Hong Kong, China, 16 ago 2019
(Lusa) -- A porta-voz do movimento que tem liderado protestos maciços em Hong
Kong disse hoje à agência Lusa recear que Pequim possa justificar a entrada do
Exército chinês no território com a "ajuda de mafiosos e a inação da
polícia".
A vice-coordenadora da Frente
Cívica de Direitos Humanos (FCDH), Bonnie Leung, lembrou que "existem leis
que determinam quando o Exército Popular de Libertação chinês deve ser
mobilizado", sob o princípio "um país, dois sistemas", mas que
tal só pode acontecer a pedido do Governo de Hong Kong, se este alegar que não
consegue controlar a situação.
A ativista defendeu, por um lado,
que "os manifestantes não deram desculpas para o Governo de Hong Kong ou
de Pequim usarem esta medida".
"Contudo, receio que posam
criar essas desculpas", alertou, recordando os ataques a manifestantes
ocorridos a 21 de julho, supostamente cometidos por elementos das tríades, após
os quais a polícia foi acusada de inação.
"Tememos que, com a ajuda de
mafiosos e a inação da polícia, possam arranjar desculpas para mobilizar o
Exército", frisou.
Contudo, a coordenadora da FCDH
admitiu que é necessário voltar a focar a luta nas exigências iniciais e em
promover protestos pacíficos maciços como aquele que a 16 de junho juntou cerca
de dois milhões de pessoas, um número que representa quase um terço da
população de Hong Kong.
Por isso, este domingo a FCDH
"decidiu organizar mais uma manifestação maciça para colocar o foco de
novo nas nossas cinco reivindicações e com um largo número de participantes nas
ruas", declarou.
"Queremos mesmo deixar de
ter o foco (...) nos confrontos, na violência" e "acreditamos que com
as imagens de centenas de milhar de pessoas ou mesmo de milhões nas ruas pode
criar-se uma outra onda de pressão sobre o Governo e mostrar de novo ao mundo
que os manifestantes de Hong Kong podem ser pacíficos", acrescentou.
"Este é um movimento sem
liderança", destacou, ressalvando que "alguns manifestantes podem ter
outras abordagens mais radicais".
Algo que o movimento não
recomenda, até porque, explicou, teme pela segurança dos jovens e das
consequências legais.
Contudo, sustentou, os comportamentos
mais radicais de alguns manifestantes explicam-se pelo facto de o Governo ter
ignorado todos os protestos pacíficos.
Por isso, defendeu, "o
diálogo deve começar", com o movimento, com os deputados pró-democracia e
grupos de advogados, exemplificou, frisando que existe essa vontade para se
sentarem à mesma mesa com a chefe do Governo de Hong Kong.
O objetivo da manifestação e da
marcha de domingo passa por exigir que o Governo responda a cinco
reivindicações: retirada definitiva da lei da extradição, a libertação dos
manifestantes detidos, que as ações dos protestos não sejam identificadas como
motins, um inquérito independente à violência policial e a demissão da chefe do
Executivo, Carrie Lam.
Há mais de dois meses que Hong
Kong é palco de protestos maciços, marcados por violentos confrontos entre
manifestantes e a polícia, que tem usado balas de borracha, gás pimenta e gás
lacrimogéneo.
A 01 de julho, alguns
manifestantes invadiram mesmo o parlamento de Hong Kong.
Mais recentemente, o aeroporto de
Hong Kong foi palco de manifestações, com as autoridades a serem obrigadas a
cancelar centenas de voos na segunda e na terça-feira naquela que é uma das
infraestruturas aeroportuária mais movimentada do mundo.
Os defensores da lei argumentam
que, caso se mantenha a impossibilidade de extraditar suspeitos de crimes para
países como a China, tal poderá transformar Hong Kong num "refúgio para
criminosos internacionais".
Já os manifestantes dizem temer
que Hong Kong fique à mercê do sistema judicial chinês como qualquer outra
cidade da China continental e de uma justiça politizada que não garanta a
salvaguarda dos direitos humanos.
A transferência de Hong Kong e
Macau para a República Popular da China, em 1997 e 1999, respetivamente,
decorreu sob o princípio "um país, dois sistemas", precisamente o que
os opositores às alterações da lei garantem estar agora em causa.
Para as duas regiões
administrativas especiais da China foi acordado um período de 50 anos com
elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário, sendo o
Governo central chinês responsável pelas relações externas e defesa.
JMC // ANP
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