terça-feira, 28 de dezembro de 2021

A DERROCADA DE BOLSONARO E O RESGATE DO BRASIL

# Publicado em português do Brasil

Outras Palavras segue esforço para pensar reconstrução do país. Sugerimos: não pode haver acordo por cima, sem mudanças reais, após derrota do fascismo. Em debate: Renda Básica, Reforma Tributária e ressignificação da Assistência Social

Antonio Martins* | Outras Palavras

O presidente Jair Bolsonaro está queimando de forma acelerada, desde o 7 de setembro, o capital político que lhe restava. A ameaça fascista que seu governo representa nunca esteve tão enfraquecida e próxima do naufrágio. Avançou muito rapidamente, por outro lado, a articulação do grande arco conservador – poder econômico-financeiro, establishment político, mídia e Judiciário – para salvar da derrocada, e manter vivo, o programa neoliberal que acompanha o bolsonarismo desde o início, ainda que o presidente afunde. Este movimento duplo pode ser visto, ao mesmo tempo, com alívio e inquietação. Mas para ir além do que ele oferece – a mera volta ao “velho normal” – é preciso recompor um horizonte político de esquerda. A partir da próxima segunda-feira (13/9), Outras Palavras voltará a contribuir com esta reconstrução. O projeto Resgate, que busca desenvolver ideias-força para a superação do neoliberalismo, realizará nove novos diálogos. Estarão em debate a Renda Básica, a Reforma Tributária e a ressignificação da Assistência Social. A agenda já está disponível.

A prova de que o risco de um “autogolpe” fascistizante (ao estilo da “tomada do Capitólio”) foi real são seus fios desencapados, que ainda crepitam. Os bloqueios nas rodovias de 16 estados, feitos por “caminhoneiros” ligados ao agronegócio, que agora o presidente tenta desmobilizar, por saber que o ato tem suas digitais. Os poucos seguidores do ex-capitão que permaneceram acampados em Brasília e, para tentar iludir a própria frustração, “comunicam” nas redes sociais que se decretou estado de sítio. Os vídeos em que o foragido Zé Trovão dirige-se diretamente a Bolsonaro e lhe indaga, entre decepcionado e lastimoso, por que não cumpriu sua parte na trama.

Os porquês do malogro operacional do “autogolpe” emergirão aos poucos (circulam hipóteses plausíveis, como a de Fernando Horta). Mas, ainda que tivesse sido exitosa no primeiro momento, a aventura não se consolidaria. As multidões que o bolsonarismo ainda consegue mover são um fenômeno político a ser examinado em profundidade – mas, com certeza, insuficientes para assaltar o poder e controlá-lo. E não é só porque os chefes das forças armadas faltaram ao “capitão” (ausentando-se inclusive do palanque em Brasília), nem porque as polícias militares deixaram de acudir em seu socorro (é emblemático que o governador João Doria estivesse no Comando de Operações da PM de São Paulo – o Copom – no momento em que pronunciou-se pela primeira vez em favor do impeachment de Bolsonaro, no 7 de setembro).

Ocorre que há outra história do 7 de setembro a ser contada no futuro. Por algum motivo, um conjunto de atores políticos do campo das elites reposicionou-se em oposição a Bolsonaro quase em bloco. Incluem-se no rol os ministros do STF; expoentes de partidos como o MDB, o PSDB, e até o DEM e o PSL; os meios de comunicação dominantes, que se pronunciaram por meio de editoriais e de seus articulistas. Os integrantes deste bloco ou haviam participado da eleição de Bolsonaro (no caso dos dirigentes partidários e da mídia empresarial), ou sido coniventes com as irregularidades que a marcaram (os membros do Supremo, que afastaram Lula da disputa). Também mantiveram indiferença, diante dos seguidos crimes de responsabilidade cometidos pelo capitão desde o início de seu mandato.

"Mesmo com presença de muitos militares, os terroristas conseguem atacar"

MOÇAMBIQUE

Ataque de homens armados na localidade de Laulala, província moçambicana do Niassa, matou cinco pessoas e feriu outra, a 22 de dezembro. Apesar da presença do Exército, a população sente-se insegura.

