terça-feira, 31 de março de 2020

APESAR DE TUDO SE ESTAR A DESMORONAR… VENCEREMOS!


Traiçoeiramente, sem convite, o vírus ocupou globalmente os países, adoecendo e assassinando seus habitantes, obrigando-os a fecharem-se em casa para se salvarem, para que ele não os afete na saúde, nem lhes leve familiares queridos, nem amigos. No Planeta Terra tudo mudou e as cidades são semelhantes a desertos em que raramente passam os humanos.

Os efeitos tantas vezes mortais do vírus contamina também a economia. Os mais fracos são aqueles que mais estão expostos a serem dizimados. Há empresários que já nem sabem o que fazer, principalmente os pequenos empresários. Os grandes empresários, os que se podem incluir nas faldas aproximadas dos 1% que detêm as riquezas do mundo já vêem na pandemia do covid-19 novas oportunidades de aumentarem as suas fortunas e de radicalizarem ainda mais as suas predisposições para a especulação, para a obtenção de chorudas maquias que os governos lhes oferecerão de bandeja conforme já está planeado. Os trabalhadores, esses, são carne para canhão, como sempre.

Da angustia de empresários a “fala” é hoje da jornalista do Expresso Elisabete Miranda. Tema delicado porque sabemos que há empresários e empresários. Há os que com esta pandemia vão enriquecer ainda mais desassombradamente, mais descaradamente, mais desumanamente, mais imoralmente, e existem também no grosso da mole imensa dos dessa atividade, os patrões, aqueles que estão a ver e a sentir os seus esforços a serem derrubados por um vírus como se de um castelo de cartas tivesse sido o seu empreendimento, não sabendo como poderão pagar os ordenados aos seus poucos empregados. Sim, porque afinal o negócio está suspenso e nem dá para as despesas certas do quotidiano.

Evidentemente que compete aos governos olharem para esses e para os seus trabalhadores. Inteirar-se sobre os que são compulsivos oportunistas e vigaristas e os que não são. Mas como? Pois, a “coisa” assim será muito complicada. Aliás, como quase tudo nesta sociedade que sobrevive muito mal neste dia de cada vez. Apesar de saber que amanhá o dia será quase igual em quase tudo, exceto no número de vítimas mortais do vírus e dos números de cidadãos que são contaminados por ele. Ele, o covid-19.

Este é o Curto do Expresso que importa ler porque os “patrões”, muitos deles, estão a ficar à mingua. Assim sendo ainda mais à míngua ficarão aqueles e aquelas que vendem a sua força de trabalho nos vários ramos de atividades que sustentam a economia dos países…

Vêm aí dias ainda mais difíceis para quase todos e muito mais para os mais fragilizados na saúde e na economia.

É disso que trata este Expresso Curto. Vá ler, a seguir. Inteire-se e não desanime. Resista. Lute. Procurem o coletivo, unam-se e lutem. Lutemos.

Bom dia, mesmo que tudo se esteja a desmoronar o arco-íris há-de acontecer e exibir-se  radiante, para nos maravilhar. Venceremos!

MM | PG



A angústia do empresário no momento de pagar salários

Elisabete Miranda | Expresso

“Tenho uma pequena confeção com 25 pessoas. As máquinas são enormes, não podem ser transportadas para casa. Se fechar, vou à falência.”

"Tenho uma micro empresa de turismo rural num dos locais mais profundos de Portugal. Tenho uma sociedade por quotas - eu, que sou sócia gerente, e o meu marido, que está desempregado. Todos os meses desconto para a Segurança Social, tenho os impostos e obrigações em dia. Porque não tenho apoio?”

“Tenho quatro funcionários a trabalhar na loja online e oito em casa num limbo laboral, sem estarem de férias, nem deixarem de estar, à espera dum enquadramento legal para a precaução e para o medo. Tenho uma estagiária com estágio financiado pelo IEFP que, por acaso é casada com um profissional que está a fazer receção de doentes com Covid-19. Recorri à página do IEFP para saber como proceder na atual conjuntura, porque não temos obviamente capacidade para orientar um estágio. Eis que me deparei com uma resposta inacreditável: Se não se sente em condições de continuar o estágio, deverá formalizar o pedido de desistência, expondo o motivo, enviando esse pedido por e-mail para o serviço do IEFP. Na atual conjuntura, o Estado responde displicentemente a uma estagiária: Desista, vá para casa e depois logo se vê!”

“Não antecipo quebra no volume de negócios mas vou ter um problema de cobrança. Vou continuar a faturar, mas os clientes não me vão pagar. O lay-off não cobre isto, não tenho outro remédio senão mandar embora a estagiária, para já”.

As citações que aqui reproduzo são excertos adaptados de conversas e de emails que eu, como muitos outro colegas meus, temos recebido ao longo das últimas três semanas. De empresários angustiados sem saberem como vão pagar os salários no fim do mês, de pessoas revoltadas por se verem desamparadas por um Estado que ajudam a financiar, de cidadãos perplexos com a desorganização de uma máquina pública que funciona deficientemente e que, em alturas de maior pressão, bloqueia quase por completo, dando respostas equivocas ou nenhuns esclarecimentos.

