Chris Marsden | WSWS | opinião
As expectativas sobre a saída do
Reino Unido da União Europeia (UE) provocou a mais profunda crise de governo na
história do pós-guerra do imperialismo britânico. Mas o grande perigo é que a
classe trabalhadora não apenas esteja sendo impedida de intervir segundo seus
próprios interesses, como também esteja sendo dividida contra si própria e
subordinada politicamente a uma ou outra das facções pró-capitalistas de
direita.
Depois de três tentativas
fracassadas da Primeira-Ministra Theresa May de garantir a aprovação no
Parlamento do acordo com a UE sobre as relações comerciais pós-Brexit,
conversas em torno da disputa pela liderança do Partido Conservador estão agora
sendo substituídas pela possibilidade de ser convocada uma nova eleição geral
antecipada depois daquela realizada em 2017.
Se uma nova eleição for
convocada, é esperado que os Conservadores percam o poder para o Partido
Trabalhista, que tem cinco pontos percentuais de vantagem nas pesquisas de
opinião e poderia formar um governo de minoria. Parlamentares favoráveis e
contrários ao Brexit estão unidos contra essa possibilidade, temendo que ela
faça a classe trabalhadora exigir o fim da austeridade, apesar do declarado
objetivo de Jeremy Corbyn, líder dos Trabalhistas, de defender o “interesse
nacional”.
Corbyn indicou que uma moção de
desconfiança será proposta nesta semana se o acordo de May for rejeitado
novamente. Isso coloca claramente à frente da classe trabalhadora importantes
questões de perspectiva e liderança política.
Se a classe dominante conseguir
resolver seu intenso conflito interno, isso acontecerá por Corbyn se recusar a
honrar o mandato que recebeu em duas eleições para a liderança do partido:
Acabar com décadas de austeridade, militarismo e guerras coloniais, começando
pela expulsão da ala de direita blairista (uma referência ao ex-primeiro
ministro Tony Blair) do Partido Trabalhista.
Os membros da base do partido que
o elegeram, ao invés disso, foram submetidos a três anos de recuos políticos –
incluindo sobre a permanência na OTAN, a continuidade do uso de armas nucleares
e a insistência de Corbyn em impor os cortes exigidos pelos Conservadores sobre
autoridades locais Trabalhistas –, além de seu consentimento à caça às bruxas
contra a “esquerda” por acusações forjadas de antissemitismo.
Enquanto isso, o vice-líder do
Partido Trabalhista, Tom Watson, deixou claro que os blairistas farão o que for
necessário para impedir que o capital britânico seja politicamente desafiado.
Ele disse ao “think tank” Prospect que estava pronto para juntar-se aos
Conservadores pró-UE em um governo de “união nacional” dos dois partidos.
Watson lidera um grupo de 80 parlamentares Trabalhistas chamado de “Future
Britain” (Reino Unido do Futuro), que possui mais de um terço do Partido
Trabalhista no Parlamento.
Os sindicatos também não oferecem
qualquer alternativa para os trabalhadores, com o Secretário Geral do Congresso
de Sindicatos, Frances O’Grady, e a Diretora Geral da Confederação da Indústria
Britânica, Carolyn Fairbairn, publicando uma carta conjunta para May declarando
que “Nosso país está enfrentando uma emergência nacional”, e exigindo um “Plano
B”.
Existem razões genuínas e válidas
que fazem os trabalhadores apoiarem o Brexit e que não refletem o racismo e
nacionalismo incitados pela facção pró-Brexit da burguesia, como a hostilidade
contra as políticas de austeridade da UE e esperança de que deixar a UE pode
acabar com a devastação social realizada por sucessivos governos Trabalhistas e
Conservadores. O mesmo vale para muitos que são contra o Brexit, que apoiam
criticamente a UE, temem o impacto econômico do Brexit, repudiam o nacionalismo
e as exigências para acabar com a imigração e o livre movimento de
trabalhadores do qual muitos jovens dependem.
