Pedro Tadeu | TSF | opinião
O primeiro foi Rui Rio a acusar
Mário Centeno de ter feito um suposto erro de 590 milhões de euros na forma de
apresentação do Orçamento do Estado.
Segundo o atual líder do PSD, na
proposta de Orçamento do Estado entregue há semanas no Parlamento estavam dois
quadros com valores diferentes para o saldo das administrações públicas, que
totalizavam valores tão díspares que poderiam fazer com que se passasse do
propagandeado excedente orçamental para um banal pequeno défice, coisa hoje em
dia irrelevante no jogo da política portuguesa.
Na altura Mário Centeno
respondeu, numa entrevista ao Expresso, que (e cito) "Rui Rio não sabe
nada de economia - e muito menos de Finanças Públicas - ou nunca viu fazer um
Orçamento do Estado" e acusou-o ainda de (volto a citar) "fraude
democrática" por, alegadamente, não conseguir "entender as regras da
contabilidade pública e da contabilidade nacional".
Agora é a Unidade Técnica da
Apoio Orçamental da Assembleia da República que afirma, como a TSF noticia esta
manhã, ter detetado dois erros com alguma gravidade neste Orçamento que, hoje,
o próprio ministro das Finanças começa a defender numa comissão parlamentar.
Segundo a UTAO, por um lado, não
se contaram as receitas em impostos e contribuições que o Estado arrecada por
aumentar 0,3% os salários dos funcionários públicos e, por outro lado, não se
contam devidamente as despesas com pessoal.
Não sei se Mário Centeno acha que
a UTAO, com esta crítica, também participa na mesma hipotética "fraude
democrática" com que apelidou a intervenção de Rui Rio, mas sei que, para
quem está sempre a falar das "contas certas" do Estado como foco
principal da sua política, estes pequenos incidentes causam alguma mossa -
mesmo que, no final de tudo, para a vida real das pessoas, das instituições
públicas e da economia, estas diferenças nada signifiquem.
A política de "contas
certas" é a bandeira de Mário Centeno, é a base do seu poder. E essa ideia
política, esse instrumento de propaganda, está hoje mais fragilizada.
A política de "contas
certas" deu a Mário Centeno a porta de acesso à presidência do Eurogrupo,
atribuiu-lhe a autoridade com que calou as reivindicações financeiras de outros
ministros, justificou a mansidão com que o país aceitou as constantes
cativações de imensas despesas aprovadas no Parlamento, e construíram o
prestígio do ministro das Finanças que, tantas vezes no mandato anterior,
pareceu mandar mais no governo do que o próprio primeiro-ministro António
Costa.
Ao entrar (com estas notícias e
na semana decisiva para a aprovação do Orçamento) numa discussão basicamente
técnica sobre a forma como o documento foi construído, estaremos a descobrir,
afinal, que há um Mário Centeno desleixado?
Não. O que estamos a confirmar é
que o documento do Orçamento do Estado - cuja discussão é apresentada como o
momento político mais relevante do ano - é utilizado pelo governo num jogo de
ilusões políticas que ridiculariza o sistema político português.
Já o tínhamos percebido antes,
durante vários anos, com a enorme dimensão das chamadas cativações que
falsificam, ao longo do ano e na vida real, as intenções dos deputados que
votam a favor do Orçamento, pois uma parte importante das despesas aprovadas acaba
por não ser paga.
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