Mesmo com a proteção das Forças Defesa e Segurança (FDS) e nas vésperas do natal, homens armados invadiram a localidade de Laulala, onde mataram cinco pessoas e feriram gravemente uma idosa, para além de queimaram casas, como conta João Rodrigues morador da localidade de Laulala dois.

"À noite nós só ouvimos pessoas a gritarem e a fugir, quando saímos vimos só fumo em cima. Fugi com a minha família. Ouvi que morreram pessoas e uma idosa foi balhada", testemunhou Rodrigues.

Segundo a Televisão de Moçambique, os ataques foram protagonizados por terroristas do grupo "Alsunawadjamah".

Os moradores afirmam não se sentirem seguros, apesar da presença militar no local, "porque nunca se sabe onde acontecerá o próximo ataque", como afirma Luiza Pedro.

Angola | MAIS DE 800 FAMÍLIAS EM SITUAÇÃO DE FOME NO CUNENE

Os gafanhotos já devastaram perto de 250 hectares no município de Namacunde, província angolana do Cunene, deixando 4.000 famílias em situação vulnerável. População pede apoio do executivo, que reconhece o drama vivido.

Desde fevereiro de 2020 que a região centro e sul de Angola, mais concretamente as províncias de Benguela, Cunene, Huíla, Namibe e Cuando Cubango, tem-se debatido com a invasão de gafanhotos.

Na província do Cunene, as pragas foram registadas nos municípios do Curoca, Namacunde e Ombadja. Os gafanhotos devastaram perto de 250 hectares e a praga deixou mais de 800 famílias em situação extrema de fome.

Rodeth Peingoambili Mwehanawa, sensibilizadora da povoação Marco 16, comuna e município do Namacunde, diz que a situação é crítica. Explica que, para fugir da morte por fome, a população tem recorrido aos líderes tradicionais.

"Por causa da praga, temos muitas dificuldades de fome. Muitas pessoas tendem a ir para a república vizinha da Namíbia, mas como as fronteiras estão encerradas, então recorrem todos os dias aos sobas e seculus (reis)", conta à DW África. "Desde o início da praga na área do Marco 16 até ao momento registámos duas mortes por conta da fome", acrescenta a responsável.

Guiné-Bissau | GUERRA ENTRE SISSOCO E O SEU PARTIDO

"MADEM-G15 está a provar do próprio veneno"

O Parlamento guineense não vai discutir o suposto aliciamento dos deputados da coligação governamental. Para a sessão extraordinária desta terça-feira não foi agendada a guerra aberta entre o PR e os órgãos de soberania.

Os deputados da Assembleia Nacional popular da Guiné-Bissau (ANP) voltam a renuir-se, nesta terça-feira (28.12), em sessão extraordinária para retificar e votar na globalidade o Orçamento Geral do Estado (OGE), já aprovado na generalidade a 9 de dezembro, apurou à DW.

A Comissão Permanente do Parlamento deixou de fora um eventual debate sobre a crise política e a crescente tensão entre o Presidente da República e o Parlamento, disse à DW África o vice-líder da bancada parlamentar do Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G15).

Nelson Moreira esclarece que a sessão extraordinária não é convocada para discutir a crise política e a "guerra aberta" entre o Presidente da República e os principais órgãos de soberania da Guiné-Bissau.

"Está fora de hipótese discutir outros temas. O Orçamento quando é agendado tem prioridade sobre os outros pontos. Além disso, único ponto que agendamos é a aprovação global e final do Orçamento Geral do Estado", disse o também membro da Comissão Permanente da ANP.

Portugal | CASTIGUE-SE OS POBRES

Mariana Mortágua | Jornal de Notícias | opinião

No encerramento do Congresso do PSD, Rui Rio escolheu confundir o inconfundível, e associar os apoios sociais à falta de oferta de mão de obra em Portugal.