Não são empresários que tentam pôr-se a salvo sem olhar para os destroços que deixam para trás (como alguns casos que também vimos relatando), parecem ser empresários conscienciosos que durante 15 dias esperaram que lhes fosse lançada uma boia de salvação, e empresários que, 15 dias depois, começaram a temer que não haja boia que os salve da tempestade.

As medidas que o Governo anunciou na semana passada, de apoio ao pagamento aos salários de empresas em situação de crise (lay-off simplificado), de adiamento da taxa social única e dos impostos, de adiamento do pagamento de empréstimos bancários e o lançamento de empréstimos com desconto, mais ainda assim caros para a ocasião, apesar de tardias, permitem a alguns setores respirar temporariamente de alívio. Mas, para outros, é só a confirmação de que terão de se desenvencilhar sozinhos numa crise com contornos imprevisíveis.

Na linha da frente dos esquecidos pelo Estado temos os trabalhadores temporários. Ao todo, a associação do setor fala em “75 mil pessoas despedidas”, entre as que já o foram, nas últimas duas semanas, e as que ainda vão ser, nas próximas duas, como pode ler nesta reportagem de Helena Bento. Muitos deles sem terem descontos suficientes para acederem ao subsídio de desemprego, ficam dependentes de um incerto subsídio social.

Depois, temos os trabalhadores independentes, que também vão poder adiar impostos e contribuições sociais, mas que só terão um magro e tardio apoio ao financiamento do seu salário se cessarem toda a sua atividade - continuando a trabalhar qualquer coisa para sobreviver não são elegíveis, o que não deixará de constituir um incentivo à subdeclaração de rendimentos ou ao ócio.

Depois temos os sócios gerentes de micro-empresas, que, apesar de em 2015 terem passado a descontar 34,75% para a Segurança Social em troca de uma proteção social alargada, não têm apoio no lay-off e quase só em situações desesperadas conseguirão obter subsídio de desemprego.

A lista de desamparados pelo Estado nesta crise é longa, e, a julgar por uma leitura (ainda superficial) da legislação de proteção às rendas ontem apresentada, poderá engrossar com os pequenos senhorios que, durante meses, não só se verão impedidos de cobrar as rendas aos inquilinos afetados pela crise como ainda se arriscam a ficar com um empréstimo a pagar no fim, mesmo que não tenham conseguido recuperar as rendas.

É certo que o dinheiro público é de todos, e, por isso, tem de ser gerido com cautela, e também é preciso ter em conta que não há soluções técnicas fáceis para apoiar grupos profissionais que facilmente conseguem manipular as suas declarações de rendimento e desviar para si recursos que fazem falta à comunidade. Mas, em tempos de crise como a que se avizinha, é preferível que o Estado corra o risco de apoiar um oportunista, do que deixe cair na miséria um necessitado.

OUTRAS NOTÍCIAS COVID-19

Nas maternidades, os pais estão a ser privados da alegria de ver os filhos nascer. Nos hospitais, os familiares têm de deixar os familiares partir sem se despedirem. Assim se nasce e morre nestes extraordinários tempos de covid-19.

"Inútil, extemporânea, absurda” e “medieval” é como o presidente da Câmara do Porto classifica um eventual cenário de cerco sanitário à cidade.

O Santander em Portugal vai seguir os passos da líder do grupo e determinar o corte de salários aos administradores. Em Espanha, eles variaram entre 20% e 50%, por cá ainda não se sabe. Para já, é o único banco a assumir fazê-lo. O Banco Central Europeu, que já tinha recomendado aos bancos que não distribuam dividendos, vem agora alertar para a necessidade de serem comedidos nos prémios.

Esta terça-feira, pelas 10 da manhã, Presidente da República, Conselheiros de Estado, primeiro-ministro, líderes dos partidos políticos, patrões e sindicatos vão receber uma atualização, em privado, do estado da epidemia em Portugal. Os números mais recentes em Portugal e no mundo podem ser encontrados aqui, aqui, e daqui a poucas horas no nosso Expresso Curto especial dedicado à pandemia.

No Brasil, Jair Bolsonaro vai somando derrotas dos tribunais para tentar anular as medidas de contenção impostas a nível estadual, e tem as redes sociais a vigiar as suas mensagens (além do twitter, também o facebook e o instagram apagaram posts seus). Segundo conta o Estadão, o presidente brasileiro sentir-se-à cada vez mais isolado, e especialmente magoado com Sérgio Moro, seu ministro da Justiça, que se tem mantido prudentemente à margem do debate.

Na Hungria, Viktor Orbán tem agora plenos poderes para governar por decreto, sem consultar o Parlamento.

