pertencem ao sistema que está nos poderes. Pelo que denunciam, o crime compensa em Moçambique. (PG)

Grávidas que não pagam subornos ficam sem serviços de maternidade em Lichinga

Denúncia é feita por utentes dos serviços de maternidade do hospital provincial de Lichinga, na província do Niassa, norte de Moçambique. Se não pagarem subornos, grávidas não acedem aos serviços ou são mal atendidas.

É uma prática ilegal, as autoridades estão a par da situação, mas, mesmo assim, continua a haver enfermeiras e parteiras a cobrar pelos seus serviços nas duas maternidades existentes no hospital de referência na cidade de Lichinga.

A denúncia é feita por utentes, em entrevista à DW África, que recusam divulgar o nome, por medo de represálias. Afirmam que, sem pagar, as mulheres são mal atendidas ou podem mesmo ficar sem atendimento.

"Sem sacudir a capulana" não há atendimento

Uma das utentes conta a sua história: " A minha mãe saiu e foi procurá-las e encontrou uma das parteiras. Pediu-lhe para vir ver-me e uma delas saiu e chegou, observou-me e disse que o bebé estava longe, precisava de ser operada. Daí, a minha mãe pediu-lhes para esperarem um pouco e elas foram dormir e deixaram-nos sozinhas, sem atendimento".

Se a sua mãe não tivesse dinheiro, acrescenta, teria perdido a sua filha. "A parteira disse 'se a senhora não sacudir capulana a sua filha não vai ser atendida', e a minha mãe não estava a entender o português. Eu disse que elas queriam dinheiro. E a minha mãe respondeu 'podem atender, eu tenho 500 meticais'. Disseram que 500 meticais era pouco. Minha mãe disse 'é o que eu tenho e se tivesse em casa ia correr para ir buscar'. Aí, elas me atenderam e me puseram a soro e tive a bebé", conta.

Direção garante que está a tomar medidas

500 meticais é o equivalente a 7 euros. José Manuel, diretor provincial de saúde no Niassa, diz que tem conhecimento do fenómeno, mas que é difícil agir porque não há denúncias: "Nós, como sector de saúde, temos estado abertos à articulação com todas as entidades necessárias, porque o combate à corrupção é um ponto fulcral para o sector da saúde", afirma, frisando que "o combate à corrupção requer a intervenção de todos".

Os utentes podem fazer as denúncias directamente nas unidades de saúde, segundo o director provincial. Na perspectiva da prevenção e numa tentativa de detectar e resolver estes casos, explica José Manuel, foram criadas "plataformas em todas as unidades sanitárias para que, se realmente os cidadãos [pagarem] um valor para um acto clínico, possam prontamente colocar os assuntos".

O responsável faz um alerta: os funcionários ou funcionárias que forem apanhados a fazer cobranças ilícitas serão expulsos do sistema de saúde, como forma de desencorajar outros profissionais.

Manuel David (Lichinga) | Deutsche Welle (30.06.2018)


Todos os dias morrem 80 bebés à nascença

Todos os anos morrem em Moçambique cerca de 29 mil recém-nascidos, segundo a UNICEF. As autoridades pedem às mulheres grávidas para não terem os bebés em casa. Mas muitas continuam a não ir ao hospital.

Há muitas mulheres grávidas que não têm os filhos no hospital por culpa dos maridos, conta Laura Alfredo, uma residente no distrito de Morrumbene, província de Inhambane.

Os maridos têm medo que as mulheres laqueiem as trompas no hospital, para não terem mais filhos, sem o consentimento deles - por isso, obrigam-nas a fazer o parto em casa, denuncia. Mesmo se forem consultas pré-natais, os maridos não aceitam "nem se avistar com o médico".

Mas a falta de aconselhamento acarreta riscos. De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), todos os anos morrem em Moçambique cerca de 29 mil recém-nascidos, sobretudo devido a infeções durante a gravidez ou complicações no parto.

Denúncias de cobranças ilícitas

Ainda há outro motivo que leva muitas mulheres grávidas a ter os filhos em casa, segundo uma cidadã, que pede para não ser identificada, por medo de represálias: supostas cobranças ilícitas nas unidades de saúde.

"Tem sempre de levar 500 meticais [o equivalente a cerca de 7 euros] no bolso para a enfermeira a atender. Para ir à consulta pré-natal, tem de ter uma madrinha enfermeira, se não é deixada à sua sorte", afirma. "Na maioria dos partos no hospital rural, se não fez um pacto para ela a acordar, ela esquece".

Naftal Matusse, diretor provincial de saúde em Inhambane, recusa comentar estas acusações em detalhe. Avança apenas que alguns profissionais foram expulsos ou enfrentam processos disciplinares e estão a responder na Justiça por causa desta prática.

Apelo das autoridades

Matusse pede, no entanto, às mulheres que se dirijam às unidades de saúde, para serem acompanhadas durante a gravidez.

"Muitas das vezes, os óbitos acontecem devido à chegada tardia às unidades sanitárias", diz. "O que nós queremos é que os agentes polivalentes elementares, os líderes comunitários e os familiares dessas mulheres grávidas as encaminhem para a unidade sanitária, para que elas tenham, no mínimo, quatro consultas pré-natais. Assim poder-se-á detetar o risco."

Benilde Soares, especialista de saúde da UNICEF, revelou à DW África que a organização vai ajudar a implementar várias medidas para combater a mortalidade neonatal ao longo deste ano, incluindo um programa de monitoria de enfermeiros de saúde materno-infantil, em colaboração com o Ministério da Saúde.

O programa começará na Zambézia, por ser uma das províncias moçambicanas com a maior taxa de mortalidade neonatal.

Luciano da Conceição (Inhambane) | Deutsche Welle (22.03.2018)

Leia mais em Deutsche Welle

Brasil | O encarceramento do voto popular


O ostensivo espetáculo de transgressões jurídicas para impedir a presença do ex-presidente Lula no escrutínio que definirá o futuro do país dentro de apenas quatro meses, acaba de galgar mais um degrau constrangedor.

Joaquim Ernesto Palhares | Carta Maior | opinião

O salto reflete o clima de últimos dias de Pompéia vivido no quadro de um golpe que já jogou a toalha em todas as dimensões.

Exceto uma.

Impedir que o maior líder popular brasileiro --o único, ainda, com capacidade para superar o estilhaçamento político da nação-- deixe o cárcere e ouse construir um novo pacto da democracia social com o desenvolvimento na oitava maior economia da terra.

Nisso se resume o ‘derradeiro trem para Paris’ no qual a aliança da mídia com a escória, o dinheiro e o judiciário se amarrota em busca de um assento mitigador. Nem que para isso seja imperativo preservar a desordem na economia. E o caos na esfera política.