No Expresso, o deputado do Bloco José Soeiro expôs o propósito das declarações de Rio, que exploram os equívocos criados pela extrema-direita, associando a pobreza à preguiça e até ao crime. Através do Twitter, Rio deu o dito por não dito, afirmando que só pedia "mais fiscalização" para os apoios sociais. Mas o que disse de facto o líder do PSD?

"Não é aceitável um país com a sua classe média sufocada em impostos e em que o seu salário de referência pouco se distingue do mínimo em vigor. Assim como também não é racional manter apoios sociais a quem os usa para se furtar ao trabalho e, dessa forma, condicionar a própria expansão empresarial que, cada vez mais, se lamenta da falta de mão de obra disponível. Os apoios sociais são socialmente indispensáveis, mas apenas para quem deles verdadeiramente necessita, e não para quem os recebe indevidamente. Tem de haver uma fiscalização adequada...".

As palavras escolhidas por Rio não são inocentes. Desde logo porque a "fiscalização" foi sempre a senha para reduzir apoios sociais, coisa já demonstrada por anteriores governos muito "fiscalizadores". Foi também em nome dos "abusos" que Rio e Chega se uniram nos Açores para cortar a eito o rendimento social de inserção. A região tem a taxa de pobreza mais elevada do país (32%), o apoio mensal médio é de 86 euros e serve sobretudo mulheres e famílias numerosas onde os adultos trabalham por salários muito baixos. Mas nada impediu Rio de declarar que "não tenho nenhum problema com as posições do Chega sobre esta questão da subsidiodependência".

PORTUGAL REGISTA O MAIOR AUMENTO DIÁRIO DE CASOS DE COVID-19

Portugal registou 19 mortes e 17172 novos casos de covid-19, no boletim diário da DGS divulgado esta terça-feira. Este é o valor mais alto de sempre, ultrapassando os 16432 do boletim divulgado no dia 28 de janeiro de 2021.

Com dados relativos ao primeiro dia útil a seguir ao Natal, o documento da DGS revela ainda um aumento de 22 internamentos em enfermaria geral (total de 936 internados) e dois em unidades de cuidados intensivos (total de 152), valores muitos diferentes dos registados a 28 de janeiro: 6565 internados e 782 em cuidados intensivos. Nesse dia, havia o registo de 303 mortos.

No balanço entre novos casos e infetados recuperados, houve esta terça-feira um aumento de 8927 casos ativos, para 114541.

Lisboa e Vale do Tejo é a região do país com mais casos (8576), seguido pela região Norte (5046), Centro (2124), Algarve (417) e Alentejo (325). A Madeira registou mais 516 casos e os Açores 168. Na distribuição de óbitos, foram registados seis em Lisboa, cinco no Centro, quatro no Norte, dois no Algarve e dois na Madeira.

Em relação ao dia anterior, as autoridades de saúde têm mais 6.976 contactos em vigilância, totalizando 134.645 pessoas.

Segundo os dados da DGS, a maioria dos óbitos diários continua a registar-se entre os idosos com mais de 80 anos, num total de oito, seguido da faixa etária dos 60 aos 69, com seis mortes registadas, tendo ainda ocorrido quatro mortes entre os 70 e os 79 anos e uma entre os 50 e os 59 anos.

Portugal | RENDIMENTO MINIMO DO POLÍTICO CALÃO

Não tens ideias de jeito? As eleições estão à porta e queres apelar aos piores sentimentos dos eleitores e piscar o olho à extrema-direita, mais à sua retórica de exclusão e ódio? Mandas-te ao RSI, pois então. Mas como não queres parecer uma grande besta dizes que estás só a pedir "mais fiscalização".

Fernanda Câncio* | Diário de Notícias | opinião

“Sentia-me sempre inferior aos outros. Às vezes, parecia-me um dinheiro amaldiçoado. Era como se não fosse realmente meu, tinha que estar sempre a prestar contas de tudo - e faz sentido que assim seja, mas, ao mesmo tempo, sentia-me um bocado envergonhada."

