ENTREVISTA
Para Miguel Pinto Luz, quando chegar a altura de o PSD governar irá implementar as suas soluções, mas espera que isso ‘não seja feito às custas de uma profunda crise social, económica e de credibilidade política’, lembrando que essa ‘tem sido a história’ do partido nos últimos anos em que governou.
Sem surpresa, Miguel Pinto Luz arrasa a gestão de governação socialista: «Nos últimos anos tem engrossado um Estado que hoje garante maus serviços, aumenta as suas clientelas numa estratégia puramente eleitoralista, de sobrevivência partidária, nunca colocando os interesses nacionais à frente dos interesses partidários e do seu grupinho de interesses». E considera que a TAP é reflexo dessa «normalidade socialista». Também não poupa críticas ao Orçamento de Estado, em que são anunciadas medidas atrás de medidas que nunca são aplicadas, defendendo que é para «cumprir calendário e uma agenda mediática».
Em relação ao papel do PSD, defende que tem de escrutinar o Partido Socialista e que a seu tempo o partido irá apresentar o seu modelo que tem para o país. «No PSD não adiamos o futuro. Quando somos Governo tomamos decisões e quando não somos Governo, como é o caso, ajudamos o Partido Socialista a tomar decisões porque, pelos vistos, o Partido Socialista também não é capaz de tomar decisões sozinho», dando como exemplo o caso aeroporto.
Já em relação aos nomes que têm sido avançados para as presidenciais, não esconde a ‘admiração’ que tem por Passos Coelho, cujo nome foi avançado esta semana por Marcelo Rebelo de Sousa: «Pedro Passos Coelho é um homem que deu muito ao país e continuará a dar». Mas garante que este é o tempo de decisões pessoais e só mais tarde é que os partidos se poderão pronunciar.
A privatização da TAP voltou a estar em cima da mesa. Enquanto membro do Governo de Passos Coelho foi um dos responsáveis pela assinatura da privatização da companhia aérea. Como vê estes avanços e recuos?
Como secretário de Estado finalizámos o processo de privatização com um parceiro privado credível, ao qual foi imposto um caderno de encargos muito pesado, em termos de investimento em novos aviões, em termos de investimento na própria companhia, em termos de exigência de manutenção de um hub estratégico em Portugal e na criação de novos mercados. Não nos podemos esquecer que hoje dizemos que o mercado americano descobriu Portugal, mas descobriu Portugal porque há sete anos um Governo liderado por Passos Coelho decidiu privatizar a TAP com uma estratégica e essa estratégia era precisamente apostar no mercado americano.
E com a entrada na TAP de um parceiro americano...
As coisas têm um nexo de causalidade quando fazemos política para as pessoas e para o país. Quando fazemos política ao serviço da ideologia, esse nexo de causalidade perde-se, esfumaça-se no tempo e o processo de reversão dessa privatização foi nefasto para a companhia e para o erário público. Já o processo de nacionalização foi encapotado para inglês ver, para os parceiros da geringonça verem e para servir os interesses ideológicos socialistas. Tudo foi feito de forma ludibriada num processo de renacionalização que concedia ao privado os mesmos direitos que tinha anteriormente, mas com muito menos deveres. O privado não tinha o dever de garantir a dívida, nem de garantir rigorosamente nada daquilo que tinha sido o objetivo do Governo anterior. Este faz e desfaz por critérios puramente ideológicos foi nefasto. Isto levou a que, quando a companhia precisou de ajuda, como todas as companhias da Europa precisaram, como nesse momento já era pública, a Comissão Europeia não permitiu essa ajuda, ao contrário do que aconteceu com a Lufthansa e de todas as outras que tiveram ajudas de Estado excecionadas, com critérios muito específicos, em que os Estados já foram a maior parte deles ressarcidos e alguns até com lucros.
É o caso da Lufthansa...
Exato. A TAP, como era pública, foi impedida de recorrer a esse processo e passou a ser alvo de uma ajuda do Estado, com obrigação de despedimentos e de reestruturação. E vem agora o ministro Pedro Nuno Santos, o pai da geringonça, o grande combustível da geringonça, perguntar o que é que o PSD fazia para salvar a TAP. Não, o que tem de ser dito é que perante a decisão que tomou – a decisão que ajudou a tomar há sete anos – condicionou anos mais tarde a posição da companhia. Não pode agora apontar o dedo ao PSD e perguntar o que faria nessa situação. A asneira foi cometida há sete anos e condicionou a companhia. Hoje vai ser vendida ao desbarato.