Desordem econômica funcional, diga-se, para sepultar as chances de uma retomada do crescimento e do emprego, das demandas e das mobilizações, da reversão do entreguismo e do assalto aos direitos da cidadania e aos recursos da nação.

Caos político funcional, da mesma forma, para manter nas mãos do conservadorismo a chave-mestra de todas as portas, afunilando o desespero social no estuário das distintas ‘opções’ fascitoides e esquizoides para a crise.


Estamos num plano inclinado vertiginoso. A economia se despedaça: nos últimos três anos do ciclo golpista, o país fechou 13,8 mil indústrias, segundo o IBGE; o investimento industrial diminuiu quase 25% (1/4) e o setor cortou 1,3 milhão de vagas no período. Isso, num mundo em que a busca de competitividade já impulsiona uma quarta revolução industrial, baseada em robôs e na inteligência artificial.

Retalhos da nação são eviscerados e ofertados na bacia das almas aos capitais sedentos de opções à liquidez necrosada da ciranda financeira global.

Entrega-se o pré-sal. E se enterra o país no desemprego.

A derrocada do setor petroleiro no Brasil é obra do desassombro demolidor.

Em dois anos, entre 2014 e 2016, quase metade das vagas na construção de embarcações foram fechadas no país. O pessoal ocupado na área caiu de 61.543 para 31.505, uma queda de 49%.

No Rio de Janeiro, a redução da mão de obra foi ainda maior: 74,2% dos postos de trabalho foram fechados entre 2014 e 2016.

O Exército na rua não vai suturar essa sangria da razão.

O vale-tudo conservador lubrifica os trilhos da espiral descendente com a cegueira característica dos impulsos pró-cíclicos. Corte-se mais. ‘Privatize-se tudo o que for possível’, como receitou o sociólogo Fernando Henrique Cardoso.

Nesse atropelo da razão, da nação e do Estado de Direito, ao papel sabido de Sergio Moro & Cia, junta-se agora a desconcertante figura do ministro Edson Fachin, cujo retrofit nos valores espanta a própria biografia.

Se o Brasil fosse um filme do cineasta Costa Gavras, o ministro Fachin teria suas motivações privadas colhidas pelas lentes silenciosas da miséria humana.

O viés desse olhar mudo talvez explicasse –garantem alguns— o travestismo histórico desse homem da lei, de passado progressista, que ora assume a ponta de lança da sofreguidão conservadora para sustentar o encarceramento ilegal do cidadão Luiz Inácio Lula da Silva, impedi-lo de se candidatar, abduzi-lo da visão política dos eleitores e, assim, e somente assim, dissocia-lo de um escrutínio do qual dificilmente sairia para uma outra condição que não a de Presidente da República.

As artimanhas jurídicas de Fachin espantam o mundo jurídico pelo duplo atentado à democracia e ao percurso de vida do jurista.

Segundo o ministro Marco Aurélio, Lula permanece ilegalmente preso graças à ministra Carmem Lúcia que não coloca em julgamento as Ações Declaratórias de Constitucionalidades (ADCs) que poderiam libertá-lo.

É pior que isso.

E por ‘pior’ leia-se, ‘Fachin’.

Um histórico necessário.

Fachin encarnou a missão de barrar um pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para suspender sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).

Na semana passada, o ministro mandou arquivar recurso que pedia a suspensão dos efeitos da condenação - e que estava previsto para ser julgado nesta terça (26/06) pela segunda turma do STF.

A defesa de Lula entrou com novo recurso, pleiteando que o ministro reconsiderasse a decisão diante de um histórico processual que feria garantias constitucionais.

O TRF-4, alerta e veloz como uma corsa, ergueu-se contra esse novo pedido ao Supremo, sob a justificativa de que o reexame de provas, por exemplo, não seria de competência da Corte.

A defesa de Lula não teve outro caminho a não ser recorrer ao próprio STF solicitando que o recurso fosse julgado pela segunda turma, que acaba de determinar a libertação do ex-ministro José Dirceu, reafirmando a sua composição claramente crítica à natureza política assumida pela Lava Jato.

Emparedado mas indiferente à estupefação que manifesta no mundo jurídico e político, Fachin ainda encontrou espaço para a rasteira final.

Mostrou mais uma vez encarnar o espírito do capitão-do-mato determinado a cumprir a missão que lhe foi reservada nesse túnel da história.

O ministro decidiu levar ao plenário mais adverso, o pleno da Corte, o julgamento desse recurso, o que, ademais, protela sua análise no mínimo para agosto, uma vez que em julho o STF entra em recesso.

A definição exata da data caberá a Cármen Lúcia, a presidente do tribunal festejada pelas Organizações Globo, cuja sintonia com a agenda do desastre golpista dispensa reiterações.

Pode-se esperar o pior, portanto: o adiamento do exame do recurso para depois do período de inscrição de chapas ao pleito presidencial.

A armadilha excretada nas últimas horas não destoa do padrão do lavajatismo protagonizado por Sergio Moro & Cia.

Mas a captura de um jurista com o perfil de Edson Fachin, que empresta sua biografia, as vértebras e as mandíbulas à mastigação do Estado de Direito, dá o peso e a medida do jogo pesado que se abre nesse entroncamento entre uma aventura golpista fracassada e a hora da verdade nas urnas.

A caçada desabrida à candidatura Lula aferra-se à determinação de manipular esse acerto de contas, nem que para isso seja preciso entregar a nação ao vácuo no qual proliferam os esporos de um higienismo social de sarjeta, mas não menos virulento que o original.

A captura de Fachin por esse triturador ilustra a virulência do processo para o qual já se advertia desde o início quando alguns ainda nutriam esperança numa salvação no STF, ao abrigo de ‘éticos’, como o jurista paranaense nomeado por Dilma para a vaga de Joaquim Barbosa.

Contra essa esperança já se ouviam premonições graves recebidas com incredulidade ainda, em fevereiro de 2017, como aconteceu, então, em uma roda no Hospital Sírio-Libanês, onde dona Marisa, sedada e já sem fluxo cerebral, agonizava e Lula recebia a solidariedade de amigos e políticos.

Em meio a especulações sobre o futuro do país e o destino do ex-presidente na Lava Jato, uma ex-ministra de Dilma, num círculo do qual faziam parte dirigentes e lideranças do PT, advertia que a situação seria muito difícil também no STF...

E não apenas por conta de Cármen, Gilmar, Fux, etc., explicou.

Exatamente naquela semana, no início de fevereiro, Fachin acabara de ser sorteado relator da Lava Jato no Supremo. Dias antes pedira para trocar de turma e assim poder concorrer ao cargo...