Esta fala é de Ana Ameijides, em entrevista ao Público nos 25 anos do Rendimento Mínimo Garantido/Rendimento Social de Inserção, feitos em 2021. Ana foi, em criança, com os quatro irmãos, uma das primeiras beneficiárias desta prestação criada em 1996 pelo governo de António Guterres. Aos 29 anos, já não é - e diz que apesar de sentir gratidão pelo programa, pelo que a ajudou e à sua família, não é um sítio onde queira voltar.

Claro que Ana não é todas as pessoas que alguma vez beneficiaram do RSI. É só uma pessoa, como muitas outras, para quem fez a diferença entre a miséria e uma pobreza menos miserável. Mas aquilo que diz sobre esta prestação social - o facto de aos que a recebem se fazer sentir que estão sempre sob vigilância - é corroborado pelos estudiosos. "A fraude no RSI é menor do que noutras prestações sociais, porque nunca houve nenhuma medida tão escrutinada quanto esta", diz por exemplo Carlos Farinha Rodrigues, especialista em políticas públicas e uma das autoridades nacionais sobre pobreza e exclusão.

Portugal | A VILANAGEM NUNCA SE FARTA

Usar cartões vai sair mais caro. Deco critica aumento de comissões bancárias

O Novo Banco é um dos bancos que já anunciou que vai ter comissões bancárias mais altas já no início de 2022.

Deco antecipa o aumento de comissões bancárias e do uso de cartões de crédito e débito para os primeiros meses de 2022.

A associação de defesa do consumidor critica o progressivo aumento de preços numa altura em que a banca continua a fechar balcões e a despedir trabalhadores. Em declarações ao Diário de Notícias (DN), o economista da Deco Proteste Nuno Rico defende que não há argumentos para estes aumentos.

"Não há argumentos para estes aumentos. Cada vez os portugueses têm menos banca, mas uma banca mais cara", disse o economista ao DN.

O jornal refere também um levantamento feito pela "ComparaJá", uma plataforma de comparação de produtos e serviços financeiros, adiantando que, até agora, três bancos já anunciaram que vão ter comissões mais altas no próximo ano.

Um deles é o Novo Banco. Neste caso, os clientes vão gastar mais dinheiro quando usarem os cartões de crédito e débito e vão também pagar muito mais para manter uma conta à ordem. Seja qual for o saldo, pagam todos o mesmo. O valor anual passa para mais de 62 euros.

"Para já, o Novo Banco anunciou aumentos de comissões para 2022 mas é muito expectável que os outros bancos sigam a mesma tendência e anunciem aumentos no primeiro trimestre do novo ano", explicou Nuno Rico ao DN, acrescentando que "estas subidas de preços ocorrem sem fundamento".

Os bancos estão cada vez mais digitais e continuam a fechar balcões e a reduzir o número de trabalhadores", sublinhou.

TSF

Leia em TSF:

Novo ano chega com aumento de preços para os consumidores

O ano que se aproxima vai ficar marcado pelo aumento generalizado de preços que os consumidores irão pagar pelos serviços que usam no dia-a-dia.

CHINA: O “PERIGO AMARELO”, REALMENTE?

Thierry Meyssan*

O Presidente Biden relembra-nos o «perigo amarelo»: a China roubaria as nossas patentes, promoveria a corrupção e destruiria o ambiente antes de nos vir impor pela força o seu regime totalitário. Felizmente os Estados Unidos e a OTAN protegeriam as democracia e a paz. Mas, então como explicar a aliança entre Pequim e Moscovo, a qual deveria sentir o mesmo medo ? Tal seria simplesmente uma « aliança de ditaduras ». Para todos os que viveram a Guerra Fria, esta narrativa soa a falso.

O projecto chinês de rotas da seda é um sucesso mundial. Apesar de todas as criticas expressas (corrupção das elites locais, endividamento dos países parceiros, atentados às leis ambientais), os países que nele participam experimentam um forte crescimento.

Como não se espantar que os programas de ajuda ao desenvolvimento dos Ocidentais desde a descolonização não o tenham conseguido ?

E sobretudo, como não se admirar que após ter, durante décadas, elogiado as vantagens para todos do livre comércio internacional, o Ocidente ataque este sucesso ?

