sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Eleições em Moçambique: Clima de medo em Quelimane


A polícia da Zambézia não tem pistas para capturar os malfeitores que tentaram assassinar a mãe do candidato da RENAMO Manuel de Araújo. Analistas preveem abstenções no dia de voto por causa do clima de violência.

São muitos os atos de violência que os partidos políticos têm denunciado nos últimos dias nesta campanha eleitoral, que termina no próximo dia 12 de outubro, três dias antes do início da votação nas eleições gerais moçambicanas.

A primeira vítima desses atos de violência solicitou o anonimato e é membro do Movimento Democrático de Moçambique (MDM). "Amarraram-me, espalharam pelo corpo combustível e atearam o fogo. O vizinho que estava a apagar o fogo é que veio desamarrar-me e só depois começamos a pedir socorro", conta.

Também o porta-voz deste partido, Vitorino Francisco, há dias convocou a imprensa para pedir proteção, porque teme pela sua vida. "No distrito de Mocuba, quando os nossos membros realizavam a campanha porta a porta vieram os régulos e ameaçaram-nos de morte e deram-lhes um ultimato: se continuassem a angariar mais membros, seriam proibidos de manter as suas residências nos locais onde vivem", afirmou.

 O segundo caso ocorreu na segunda-feira (16.09.) quando homens armados incendiaram a casa da mãe do cabeça-de-lista da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) na província da Zambézia, Manuel de Araújo, no bairro Coalane, nos arredores da cidade de Quelimane.

Para Manuel de Araújo, todos esses crimes têm a mão da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), o partido no poder. "Nós temos informações de que dez homens pertencentes ao que se convencionou chamar de esquadrões da morte foram enviados para a Zambézia, e dez para Nampula para seguir as movimentações dos cabeças-de-lista da RENAMO. Esses dez homens estão sob o comando do ministro do Interior, Basílio Monteiro", disse.

Para o porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM), Sidner Lonzo, mais cedo ou mais tarde os autores desse e de outros atos de violência na província serão capturados. Entretanto, apesar dos esforços desenvolvidos, a polícia não apresentou qualquer resultado.

"Não há pistas até então. Patrulhas em todos os bairros da cidade de Quelimane são realizadas regularmente e há reforços por conta deste ambiente de campanha com contornos de violência que as pessoas estão a viver. A polícia já intensificou o patrulhamento e o monitoramento em todos os bairros", disse.

FRELIMO não se manifesta

Entretanto, a FRELIMO prefere por enquanto não fazer quaisquer comentários sobre as perseguições e ameaças de morte denuncidas pelas formações políticas da oposição, que exigem investigações mais céleres sobre os casos que ocorreram e que são do conhecimento das autoridades.

Segundo o porta-voz da FRELIMO, Sabado Chombe, o seu partido irá pronunciar-se só depois da conclusão das investigações em curso. "A FRELIMO aguarda as investigações em curso pelos órgãos competentes sobre estas ocorrências. A FRELIMO reafirma a sua luta incansável pela convivência harmoniosa e pelos princípios da paz social pelo candidato Filipe Nyusi, o candidato do povo moçambicano nas eleições de 15 de outubro", diz.

Como era de esperar, residentes na Zambézia dizem que estão com muito medo. Caso a violência prevaleça, preferem não ir votar no dia 15 de outubro para não se tornarem vítimas da violência.

"Estou com medo de represálias. A minha casa pode ser incendiada ou eu ser perseguido. Estou com muito medo do que poderá contecer", sublinhou Eufrasio Faz Bem, munícipe da cidade de Quelimane. 

"Na verdade, não há seriedade nesta campanha e as promessas não estão a ser cumpridas. Falou-se no início que a campanha seria ordeira e uma festa, mas não é isso que está a acontecer. Não sei quais são os motivos que levam um munícipe a partir para a agressão quando somos todos irmãos", lamentou Samuel Francisco Alfredo. 

Clima tenso

Os analistas políticos Lourindo Verde e Ricardo Raboco dizem estar surpresos com o índice de violência eleitoral na província da Zambézia e já preveem que o clima será muito tenso no dia da votação.

"O processo de recenseamento não foi transparente e estamos a assistir agressões e violência dos membros de um e de outro partido na campanha eleitoral. Isso significa que também poderemos ter situações muito semelhantes no dia das eleições", diz Lourindo Verde.

"Alguns eleitores poderão ter receio em ir votar, algo que terá grandes consequências no pleito eleitoral deste ano. O nível de abstenção poderá ser elevado precisamente porque os eleitores temem ir à cabine de voto e na altura sofrer atos de agressão ou violência", acrescenta o analista.

Ricardo Raboco tem a mesma opinião. "No âmbito da campanha eleitoral, os níveis de violência estão a ser preocupantes. Portanto, é de esperar que no próprio dia da votação e nos dias seguintes, enquanto se aguarda o anúncio de resultados, o pico possa atingir níveis preocupantes. Isso é preocupante", diz.

Apesar dos incidentes, a campanha eleitoral está a decorrer com o MDM a privilegiar os contatos porta a porta na cidade de Quelimane, enquanto os cabeças-de-lista da RENAMO e da FRELIMO preferem realizar comícios populares nos distritos da província da Zambézia.

Marcelino Mueia (Quelimane) | Deutsche Welle

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