segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Angola: A INTERNACIONAL SOCIALISTA NOS BRAÇOS DO MPLA

 


William Tonet - Folha 8, 14 fevereiro 2014
 
Vista de Portugal, a pre­sença do MPLA na Interna­cional Socialista não sur­preende especialmente. Desde que se iniciou em Angola a extracção petro­lífera em larga escala que a família política internacio­nal do partido do governo não cessou de alargar-se.
 
No congresso do MPLA, em 2009, discursou como convidado um dirigente de topo do Partido Comu­nista Português, que deu detalhes sobre “o alarga­mento de uma frente anti­-imperialista que inverta o actual curso das relações internacionais”. A proxi­midade com o PCP vêm dos tempos do heróico combate pela independên­cia, quando o movimento angolano era uma referên­cia para todas as forças da luta anti-colonial.
 
Mas há muito que o MPLA se transformou num poder pró-imperialista e pró-ca­pitalista, pouco interessa­do na inversão do “actual curso das relações inter­nacionais”. É assim que a amizade com o PCP se vai tornando cada vez mais incómoda, tanto mais que o regime angolano se tor­nou dono de muitos bens privatizados em Portugal, da banca à energia e às te­lecomunicações. Aliás, na­quele mesmo congresso, o enviado comunista teve de partilhar os holofotes com Nuno Morais Sarmento, um ex-ministro do Parti­do Social Democrata, de direita, com responsabili­dades na privatização da Galp a favor dos interesses da oligarquia angolana.
 
Esta amplitude das rela­ções políticas do MPLA não é de hoje. O PSD já chegara aos palcos do MPLA em Setembro de 1991, quando Cavaco Sil­va, então de visita ao país como primeiro-ministro, aproveitou para participar num comício partidário na cidade de Luena.
 
Não surpreende por isso que também os socialistas portugueses se encontrem em irmandade política com a cúpula do MPLA no seio da Internacional Socialista.
 
É que, não só foram gover­nos do Partido Socialista que abriram ao regime de Angola o acesso à proprie­dade de grandes grupos económicos portugueses, como também são do PS muitos dos ex-governan­tes portugueses nomea­dos para cargos de topo em empresas de direito angolano.
 
TRÁFICO DE INFLUÊNCIA DO MPLA CORROMPE POLÍTICOS PORTUGUESES
 
Estão nessa situação 27 membros de governos portugueses, onze dos quais do PS, segundo o estudo que publicámos no livro “Os Donos An­golanos de Portugal”. Estas são empresas de capitais angolanos (Fi­nertec, banco Atlântico, BAI), de maioria ango­lana (Multitel) ou filiais angolanas de empresas portuguesas (Millenium, Mota Engil) ou brasilei­ras (Camargo Correa), que incluem no seu ca­pital “parceiros locais” angolanos.
 
Esta proximidade do PS português com o poder angolano é a mesma que outras formações da In­ternacional Socialista fo­ram mantendo, ao longo dos anos, com regimes políticos que nada tinham de comum com os princí­pios políticos proclama­dos pela Internacional Socialista. Ilustres mem­bros da IS foram também, no passado, os ditadores tunisino Ben Ali ou o egípcio Hosni Mubarak.
 
Mário Soares, histórico socialista e ex-presi­dente da República de Portugal, refere-se cri­ticamente ao fenóme­no: “ditaduras [como a da Tunísia] não devem poder entrar na Interna­cional Socialista, mas é a mesma razão pela qual o MPLA também faz par­te: é o partido único de José Eduardo dos Santos, ditador que confunde o seu gozo próprio com o orçamento” (entrevista a Joaquim Vieira, 2013).
 
Pelo seu lado, o presiden­te do Parlamento Euro­peu, o também socialista Martin Schultz, confron­tado com as vultuosas aplicações financeiras do poder angolano em Portugal, declarou em Fevereiro de 2012 que “este tipo de pedidos [de investimento, feitos pelo governo português ao regime angolano] conde­na Portugal ao declínio.
 
Lisboa deve perceber que só tem hipóteses no quadro da União Euro­peia, onde há um modelo democrático estável que pode ser conjugado com uma estabilidade econó­mica”.
 
As palavras de Schultz valem pouco: assim como as suas críticas a Luanda convivem bem com a presença do se­cretário-geral do MPLA na vice-presidência da IS, o líder do SPD ale­mão aceita pactuar com o partido de Angela Merkel, a mesma direi­ta que ameaça a União Europeia a golpes de empobrecimento sobre países como Portugal. Mas mais significativa que a presença de vozes críticas no campo da In­ternacional Socialista, é a falta de ouvidos para as escutar. O autoritarismo e o modelo de acumula­ção de riqueza pelo regi­me angolano não põe em causa o seu papel naque­la organização.
 
Ora, nada demonstra melhor a força da in­fluência de Luanda entre os dirigentes políticos dos partidos socialistas, desde logo portugueses. Vendo o MPLA sentado sobre a riqueza nacional angolana, logo se pres­tam a atribuir-lhe todos os cartões-de-visita e credenciais de esquerda que a Internacional So­cialista tem para dar.
 
(*) Membro da Comissão Política do Bloco de Esquerda
 

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