Sem uma alternativa socialista,
mesmo se uma eleição geral fosse realizada, nada seria resolvido. Ela seria
disputada quase exclusivamente ao redor da questão do apoio ou oposição ao
Brexit, dividindo a classe trabalhadora e impedindo qualquer luta unificada
contra o atual ataque sobre empregos, salários e condições sociais. Qualquer
que fosse o lado vitorioso, as divisões políticas continuariam, e seções da
classe dominante utilizariam a insatisfação popular para defender um estado
forte e um governo autoritário.
A História oferece uma
advertência.
O apoio de Watson pela formação
de um governo nacional lembra a decisão tomada em 1931 pelo então líder
Trabalhista, Ramsay MacDonald, de se unir aos Conservadores em um Governo Nacional.
O preço pago pela classe trabalhadora foram milhões de desempregados e uma
política de austeridade selvagem durante a faminta década de 1930, além do
surgimento da União Britânica de Fascistas liderada por Oswald Mosley, um eco
dos regimes fascistas da Alemanha e Itália.
O mesmo preço será hoje pago
pelos trabalhadores pela traição tanto da direita quanto da esquerda do Partido
Trabalhista.
Qualquer que seja a forma que a
luta pela competitividade global assuma, dentro ou fora da UE, ela exige uma
continuação do ataque selvagem contra as condições de vida dos trabalhadores. É
por isso que o plano para a mobilização doméstica de 50 mil soldados no Reino
Unido no caso de um Brexit “sem acordos” tem paralelo dentro da UE com a
declaração do estado de emergência pelo presidente Emmanuel Macron e o
destacamento do exército contra os “coletes amarelos” na França.
O Partido Socialista pela
Igualdade (PSI) levou adiante uma perspectiva no referendo sobre o Brexit que
articulava os interesses dos trabalhadores e da juventude não apenas no Reino
Unido, mas em toda a Europa e ao redor do mundo, e que hoje oferece a única
saída para a armadilha política “a favor ou contra o Brexit”.
Ao defender um boicote ativo no
referendo, o PSI rejeitou tanto a perspectiva reacionária de desenvolvimento
econômico nacional que estava no centro da agenda do Brexit quanto qualquer
apoio à UE. Nós explicamos que aqueles contra e a favor do Brexit representavam
forças capitalistas de direita unidas em sua hostilidade contra a classe
trabalhadora, que discordam apenas se devem ou não perseguir os interesses estratégicos
do imperialismo britânico dentro de um bloco de comércio europeu.
O PSI escreveu:
Um boicote prepara o
desenvolvimento de uma luta política independente da classe trabalhadora contra
essas forças. Tal movimento precisa se desenvolver como parte de um
contra-ataque continental da classe trabalhadora, que irá expor o referendo
como apenas um episódio da crise existencial cada vez mais profunda da
burguesia britânica e europeia.
O Brexit é o produto da erupção
de antagonismos inter-imperialistas, que encontrou a expressão mais clara na
chegada de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos e sua invocação fascista
dos “EUA Primeiro”. Essa é a manifestação mais avançada da ruptura da UE, que
se confronta com uma guerra comercial, militarismo e o aprofundamento dos
antagonismos de classe provocados por níveis sem precedentes de desigualdade
social entre uma oligarquia super-rica e a massa de trabalhadores.
Em toda a Europa, a resposta dos
governos à crise cada vez mais profunda do capitalismo mundial é mais
austeridade, a incitação do nacionalismo e da xenofobia anti-imigrante e o
cultivo da direita fascista. Mas a classe trabalhadora está começando a lutar
em uma onda crescente de greves e protestos em toda a Europa, Argélia e Sudão,
México, Estados Unidos, China e em todo o mundo. É em direção a esse movimento
emergente da classe trabalhadora internacional que a classe trabalhadora
britânica deve se voltar.
A resposta à crise do Brexit não
é a união com a UE, mas a união de classe com os milhões de trabalhadores que
estão iniciando sua luta contra os governos da Europa. Os trabalhadores
precisam formar organizações de base de luta de classes, independentes dos
Trabalhistas e da burocracia sindical, para derrubar os Conservadores e formar
um governo dos trabalhadores como parte de uma luta continental pelos Estados
Unidos Socialistas da Europa.
*Chris Marsden | World Socialist Web Site
Publicado originalmente em 1 de
Abril de 2019
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