Paulo Baldaia* | Diário de Notícias | opinião
Sem os imigrantes a economia nacional colapsava. O turismo, motor da nossa economia, está altamente dependente da mão-de-obra estrangeira; os frutos vermelhos ficariam por apanhar no Alentejo e a pera-rocha não sairia das árvores no Oeste; a construção civil avançaria a passo de caracol; a limpeza dos hospitais, das empresas e das casas particulares, para quem pode pagar um(a) empregado(a) doméstico(a), não seria feita. A lista é infindável.
Ainda assim, os portugueses não se mostram grandes entusiastas com a imigração. O European Social Survey mostrava, em 2018, que o país dava uma nota de apenas 5,6 (numa escala de zero a 10) quando tinha de definir a imigração como sendo boa ou má para a economia. A avaliação piorava (5,1), quando os portugueses eram chamados a dizer se os imigrantes tornavam o país melhor ou pior para se viver. Dos 23 países europeus analisados, Portugal ficava a meio da tabela, dando o pódio, pela negativa, à Rússia, Hungria e Itália, onde a extrema-direita acabou de ganhar o poder.
Num estudo da Escola de Economia de Paris, onde se avaliaram fluxos migratórios entre 1985 e 2015, conclui-se que nos países que mais receberam imigrantes o PIB per capita aumentou e o desemprego caiu, exatamente o oposto do argumento mais utilizado pelos partidos populistas e xenófobos. Um outro estudo, feito pelo McKinsey Global Institute e pelo FMI, mostra que os imigrantes, que correspondem a cerca de 3,4% da população mundial, produzem no total 9,4% da economia global. Valem o triplo da riqueza face ao seu peso populacional.
Mesmo perante estas evidências, a imigração e a aversão das comunidades ao que é diferente são os fatores que mais têm contribuído para o crescimento da extrema-direita nacionalista na Europa. Raramente se atrevem a pedir o fim da imigração, sabem que não há nacionais para fazer o trabalho desses estrangeiros, mas exigem uma imigração seletiva, cumprindo regras que transformariam esses imigrantes em prisioneiros, remetidos a guetos de onde pudessem sair apenas para trabalhar; sem cultura e sem valores próprios, como novos cristãos-novos; com míseros salários apenas para garantir que ninguém pudesse dizer literalmente que a escravatura voltou. Mas é escravatura o que defendem, à moda do que se fez e faz no Qatar, por exemplo, para que um mundial de futebol possa acontecer.
Trata-se de defender os valores europeus, dizem os que nos pedem que olhemos para a imigração com cautelas e regras apertadas, regras que desumanizam a relação entre os povos e que transformam em máquinas os trabalhadores estrangeiros que garantem o nosso nível de vida. Como se os valores europeus não assentassem no Humanismo, onde impera o amor e o respeito pelos outros, a racionalidade e a valorização do confronto de ideias e valores diferentes como única forma de evoluirmos enquanto sociedade. Os que apregoam que é preciso sair em defesa dos valores europeus devem ser coerentes e lutar para que a extrema-direita não se aproprie desses valores como chavão com o único propósito de os corromper.
A extrema-direita nacionalista é violenta e, sempre que pode, arrasta os povos para a guerra. Já vimos isto acontecer, o que nos leva a pensar que não pode acontecer de novo?
*Jornalista
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