Domingos Simões Pereira:
Candidatura às presidenciais seria "obrigação" após "criar
expetativa nos guineenses"
Em entrevista exclusiva à DW,
Domingos Simões Pereira diz sim a uma candidatura às eleições de 24 de novembro
- se essa for a vontade do PAIGC - e acusa o Presidente José Mário Vaz de
"atentado às regras democráticas".
Domingos Simões Pereira está
totalmente disponível para entrar na corrida às eleições presidenciais de 24 de
novembro na Guiné-Bissau, se o Partido Africano para a Independência da
Guiné-Bissau e Cabo Verde (PAIGC) entender que é a pessoa certa para derrotar
José Mário Vaz, o seu principal adversário.
Em entrevista exclusiva à DW
África, em Lisboa, afirma que tem essa "obrigação", depois de criar
expectativa entre os guineenses: "Eu fiz os guineenses acreditar, eu faço
parte desse acreditar dos guineenses. Eu não posso virar cara à luta".
Simões Pereira acredita que a
soma de todas as sensibilidades existentes no seio do partido saberá
interpretar a sua disponibilidade e garante que a decisão sobre quem será o
candidato do PAIGC será conhecida dentro de dez dias.
"Dentro do PAIGC, se há algo
que hoje funciona são as regras. O estatuto é o que fala mais alto. E,
portanto, de acordo com o estatuto, nós vamos ter uma reunião do presidium para
estabelecer a agenda da nossa comissão permanente", afirma.
Nessa altura, será apresentada
uma proposta ao Bureau Político do PAIGC e caberá ao Comité Central deliberar
sobre o candidato. Nesta condição, Simões Pereira diz que ainda é cedo para
falar de propostas concretas, mas adianta já que não será necessário mudar a Constituição
para alterar o regime semipresidencialista.
"Eu acho que as pessoas é
que não têm sabido interpretar e fazer jus àquilo que é o ordenamento jurídico
que foi escolhido. Eu acredito que o sistema semipresidencial é mais
democrático do que os outros sistemas", explica.
A figura presidencial, sublinha,
é fundamental, nomeadamente nas Forças Armadas, onde "o trabalho do
Presidente da República é muito importante" para avançar com a
reforma.
E os desafios não ficam por aqui:
"Temos um ambiente a cuidar. Somos um país ribeirinho. Somos um país que,
com a alteração climática, temos um aumento do nível das águas do mar que pode
por em causa várias zonas do nosso território. Nós temos camadas sociais
vulneráveis. Temos uma taxa de mortalidade infantil e materna das mais elevadas
do mundo".
"A alteração desse
quadro", frisa Simões Pereira, "passa por um Presidente da República
que tem sensibilidade suficiente para trabalhar com o Governo no sentido de
destacar parte do seu orçamento para o atendimento dessas necessidades".
Para o líder do PAIGC, o
Presidente da República dever ser uma figura que promova o "diálogo
permanente" com todos em busca de consensos que favoreçam a
construção da nação guineense. Neste âmbito, propõe exercer uma
presidência aberta sem se constituir num factor de bloqueio. Garante à
comunidade internacional que será um factor da estabilidade, com o envolvimento
de todos os guineenses.
"Essa garantia à comunidade
internacional tem que resultar do compromisso que nós vamos estabelecer a nível
interno. É impossível dar garantias à comunidade internacional quando nós não
somos capazes de consolidar uma postura nacional a favor dos grandes
objectivos", considera.
Domingos Simões Pereira quer uma
Guiné-Bissau comprometida, onde a lei seja respeitada e onde a Constituição
deve ser realmente a matriz. "Todos temos um único objetivo, que é a
vitória da Guiné-Bissau", sublinha.
DSP e Jomav: Uma relação
complicada
O líder do PAIGC admite que o seu
principal adversário poderá ser José Mário Vaz, cujo mandato de cinco anos como
chefe de Estado terminou oficialmente a 23 de junho passado, considerando que
"isso depende dele e do partido".
"O meu partido irá decidir quem
apresentar como seu candidato. No caso dele é bastante mais fácil. Terá que ser
simplesmente ele a decidir", afirma.
Domingos Simões Pereira garante
que, "em termos pessoais", não se sentiu atingido pelo facto de não
ter sido indigitado para o cargo de primeiro-ministro pelo Presidente, ainda em
funções até à realização das eleições, mas, "enquanto cidadão" o
caso muda de figura, "porque é claramente um atentado às regras
democráticas".
"Um Presidente da República
que não aceita aquilo que é o resultado de umas eleições legislativas não tem
condições de contribuir para a consolidação democrática", sublinha.
"Com a minha não confirmação
como chefe de Governo, senti que houve aí um desperdício de
oportunidades", lamenta, sublinhando, no entanto, que olha "sempre
para as partes positivas dos factos".
Olho para o quadro global e tenho
que concluir que, mesmo sem a minha indigitação, o país dispõe de um plano
estratégico operacional, o país dispõe de um Governo, de uma Assembleia
Nacional Popular democrática e funcional. Temos outros desafios mas temos
também algumas conquistas", considera.
O problema da relação entre
Domingos Simões Pereira e José Mário Vaz "só existe num sentido",
esclarece. "No sentido do José Mário Vaz em relação ao Domingos Simões
Pereira e não o contrário", precisa. "Considero que o exercício de
funções públicas obriga a uma preparação de cada um dos titulares a compreender
que está a desempenhar ou a cumprir uma missão. E não propriamente a escolher
aquilo que é mais conveniente para ele. Porque nenhum de nós foi escolhido para
gostar do outro".
Simões Pereira considera que
Jomav provou que é um cidadão que não partilha as preocupações da grande
maioria dos guineenses, "insistiu e provocou a crise", remata,
referindo-se ao período entre 2015 e 2019, em que o país viveu uma espécie de
"calvário inventado e sustentado por um homem que, obviamente, tinha o
apoio de mais gente atrás dele".
Respeito por todos os candidatos
O líder do PAIGC não está
igualmente preocupado com a candidatura independente de Carlos Gomes Júnior, que
mantém a sua condição de militante. Diz respeitar todos os cidadãos nacionais
que, no gozo das suas liberdades, se mostrem disponíveis a servir o país.
"Se é essa a condição com
que o Carlos Gomes se apresenta como candidato tem que ter o nosso respeito,
tem que ter a nossa consideração e esperamos que também no uso das suas
liberdades o povo guineense saiba decidir se ele tem condições para o efeito ou
não", sublinha.
Domingos Simões Pereira, que
regressou esta terça-feira (13.08) à Guiné-Bissau, estabeleceu contatos
intensos com várias entidades e setores da diáspora guineense em Portugal, com
os quais refletiu sobre a situação política, social e económica guineense.
Se for eleito Presidente da
República, Simões Pereira garante que deixará a liderança do partido.
João Carlos (Lisboa) | Deutsche
Welle
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