Sugestivamente, foi o escolhido pela roleta...

O jurista substituiria assim o ministro Teori Zavascki, morto em desastre aéreo em Paraty, na costa sul fluminense, em episódio sobre o qual ainda recaem dúvidas e interrogações.

'Fachin está nas mãos deles', dizia a ministra em voz baixa aos que manifestavam esperança com a nova titularidade da relatoria.

Em tom recolhido a ex-ministra puxou um dos presentes pelo braço e assumiu o centro da rodinha para balbuciar:

'Eles estão chantageando o Fachin’.

Para muitos, ela parecia falar de outra pessoa que não a figura simpática do militante católico da ala progressista da Igreja, advogado ético, defensor do MST, ungido ao Supremo como um potencial contraponto à barricada conservadora.

Edson Fachin, em cerca de 60 anos, montou sua biografia nessa vertente da história.

Não por acaso, sua nomeação para a vaga de Joaquim Barbosa em 2015 --após oito meses de vacância meticulosa por parte do governo Dilma-- foi recebida com restrições conservadoras.

Sua sabatina confirmou o que se anunciava: foi uma das mais difíceis e demoradas da história. Durou cerca de 12 horas.

Defensor da reforma agrária e do casamento entre pessoas do mesmo sexo, ele contrariava duas bancadas poderosas: a evangélica e a ruralista.

Não só. Defensor da função social da propriedade da terra, tema de um dos seus livros, carregava a marca dessa convicção no exercício da advocacia e na atuação como procurador geral do INCRA, cargo que assumiu em 1985.

A resistência conservadora na sabatina do Senado pinçava ainda outros episódios ilustrativos de uma coerência política para se mostrar especialmente dura:

em 2003, Fachin assinou um manifesto, junto com Fabio Konder Comparato, em favor do cumprimento da norma constitucional que prevê a desapropriação, para fins de reforma agrária, de imóveis rurais que descumpram a função social da propriedade;

em 2010, por indicação da CUT, integrou a Comissão da Verdade do Paraná;

nesse mesmo ano, assinou um manifesto, juntamente com outros juristas, em defesa do direito do então presidente Lula opinar sobre as eleições;

em outubro de 2010, participou de um vídeo de campanha lendo um manifesto de juristas com declaração de apoio à candidata Dilma Rousseff.

'Fachin está nas mãos deles', insistiu a ex-ministra aos incrédulos que pinçavam esses argumentos do currículo do novo relator da Lava Jato para reiterar a aposta nas chances de absolvição de Lula no STF.

'Fachin está sendo chantageado', disparou ela interrompendo os incrédulos.

Em resposta aos olhos arregalados e semblantes de espanto, desferiu a última estocada: 'Fachin é um pai de família tradicional, construiu uma imagem pública baseada na ética e nos valores cristãos. Ele não tem estrutura par aguentar essa chantagem: vai fazer tudo o que eles quiserem'.

Carta Maior não endossa, nem sanciona os elementos desse relato.

Cita-o porque se ajusta com precisão ao mosaico de pressões, delações fabricadas, filtradas e induzidas, transgressões jurídicas e violência pura e simples que compõe a engrenagem de forças e interesses coagulados na pedra angular de um golpe que se avoca ‘institucional’.

Ou seja, um golpe que não elide a urna, mas opera o encarceramento do voto popular.

A abdução de Lula é uma das barras estruturais dessa detenção em massa, da qual os moros, os fachins e assemelhados são o pelotão de vigia da torre.

A mídia completa o pan-óptico do controle absoluta da sociedade, como previu Foucault ao extrapolar para o sistema de comando do capitalismo a arquitetura idealizada originalmente para a vigilância indivisa dos presídios.

O jornalismo da chamada mídia comercial tem se prestado com afinco a esse papel de vigia ubíquo da consciência popular.

Para isso abduziu Lula após o sequestro do ex-presidente pela Lava Jato.

Não se toca mais na natureza virulenta dessa prisão.

Não se cobriu o lançamento da candidatura do petista em Contagem (MG), no último 8 de junho.

Não se dá espaço a aberrações e violações inúmeras do processo em curso contra o ex-presidente.

De um exemplo com personagens anônimos infere-se todo os demais: a cunhada e o sobrinho menor de idade do caseiro do sítio de Atibaia foram arrancados de sua casa recentemente, sem qualquer aviso, às seis horas da manhã, por homens fardados, para serem interrogados ‘sobre Lula no sítio’.

Dois jornalistas, Luna Sassara e João Feres Júnior esmiúçam os dentes dessa engrenagem na reportagem “Não é Lula pré-candidato?” que analisou 120 textos de capa sobre as eleições 2018, distribuídos nos três principais jornais do país durante 45 dias.

Primeiro fruto da parceria entre Carta Maior e o Manchetômetro, que anunciamos com muita alegria nesta semana, a pesquisa traz um dado, no mínimo, perturbador:

"O pré-candidato à Presidência mais citado nas capas dos grandes jornais em matérias que tratam de eleições no período em análise foi Jair Bolsonaro (PSL-RJ), seguido por Geraldo Alckmin (PSDB-SP).

Lula, que lidera as pesquisas de intenção de voto, aparece apenas em terceiro lugar, seguido por Ciro Gomes, Marina Silva e Henrique Meirelles”.

A pesquisa do Manchetômetro mostra ainda que:

“Os grandes jornais têm dedicado pouquíssimo espaço de suas capas para tratar Lula enquanto candidato, comparado aos outros com menor índice de intenção de votos. Isso não ocorre, contudo, com outros temas envolvendo o ex-presidente, como as investigações contra ele e o andamento de processos nos quais é réu”.

Como adiantei duas semanas atrás, a única saída do neoliberalismo é a sua radicalização (leia mais).

É o que está em marcha no país.

Quem melhor para cumprir essa agenda, do que um capitão defensor da tortura e do armamento da população, em suma, alguém disposto a aprofundar a anomia social amesquinhadora da vida política?

É preciso destacar que não apenas o Judiciário e os veículos de comunicação fazem parte dessa espiral fascistizante, mas também o mercado financeiro, as elites do agrobusiness, o que restou da indústria e do comércio.

Todos formam desde sempre o “condomínio golpista” servil aos interesses norte-americanos e das grandes corporações que querem as terras, o petróleo, a água e o dinheiro da gente brasileira.

O assalto é generalizado e Bolsonaro surge como o guarda-da-esquina de confiança do butim.

Correto estava o saudoso companheiro Marco Aurélio Garcia que nos ensinou a sempre desconfiar das elites brasileiras.

