O aumento do interesse dos jovens
guineenses pela política levanta a questão se realmente estão preparados para
serem diferentes dos políticos. Insultos, calúnias e difamações marcam debate
juvenil pela negativa.
As redes sociais têm sido um
autêntico campo de batalha entre os jovens apoiantes das candidaturas às
presidenciais. O nível do debate é muito questionado, na maioria dos casos por
misturar insultos e ataques pessoais.
A campanha eleitoral para a
segunda volta das presidenciais começa na próxima sexta-feira (13.12), mas o
debate dos jovens sobre o futuro da Guiné-Bissau aqueceu há muito nas
redes sociais, com direito a vídeos ao vivo no Facebook e até insultos de parte
a parte.
Na opinião do ativista Saturnino
de Oliveira, de 33 anos, a participação
dos jovens na política aumentou de forma quantitativa e qualitativa.
Sobretudo desde as eleições legislativas de março passado, nota-se cada vez
mais jovens a interessar-se por política, a militar nos partidos e a falar
sobre isso nas redes sociais. Mas há também um reverso da moeda: alguns usam as
redes sociais como forma de veicular notícias falsas ou insultar outras
pessoas.
Para Saturnino de Oliveira, isso
demonstra o nível de desespero a que se chegou no país. "Apesar de
realmente ser notável uma parte da juventude que faz a política voltada aos
insultos, a difamação, a calúnia e a intriga, mas a maior parte está a fazer a
política com uma abordagem mais assertiva. Infelizmente essa pequena parte tem
feito a política no sentido de criar divisões dentro da camada juvenil e isso tem
manchado a imagem da participação política da juventude guineense",
lamenta.
Falta educação
Saturnino aponta a insuficiência
na educação da camada juvenil guineense como fator que condiciona os jovens a
recorrer ao debate de baixo nível para defender um partido ou candidato. E
afirma que fazem um interpretação errada da liberdade de opinião. Saturnino
nota ainda que tem faltado uma boa liderança política capaz de deixar um bom
legado aos jovens, alegando que muitos criticam só para conseguir emprego no aparelho
do Estado.
"Na ausência de uma
liderança de referência, não tem um espelho e isso tem contribuído para a má
perceção dos jovens em relação à política. Agora, os jovens querem ingressar
nas fileiras [dos partidos] sem convicção, só vão porque o maior empregador no
país é o Estado. Só querem aproveitar-se desta oportunidade para poder entrar
na Função Pública e ter também uma oportunidade de aproveitar-se do Estado.
Essa é a lógica que domina, neste momento, o pensar da maior parte dos jovens
que estão a fazer a política, esplica.
Em entrevista à DW África, o
ativista diz ainda que não acredita que, com a eleição do novo Presidente, as
coisas possam mudar. Opinião contrária tem a jovem Dara Fonseca Ramos, apoiante
do candidato Umaro Sissoco Embaló, que vai disputar com Domingos Simões Pereira
a segunda volta.
A política mudou na Guiné-Bissau
"Por incrível que pareça,
acredito que é desta que o país vai sair da instabilidade. Não porque Umaro
Sissoco será eleito Presidente da República, mas acredito porque o papel que a
juventude está a ter neste momento é absolutamente extraordinário",
diz a jovem residente em Portugal e formada em gestão de empresas.
"Portanto", acrescenta.
"já não vamos ter falhas de memórias, de gente que finge esquecer o que
aconteceu antes de ontem. A juventude está a ter um papel atento, crítico, um
papel expressivo. Acredito que é desta que todos nós vamos ter vergonha na cara
para cumprir a promessa."
Dara Ramos faz quase todos os
dias diretos no Facebook sobre política e quase sempre é alvo de
vários insultos: "Foi uma senhora que fez um vídeo, a partir da sua sala,
em que me insultou durante 17 minutos. Nunca a vi e nem a conheço. E o
argumento que ela utilizou para me insultar a mim e à minha família foi porque
eu insulto Domingos Simões Pereira. O que não faço e nunca faria." Segundo
a jovem, o debate de ideias sempre faltou na política guineense.
Recorrem aos insultos por faltar
argumentos
Por seu lado, o jurista Lesmes
Monteiro apoia a candidatura de Domingos Simões Pereira e diz que a falta de
argumentos de alguns jovens é o que leva aos insultos.
"Há jovens que estão neste
processo engajados com uma convicção, que tiveram a oportunidade de estudar, de
se formar. E em contrapartida há outros jovens que veem nisso um processo de
aproveitamento, de ganhar uma certa notoriedade na sociedade. E quando a pessoa
não tem base sólida e argumentos para se sustentar recorre a outros mecanismos
para contrariar aqueles que têm argumentos. Então, surgiu o fenómeno dos
insultos", observa o jovem formado pela Faculdade de Direito de
Bissau.
Na opinião do jovem mentor de
vários protestos contra o Presidente cessante José
Mário Vaz, esses insultos passam a ideia de que a juventude não está
preparada a 100% para substituir os políticos mais velhos. Alega que os jovens
não estão a ser exemplos de moral para a geração.
Lesmes Monsterio pede legislação
para crimes cibernéticos. "Depois das eleições, há toda uma necessidade de
legislar sobre esses fenómenos, principalmente de crimes ligados aos média, à
Internet, à comunicação, e instituir sobretudo crime de ódio ligado a ataques a
etnias e religião. Neste momento, a sociedade guineense está muito divida. Há
toda uma necessidade de fazer os jovens ganharem a consciência de fazer
diferente dos mais velhos", argumenta.
Insultos afastam pessoas do
debate
Lesmes confessa que tem bloqueado
muita gente da sua conta pessoal no Facebook, porque a casa vez que faz um
direto para apelar à consciência dos jovens recebe em troca insultos
gratuitos. O ativista lembra que já foi espancado na sua residência divido
aquilo que chamada de luta pela afirmação da democracia e consequentemente
desenvolvimento da Guiné-Bissau.
Devido aos ataques pessoais,
insultos, calúnias e intrigas, muitos dos analistas e observadores que
escreviam artigos sobre a política guineense deixaram de o fazer.
Domingos
Simões Pereira e Umaro Sissoco disputam a segunda volta das
presidenciais a 29 de dezembro.
Braima Darame | Deutsche Welle
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