quinta-feira, 4 de maio de 2023

Angola | O PRIMEIRO DE MAIO EM LUANDA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O revisor Rui Ramos ataca de novo a verdade dos factos históricos nas páginas do Jornal de Angola. No 25 de Abril investiu com aldrabices e falsificações na companhia do deputado da UNITA, Justino Pinto de Andrade. Tentei reparar os danos causados à História Contemporânea de Angola e às gerações que não viveram aquele acontecimento em 1974. A minha resposta não foi considerada. O falsário hoje volta a falsificar.

 Desta vez o revisor entrou a matar tudo quanto é a verdade dos factos. Escreveu que no dia 1 de Maio de 1974 nada aconteceu em Luanda. E invocou o jornal “A Província de Angola” para justificar tal afirmação. Escreveu ele: “Na Mutamba havia a calma habitual de um dia feriado e nos bairros africanos a vida decorria normalmente, sem os mínimos sinais próprios de uma data comemorada mundialmente”. Tudo aldrabices. Nesse Primeiro de Maio o dia ainda não era feriado. Nos musseques houve grande agitação que foi reprimida pela polícia. Trabalhadores da Condel foram presos. Trabalhadores da Mabor foram presos. Trabalhadores da Fapobol foram presos.

Por falar em Mabor, a fábrica de pneus acaba de fechar. José Campelo foi o seu director-geral, um apoiante do MPLA que depois fez parte do governo do almirante Rosa Coutinho. Grande camarada. Mesmo tendo ficado mais do lado da Revolta Activa. Quem nunca errou na vida que atire a primeira pedrada.

No dia 1 de Maio de 1974 a Mutamba foi palco de uma manifestação popular convocada por várias organizações políticas, inclusive por activistas do MPLA. A PIDE ainda existia. A Policia de Segurança Pública tinha o mesmo comandante. Mas o engenheiro Santos e Castro, governador fascista e apoiante da independência branca, já tinha sido recambiado para Lisboa. À hora marcada estavam algumas centenas de manifestantes na Mutamba. Dadas as circunstâncias, uma multidão corajosa.

Em frente ao edifício da Fazenda (hoje Ministério das Finanças) estava a cabeça da manifestação com duas jovens empunhando uma grande tarja branca com as palavras ABAIXO O COLONIALISMO VIVA ANGOLA INDEPENDENTE. Pouco antes da manifestação partir em direcção ao Palácio da Cidade Alta, onde os manifestantes iam exigir a libertação imediata dos presos políticos, a polícia apareceu e os agentes arrancaram a tarja das mãos das manifestantes. Alguns jovens enfrentaram a polícia e foram também detidos. Todos atirados para dentro de um carro celular e levados para parte incerta.

Um manifestante subiu para um dos bancos da Mutamba, então paragem central dos autocarros urbanos, e dirigiu-se aos manifestantes: Vamos para o Palácio da Cidade Alta exigir a libertação dos detidos! Uma das jovens era Rita Barreto Lara, chefe da secretaria do Liceu Paulo Dias de Novais. A outra era Maria Orquídea Augusto, professora na Escola João Crisóstomo e directora técnica da Farmácia Orquídea, no Bairro Popular. Os manifestantes foram mesmo para o Palácio da Cidade Alta. À porta estavam agentes da PIDE exibindo pistolas à cintura. E agentes da PSP armados. Os oficiais do MFA conseguiram a libertação dos manifestantes, ao fim da tarde daquele Primeiro de Maio.

O revisor Rui Ramos, reformado da empresa de Pinto Balsemão, quando foi trabalhar para o Jornal de Angola, após umas férias de um ano no Hotel Tivoli à custa do MPLA, disse que tinha todo o tempo do mundo. Mas logo no segundo dia alegou que estava quase cego e afinal tinha que distribuir livros pelo país. Hoje deve estar completamente cego. Porque o jornal A Província de Angola de 1 de Maio de 1974 publicou na primeira página uma foto com as duas jovens (brancas!) e a tarja exigindo a Independência de Angola. O jornal Diário de Luanda publicou na primeira página uma foto do manifestante falando às massas, em cima de um banco na Mutamba. O que leva o revisor a mentir e falsificar? Coisa estranha.

O revisor cegueta diz que a Escola Comercial Vicente Ferreira era adjacente ao Largo Primeiro de Maio e por isso foi baptizada de Escola Primeiro de Maio. Mais uma aldrabice. O estabelecimento de ensino adjacente era a Escola Industrial de Luanda. No topo (lado do Hospital Militar) estava o Liceu Feminino Dona Guiomar de Lencastre. A Escola Comercial Vicente Ferreira ficava no Bairro do Café mesmo em frente ao prédio onde vivia o antifascista e advogado Eugénio Ferreira. 

A aldrabice mais grave é esta: ”As estruturas centrais dos movimentos de libertação começam a chegar a Luanda, a partir dos fins de 1974, com os acordos já assinados com Portugal e, em Luanda, pelo menos o MPLA encontra um ambiente político favorável à sua implantação”. O revisor enlouqueceu. O MPLA estava implantado em Luanda até ao mais profundo das suas raízes. Escrever que encontrou um ambiente favorável à sua implantação é falta de respeito por todos os que dirigiam e militavam no movimento.