E passou de empresa de bandeira e estratégica para o país para ser preciso encontrar um parceiro para salvar e manter a sua sobrevivência.
Quase todas as companhias na Europa foram privatizadas na década de 90 e no início da década de 2000 e não perderam o conceito de companhia de bandeira. A Lufthansa, a British Airways são companhias de bandeira que servem estrategicamente os seus países, mas têm estruturas de capital privado. E continuam a ter interesse estratégico para o país. Agora, é preciso alinhamento estratégico, alinhamento só ideológico leva a estes disparates, disparates esses em que este Governo é pródigo.
Se não tivéssemos assistido a estes reversões teríamos evitado a saída de trabalhadores e estaríamos a apostar na renovação de novas rotas e novos aviões?
Claro, isso é o que vimos nas outras companhias. Claramente que isto teria sido evitado, porque o problema não foi só este. O Partido Socialista, nesta senda de garantir as suas clientelas, além do processo de reversão da nacionalização colocou lá a sua entourage, os seus boys. Esses boys foram criar conflitos no modelo de governo interno. Os administradores colocados pelo privado estavam em conflito permanente com os administradores colocados pelo Governo. Este caldo de cultura socialista profundamente alimentado em clientelas, muitas vezes obscuras, levou a que a companhia cometesse erros de gestão e depois impossibilitou a companhia de receber ajudas, como receberam todas as outras por essa Europa fora, levando a este descalabro. Hoje temos milhares de trabalhadores em risco, o tal caráter estratégico da companhia a perder-se. O que seria se um Governo liderado pelo PSD estivesse a fazer um processo de privatização completamente às escondidas. Fala-se à boca pequena pelos corredores todos deste país, que é tão pequenino, que várias companhias têm vindo a Portugal e estão a fazer processos de avaliação da TAP. Tudo às escuras, tudo à revelia da Lei Quadro das Privatizações.
Quando for anunciado não se vai saber quem foram os interessados, nem as propostas em cima da mesa...
Como é lógico. A política deve ser escrutinada pelos media, pelos eleitores, pelas populações e pelos partidos que estão na oposição. Esse escrutínio é saudável. O processo de privatização do Governo de Passos Coelho teve dois momentos. Teve um primeiro momento que foi um buraco com um investidor sul americano que depois não revelou ter as condições para acompanhar as exigências que o Estado tinha. E depois tivemos um segundo momento. Nesses dois momentos, a Lei Quadro das Privatizações foi respeitada. Foi tudo transparente, houve discussão, debates televisivos, entrevistas nos media, até a sociedade civil se movimentou com movimentos cívicos, como o ‘Não nos TAPem os olhos’, agora não vejo esses movimentos sequer a levantarem um dedo. O que quero dizer com isto? Quero dizer objetivamente que havia uma orquestração do Partido Socialista e de algumas forças à esquerda e da extrema esquerda que estavam a apoiar o Partido Socialista para alimentar este caldo de cultura de enorme sobressalto social. O movimento ‘Não tAPem os olhos’ é um bom exemplo disso. Pergunto onde pára agora o cineasta António Pedro Vasconcelos e toda essa gente que fez parte desse movimento, que não diz rigorosamente nada sobre um processo de privatização completamente obscuro feito às escondidas nos corredores e nos gabinetes do ministro. Num Estado de Direito, num Estado democrático que exige transparência e escrutínio, isto é tudo aquilo que não precisávamos neste momento.
Acha que esses movimentos são mais tolerantes por estamos perante um Governo socialista?
Parece que sim. Mas o PSD não permitirá esse silenciar deste desbaratar do dinheiro dos portugueses. O PSD será uma voz audível, defensora do interesse nacional, do erário público e daquilo que são os impostos que os portugueses pagam para fazer face a este desbaratar do Governo socialista que, nos últimos anos, tem engrossado um Estado que hoje garante maus serviços, aumenta as suas clientelas numa estratégia puramente eleitoralista, puramente de sobrevivência partidária, nunca colocando os interesses nacionais à frente dos interesses partidários e do seu grupinho.