Sua obra de rara clarividência, aliás, está sendo lançada em três volumes. O primeiro já na praça desde última quinta-feira, pela Editora da Fundação Perseu Abramo.

A parceria entre Carta Maior e o Manchetômetro representa a união do espaço de reflexão com a pesquisa propriamente dita, tão necessário neste universo em que a opinião publicada é, desde sempre, a grande produtora das fake news.

Se o ministro Luiz Fux, presidente do Superior Tribunal Eleitoral (TSE), pretende efetivamente combatê-las, aqui vai o endereço: Central Globo de Jornalismo, Jardim Botânico, Rio de Janeiro.

Caras leitoras e leitores, como vocês sabem, ao contrário do diversionismo da mídia neoliberal, Carta Maior sempre se assumiu como um portal de esquerda e, há mais de 17 anos, garante assim a presença da reflexão interditada no país pela mídia hegemônica.

É de fundamental importância a guerrilha diuturna que realizamos nas redes sociais; mas é a formação política que nos possibilitará enfrentar o fascismo hoje representado na figura de Jair Bolsonaro, como diz o candidato Ciro Gomes.

O trabalho da mídia alternativa evidencia-se assim cada vez mais difícil e necessário. Para desenvolvê-lo, precisamos do compromisso e da participação de milhares de parceiros. Com apenas R$1,00 por dia, R$30,00/mês, você pode agregar força e legitimidade a essa trincheira.

Quem puder, DOE MAIS (clique aqui e confira opções de doação) possibilitando que o nosso conteúdo também ultrapasse os limites atuais.

Mais que isso: por favor, cadastrem-se na Carta Maior ou atualizem seu cadastro clicando aqui. Precisamos nos manter unidos e em contato permanente frente a qualquer eventualidade no ciclo eleitoral que se abre.

Sigamos juntos e mobilizados na luta por uma verdadeira democracia social no Brasil.

Um abraço,

*Joaquim Palhares - Diretor de Redação

Brasil | Bolsonaro ama Trump, o carrasco de crianças


Os brasileiros que estão chocados com o facínora Donald Trump, que enjaula crianças e as separa dos pais imigrantes, devem ficar mais atentos aos monstros em sua própria casa. O fascista Jair Bolsonaro, que desponta em segundo lugar nas pesquisas eleitorais, é um seguidor do carrasco.

Altamiro Borges | Vermelho | opinião

Em novembro de 2016, logo após a vitória do republicano no colégio eleitoral, ele postou: “Parabéns ao povo dos EUA pela eleição de Trump. Vence aquele que lutou contra ‘tudo e todos’. Em 2018, será o Brasil no mesmo caminho”. Em outubro passado, quando visitou o país e fez continência diante da bandeira ianque, ele mostrou todo seu servilismo: “Trump serve de exemplo para mim”. Já na semana passada, quando a política migratória criminosa do império foi criticada nas Nações Unidas, ele saiu em sua defesa: “Os EUA acabam de deixar o tendencioso e parcial Conselho de Direitos Humanos da ONU”.

Metido a valentão – apesar de morrer de medo de debates –, o fascista nativo não esconde que deseja seguir as mesmas políticas do psicopata do império. Matéria publicada na Folha de São Paulo no dia 21 de junho mostra que ele inclusive tenta estreitar os laços com o seu ídolo. “A família do presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) acionou emissários nos EUA para tentar uma aproximação com o presidente americano Donald Trump. A expectativa é que aliados do pré-candidato pavimentem um caminho para que o próprio seja recebido pelo chefe da Casa Branca entre o primeiro e o segundo turnos da eleição, supondo que estará no páreo... Admirador de Trump, Jair Bolsonaro força uma associação entre ele e o americano, que era visto nos Estados Unidos como um outsider destemperado em cuja vitória o establishment jamais apostou”.

De fato, ambos têm muitas coisas em comum. O ex-capitão do Exército brasileiro e o empresário ianque defendem com paixão os privilégios da cloaca burguesa. Trump apresentou uma reforma tributária que beneficia o 1% de ricaços do país; já Bolsonaro disse recentemente que é contra a tributação de grandes fortunas. Os dois também são inimigos mortais dos direitos dos trabalhadores e de seus sindicatos. O deputado nativo inclusive votou favoravelmente a “reforma trabalhista” do vampiro Michel Temer, que faz o país regredir ao período da escravidão, e até postou um vídeo com ataques furiosos ao sindicalismo. Eles também estão ligados aos interesses de poderosos grupos empresariais – banqueiros, ruralistas, indústrias de armamento, entre outros.

Além da unidade na pauta econômica, outro ponto que aproxima os dois facínoras é o estímulo ao ódio e ao preconceito. Trump é conhecido por suas posições racistas e xenófobas. Jair Bolsonaro não fica atrás. Em abril passado, por exemplo, ele foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República por seu discurso contra quilombolas, indígenas, estrangeiros e mulheres em uma palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro. Segundo a procuradora Raquel Dodge, “Bolsonaro usou expressões de cunho discriminatório, incitando o ódio e atingindo diretamente vários grupos sociais”. Na denúncia, a PGR transcreveu vários trechos da palestra, que agora os advogados de defesa do fascistoide tentam desesperadamente justificar para evitar a cassação da sua candidatura.

O belicista Donald Trump e o militarista Jair Bolsonaro também são partidários da violência. O senhor do império enjaula crianças imigrantes, patrocina golpes de Estado e dispara bombas. Já o fascista nativo é um adorador da morte. Em 2003, o deputado Jair Bolsonaro usou os microfones da Câmara Federal para elogiar os grupos de extermínio. “Enquanto o Estado não tiver coragem de adotar a pena de morte, esses grupos de extermínio são muito bem-vindos. E se não tiver espaço na Bahia, pode ir para o Rio de Janeiro. Se depender de mim, terão todo o apoio, porque no Rio de Janeiro só as pessoas inocentes são dizimadas. Na Bahia, as informações que tenho – lógico que são grupos ilegais, mas meus parabéns – [são as de que] a marginalidade tem decrescido”. A informação era totalmente mentirosa, uma típica “fake news” da extrema-direita para enganar os eleitores incautos.

*  Jornalista e presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.

Mexicanos vão a votos em eleições com resultado previsível, ao contrário do futuro do seu país


O esquerdista López Obrador é o favorito para vencer as eleições mexicanas, pondo um fim a décadas de poder do PRI e do PAN. Violência, corrupção e Trump pesam sobre o futuro incerto do México.

Os mexicanos vão a votos este domingo no México, numas eleições que se prevêem que resultem na eleição de Andrés Manuel López Obrador como Presidente do México. O líder do Morena deixa no ar mais dúvidas do que respostas para o futuro do país, que chega às urnas numa altura em que a corrupção e a violência no México chega a níveis preocupantes.