As relações entre o Ocidente e a China no século XXI não são uma sucessão de qui-pro-quos, mas de equívocos unilaterais. Os Estados Unidos recusam entender o modo de pensar chinês e não cessam de projectar os seus próprios defeitos sobre Pequim.

A VISÃO SOBRE O PRÓXIMO ANO PARA A EUROPA

The Guardian | editorial

Da França à Ucrânia, o continente enfrenta muitos desafios em 2022

O presidente francês Emmanuel Macron (R) cumprimenta o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, em Paris, em 10 de dezembro, poucos dias depois que Scholz oficialmente assumiu o cargo de sua antecessora, Angela Merkel. Fotografia: David Silpa / UPI / Rex / Shutterstock

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A recente enxurrada de ameaças de Vladimir Putin não tem mais a ver apenas com a Ucrânia. O presidente da Rússia tem ampliado constantemente o escopo de suas demandas para abranger os arranjos de defesa e segurança na Europa como um todo. Mesmo que as tensões atuais nas fronteiras da Ucrânia não resultem em conflito aberto, essa escalada deliberada é um mau presságio para 2022.

O que Putin quer, com efeito, é voltar o relógio para a década de 1990, antes que países do antigo Pacto de Varsóvia, como a Polônia, e ex-repúblicas soviéticas, como a Estônia, ingressassem na Otan. Se ele conseguisse, provavelmente reconstituiria a União Soviética, cuja morte ele lamenta. Este amargo espião da KGB nunca aceitou a derrota da Guerra Fria.

A aliança ocidental deve deixar claro que esse perigoso revisionismo é inaceitável. A Rússia não pode ter direito de veto à futura adesão da Ucrânia (ou da Geórgia) à OTAN. Nem pode Putin reviver o velho soviético “próximo ao exterior”, ressuscitar esferas de influência ou ditar onde as forças ocidentais estão estacionadas. Conversas sobre medidas de fortalecimento da confiança para aliviar as preocupações da Rússia seriam um caminho mais sensato a seguir.

No entanto, ao enviar cerca de 100 mil soldados para as fronteiras da Ucrânia e manter um bombardeio verbal, Putin deixou claro que não vai relaxar rapidamente a pressão sobre os líderes europeus. Para Washington, esse é um quebra-cabeça geopolítico. Para os europeus, uma Rússia hostil e furiosa é um perigo imediato e ameaçador à espreita à sua porta.

Documentário de Oliver Stone sobre o assassinato de JFK não deve ser descartado

O governo dos EUA continua a manter arquivos confidenciais relacionados ao assassinato de John F. Kennedy em 1963 em segredo. (Corbis via Getty Images)

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Branko Marcetic | Jacobin

O novo documentário sobre o assassinato de JFK, de Oliver Stone, lutou para chegar às telas dos Estados Unidos, apenas para ser ridicularizado pela mídia quando o fez. Mas se não há nada para ver aqui, por que o governo ainda bloqueia a liberação dos registros 60 anos depois?

Nove anos atrás, o jornalista independente Luke Rudkowski estava no segundo debate presidencial de 2012 quando teve a chance de perguntar à então presidente do Comitê Nacional Democrata, Debbie Wasserman Schultz, sobre a “lista de mortes” do presidente Barack Obama. O New York Times havia revelado sua existência apenas cinco meses antes , baseando-se no testemunho de dezenas de conselheiros atuais e anteriores do presidente que descreveram o processo pelo qual ele e sua equipe de segurança nacional decidiram quem marcariam para assassinato por drone. Rudkowski queria saber se ela se sentia confortável com Mitt Romney, o oponente republicano de Obama, herdando e usando um poder tão radical.

“Não tenho ideia do que você está falando”, respondeu Wasserman Schultz, olhando para ele com um misto de preocupação e pena.

“Obama tem uma lista secreta de mortes”, ele começou a explicar, “que ele usou para assassinar pessoas em todo o mundo -”

“Estou feliz em responder a quaisquer perguntas sérias que você tenha”, disse Wasserman Schultz, agora sorrindo e balançando a cabeça como se estivesse falando com alguém no meio de um surto psicótico.

