O novo secretário-geral do Grupo
África, Caraíbas e Pacífico (ACP), o angolano Georges Chikoti, diz que a
comunidade internacional não apoiará alguém que tome o poder pela força. E
apela à estabilidade na Guiné-Bissau.
Georges
Chikoti, o primeiro lusófono a liderar o Grupo África, Caraíbas e Pacífico
(ACP), ligado à União Europeia, defende uma maior intervenção de
instituições como a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental
(CEDEAO) e a União Africana para ajudar a resolver a crise política na
Guiné-Bissau.
Chikoti, que assumiu o cargo na
segunda-feira (02.03), diz ser "necessária uma presença militar da região
para criar condições de estabilidade" no país e que vai dialogar com as
organizações africanas "para que elas possam levar essa questão de maneira
muito séria".
Em entrevista à DW África, o novo
secretário-geral do Grupo ACP, com um mandato de cinco anos pela frente, também
falou sobre Angola. Defendeu que é preciso ter paciência para esperar os resultados
da luta iniciada pelo Presidente angolano, João Lourenço, para combater
a corrupção.
DW África: Estamos a ver na
Guiné-Bissau uma situação de incerteza política e tensão, com movimentações
militares em órgãos do Estado. Como é que acompanha esta situação?
Georges Chikoti (GC): É
bastante preocupante a situação da Guiné-Bissau. Estive a falar com a CPLP
[Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] e naturalmente que nós, países da
CPLP, temos alguma limitação, porque a CPLP é uma comunidade dos Estados e não
tem essa vocação política de intervir. Quem deve intervir, em princípio, no
caso da Guiné-Bissau, é a CEDEAO ou a União Africana. Eu, como secretário-geral
do Grupo ACP, poderei em breve, depois de consulta, escrever para a União
Africana e para a CEDEAO para que elas possam levar essa questão de maneira
muito séria.
Primeiro, acho que é necessária
uma presença militar da região para criar condições de estabilidade no país. Em
segundo lugar, é necessário ajudar para que os processos eleitorais na
Guiné-Bissau sejam estáveis, transparentes e justos, para que todos possam
participar bem coletivamente. Não se pode aceitar que alguém açambarque o poder
com a força das armas e a prender os outros. Então, a CEDEAO tomou uma posição
que parece ser boa e acho que a União Africana deveria segui-la; condenar todo
o uso da força e fazer com que o processo político retome, mas na transparência
e na justiça.
DW África: Como é que essa
situação de incerteza política na Guiné-Bissau pode prejudicar as relações com
a União Europeia?
GC: A União Europeia é
parceira do desenvolvimento para a Guiné-Bissau. E claro que, quando há uma
situação de instabilidade, a ajuda não pode chegar. Mas eu penso que, se alguém
tomar conta do poder pela força, não vai ter apoio da comunidade internacional.
E naturalmente que a União Europeia não apoiaria alguém que tomasse conta do
poder pela força. Então, é necessário que haja, de facto, estabilidade no país
para que possa continuar a beneficiar da ajuda da União Europeia ou da
comunidade internacional.
DW África: E, como angolano,
também deve estar a acompanhar no seu país casos como o "Luanda
Leaks" e processos contra figuras políticas por corrupção. Acredita que,
de facto, Angola está a ter um combate sério contra a corrupção?
GC: Sim. É necessário que
possamos encorajar o Presidente João Lourenço por ter iniciado um
processo sui generis. É difícil fazer uma luta contra a corrupção num país
como Angola, mas o Presidente iniciou este processo. Primeiro, é preciso
entender que não se pode ter resultados tão evidentes logo à partida. Mas acho
que o processo tocou em algumas áreas importantes. Há um retorno importante de
bens do Estado que foram desviados, isso não há dúvida. E também ele [o
Presidente] está a mostrar que o futuro não será como o passado foi e uma
grande vontade de cooperar com as instituições e organizações internacionais
para que em Angola haja, de facto, um Estado de direito. O que se espera é que
esses órgãos da Justiça em Angola consigam trabalhar de maneira mais aceitável
e eu penso que estão a fazer esse esforço.
DW África: Acha que esse combate
à corrupção está a ser feito de forma seletiva?
GC: Seletiva ou não, acho
que todas as pessoas que foram tocadas foram ou estão de alguma maneira com um
processo a decorrer na Justiça. Isso só começou agora, porque havia um período
de seis meses de amnistia, agora estão a entrar na profundeza. Penso que haverá
um momento em que Angola vai publicar o que recuperou, de quem recuperou e
quanto... Portanto, devemos ter a paciência de dar este tempo para que Angola
possa dizer o que fez. E esse processo tem que culminar com um processo de
transparência das instituições do Estado em termos de gestão da Justiça, e acho
que é para ali que o Presidente João Lourenço está a caminhar.
DW África: Que desafios é que
pretende enfrentar como primeiro angolano no cargo de secretário-geral do Grupo
África, Caraíbas e Pacífico?
GC: Sou o primeiro angolano
e, se calhar, o primeiro lusófono a ocupar este posto, entre os diferentes
países lusófonos do Grupo ACP. Somos 79 países e naturalmente que o
grupo tem desafios que têm a ver com o desenvolvimento sustentável, a luta
contra a pobreza e na base de acordos que normalmente nós assinamos com a União
Europeia. A visibilidade é um dos maiores desafios que tenho neste momento que
o grupo mudou o seu nome e é, agora, uma organização internacional dos Estados
de África, das Caraíbas e do Pacífico. Também tenho como desafio angariar
fundos para a organização. Mas, sobretudo, vou priorizar a cooperação sul-sul,
a cooperação norte-sul e a cooperação triangular. Vou promover várias
iniciativas, mas penso que, por exemplo, o setor privado é um dos setores
importantes para promover o desenvolvimento nos nossos países.
Thiago Melo | Deutsche Welle
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