Durante a longa campanha, que durou três meses, López Obrador prometeu levar o México à sua quarta transformação, sucedendo assim a três momentos históricos daquele país: a independência (1821), a reforma (1854) e a revolução (1920).

As urnas abriram às 8h00 locais (14h00 de Lisboa) e só fecham às 18h00 locais (00h00 de Lisboa). Os primeiros resultados são esperados apenas às 23h00 locais deste domingo (5h00 de segunda-feira de Lisboa).

O fundador e líder do Morena (Movimento Nacional de Regeneração, de esquerda) aparece destacado nas sondagens, com valores que quase tocam nos 50% — o suficiente para ser eleito, já que no México as eleições presidenciais fazem-se a uma só volta. O maior adversário de López Obrador é Ricardo Anaya, do Partido Ação Nacional (PAN, de centro-direia), cujas previsões em torno dos 25% o deixam longe de poder realisticamente ser eleito.

Ao vencer estas eleições, o homem conhecido como AMLO (junção das suas iniciais) deverá tornar-se no primeiro Presidente mexicano a liderar um governo que não pertence nem ao Partido Revolucionário Institucional (PRI, de centro-esquerda e do Presidente cessante, Enrique Peña Nieto) nem ao PAN. López Obrador já tinha concorrido outras duas vezes para Presidente do México: em 2006 perdeu por menos de 250 mil votos contra Felipe Calderón; em 2012 perdeu contra Peña Nieto, por 6,6%. Agora, a vitória parece não fugir-lhe das mãos.

Desta forma, o resultado destas eleições presidenciais e legislativas é praticamente um apontamento quando colocado ao lado daquilo que parece ser a maior dúvida: que futuro sobra para o México depois deste domingo? A campanha de López Obrador tem sido marcada por uma ambiguidade.

Embora prometa o fim daquilo a que chama a “época neoliberal” e de se promover como um opositor do establishment — valendo-lhe de forma recorrente comparações a Hugo Chávez — durante esta campanha procurou ir ao encontro de empresários. Se, de um lado, promete um combate cerrado contra a corrupção, por outro, em dezembro, chegou a sugerir amnistiar alguns dos líderes de cartéis da droga que estão atualmente presos — proposta que retirou depois de ter sido amplamente criticado por ela.

A violência é também uma das principais preocupações neste México que vai agora a votos. Com mais de 26 mil homicídios — a um ritmo cerca de 80 por dia — o ano de 2017 foi um dos mais sangrentos dos últimos 20 anos, quase ultrapassando os 27.199 homicídios registados em 2011. Aqui, o combate ao narcotráfico e também os conflitos entre alguns daqueles grupos criminosos, é o principal responsável. Durante a campanha, também foram mortos 130 políticos.

A nível internacional, López Obrador terá a Norte o seu maior desafio, à medida que Donald Trump fecha a fronteira com o México (impedindo a passagem de emigrantes mexicanos e também de outros países da América Central) e no caso de o Presidente norte-americano cumprir a sua promessa de rever ou cancelar o NAFTA, o tratado de livre-comércio entre os EUA, o México e o Canadá.

João de Almeida Dias | Observador | Foto: Pedro Pardo | AFP/Getty Images

Eleições | Cidade mexicana tem todos os policiais presos após assassinato


Autoridades detêm todos os membros da força de segurança de Ocampo após morte de candidato a prefeito. México vive campanha eleitoral mais sangrenta de sua história moderna, com ao menos 18 políticos assassinados.

Autoridades do estado mexicano de Michoacán prenderam todos os 28 policiais da cidade de Ocampo, por suposto envolvimento no assassinado de um candidato a prefeito da localidade.

As autoridades locais divulgaram neste domingo (24/06) um comunicado dizendo terem detido todos os membros da força policial do município para serem interrogadas pelo departamento de assuntos internos da polícia. Com uma população de cerca de 24 mil pessoas, Ocampo fica a 150 quilômetros a oeste da Cidade do México.

Mídias locais e nacionais afirmaram que os policiais foram presos sob suspeita de cumplicidade na morte do candidato a prefeito Fernando Ángeles Juárez. Ele foi morto a tiros na última quinta-feira, e concorria pela legenda de centro-esquerda Partido da Revolução Democrática (PRD).

Os mexicanos irão às urnas em 1° de julho para eleger um novo presidente e representantes federais, estaduais e municipais. A campanha para as eleições gerais tem sido marcada pela violência de gangues, tornando-se a mais sangrenta da história moderna do país.

Ao menos 18 candidatos à eleição para vários cargos já foram mortos. Além de Juárez, também foi assassinado outro candidato a prefeito em Michoacán, Omar Gomez Lucatero, que concorria no município de Aguililla, dominado por gangues.

Crescimento das gangues

O analista de segurança mexicano Alejandro Hope acredita que o aumento da violência foi em parte causado pelos cartéis de drogas do país, que se ramificam e ampliam sua atuação para outros crimes, como extorsão, roubo de combustível, extorquindo, inclusive, os governos locais, forçando-os a assinar contratos públicos inflacionados.

Acredita-se que setores da força policial também sejam altamente corruptos, estando envolvidos em crimes como sequestros e assassinatos, por ordem dos cartéis.

"Com a evolução do crime, torna-se muito mais importante ganhar controle sobre o território, sobre os governos locais", disse Hope à agência de notícias AP. As gangues tentam expandir sua influência dentro da polícia e entre os funcionários públicos, levando-as a eliminar políticos hostis, acrescentou.

O governo federal do México tem lutado para reprimir os cartéis de drogas do país. Apesar das repetidas ações repressivas, os números oficiais registraram o ano como o mais violento nas duas últimas décadas, com 25.339 homicídios.

MD/rtr/afp/ap | Deutsche Welle

Milhares protestam contra política migratória de Trump


Manifestantes pedem reunião de 2.300 crianças com seus familiares, presos ao tentar ingressar nos EUA, e também fim da política de linha-dura para imigrantes ilegais.

Milhares de pessoas participaram neste sábado (30/06), nos Estados Unidos, de protestos contra a polêmica política migratória de "tolerância zero" do presidente Donald Trump, realizados em centenas de cidades.

Sob o lema #familiesbelongtogether ("Famílias devem estar unidas", em tradução livre), os manifestantes pediram a reunificação das mais de 2.300 crianças que foram separadas de seus familiares depois que estes foram presos ao tentar ingressar ilegalmente nos Estados Unidos pela fronteira com o México, desde 19 de abril.