Nos Países Baixos, na cidade de Laren, um quadro de Van Gogh foi roubado de um museu que está encerrado devido à pandemia. Esta terça-feira, o primeiro-ministro Mark Rutte deverá anunciar novas medidas de contenção, que poderão impor restrições à mobilidade dos holandeses. Em França deverá ser anunciado o prolongamento da quarentena por mais 15 dias.

Fora da epidemia as notícias não abundam mas esta destaca-se pela brutalidade: a 12 de março, um ucraniano de 40 anos que tentava entrar ilegalmente em Portugal foi morto nas instalações do Centro de Instalação Temporária, no aeroporto de Lisboa, depois de alegadamente ter provocado alguns distúrbios. Ontem, após uma notícia da TVI, três inspetores do serviço de estrangeiros e fronteiras (SEF) foram detidos e diretor e subdiretor da direção de fronteiras demitidos. Os suspeitos ficam em prisão domiciliária, por causa da covid-19.

E apesar do coronavírus, amanhã começa a campanha do IRS e, apesar da crescente familiaridade com o processo, não é demais lembrar o calendário e as regras básicas a seguir.

FRASES

O estado de emergência tornou a extrema direita na oposição inaudível, mas os seus líderes esperam que as medidas que limitam as liberdades habituem os cidadãos á ideia de que a autocracia é o sistema que melhor os protege. Álvaro Vasconcelos, no Público

Temos o Governo que temos (...) e a prioridade é resolvermos este problema. Marcelo Rebelo de Sousa sobre o cenário de um governo de salvação nacional

É óbvio que qualquer utilidade que a escola tenha como elevador social desaparece quando está fechada. (…) A agravar o panorama, há dezenas (ou centenas) de milhares de alunos que não têm nem computador nem internet. Andam a pedir telemóveis emprestados para ver os trabalhos de casa. (…) Este é um dos grandes testes à governação socialista. Luís Aguiar-Conraria, no Expresso

A contração que está agora em curso não se parece com um V – nem sequer tem a forma de um U ou de um L (uma forte contração, seguida de estagnação). Em vez disso, parece-se com um I: uma linha vertical que representa os mercados financeiros e a economia real a desabarem. Nouriel Roubini, no Negócios

Os europeístas dos países periféricos parecem aquelas pessoas amarradas a relações tóxicas: sempre a anunciar o risco do fim da relação para depois aceitar que tudo fique na mesma porque a solidão é bem pior. Daniel Oliveira, no Expresso

O QUE ANDO A LER

Por estes dias, as leituras são sobretudo técnicas para tentar perceber a forma como o coronavirus se vai contagiar à economia e quais os instrumentos de que os Estados dispõem para atenuar uma crise que não só é certa, como se antecipa muito violenta.

Para o caso de se interessar pelo debate económico, neste artigo do Voxx, Lorenzo Bini Smaghi, um economista que já passou pelo BCE, explica a dificuldade política do lançamento das Eurobonds (ou coronabonds, como entretanto foram rebatizadas), que exigem uma massiva transferência de soberania dos Estados, e defende, antes, a solução que está a desenhar-se no Eurogrupo.

A resposta pode ser encontrada por exemplo neste, onde se argumenta porque é que uma combinação de programas de compra de divida por parte do BCE com empréstimos com baixos custos de financiamento do Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira não chegam. Não evita que as dívida públicas se descontrolem e traz custos reputacionais (e de ‘rating’) para quem recorra aos empréstimos do MEE.

Aqui, o economista Jordi Gali defende uma terceira via, ainda mais polémica e de difícil implementação, mas que evitaria o enorme problema do endividamento do Estados: que o Banco Central Europeu dê diretamente dinheiro aos governos, sem cobrar nada por isso – que ative o chamado helicóptero.

Numa altura em que vários economistas defendem a necessidade de uma espécie de Plano Marshall que relance da economia europeia e mundial, o nobelizado Paul Krugman propõe uma política permanente de estimulo económico, semelhante à encetada pelo Japão na década de 1990, que anualmente injete o equivalente a 2% do PIB em investimento público. Levados níveis de stock de dívida, como os que Portugal tem, não são tão importantes assim quando a taxa de juro é baixa, sustenta.

Neste texto da Tax Justice Network é feito um mapeamento do comportamento da política fiscal em tempos de guerra, concluindo-se que, quando maior é o grau de aceitação social, mais os impostos tendem a subir para financiar o esforço público. Neste caso, contudo, a proposta é para que se lance mão de um aumento seletivo de impostos (por exemplo, sobre as empresas mais lucrativas e os mais ricos).

aqui, Mariana Mazucatto, uma das economistas admiradas pelo papa Francisco, defende que, ao contrário do que aconteceu em crises anteriores, os governos devem aproveitar a oportunidade para garantirem uma recuperação económica mais inclusiva.

Desejo-lhe uma boa terça-feira, com saúde. Ao longo do dia, já sabe, encontra informação ao minuto no Expresso online, na Tribuna e no Blitz.

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