sábado, 22 de fevereiro de 2020

A saúde de Portugal e dos Algarves


Há dois países na avaliação do sistema de saúde. Mas é surpreendente que a clivagem não seja entre litoral (onde há mais respostas) e interior (onde a presença do SNS é mais exígua), nem sequer entre cidades médias e pequenas urbes, mas entre o “reino de Portugal e dos Algarves”

Pedro Adão e Silva | Expresso | opinião

A sondagem do ICS/ISCTE confirma a perceção de que a saúde é uma prioridade para os portugueses. Sem margem para dúvidas: 34% dos inquiridos considera a saúde o tema mais importante para o país, a uma distância significativa de outros assuntos. É um daqueles casos em que a centralidade de uma questão no debate público corresponde à importância que os portugueses lhe atribuem.

Ao mesmo tempo, a onda de notícias negativas sobre o funcionamento do sistema de saúde não encontra eco na forma como este é avaliado. Apesar de tudo, a avaliação mantém-se positiva – numa escala de zero a dez, os portugueses atribuem seis pontos à qualidade global dos serviços públicos de saúde e pouca diferença faz se os utilizaram recentemente ou não. A avaliação dos profissionais, quer médicos, quer enfermeiros, é ainda melhor. Se a qualidade global é valorada positivamente, o tempo de espera para a marcação de consultas, exames ou tratamentos continua a ser um problema primordial e, desta feita, para aqueles que recorreram a um serviço público no último ano, a nota atribuída é mesmo mínima (5,2).


Se não admira que o país não seja todo igual quando se trata de avaliar as respostas da saúde, é surpreendente que a clivagem não seja entre litoral (onde há mais respostas) e interior (onde a presença do SNS é mais exígua), nem sequer entre cidades médias e pequenas urbes. Há, na verdade, do ponto de vista da avaliação do sistema de saúde, dois “países”, podendo-se aqui recuperar a velha distinção política entre o “reino de Portugal e dos Algarves”. Com efeito esta região destaca-se negativamente em todos os itens. Os residentes no Algarve avaliam muito pior o tempo de espera, o tratamento clínico prestado e, naturalmente, também atribuem nota negativa (3,5) à qualidade global das respostas.

De resto, quando o tema é urgências, os inquiridos não hesitam: 71% dizem que preferem recorrer aos hospitais públicos. E se a qualidade do serviço prestado conta para a opção, o que faz mesmo diferença é o custo.

E como é que se resolvem os problemas do sistema? A resposta é clara. Confrontados com a melhor forma de solucionar, por exemplo, as listas de espera, não há hesitações entre os inquiridos – são poucos os que defendem o aprofundamento da contratualização com o setor privado e social e uma imensa maioria (76%) declara que o Estado devia aumentar o investimento no SNS.

Será possível investir mais? E em que medida esta opção será eficaz e eficiente? Tendo em conta o reforço da dotação orçamental para este setor no OE2020, daqui a um ano poderemos ter respostas diferentes das atuais. Resta saber se mais negativas ou, pelo contrário, mais positivas do que as que encontrámos hoje.

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