Os manifestantes também exigiram o fim da política de "tolerância zero", que criminaliza os imigrantes ilegais, e dos "campos de detenção" de imigrantes, onde Trump quer manter reclusos durante longos períodos de tempo os imigrantes ilegais e suas famílias.

Trump, que passou o dia jogando golfe em Nova Jersey, atacou a "esquerda radical" do Partido Democrata, que, segundo ele, quer o fim da agência ICE, responsável pela execução da sua política migratória.

Em Washington, milhares de manifestantes se concentraram diante da Casa Branca para exigir do governo dos Estados Unidos que reunifique as famílias de imigrantes ilegais separadas e que acabe com a política de "tolerância zero".

A cantora Alicia Keys, a atriz America Ferrera e o dramaturgo de origem porto-riquenha Lin-Manuel Miranda participaram de uma manifestação que, segundo os organizadores, reuniu mais de 30 mil pessoas no centro de Washington, enquanto outras 700 cidades em todo território americano organizavam manifestações similares.

"Nossa democracia está em jogo. Nosso valores humanitários estão em jogo. Estamos aqui para salvar a alma de nossa nação", disse Alicia Keys. Ela e Ferrera, que é descendente de imigrantes hondurenhos, leram as histórias reais de uma mãe que foi separada de seu filho e de um avô que teve o pedido de acolher e cuidar da própria neta rejeitado pelas autoridades americanas.

"Eu vivo ao lado de um centro onde estão detendo acho que entre dez e 15 crianças", disse à agência de notícias Efe a jovem Alexandra Cornejo, de 22 anos.

Na semana passada, Trump assinou um decreto para acabar com a separação de famílias de imigrantes, depois de intensos protestos motivados pelas imagens de crianças detidas em locais que lembram jaulas. Não está claro, porém, o que acontecerá com as cerca de 2.300 crianças que já foram separadas de seus familiares e continuam detidas.

AS/efe/ap/afp | Deutsche Welle

Notícias da piolheira


Afonso Camões* | Jornal de Notícias | opinião

Por mais que se imponha o Fernando Santos que há em nós, não há como ignorar a colossal derrota da unidade europeia perante a tragédia dos refugiados. Ou o sinal de esperança que representa a eleição de António Vitorino para dirigir a Organização Internacional das Migrações. Porque nestas coisas convém ter alguém com um perfil humanista e que, no mínimo, saiba um pedacinho de como a História vai desenhando o nosso Mundo. E vice-versa.

Houve um tempo em que muitos milhões de europeus, pobres e maltrapilhos, se lançaram ao mar para escapar à fome e ao desastre que era o Velho Continente. O êxodo foi bíblico. De milhares e milhares de portugueses, também. E a América foi, então, um dos principais destinos, o porto menos inseguro do Novo Mundo. Fotografias da época ainda mostram filas intermináveis de europeus submetidos à inspeção, cabeças rapadas para catar ou prevenir piolhos e outros parasitas. Em desespero, fugia-se da guerra, da miséria, da perseguição.

Estão a ver a ilha de Ellis, mesmo em frente a Nova Iorque, na ponta da qual se haveria de levantar a Estátua da Liberdade? De 1892 a 1954, por muitas décadas, foi esse o mais importante centro de acolhimento e classificação de imigrantes no Mundo, o filtro e a porta americana por onde terão passado mais de 20 milhões de europeus, em número muito superior ao de africanos que agora demandam as praias da margem norte do Mediterrâneo, em vagas sucessivas.

Quando agora sugerem a criação de "plataformas de desembarque para migrantes", do lado de cá do Mediterrâneo ou por subarrendamento, em território de terceiros, é de novas ilhas Ellis que os chefes europeus estão a falar. Vêm com um século de atraso e insistem em ignorar a razão pela qual tantos milhares de africanos se arriscam ao naufrágio para bater à porta da Europa, à procura de uma oportunidade num mundo que já não é novo.

*Diretor do JN

Portugal | Jornalistas?


O jornalismo português só existe de vez em quando pelos realmente profissionais responsáveis, de resto assistimos a produtos a apontar para as vendas, para a aquisição do vil metal, como outro produto qualquer, que até pode ser pomada para os calos vendidos por um vigarista qualquer.

É repugnante ter de enfrentar esta realidade quando sabemos que existiam e existem no país bons jornalistas, que até foram postos na “prateleira” por troca com escribas e publicistas do piorio que adquiriam carteiras profissionais por dá cá aquela palha. O mal está feito. Para corrigi-lo vai demorar tempo. Se é que alguma coisa vai ser feita. É o “sistema”, pois é. Venderam-se ao sistema, pois foi. Resta ao menos lhes apelar cara a cara ou letra a letra  que “tenham vergonha!”

A seguir, Fernanda Câncio aborda o assunto. Claramente mas também diplomaticamente. Tenta explicar. Mas há situações inexplicáveis. Não chama aos colegas que merecem (colegas?) sabujos nem vendidos, mas é o que muitos portugueses fazem arrasando uma classe profissional que era credível, estimada e respeitada, que fazia da sua profissão um poder que representava os interesses dos portugueses e do país em quase todas as vertentes, incluindo as humanas, sociais e políticas. Em vez disso agora vendem-se. Jornalistas? (PG)

A preta de merda e o jornalismo de Segóvia

Fernanda Câncio | Diário de Notícias | opinião

O jornalismo é chegar tarde logo que possível. À irónica definição do jornalista e escritor sueco Stig Dagerman faz falta, nos dias que correm, ironia maior: jornalismo é jornalismo. Se chegar demasiado cedo, desconfiem.

Como é que os media portugueses não dizem nada sobre o caso da jovem colombiana agredida e apelidada de "preta de merda" no Porto? A pergunta foi feita no dia 26, pelas 23 horas, num longo, escandalizado e muito partilhado post. Por que é que os media colombianos tinham denunciado a situação antes do país onde ela sucedeu, perguntava. E respondia: racismo, xenofobia, silenciamento das minorias, o "sistema". Conspiração, em suma.

Só dei pelo post dias depois. À hora da publicação escrevia um artigo sobre o caso. Acabei-o pelas duas da manhã; ficou on line no dia 27 à uma da tarde. Mas por que é que, perguntar-se-á, só o estava a escrever no dia 26, àquelas horas, se a situação ocorreu entre as cinco e as seis de 24, domingo, se uma rádio colombiana conseguiu denunciá-la antes das 14 de terça e se havia desde 24 de manhã publicações no Twitter e Facebook a descrever parcialmente o ocorrido à entrada do autocarro 800, inclusive com um vídeo da agressão? Porque sou preguiçosa? Porque levo tempo de mais a escrever? Porque não dei importância ao assunto até que, como já li tantas vezes, "explodiu nas redes sociais"?

