A “Promoção da Cultura Científica
dos Angolanos” é o principal propósito do portal ciencia.ao, sob dependência do Ministério do Ensino
Superior Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI) de Angola. Qual é o “estado da
arte” do ensino superior?
Esta plataforma na Internet,
segundo o MESCTI, tem como missão estratégica “a promoção da cultura científica
e a sensibilização sobre questões de ciência, tecnologia e inovação”. O portal
a que me refiro é uma excelente iniciativa porque permite a qualquer
interessado aceder a informação de carácter científico, legislação actualizada,
dados e informações sobre Instituições de Ensino Superior e de Investigação,
artigos científicos e outros estudos, e tem a vantagem de aceitar sugestões de
qualquer cidadão.
É notório que a ciência e
tecnologia em Angola tem merecido atenção acrescida, visível através do
surgimento de legislação mais adequada, nomeadamente em relação ao estatuto dos
investigadores, realizam-se periodicamente conferências de âmbito nacional sobre
ciência e tecnologia (desde 2009 houve cinco edições e haverá uma próxima em
Novembro), são atribuídas mais bolsas de estudo para cursos de pós-graduação,
entre outras iniciativas.
Contudo, o principal problema,
para além do financiamento da investigação estar sempre muito aquém do
desejado, continua a ser a ausência de cultura científica e de investigação no
seio do corpo docente do ensino superior.
O “estado da arte” do ensino
superior em Angola
Em Angola há oito regiões
académicas, cada uma com a sua universidade pública a englobar unidades
orgânicas diversas (escolas, institutos, etc.) e nasceram várias
instituições de ensino superior (IES) privadas. Até 2015 havia por todo o
país 28 IES públicas e 45 IES privadas (MESCTI, 2015). Após esta expansão quantitativa
procura-se agora a qualidade e há por parte do MESCTI uma grande preocupação
com a formação dos docentes, e também com a harmonização e a inovação
curricular.
No âmbito da qualificação docente
há programas de formação a decorrer conducentes à melhoria da qualidade do
ensino superior público e privado, onde se incluem os chamados cursos de
agregação pedagógica para os professores do ensino superior que não possuem
competências no domínio didáctico-pedagógico. Ao nível do ensino superior
privado, quatro universidades (Universidade Católica de Angola, Universidade
Independente de Angola, Universidade Gregório Semedo e Universidade Privada de
Angola), numa perspectiva de aproveitamento de sinergias, uniram-se e iniciaram
cursos de pós-graduação em agregação pedagógica destinados aos seus docentes,
bem como o Instituto Superior Politécnico Metropolitano de Angola (IMETRO), e
outras IES privadas seguiram o mesmo caminho.
Existem igualmente iniciativas
idênticas nas IES públicas com cursos de pós-graduação destinados a docentes na
Universidade Agostinho Neto e no Instituto Superior de Ciências da Educação de
Luanda (ISCED de Luanda), IES pertencentes à Iª Região Académica, mas outros
cursos ocorrem em mais regiões académicas do país.
É pacífico aceitarmos que o bom
desempenho do professor nas IES depende desde logo das políticas de educação
superior. Em 2012 integrei a equipa técnica que trabalhou o Plano Nacional de
Formação de Quadros (PNFQ), pelo que, neste aspecto, estou em crer, as
políticas públicas estão a ser delineadas em consonância com o mundo do
trabalho e os interesses da sociedade porque todos aceitamos que o avanço do
conhecimento deve ter como fim último a melhoria da qualidade de vida da
população.
Mas a qualidade da docência
depende igualmente do processo de acreditação e avaliação externa, uma dimensão
imprescindível para que as instituições, enquanto comunidades formadoras,
responsáveis, apresentem programas com um nível de qualidade internacionalmente
aceitável.
Neste sentido, para que se
promova ainda mais a cultura científica dos docentes, no âmbito do processo de
acreditação e avaliação das IES no domínio específico da inovação curricular
seria útil haver recomendações precisas no sentido de realizarem-se programas
de iniciação científica em todas as IES logo nos primeiros anos dos cursos,
potenciando a inovação e cultura científica dos estudantes, “obrigando-se” as
IES a multiplicarem a contratação de docentes pesquisadores.
Recomendações igualmente
importantes devem apontar no sentido das IES promoverem a auto-avaliação
baseadas nos seus Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI) para que no
âmbito dos objectivos estratégicos traçados sejam estabelecidos indicadores e
metas que integrem a pesquisa e programas de pós-graduação de forma prioritária
para potenciar-se de forma efectiva a cultura científica dos angolanos.
Qualquer análise diacrónica,
temos que reconhecer, permite constatar que há em Angola mais cursos de
pós-graduação ao nível de mestrado e outros que não conferem grau académico.
Contudo, as ofertas ao nível de programas de doutoramento são quase
inexistentes e podem crescer porque já existem IES com um número de edições de
cursos de mestrado suficientes para justificar cursos que conferem o grau de
doutor.
Efectivamente, veja-se o caso do
ISCED de Luanda, em 2011, o Prof. Pedro Domingos Peterson e eu assumimos o
compromisso de garantir o funcionamento da 1ª Edição do curso de mestrado em
Ciências da Educação em parceria com o Instituto de Educação da Universidade de
Lisboa. A 3ª edição está a terminar, portanto, como já é possível congregar
docentes residentes com o grau de doutor, seria uma boa altura para iniciar-se
um programa de doutoramento, à luz do que existe na Faculdade de Direito da
Universidade Agostinho Neto e de outras faculdades, processo análogo ao que se
passa em outras partes do mundo.
Situações similares podem ser
identificadas em outras IES, pelo que, tendo-se presente que nenhum país pode
ter pretensões de ser desenvolvido e independente sem um forte sistema de
ensino superior, salvo melhor opinião, o que tenho verificado é que muitas IES
apresentam fragilidades por ausência de sentido estratégico e uma certa
incapacidade em perspectivar o futuro.
Nesta linha de raciocínio, a
existência de mais programas de doutoramento no país afigura-se uma prioridade
estratégica e justifica-se para que Angola possa participar em pesquisas em
rede de cooperação com o Brasil (uma exigência do CAPES é que as IES parceiras
tenham em funcionamento cursos de doutoramento), com Portugal, com os restantes
Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e com Timor-Leste, e
desta forma multiplicarem-se os percursos de promoção da cultura científica dos
angolanos.
*PhD em Educação / Universidade
de Lisboa
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