E como vê as polémicas em torno da sua gestão? Primeiro foram os prémios, depois a renovação da frota, agora a contratação de uma nova diretora com ligações à CEO.
Vejo com um misto de perplexidade, mas de normalidade socialista. A normalidade socialista são casos atrás de casinhos. Aquilo que temos visto no Governo e a TAP é o espelho dessa normalidade socialista. A normalidade socialista é o empobrecimento, é o nivelar por baixo e garantir que cada vez mais portugueses dependam do Estado direta ou indiretamente para a manutenção do poder socialista. Costumo usar esta imagem que é um bocadinho o que aconteceu nos Açores com 20 anos de socialismo: hoje é a região mais pobre da Europa, não é só de Portugal, onde mais de 70% da população depende direta ou indiretamente do Estado, seja através de RSI, de apoios sociais ou de emprego público. Isto é o socialismo a servir os seus próprios interesses e o que está a acontecer na TAP é a normalidade socialista. A paz laboral já não existe, existe conflito interno entre sindicatos e administração, em que a administração não fala com os sindicatos. Pior: estou profundamente convencido – e estou a medir as palavras – que hoje a companhia não é gerida por esta administração. A TAP hoje é gerida do gabinete do ministro Pedro Nuno Santos. Isto ainda é mais grave e há sinais de que isso é verdade, exemplo disso é a frota automóvel, em que a administração tomou uma decisão e, fruto do burburinho mediático, estou convicto que teve indicação do gabinete do ministro para tentar atenuar. Esta administração é uma administração zombie, que já não tem poder.
O que achou das declarações do ministro Pedro Nuno Santos esta semana no Parlamento? E em relação ao envio para o MP da auditoria à compra de aviões?
Tudo deve ser apurado ao mais ínfimo detalhe. Nada deve ser escondido. Mas deixe-me que lhe diga que o PSD não se deixa condicionar por tentativas de distração do que realmente interessa. E neste caso o que interessa é saber o que o PS fez à TAP desde 2015 até agora. Destruiu um ativo estratégico. Destruiu valor. Mostrou total incapacidade de gestão e não tem uma visão estratégica para o futuro da TAP. E agora, para cúmulo, com uma enorme desfaçatez e com a sua habitual arrogância, Pedro Nuno Santos vem perguntar o que o PSD faria para salvar a TAP. Ora o pai da geringonça, o obreiro da renacionalização e pior aquele que pela sua total incompetência impediu a TAP de usufruir dos mesmo instrumentos que as suas congéneres europeias, esse sim, deve explicar o que fez e como pretende agora privatizar a companhia. Creio que a queixa que Pedro Nuno Santos faz visa não só as gestões anteriores, o seu antecessor Pedro Marques, a estratégia de António Costa e de Lacerda Machado, e de mais de uma dezena de administradores nomeados desde 2016 para a TAP pelo Governo do Partido Socialista. Levanta também suspeitas sobre contratos e pagamentos que ocorreram desde 2016, aviões em utilização desde 2018... tudo isto em finais de 2022, no dia de ida a uma Comissão Parlamentar explicar incompatibilidades entre o cargo de ministro e uma empresa familiar. Está tudo dito sobre o ministro mais trapalhão deste Governo.
Sente que o ministro está a ‘culpar’ o PSD por esta aquisição?
Pelo menos está a tentar fazê-lo
com esta infantil fuga para a frente. O modelo de privatização da TAP em que
participei previa que em
Pedro Nuno Santos disse em 2021 que Portugal não terá uma ‘TAPzinha’. Com este cenário estamos perante uma ‘TAPzinha’?
Já a temos, infelizmente. Desde o processo de renacionalização, aquela ambição que existia para a companhia tem vindo a decrescer, depois tivemos a covid que agravou todo esse processo e hoje temos uma TAP limitada que não pode comprar mais aviões, porque no plano de reestruturação foi limitada essa capacidade, teve de proceder a despedimentos, foi obrigada a reduzir a sua capacidade e temos de facto uma ‘TAPzinha’. Infelizmente, a TAP vai ser vendida ao desbarato e por culpa da forma profundamente ideológica como o Partido Socialista gere e devido à falta de sentido de Estado com que o Partido Solista governa o país.
Acha normal que este tema não esteja mencionado no Orçamento de Estado para 2023?