Vejamos. Os primeiros relatos terão sido publicados no domingo pelas nove da manhã, no Twitter, por uma amiga da jovem. Havia até um curto vídeo, muito confuso, em que se via uma rapariga de cara no chão, com o que parecia ser sangue, um homem sobre ela, e pessoas à volta a insultá-lo. Vi esses tuites no domingo bastante tarde e na segunda de manhã comecei a tentar chegar à fala com a autora e quem dizia ter testemunhado. Só ao início da noite, através do Facebook, consegui falar com alguém que intermediou o contacto com a agredida. Entrevistei-a, por telefone, pelas 10 da noite. Antes, às duas da tarde, contactara a empresa 2045, à qual pertence o segurança que aparece no vídeo a "dominar" a jovem. Recusaram sequer dizer se tinham conhecimento de algo e exigiram perguntas por escrito. Só teria resposta na terça 27, já após publicar o texto. Tentei também, durante a tarde de 25, obter informação junto da PSP mas só no dia seguinte conseguiria inquirir uma oficial das Relações Públicas.

Mas, sim, segunda ao fim da noite tinha já o relato pormenorizado de Nicol Quinayas, a protagonista. Por que não o publiquei logo? Teria "batido" até a rádio colombiana que no dia seguinte à hora do almoço difundiu o relato da mãe da agredida. O DN teria sido o primeiro a "dar a história". Teríamos "um furo", milhares de "partilhas" e "visualizações". Sucede que só com o relato da Nicol considerava não ter nada. Nem coloquei a hipótese de o publicar. Por um motivo simples: trabalho num jornal e sou jornalista. Isso implica só publicar o que considero estar sustentado, averiguado, verificado, dando voz a todas as partes atendíveis. Faltava isso tudo.

Parêntesis aqui. Na segunda 25 pediram à Céu Neves, que se senta ao meu lado na redação, para fazer um artigo sobre uma petição, com milhares de likes e partilhas no FB, para derrubar o aqueduto de Segóvia, monumento com 2000 anos e património da humanidade, por ser "um símbolo da opressão dos romanos". Havia desde dia 22 notícias acerca da dita no on line de vários media espanhóis, incluindo o respeitável La Vanguardia (e na respetiva secção de cultura). Em nenhuma o promotor da iniciativa, um consultor de comunicação, era citado. A Céu mandou-lhe uma mensagem pelo FB e passado 10 minutos ele ligou-lhe. Disse-lhe que obviamente se tratava de um chiste, uma experiência comunicacional sobre fake news na era digital. E que nenhum jornalista o contactara até então. Gostava de poder dizer que ficámos atónitas.

Fim de parêntesis. Casos como o de Nicol são a minha raison d"être como jornalista, malgrado tratar-se de uma profissão extenuante, muitas vezes frustrante, cada vez mais mal paga e maltratada. Casos como o de Nicol são a certificação da necessidade do jornalismo, o seu estandarte. Nenhuma alteração tecnológica ou de suporte muda isso - com o on line, podemos publicar logo que está pronto, o que é bom; gosto dessa fluidez. Mas não somos o FB, não somos o Twitter, não somos nem podemos ser "sites" propagadores e agregadores de "conteúdos", angariadores de cliques e likes. Somos profissionais com exigências técnicas e éticas muito claras e a obrigação de as defender. Ou somos nada.

Racismo e xenofobia | Nós, os colaboracionistas


Pedro Marques Lopes | Diário de Notícias | opinião

As agressões bárbaras a Nicol Quinayas, rapariga negra de 21 anos, não são um acontecimento excecional, como também o não são os insultos que o homem ao serviço dos STCP proferiu. Ainda há muito pouco tempo tivemos o episódio da esquadra de Alfragide e basta um apelo à memória para nos lembrarmos de várias situações que envolvem forças de segurança e negros. Aliás, são quase rotineiros os relatórios de entidades internacionais a acusar as nossas polícias de abusos e, apesar de não exclusivamente, quase sempre a negros.

Poderíamos concluir dizendo que temos um problema de racismo basicamente circunscrito às nossas forças de segurança. Reforçar com a enésima falha grave de, no caso das agressões a Nicol, a polícia não ter identificado o agressor no local, não ter chamado o 112 e só ter feito auto de notícia três dias depois - talvez por o caso ter tido repercussões mediáticas. E sim, sendo forças de segurança ou entidades ligadas ao setor público, este tipo de situações têm mais gravidade. É que estas instituições são, de forma mais ou menos direta, os nossos representantes. São as pessoas a quem delegamos a segurança ou outros interesses comunitários, somos nós.

Mas não, não é assim. A conversa de não termos um problema de racismo na nossa comunidade, de sermos um povo com uma relação diferente da de outros com gentes de outras raças é uma terrível mentira. Uma mentira mil vezes repetida. Uma mentira que ajuda um selvagem a espancar selvaticamente uma rapariga de 21 anos perante a passividade das pessoas que assistiam à cena. Uma mentira que permite que numa manifestação, poucos metros acima da Assembleia da República, se chame monhé ao primeiro-ministro. Uma mentira que permite a muitos chamar fundamentalista a quem se revolta por se utilizar linguagem objetivamente racista. Uma mentira que permite não termos negros com cargos relevantes na função pública, em cargos políticos, na administração de empresas privadas. Uma mentira que faz que ignoremos olimpicamente os insultos sistemáticos a negros em campos de futebol. Uma mentira que faz que sejamos, segundo um relatório da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia, entre nove países (incluindo a Hungria), os que mais discriminamos os ciganos no acesso a direitos básicos.

Não tenhamos ilusões. Tivéssemos situação comparada à dos fluxos de imigrantes de outros países europeus e a reação de muitos de nós seria igual ou pior do que a dessas comunidades. E tenho poucas dúvidas de que inevitavelmente apareceria um tocador de flauta de Hamelin racista e xenófobo a quem não faltariam nossos concidadãos a segui-lo.

O vírus do racismo está bem vivo entre nós. Não basta existir e estar a ser alimentado de muitas formas e poder ser engordado por outras, ainda conta com a colaboração de quem não está infetado mas encolhe os ombros quando o vê diariamente, que promove a mentira de sermos um país de brandos costumes perante outras raças. Não se iluda, caro leitor, de uma forma ou de outra eu e você estávamos nos socos que deixaram a cara da Nicol naquele estado.

O inferno da Portela 

Só quem não apanhou nos últimos tempos um avião no terminal 1 do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, é que desconhece o caos que ali está instalado. As zonas de check-in parecem, o dia todo, o metro em hora de ponta e as filas para passar pela segurança estendem-se por centenas de metros.

No dia 14 de junho demorei hora e meia desde o momento em que passei a zona de validação do cartão de embarque até cruzar a segurança. É evidente que os recursos estão a ser todos explorados. Não há máquinas de verificação da bagagem de mão que estejam paradas e não há falta de trabalhadores. E, claro, nem vale a pena falar dos atrasos nos voos.

As músicas que nos salvam a vida

A rubrica faz parte de um programa da CBS, The Late Late Show. Nela, o apresentador James Corden convida um músico que leva num passeio de carro enquanto conversam e cantam.

Num dos últimos episódios, o convidado foi Paul McCartney. O passeio percorreu Liverpool, a casa onde Paul e John escreveram os primeiros êxitos, os locais onde se inspirou para muitas músicas que fazem parte da minha e da vida de tanta gente.

- Foto: Jornal de Notícias

Portugal fora do mundial | Há males que vêm por bem


Portugal perdeu com o Uruguai, tinha de acontecer com aquele árbitro mexicano que foi subtilmente tendencioso mas muito provavelmente preponderante no resultado. Contudo a seleção portuguesa já não é o que era, os jogadores mais jovens ainda não aprenderam a comer a relva, daí Ronaldo ter de vir atrás buscar jogo em vez de estar adiantado e ter maiores possibilidades de marcar golos.

Foi um péssimo resultado, este com o Uruguai, mas com jogadores daqueles outra coisa não seria de esperar. Pela postura que todos tiveram, apesar de tudo, estão desculpados. Afinal venceu a melhor seleção, Uruguai. 

Os tais “melhores do mundo” – Messi e Ronaldo – não fazem milagres e os que no jogo se encostam a eles e deles se sentem dependentes são os responsáveis pelas derrotas que lhes foram infligidas. 

Daqui por quatro anos há mais. Talvez Ronaldo já nem jogue, nem Messi. Há males que vêm por bem. (PG)

Era para ser o Mundial de Ronaldo, mas acabou cedo de mais

Seleção nacional saiu derrotada pelo Uruguai nos oitavos (1-2) e o campeonato do mundo fica sem Messi e Cristiano Ronaldo no mesmo dia

Mundial que começou por ser o de Cristiano Ronaldo despediu-se da seleção nacional e do seu capitão com as expectativas portuguesas por cumprir. Portugal caiu nos oitavos-de-final perante o Uruguai (1-2), pagando uma crise de identidade futebolística que Fernando Santos resolveu tarde de mais neste torneio. O campeão europeu saiu de cena e arrastou Ronaldo com ele, no mesmo dia em que também deixou a prova o seu principal rival, Lionel Messi.

Cristiano Ronaldo continua sem ter qualquer golo em jogos a eliminar de campeonatos do mundo. E mantém as meias-finais do Mundial 2006, o seu primeiro, como a melhor campanha. De então para cá, duas eliminações nos oitavos-de-final (ontem e em 2010) e uma na fase de grupos (2014).

"Não me parece nada justo, Portugal fez o suficiente para ter outro resultado. Os jogadores tentaram tudo. Estou muito triste, mas futebol é isto", lamentou no final o selecionador português. Portugal jogou mais, sim; teve mais oportunidades, também; mas perdeu demasiado tempo em indefinições ideológicas e acabou em desespero, a cobrar do árbitro o tempo perdido por culpa própria, como os mais de 300 minutos que Fernando Santos levou neste Mundial a perceber que Bernardo Silva tinha de ter mais presença interior no jogo da seleção portuguesa - só o fez na segunda metade de ontem.

Na era Fernando Santos, esta foi apenas a segunda derrota de Portugal em competições oficiais (num total de 33 jogos), e a primeira em fases finais (onde Portugal não perdia desde a estreia no Mundial de há quatro anos, contra a Alemanha, há 18 jogos). Mas foi uma derrota dolorosa pela sensação de se ter desperdiçado, numa série de equívocos coletivos, a melhor versão de Cristiano Ronaldo num Mundial de futebol.

Por vezes, a culpa também é da vontade. Já o cantou Variações. E Portugal começou a sucumbir assim frente ao Uruguai. Pela vontade excessiva com que entrou. Sobretudo Ronaldo. O capitão partiu para cima da defesa uruguaia mal soou o apito inicial: logo aos 2", tentou entrar pela esquerda; aos 6", foi atrás buscar a bola e rematou de meia distância; e aos 7", entusiasmado, correu para fazer rapidamente um lançamento lateral. Mas quem acabou surpreendido foi Portugal: os uruguaios intercetaram o lançamento e partiram para um rápido contragolpe que apanhou a equipa portuguesa desposicionada e acabou em golo construído pela letal dupla de avançados da seleção celeste - Suárez cruzou para a cabeça de Cavani.

Aos 7", a seleção com fama de ser o melhor exemplo de como defender bem, um Uruguai que não sofreu qualquer golo na fase de grupos deste Mundial, apanhava-se na situação ideal: em vantagem, a ter de preocupar-se "apenas" em tapar os caminhos para a sua baliza.

E Portugal perante uma tarefa gigantesca. Ainda para mais mantendo a estranha contradição ideológica com que atravessou grande parte deste Mundial da Rússia. Uma equipa de médios interiores no meio-campo (Adrien ganhou o lugar a Moutinho, ontem), mas a abusar dos corredores laterais (Ricardo Pereira, na direita, foi principal novidade do onze) na procura de cruzamentos para a área (onde, no entanto, faltava uma referência, pois Ronaldo e Guedes "fugiam" demasiado para outras zonas).

As coisas melhoraram, substancialmente, quando Fernando Santos resolveu colocar Bernardo Silva junto a Cristiano Ronaldo na zona central do ataque - com o criativo do Manchester City a 10 a mostrar por fim algum do futebol que lhe vale a fama de novo "pequeno genial" do futebol português. Mas foi numa bola parada (num canto) que Pepe fez aquilo que se julgava ser o mais difícil: marcar um golo ao Uruguai.

Só que, quando o entusiasmo tinha finalmente (bom) futebol no qual se alavancar para tentar chegar à vitória, Portugal acabou traído por outro dos seus pecados neste Mundial: os erros defensivos que atravessaram a campanha portuguesa na competição. Um pontapé de baliza de Muslera mal abordado por Pepe foi o suficiente para Cavani arranjar forma de voltar a marcar, num belíssimo remate cruzado. Depois disso, já era pedir de mais ver o Uruguai sofrer um segundo golo. O Portugal-Coreia do Norte de 1966 continua a ser a única reviravolta lusa em Mundiais de futebol.

Diário de Notícias | Foto: Cristiano Ronaldo vê amarelo por reclamar uma falta na parte final © REUTERS/Toru Hanai

Mais lidas da semana