domingo, 18 de setembro de 2022

Guiné-Bissau | PAIGC teria "maioria absoluta" com eleições livres - Simões Pereira

O presidente do PAIGC, Domingos Simões Pereira, manifestou a convicção de que se as eleições legislativas na Guiné-Bissau se realizassem agora e fossem justas e transparentes o seu partido terá "maioria absoluta".

"Penso que se hoje houvesse eleições livres, justas, transparentes, o PAIGC ganhava com maioria absoluta. Não há nenhuma dúvida sobre isso", disse o líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC, na oposição). 

No entanto, admitiu que para as eleições antecipadas previstas para 18 de dezembro o PAIGC poderá fazer coligações com outros partidos "porque hoje os desafios são tão grandes" que exigem "uma frente unida".

Domingos Simões Pereira considerou, no entanto, que o atual regime guineense, liderado pelo Presidente Umaro Sissoco Embaló, não está apostado em realizar eleições "que forneçam ao povo a oportunidade de escolher livremente os seus representantes". O dirigente exemplificou com algumas irregularidades e atropelos à Constituição, como o facto de o mandato da Comissão Nacional de Eleições (CNE) já ter terminado sem que o parlamento, entretanto dissolvido, tivesse nomeado novos membros ou o incumprimento dos prazos em relação ao recenseamento eleitoral.

"Temos uma CNE caduca. Para legitimar uma nova CNE, é preciso a plenária da Assembleia Nacional Popular, que já não existe", disse em entrevista à agência Lusa em Lisboa, depois de ter conseguido sair do seu país, manifestando também dúvidas da viabilidade de realizar um recenseamento de raiz em plena época das chuvas na Guiné-Bissau.

Falta de recenseamento

Para Domingos Simões Pereira, a falta de recenseamento coloca também em causa a elaboração das listas dos partidos que pretendem concorrer às eleições, "o que deveria acontecer até 18 de outubro".

O líder do PAIGC questionou ainda o facto de as eleições terem sido convocadas em 16 de maio deste ano para 18 de dezembro "quando a Constituição estipula um prazo de 90 dias". "E é óbvio que se essas perguntas forem colocadas a quem exerce o poder na Guiné-Bissau, vai olhar para o lado e assobiar e dizer isso não interessa", disse, referindo-se a Sissoco Embaló.

Questionado sobre as principais propostas eleitorais do PAIGC, referiu que "na Guiné-Bissau, é preciso começar pelo básico". "O PAIGC entende que primeiro é preciso consolidar as instituições democráticas, porque o grande problema da maioria dos países africanos é a questão do Estado. O Estado não funciona. Às vezes até não existe", disse.

Domingos Simões Pereira acrescentou que "é preciso que o cidadão guineense faça confiança nas instituições como representantes de uma entidade de bem, numa entidade que faz com que a justiça seja aplicável, que faça com que aquilo que é prioridade para o povo é também prioridade para quem governa", referindo que o seu partido é o único que apresenta programas eleitorais e assume "um compromisso com o povo". 

Entre as prioridades, elencou a educação e a saúde num país onde há "pessoas da terceira idade a morrer de fome porque comem uma vez por dia" e "onde os jovens precisam ir à escola" para garantirem que "amanhã têm um futuro". "Nós estamos a falar de um país que tem a maior taxa de mortalidade maternoinfantil", mas onde o Presidente "pensa que a governação é viajar" ou fazer "demonstrações de força".

Sobre se considera ainda ter a confiança do partido, impedido pela justiça de realizar o congresso devido à interposição de uma acção de um militante, Domingos Simões Pereira considera que sim porque o Comité Central do partido continua a aprovar as suas proposta "por uma maioria superior a 90%". "Eu penso que todo o mundo já compreendeu que há uma estratégia de criar esta imagem de desgaste para ver se isso me convence a sair, porque me reconhecem como eventualmente o último reduto de resistência a essa tentativa de impor o absolutismo na Guiné-Bissau", disse, referindo-se novamente ao chefe de Estado. "Que há interferência política na questão da realização do congresso do PAIGC é por demais evidente", disse, considerado que o próprio Presidente "não esconde isso".

Portugal em "silêncio cúmplice"

O presidente do PAIGC lamentou o "silêncio cúmplice" de Portugal face às violações dos direitos do povo da Guiné-Bissau por parte de um regime "totalitário", liderado pelo chefe de Estado, que "investe em mecanismos de repressão".

Domingos Simões Pereira referiu que atualmente "a comunidade internacional tem falta de liderança", mas lamentou sobretudo a posição de Portugal. "Pela relevância que Portugal tem junto da União Europeia, junto das Nações Unidas e de outras organizações, de facto, o seu silêncio é cúmplice, porque não se limita a ser um silêncio, já houve manifestações de apoio, já houve manifestações de aproximação sem serem acompanhadas de uma tentativa de compreender a realidade", referiu.

Domingos Simões Pereira considerou que este silêncio "preocupa muito" a comunidade guineense em Portugal, que "acompanha e vê o povo português como um povo irmão" e "tem dificuldades em compreender determinados sinais" em vez de apoio para "tentar ajudar a ultrapassar essas situações".

O dirigente do PAIGC considera que o chefe de Estado guineense quer um poder totalitário e investe em meios de repressão do povo em vez de assegurar as suas necessidades básicas. "Neste momento há um investimento forte da administração, portanto do Governo guineense, não nas escolas, não nos hospitais, não naquilo que é do interesse do povo guineense, mas nos mecanismos de repressão, na aquisição de meios para o controlo de manifestações, para a intimidação do povo", disse. 

Simões Pereira, quando instado a dar exemplos dessa repressão, referiu que as pessoas são espancadas por qualquer motivo. "Isto entrou para o dia-a-dia do cidadão guineense, o cidadão guineense hoje é espancado porque, por exemplo, rezou num dia em que não devia rezar".

Neste sentido, considerou que "a perceção que Umaro Sissoco Embaló tem do poder é o totalitarismo". "Para ele a democracia é: ele dá ordens e os outros executam. E quando o que está a ser executado lhe parece não coincidente com o seu interesse e as suas ordens, ele pensa que tem o direito de chamar as forças de segurança e as forças de defesa para corrigirem aquilo que ele entende estar mal", disse, referindo-se ao Presidente.

Questionado sobre com que armas pretende combater este regime, disse que é preciso continuar "a alertar o povo guineense" de que os seus direitos "estão a ser postos em causa". "Impõe-se neste momento que o povo se mobilize, que o povo compreenda a importância de assegurar os seus direitos fundamentais e as suas liberdades e todos juntos podermos realmente pôr fim a esta tentativa de sufoco da sociedade e dos direitos do povo guineense", defendeu.

Deutsche Welle | Lusa

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