A parte que se segue é mais delírio de kapuka. Escreve o revisor reformado da empresa de Pinto Balsemão: “Os Comités Henda, por sua vez, produziam o jornal "4 de Fevereiro” e instalaram-se na garagem do DIP central do MPLA, na Vila Alice, lançando a primeira agência de notícias da Angola prestes a ser independente”. O homem não sabe o que é uma agência noticiosa. Não sabe o que é jornalismo. Só sabe acumular tachos e para os manter é capaz de tudo, até inventar uma agência de notícias na “garagem” do DIP na Vila Alice.

Neste rol de falsificações, o revisor Rui Ramos já fala de Aristides Van-Dúnem, ao qual chama “o dirigente executivo da UNTA”. Mas insiste na aldrabice ridícula de Agostinho Mendes de Carvalho ser sindicalista!  

Um erro grave tem de ser corrigido pelo Jornal de Angola. Podem silenciar os outros mas este não. O revisor cegueta diz que numa manifestação da UNTA existia um caderno reivindicativo que incluía a exigência da “destituição do alto-comissário português Leonel Cardoso, acusado de favorecer a FNLA”. O alto-comissário era o general da Força Aérea Silva Cardoso. Foi mesmo afastado pela comissão coordenadora do MFA em Angola. Ficou no seu lugar o almirante Leonel Cardoso que, com tremendos sacrifícios, levou o processo de descolonização até ao fim, apesar de Lisboa ter suspendido o Acordo de Alvor. Confundir um homem honrado com um fantoche é crime e grave.

Sobre a tomada de posse do Governo de Transição, escreve o revisor Rui Ramos: “Agora havia um Governo que incluía os movimentos de libertação com projectos de Independência diferentes e por vezes antagónicos o que, além de legítima expectativa, criava também desconfianças mútuas e muita intolerância e sectarismo”. Este é o paleio dos sicários da UNITA e dos colonialistas ressabiados. MPLA, FNLA e UNITA assinaram um documento em Mombaça no qual abdicaram dos seus programas e projectos para se apresentarem ante a potência colonial com uma posição única, até ao fim do processo de descolonização com a realização de eleições. UNITA e FNLA abandonaram o Governo de Transição para não chegarmos às eleições.

O revisor cegueta diz que O Acordo de Alvor foi assinado no início de Janeiro de 1975 e logo a seguir o Governo de Transição tomou posse. Falso. No início de Janeiro foi assinado o Acordo de Mombaça entre os três movimentos. O Acordo de Alvor foi assinado no meio do mês de o Governo de Transição entrou em funções no último dia de Janeiro. Isto é inadmissível.

O revisor foi “enviado especial” a Cabo Verde no Centenário de Agostinho Neto. Descobriu uma a pensão onde Neto e a família não estiveram e entrevistou o administrador de um hospital chamado Agostinho Neto, na Cidade da Praia. Mas não foi à ilha de Santo Antão para onde Agostinho Neto foi deportado e exerceu medicina como delegado de saúde. Lá é que estava a matéria de reportagem. O artista não foi lá. Não é jornalista. Foi depois passear, escreveu umas patacoadas e depois dá cá a massa e as ajudas de custo.

Em sociedade com o deputado da UNITA Justino Pinto de Andrade conspurcou as honestas páginas do Jornal de Angola com mentiras graves, falsificações e manipulações. A verdade dos factos, por mim revelada não teve guarida.

Agora o revisor cegueta volta a mentir e falsificar. Espero que desta vez o Jornal de Angola não permita que a aldrabice faça caminho. Porque se amanhã houver um cataclismo e apenas ficar uma cópia de hoje do jornal, o que fica a valer é a falsificação e a mais confrangedora falta de rigor. Mas importante, importante é que hoje a Heroína Luzia Inglês (Inga) participou na manifestação do primeiro de Maio, com os reformados. Nem tudo está perdido na luta do MPLA pela Justiça de a Liberdade.

Ismael Mateus escreveu hoje isto no Jornal de Angola: “Nunca é demais referir que os Media desempenham um papel crucial na sujeição da corrupção ao escrutínio público e na luta contra a impunidade”. Não aplaudam antes do tempo. Ponto primeiro. A corrupção é a alma do sistema capitalista. Sem ela nada funciona. Ponto dois. Os Media já não são espaços de liberdade. São antros de poderes instalados, cada vez mais ilegítimos. 

Um canal de televisão, uma estação de rádio ou um jornal quando entram no “combate à corrupção” podem estar apenas a defender os interesses dos donos. E esses interesses quase sempre passam pelo afastamento de quem lhes faz sombra no negócio. Ou estão ao serviço de poderes legitimados pelo voto popular que querem sacar as fortunas aos “denunciados”. Cuidado com os aprendizes de feiticeiro!

* Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana