quinta-feira, 11 de abril de 2013

OS “GENDARMES” DA COLONIZAÇÃO DE ÁFRICA NO SÉCULO XXI




Martinho Júnior, Luanda

1 – A França nunca deixou de ter presença militar em África desde que constituiu o seu império colonial e isso tem sido a garantia dum processo que, apesar das independências formais, faz sobreviver o colonialismo e a dependência para dentro do século XXI.

O esforço militar francês em África teve sempre razões económicas e financeiras em suporte de interesses expressos em multinacionais como a AREVA, a TOTAL, o grupo Bolloré, entre muitos outros; essas são as ênfases causais mais irredutíveis dos interesses da França em África, das suas oligarquias e de sua geo estratégia.

Por causa disso, necessário é para a sobrevivência da “FrançAfrique”, o estado de torpor e de “caos controlado” nas nações subjugadas e cronicamente subdesenvolvidas, uma parte delas possuindo os Índices de Desenvolvimento mais Baixos da Humanidade, recorrendo a uma imensa panóplia de métodos, expedientes e actores.

A dependência é tal que essas nações (grande parte delas do espaço CEDEAO), jamais se conseguiram libertar das grilhetas dum sistema perverso, tão dominante quão abrangente, tão decisivo como persuasivo, tão “inteligente” como saqueador…

Desse modo a França nunca deixou de constituir-se num “fazedor de reis” impondo seus cenários e fantoches, nem que para tal se sucedam as rebeliões e os golpes de estado, os golpes de estado e as rebeliões, num ciclo infernal que tendo sido desencadeado no século passado, está longe de parar e procura contaminar toda a África!

França, por via da “FrançAfrique” e dado o seu comportamento crónico de grande potência disposta ao saque, tornou-se efectivamente numa ameaça constante para todo o continente, de tal modo que esse facto é deliberadamente ocultado por quem dirige os destinos da União Africana (ninguém na União Africana o declara, quando isso é por demais evidente).

O espaço CEDEAO é a sua vítima mais dilecta, mas a União Africana, enredada nessa conjuntura, quantas vezes tem facilitado a presença militar francesa como se de um aliado se tratasse, como se tratasse dum “parceiro” fiável, para que tudo possa continuar na mesma, ou seja, para que se prolongue o colonialismo por todo o século XXI?!

São três os últimos exemplos todos eles encadeados e com nexos: Líbia, Mali e República Centro Africana, mas como na União Africana não há alguém que pense ou aja em termos dialécticos consequentes a favor daqueles que sofrem em pleno século XXI e opressão e todas as ementas que compõem ingerência e manipulação, outros mais se irão seguir!

2 – A ameaça deriva do carácter geo estratégico da “FrançAfrique”, uma articulação que tem esqueleto militar e uma panóplia de esforços de inteligência a acompanhar a implantação económica e financeira, fazendo proliferar os riscos em direcção ao sul do continente.

As principais bases militares conseguidas para além da colonização instalaram-se no Senegal, na Costa do Marfim e no Gabão (costa Atlântica de África), no Tchade (bem no centro do Sahel) e em Djibouti (na costa do Índico Norte), mas as articulações vão-se espraiando noutros espaços territoriais e oceânicos, ali onde as correntes dos interesses determinam os regimes de intervenção que poderão ser indefinidamente alargados (nunca se sabe onde termina a ocupação e começa a intervenção e vice-versa).

Para o efeito a França desenha Acordos, Tratados e outras Convenções, quando e onde forem necessários do Índico ao Atlântico, abrangendo na prática toda a transversal este-oeste africana, tendo como eixo principal o Sahel.

É precisamente no Sahel onde existem os principais interesses minerais, a começar pelo urânio, no Mali, no Níger, no Tchade e na República Centro Africana e são precisamente alguns dos países que se inscrevem nos Índices de Desenvolvimento Humano mais Baixos.
O esquema colonial não evolui: exploração mineral no interior profundo do continente africanos, caminhos-de-ferro ou estradas de penetração onde for estritamente necessário e portos de exportação das riquezas africanas não transformadas.

O esquema militar acompanha essa estruturação: “testas-de-ponte” no litoral (necessariamente em maior número para garantir sempre as intervenções) e uma plataforma como o Tchade bem no miolo geo estratégico do Sahel!

A partir daí, nos oceanos e mares circundantes, como no interior profundo do continente, a gestão militar da coutada “FrançAfrique” está garantida e tem sido gerida ano após ano, década após década…

3 – É evidente que só os países africanos podem evocar a miragem de terem impedido os Estados Unidos de implantarem a sede do AFRICOM em África: com tantas bases francesas, quando a França está numa posição de vassalagem e integração na geo estratégia da hegemonia, bem longe da relativa “independência” dos tempos de Charles de Gaulle, por que raios precisa o Pentágono de se preocupar em colocar a sede do AFRICOM em África?

