Há dois países na avaliação do
sistema de saúde. Mas é surpreendente que a clivagem não seja entre litoral
(onde há mais respostas) e interior (onde a presença do SNS é mais exígua), nem
sequer entre cidades médias e pequenas urbes, mas entre o “reino de Portugal e
dos Algarves”
Pedro Adão e Silva | Expresso |
opinião
A sondagem do ICS/ISCTE confirma
a perceção de que a saúde é uma prioridade para os portugueses. Sem margem para
dúvidas: 34% dos inquiridos considera a saúde o tema mais importante para o
país, a uma distância significativa de outros assuntos. É um daqueles casos em
que a centralidade de uma questão no debate público corresponde à importância
que os portugueses lhe atribuem.
Ao mesmo tempo, a onda de
notícias negativas sobre o funcionamento do sistema de saúde não encontra eco
na forma como este é avaliado. Apesar de tudo, a avaliação mantém-se positiva –
numa escala de zero a dez, os portugueses atribuem seis pontos à qualidade
global dos serviços públicos de saúde e pouca diferença faz se os utilizaram
recentemente ou não. A avaliação dos profissionais, quer médicos, quer
enfermeiros, é ainda melhor. Se a qualidade global é valorada positivamente, o
tempo de espera para a marcação de consultas, exames ou tratamentos continua a
ser um problema primordial e, desta feita, para aqueles que recorreram a um serviço
público no último ano, a nota atribuída é mesmo mínima (5,2).
Se não admira que o país não seja
todo igual quando se trata de avaliar as respostas da saúde, é surpreendente
que a clivagem não seja entre litoral (onde há mais respostas) e interior (onde
a presença do SNS é mais exígua), nem sequer entre cidades médias e pequenas
urbes. Há, na verdade, do ponto de vista da avaliação do sistema de saúde, dois
“países”, podendo-se aqui recuperar a velha distinção política entre o “reino
de Portugal e dos Algarves”. Com efeito esta região destaca-se negativamente em
todos os itens. Os residentes no Algarve avaliam muito pior o tempo de espera,
o tratamento clínico prestado e, naturalmente, também atribuem nota negativa
(3,5) à qualidade global das respostas.
De resto, quando o tema é
urgências, os inquiridos não hesitam: 71% dizem que preferem recorrer aos
hospitais públicos. E se a qualidade do serviço prestado conta para a opção, o
que faz mesmo diferença é o custo.
E como é que se resolvem os
problemas do sistema? A resposta é clara. Confrontados com a melhor forma de
solucionar, por exemplo, as listas de espera, não há hesitações entre os
inquiridos – são poucos os que defendem o aprofundamento da contratualização com
o setor privado e social e uma imensa maioria (76%) declara que o Estado devia
aumentar o investimento no SNS.
Será possível investir mais? E em
que medida esta opção será eficaz e eficiente? Tendo em conta o reforço da
dotação orçamental para este setor no OE2020, daqui a um ano poderemos ter
respostas diferentes das atuais. Resta saber se mais negativas ou, pelo
contrário, mais positivas do que as que encontrámos hoje.
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