Este Orçamento de Estado é outro exercício da normalidade socialista, que é a apresentação do Orçamento para inglês ver, porque depois nada é executado. Foi assim com Mário Centeno, é assim com Fernando Medina. E será assim recorrentemente. Apresentam-se Orçamentos de Estado para inglês ver ou para servir os interesses das coligações, geringonças ou outros que tais, para depois não serem executados. Em Portugal cometemos o erro de discutir muito a apresentação do Orçamento de Estado e não a sua execução. Era interessante que ganhássemos uma cultura democrática e daqui a um ano estivéssemos a discutir a sua execução para percebermos se foi ou não cumprido. Os políticos hoje são uma classe depreciada em termos de credibilidade, cada vez menos os cidadãos acreditam nos políticos por estes exercícios de ilusão, por estes exercícios de tentar constantemente enganar, convencidos de que os portugueses são pouco capacitados para analisar isto. Acho que hoje já todos os portugueses perceberam que os exercícios dos Orçamentos de Estado socialistas são uma pura ilusão.
É para cumprir calendário?
Para cumprir calendário, para
cumprir uma agenda mediática, para garantir que a imagem de investidores
perdura, quando sabemos que não investem no SNS, não investem na educação
pública e não investem na administração pública, que hoje tem serviços piores
do que tinha. Investe-se
Essa análise poderia ser uma forma de responsabilização? É como o PRR que em termos de execução apresenta níveis muito baixos...
Isto é assim nos últimos sete
anos. Mas o Partido Socialista tem agora o Partido Social Democrata que vai ser
audível, que vai estar constantemente a apontar o dedo e não nos apontem o dedo
do ‘Então o que é que o PSD faria’. O PSD a seu tempo apresentará o seu modelo
para o país, agora é tempo de descortinar este desgoverno socialista. É fácil
para o Partido Socialista estar constantemente a atirar areia para os olhos dos
portugueses com ‘Então digam como fariam’. Não, quando fomos Governo fizemos,
não tivemos medo e até com custos que ainda hoje estamos a pagar, porque
tivemos de governar numa situação de calamidade nacional, de emergência
nacional. Não governámos com o nosso programa. Infelizmente, nos últimos 27
anos estivemos sete anos no Governo a executar praticamente programas de
emergência. O problema não foi nosso, foi o desgoverno de António Guterres e o
desgoverno de José Sócrates. O nosso histórico é de sentido de Estado e de um
partido que quando é chamado a ajudar os portugueses e a ajudar Portugal está
disponível, mesmo abdicando dos seus próprios sucessos eleitorais e dos
sucessos a curto/médio prazo. Mas sabemos que os portugueses reconhecem que o
PSD é um partido sério, que está sempre junto deles, quando mais precisam. Com
o PS há um enganar com mil milhões de euros a menos no sistema de pensões e
tentaram passar entre os pingos da chuva. O PSD não permitiu isso, e disse-o
bem alto. Este novo PSD estará sempre na linha da frente para apontar o
desgoverno socialista e para dizer o que estes senhores estão a fazer ao país,
pondo em causa as gerações vindouras. Como pai tenho a obrigação moral de dizer
muito alto que o Partido Socialista está a empobrecer os portugueses. Vamos
entregar aos meus filhos, aos nossos filhos, um país mais pobre, menos capaz de
aguentar este ritmo alucinante de um mundo
Mas nem todos têm acesso.
Sou um defensor absoluto do SNS, sou um defensor absoluto de que o Estado tem de provir e de garantir serviços de saúde de qualidade a todos aqueles que mais precisam. Esta obsessão de anti-privados, de isolar o SNS, de não permitir que funcione de forma sinérgica entre o setor privado, o público e o terceiro setor não faz sentido. O PSD é um partido das liberdades, um partido humanista que acredita nas pessoas, no potencial das empresas, dos empreendedores para fazer crescer o país e fazer uma redistribuição justa. E uma redistribuição justa para quê? Para que a escola pública garanta mobilidade social. Estudei numa escola pública e nunca me senti inferiorizado. Hoje, cada vez menos isso acontece e os pais têm que fazer um esforço hercúleo para poderem colocar os seus filhos na escola privada, nomeadamente nas áreas metropolitanas.
Ao mesmo tempo há benefícios em termos de IRS e os 125 euros. Parece-lhe o suficiente para ajudar no combate à inflação?