“Por que isso não é sério?” ele perguntou.

"Porque não tenho ideia do que você está falando", disse ela, afastando-se abruptamente, um jovem funcionário incrédulo a seguindo.

Eu pensei muito sobre essa troca enquanto assistia ao novo documentário de Oliver Stone, JFK Revisited: Through the Looking Glass , e especialmente enquanto me debruçava sobre a reação da mídia ao filme, uma atualização do celebrado relato ficcional de Stone de 1991 sobre o assassinato de John F. Kennedy . A existência da lista de mortes de Obama foi quebrada pelo jornal oficial e pelos relatos da própria equipe do presidente, ansiosos para polir suas credenciais como um duro assassino terrorista à medida que a reeleição se aproximava. Mas aos olhos de Wasserman Schultz e seu funcionário, desinformados sobre a notícia, a ideia era obviamente absurda e risível - os delírios conspiratórios de um louco paranóico.

Isso vem à mente enquanto o governo dos EUA continua a manter arquivos confidenciais relacionados ao assassinato de John F. Kennedy em 1963, ironicamente fornecendo um terreno fértil para especulações e conspirações realmente bizarras. A desclassificação de quase 1.500 documentos pelo governo Biden na última quarta-feira foi recebida com muita decepção , com a maioria dos documentos duplicados daqueles já divulgados, e um estudioso chamando as novas redações de "mínimas e sem valor". Isso segue o adiamento anterior de Biden de um lançamento de registros há dois meses, em outubro, depois que Donald Trump decidiu atrasá-los em 2017, apontando para a segurança nacional, aplicação da lei e preocupações com relações exteriores.

De alguma forma, quase seis décadas após o ocorrido, a discussão do assassinato de Kennedy e as incógnitas que o cercam ainda fazem os jornalistas e comentaristas liberais se contorcerem - e agora, na era Trump, alimenta seu pânico contínuo sobre a desinformação.

ASSANGE E OS CIPHERSPUNKS: OS LOUCOS PELA CRIPTOGRAFIA

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César Locatelli | Carta Maior

Você se lembra do que fez no dia 18 de abril de 2016? Usou a internet? O Google? Lembra-se do que pesquisou no Google? Falou com o(a) namorado(a) ou com o(a) amante pelo Whatsapp? Sobre o que falaram? Publicou algo no Facebook, no Twitter, no Instagram? O quê publicou? Recebeu ou mandou e-mails? Para quem? Sobre que assunto? Falou ao celular?

Com alta probabilidade a resposta a todas essas questões será “não faço ideia”. E isso, na verdade, não tem mesmo lá grande relevância, se nem você e nem ninguém se lembrasse. Ocorre que não é esse o caso. Google, Whatsapp, Facebook, Twitter, Instagram e qualquer outro aplicativo que você tenha usado sabem exatamente o que você fez, em que horário, de onde se conectou e mais uma coleção de metadados e de informações que você trocou pelo ciberespaço.

Eles sabem. Todos aqueles com quem eles dividem seus bancos de dados também sabem. Sua vida online está registrada e é usada todos os dias para usos que sabemos, outros que não sabemos e, ainda, aqueles que nem imaginamos. Você já viu aparecer, nas páginas que você visita, anúncios de um produto que você tenha feito alguma busca um pouco antes, não viu? Ou mesmo te mostrarem propagandas de produtos que você mencionou por perto do celular?

Bem, mas esse é o uso, propaganda, que sabemos que fazem de nossos dados. E os usos que não sabemos? Que poder é transferido de nossas mãos, das mãos de todos que usam a internet, e concentrado em mãos de alguns poucos?

Discutir esses temas essenciais foi o objetivo de uma reunião na embaixada do Equador, em Londres, quando Julian Assange recebeu seus colegas hackers Jérémie Zimmermann, Jacob Appelbaum e Andy Müller-Maguhn. De suas reflexões nasceu o livro Cypherpunks: liberdade e o futuro da internet, publicado pela Editora Boitempo em 2013.

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