A França está bem ciente do seu papel, do seu enquadramento e das suas capacidades para montar os cenários e colocar os fantoches de conveniência, sem recorrer a essa coisa que é a “democracia representativa”, uma coisa ainda tão complicada para os africanos (“como eles são atrasados”, como eles “precisam da França” para resolver os seus próprios problemas)!

Além disso, desta forma tudo fica mais barato para a máquina militar norte americana, que está a ser empregue com todo o seu peso no Médio Oriente e agora no Pacífico, pelo que em África o AFRICOM só precisa de ser “soft”, com muitos “drones” (que os franceses também precisam) e alguns grupos de forças especiais para as intervenções pontuais e para a “formação”.

Na caça ao famigerado Kony do LRA do Uganda, os efectivos norte americanos e africanos da “missão” estão também dentro da República Centro Africana e provavelmente têm-se entendido bem mais com as forças militares francesas do que com as forças do regime deposto de François Bozizé, ou até com o Seleka e depois, com tantos “drones” ao seu serviço, puderam acompanhar em tempo real o choque dos rebeldes à sua chegada a Bangui, com os 200 homens da tão “emergentemente desamparada” África do Sul…

Os norte americanos não possuem uma arma como o Franco CFA, a moeda que de facto vai custeando muitas das despesas militares francesas, um processo que se arrasta à custa dos sucessivos orçamentos africanos e do saque das riquezas do continente!

Depois a França, em retribuição, possui os mesmos conceitos e coopera nas iniciativas correntes dos Estados Unidos:

- É capaz de contribuir para fabricar “amigos úteis” e “inimigos úteis”;

- É capaz de disputar as iniciativas da China, conforme acontece na Líbia ou na República Centro Africana, isto pelo menos enquanto as suas multinacionais não se enredarem com os interesses da China, ou de outros BRICS;

- É capaz de no seu espaço de domínio impedir presença militar de emergentes africanos e dos BRICS, conforme ocorreu subtilmente com os angolanos na Costa do Marfim e na Guiné Bissau, ou mesmo com a África do Sul na República Centro Africana;

- É capaz de contribuir par o redesenhar dos mapas do continente, pois a França entende melhor que outros as divisões étnicas que advém do passado, divisões étnicas que não se cansa de incentivar;

- É capaz de programar em direcção ao sul os factores de risco, de forma a colher os frutos das artificiosas desestabilizações que promove tendo como “ponto-ómega” a “charneira caótica” que constitui o território da República Democrática do Congo;

- É capaz de, contribuindo para manter a polarização entre o norte, oeste e centro de África dum lado e a África Austral do outro, estimular as divisões internas que os africanos tentam a todo o curto esconder ou esbater no seio da UA!

As Forças Armadas Francesas são os melhores “gendarmes” que o Pentágono, por via do AFRICOM, poderia alguma vez esperar!

4 – Os países que fazem a delícia da presença dos “gendarmes” franceses são campeões de revoltas, de golpes de estado e de riqueza mineira, todos eles na cauda dos Índices de Desenvolvimento Humano Baixo:

- Mali - 175º;
- R. C. A. - 179º;
- Burkina Faso - 181º;
- Chade - 183º;
- Níger - 186º.

Por causa das mesmas razões o último dos últimos é a riquíssima República Democrática do Congo, 187º!

A presença militar da “FrançAfrique” faz intrinsecamente parte dos cenários do subdesenvolvimento!

Mapa: - A amarelo – as plataformas militares geo estrategicamente implantadas, para a França dar continuidade às continuamente impunes ingerências e manipulações coloniais!

A consultar:
- Que fait l’armée française en Afrique? – http://www.legrandsoir.info/Que-fait-l-armee-francaise-en-Afrique.html
- L’armée française en Afrique – http://diktacratie.com/larmee-francaise-en-afrique/
- La France prépare des soldats ivoiriens à leur déploiment dans le pays – http://www.slateafrique.com/146761/mali-la-france-prepare-des-soldats-ivoiriens-leur-deploiement-dans-le-pays
- Un gouvernement au service des entreprises françaises en Afrique – http://survie.org/billets-d-afrique/2012/218-novembre-2012/article/un-gouvernement-au-service-des
- Une coopération militaire multiforme et contestée – http://www.monde-diplomatique.fr/2008/02/MUNIE/15569
- Mali, France y los extremistas – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=162870
- Les interventions françaises en Afrique engendrent des risques de répresailles – http://www.arcinfo.ch/fr/monde/les-interventions-francaises-en-afrique-engendrent-des-risques-de-represailles-577-1100354
- Liste des opérations militaires impliquant la France depuis 2000 – http://fr.wikipedia.org/wiki/Liste_des_op%C3%A9rations_militaires_impliquant_la_France_depuis_2000
- França – pequena radiografia do poder global – http://paginaglobal.blogspot.com/2011/11/rapidinhas-do-martinho-59.html
- Uma muito subtil FrançAfrique –
- Sarkozy ressuscita o pré carré com novas tendências – http://paginaglobal.blogspot.com/2012/04/sarkozy-ressuscita-o-pre-carre-com.html

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