É ilusão. As ajudas às famílias que foram projetadas na covid não foram praticamente executadas. Essa é a realidade. O Partido Socialista é pródigo e é uma máquina de comunicação brutal, em que comunica, comunica, comunica, engana, engana, engana e não entrega nada. Os portugueses sabem que estão mais pobres, sabem que não têm capacidade de poder compra e sabem que não têm um Estado Social capaz de lhes acudir quando mais precisam. No entanto, os portugueses estão a abrir os olhos.
Como vê o acordo com os parceiros sociais? Afinal a redução do IRC_é só para as empresas que subam os salários...
Os acordos em sede de Concertação Social são sempre positivos. Podíamos ter ido mais além, mas é sempre aquela visão do copo meio cheio, meio vazio.
Como ex-secretário de Estado das Infraestruturais como vê este impasse em torno do novo aeroporto e a recuperação do projeto de alta velocidade?
Penso que há projetos que podiam encontrar consensos nacionais e deviam ser alicerçados em opiniões técnicas e não políticas. Não é ideológico escolher a localização do aeroporto A, B ou C. Ideológico é escolher o formato de financiamento, a sua forma de gestão. Agora a localização é puramente uma decisão técnica. A alta velocidade é mais um exemplo da propaganda socialista. Quando está a braços com a TAP e aeroporto, atira areia para os olhos dos portugueses, requenta um assunto antigo que é o da alta velocidade. Uma parangona com mais de 25 anos e depois quando vamos ler com rigor as páginas do PowerPoint comunicacional do Governo vemos que afinal vai parar no Carregado, afinal não vai chegar ao Porto nesta primeira fase. Só será 1h30 numa terceira fase e não tem calendário. Quanto ao aeroporto, a metodologia que o PSD sugeriu e teve a aceitação do Governo dá muito mais transparência ao processo. Aos técnicos o que é dos técnicos, agora é tempo dos técnicos avaliarem, apresentarem relatórios, os prós e os contras de cada uma das soluções, o financiamento, prazos para depois os políticos tomarem decisões.
O PSD continua a defender a mesma localização de há sete anos?
O mundo mudou muito. O PSD há sete anos deixou uma decisão tomada, que foi Montijo. Mas o PSD hoje é um partido que tomou uma posição séria em prol do país ao dizer ‘vamos fazer uma análise comparada por técnicos independentes, pela academia, pelas obras públicas, pelo ambiente’, com uma multiplicidade de técnicos setoriais, que depois vão apresentar, sem qualquer tipo de espartilho ou de limites, uma avaliação transversal sobre aquilo que será o futuro aeroporto. Ao contrário de todos aqueles milhões que foram gastos em estudos parcelares, com uma visão ou uma localização já prevista. E com esse relatório, os políticos daqui a um ano não terão desculpas para não tomar uma decisão.
Poderá ser Montijo, Alcochete ou, até mesmo, Santarém?
O PSD disse de uma forma muito clara que deixava à comissão técnica e ao Governo estudar todas localizações que entendessem relevantes, desde que justificadas. Podíamos ir defender a nossa posição de há sete anos, mas não colocamos essa visão dogmática, nem dissemos que sabíamos tudo. O Governo colocou Santarém, Montijo, Alcochete e entendeu, por sugestão do PSD, atribuir à comissão técnica a capacidade de introduzir outras localizações. Depois os políticos não têm desculpa para continuarem a adiar o futuro. Adiar o futuro é para os socialistas. No PSD não adiamos o futuro. Quando somos Governo tomamos decisões e quando não somos, como é o caso, ajudamos o Partido Socialista a tomar decisões porque, pelos vistos, o Partido Socialista não é capaz de tomar decisões sozinho.
Este PSD mostra uma visão diferente da que tinha sob a liderança de Rui Rio?
É natural que uma nova liderança traga novas visões. Mas PSD só há um, não é o PSD de Luís Montenegro ou o PSD de Rui Rio. O anterior líder do PSD defendeu uma avaliação de impacto estratégico e o PSD atual manteve essa posição, logo o respeito pelo legado é muito importante. Não se fez tábua rasa, não se fez aquilo que o Partido Socialista fez quando chegou ao Governo e fez tábua rasa em relação a uma série de decisões anteriores. Reverteu os STCP, a concessão da Carris e do Metro e a privatização da TAP. Reverteu isso tudo e com custos enormes para os portugueses. Não fizemos isso, houve respeito pelo legado, mas há diferenças objetivas – se não houvesse, Luís Montenegro não se teria candidatado. Há diferenças na forma, no conteúdo, na equipa. Acho que hoje é claro para todos que o PSD é mais aguerrido, mais capaz e acutilante a fazer oposição. E somos cada vez mais alternativa a este Partido Socialista, os portugueses hoje olham para o PSD como um partido alternativo ao Partido Socialista, com gente capaz e com um líder à altura do momento que o país vive e esse líder é Luís Montenegro.
E tem de ser uma oposição forte, quando o Governo dá sinais de desgaste e quando assistimos a estes casos de incompatibilidades dos ministros?
Esses casos e casinhos espelham muito a dimensão ética do Partido Socialista quando olha para o poder, mas isso não afeta o dia-a-dia da vida dos portugueses. Essa oposição tem de ser feita. Temos de exigir à justiça o que é da justiça e não somos nós que temos de estar a apontar o dedo. E também não é a quente que devemos rever a lei das incompatibilidades, a seu tempo esse trabalho tem de ser feito, até para credibilização da classe política. Estes casos só contribuem para depreciar a classe política e a capacidade de poder convocar para a política gente boa da sociedade. Os bons homens e as mulheres talentosas que possam vir para a política estão-se a afastar. Temos de redefinir isso, criar novas formas de transparência e de credibilidade. O nosso foco é claro: temos uma preocupação genuína com os portugueses, com aquilo que os portugueses estão a perder, com o empobrecimento e com fraca qualidade dos serviços públicos. Não perdemos um segundo com faits divers, com casos e casinhos. Esses casos e casinhos devem ser resolvidos e sancionados, se for caso disso.
O PSD agora está com a casa arrumada para avançar para eleições, num cenário de eleições antecipadas?
Penso que Luís Montenegro já foi claro: o projeto liderado por si é um projeto a quatro anos. Estou convicto que os portugueses darão ganho de causa a este projeto transformador de Portugal que Luís Montenegro quer trazer para este banho de alma, de vontade e de ambição para Portugal. Mas a seu tempo, sem pressas, porque as pressas também são inimigas dos portugueses. O interesse do PSD não é rapidamente chegar ao poder, fruto de uma crise em que o país e os portugueses saiam todos prejudicados.
Caso contrário temos um cenário de déjà vu?
O interesse do PSD são os portugueses e chegaremos ao Governo quando tivermos de chegar e nas condições em que tivermos de chegar. Nessa altura, governaremos e implementaremos as nossas soluções. Esperemos que isto não seja às custas de uma profunda crise social, de uma profunda crise económica, de uma profunda crise de credibilidade política, porque infelizmente tem sido essa a história. Todas as vezes que Portugal foi intervencionado e precisou de pedir ajuda externa foi fruto do socialismo, da tal normalidade socialista que infelizmente se configura em empobrecimento, em clientelas, em pôr o Estado ao serviço do partido e não o partido ao serviço do Estado. Somos absolutamente contra esta forma de olhar com propriedade sobre o Estado e somos audíveis a dizê-lo. A nossa visão é de profunda liberdade: ao Estado ao que é do Estado; aos portugueses o que é dos portugueses; à iniciativa privada o que é da iniciativa privada. O Estado deve existir para garantir igualdade de oportunidades a todos os portugueses, garantir um Estado social capaz, mas que não consuma toda a capacidade de investimento do país e oferecendo serviços piores. Queremos oferecer serviços melhores.
Mas o PSD tem agora mais concorrência como o Chega e a Iniciativa Liberal...
Volto a dizer que o PSD não perderá um minuto do seu tempo a discutir outros partidos. São epifenómenos, do meu ponto de vista. Estes quatro anos e meio foram para o PSD um momento de clarificação ideológica que levaram a um espartilhar do centro direita. Este PSD é um PSD com uma visão diferente, com uma visão mais abrangente daquilo que são os problemas da sociedade e é um PSD tendencialmente maioritário. Diria que o PSD de Montenegro é um PSD à Cavaco, é um PSD à Passos Coelho. É um PSD maioritário que não depende de outras forças políticas para governar e é legítimo ao PSD ter essa ambição maioritária, tal como o Partido Socialista tem hoje, tendo duas forças extremistas à sua esquerda, como é o Bloco de Esquerda e o PCP. Porque é que o PSD não pode ter a ambição de ter uma maioria estável para governar tendo forças políticas à sua direita? Tudo o que estamos a fazer hoje é para combater e para deixar claro o que é que o Partido Socialista está a fazer, mas também para mostrar as nossas diferenças, mostrar ao que vamos e, dessa forma, ganhar outra vez a confiança dos portugueses. Não alinharemos em discussões prematuras se há coligações, se não há coligações, se governamos com o Chega, se governamos com a Iniciativa Liberal. Não queremos saber disso. A nossa discussão hoje é olhos nos olhos dos portugueses e dizer-lhes o que é que o Partido Socialista está a fazer: a empobrecer os portugueses, a destruir o Estado Social, a destruir a nossa capacidade de crescimento e de investimento. Por outro lado, o PSD está cá para fazer diferente, para garantir que crescemos mais do que os nossos parceiros europeus, para garantir esperança aos portugueses, garantir um Estado capaz. Esse é um PSD maioritário e não estamos dependentes nem da Iniciativa Liberal, nem do Chega, nem de A, nem de B ou de C. Essa é a vocação do PSD e qualquer outra discussão é estéril, é dar espaço e palco artificial a epifenómenos que acredito que a médio prazo vamos ver desaparecer na vida política portuguesa.
E com o parceiro histórico do PSD que é o CDS?
O CDS é um partido que faz falta à democracia portuguesa e fruto desta voracidade mediática, como não tem representação partidária parlamentar, tem muita dificuldade em comunicar. É um partido que foi parceiro do PSD em muitos momentos da governação. É um partido amigo do PSD. Espero convictamente que o CDS possa vir a ultrapassar este momento difícil da sua história. Temos coligações com o CDS em muitas autarquias por este país fora e temos uma história, um legado.
O que diz dos nomes que têm sido apontados para as Presidenciais? Marcelo lançou Passos Coelho mas também se fala de Luís Marques Mendes e de Paulo Portas...
Essa é mais uma discussão extemporânea, prematura. São todos nomes que são absolutamente incontornáveis da vida democrática portuguesa e todos eles foram homens que deram muito ao país. Tenho pena de não estarem, por exemplo, mulheres, porque também há muitas capazes de poder estar nessa lista. Não escondo que sou amigo e tenho uma enorme estima e consideração por Pedro Passos Coelho. Naturalmente que é um homem que deu muito ao país e continuará a dar. Tem sido tema esta última semana, mas penso que a decisão sobre as presidenciais é uma decisão muito pessoal e não cabe a nós espetadores, porque não tenciono candidatar-me, opinar. Só quando essa decisão pessoal for tomada então é a altura de os partidos tomarem decisões. Os partidos, nessa altura, serão chamados. Este é o tempo das reflexões pessoais. Mas disse nomes que tenho enorme estima: Luís Marques Mendes foi líder do PSD, um homem altamente preparado. Paulo Portas é um homem altamente preparado, e Pedro Passos Coelho.
Pedro Passos Coelho tem estado fora da vida politica, apesar de este ano ter aparecido na Festa do Pontal...
Terá de ser uma decisão dele e esse respeito também tem de lhe ser concedido. Então para um homem que deu tanto ao país como deu... O país hoje deve, do meu ponto de vista, muito a Pedro Passos Coelho e ao seu espírito de sacrifício, à sua abnegação e à sua paixão profunda por Portugal. Essa sua paixão permitiu que, num momento difícil, não abandonasse o barco, num momento difícil levou-o até ao fim. Foi até muitas vezes acusado de ter sido demasiado dogmático, demasiado cristalizado nessa vontade absolutamente incontornável de ultrapassar as adversidades, mas se não fosse assim, não tínhamos conseguido ultrapassar o que ultrapassámos e não tínhamos tão rapidamente como fomos capazes de sacudir e de sair desses espartilho da troika como saímos. Foi herdeiro de um programa assinado por José Sócrates de profunda austeridade, conseguiu executar e conseguiu libertar o país dessas garras. E isso deve-se a ele. Só a ele. Sacrificando o seu nome, a família, amigos, sacrificando votações e resultados eleitorais, sacrificando tudo para o país. Ora, isto tem que ser reconhecido pelos portugueses.
Sónia Peres Pinto | Jornal i
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