quinta-feira, 31 de março de 2016

REGIME ANGOLANO RECEBE APOIO DA DIREITA E DO PCP NO PARLAMENTO PORTUGUÊS




Mário Motta, Lisboa

Os 17 presos políticos condenados há dias a penas de prisão entre os 2 e os 8 anos foram tema na Assembleia da República, no parlamento português, sob proposta do PS e do Bloco. Via Lusa, o Notícias ao Minuto deu conta do resultado da votação de “uma moção que condena a aplicação de penas de prisão a 17 jovens ativistas políticos angolanos, entre os quais Luaty Beirão, apelando para que essa decisão seja corrigida.”

E o resultado? Perguntarão os que ainda não se atualizaram. O resultado foi Regime angolano 100 ou 500 X Democracia de Portugal 0. Democracia, que é como quem diz: se não preza os Direitos Humanos que raio de democracia é essa? Não é.

Adiante-se que todo o esclarecimento pode ser lido no PG no título “PSD, CDS, PCP "CHUMBAM" VOTOS DE CONDENAÇÃO A PRISÃO DE ATIVISTAS”. É natural que os partidos da direita portuguesa esteja unha com carne com o regime angolano, igualmente de direita mas com capa da esquerda a que pertenceu e noutros tempos praticou enviezadamente. A Declaração de Princípios do MPLA por certo já teve outra utilidade menos digna quando da falta de papel em Angola. O que foi elaborado pelos fundadores perdeu-se pelo cano a baixo. Só pode ter sido.

Choque e espanto é a votação do PCP ao votar contra a condenação da aplicação de penas de prisão aos 17 jovens. Alegando objetar à “tentativa de retirar do foro judicial uma questão que a ele compete esclarecer e levar até ao fim no quadro do respeito pelos direitos, garantias processuais - incluindo instrumentos legais de recurso -, normas jurídicas e princípios constitucionais da República de Angola"

É posição e pontos de vista do PCP, está no seu direito, em Portugal. Mas a questão é de ordem política e ideológica, sem cabimento nem conexão com crime, pois não foi provado que crime algum tivesse sido praticado pelos acusados. Reuniam-se, discutiam baseados num livro que continha teorias sobre como derrubar uma ditadura… e não mais que isso. Presos porquê? Tribunal porquê? Atualmente condenados e presos, sim. Presos políticos.

Também em Portugal colonial e salazarista éramos presos pela PIDE por estudarmos e discutirmos Marx, Lenine, ou outros autores não aprovados pelo regime. Quem não se lembra? Há uns quantos que parece terem perdido de facto a memória.

Dizem que a memória das pessoas e das instituições é curta. Talvez. Não será certamente o que acontece no PCP, que decerto se lembra dos antifascistas que pereceram e foram torturados, presos em masmorras terríveis da PIDE do salazarismo colonial-fascista que ocupou Portugal por mais de quatro décadas.

Agora pelas quatro décadas: Eduardo dos Santos está quase a bater o recorde de Salazar, que também “vencia” as eleições, quando as realizava. Atualmente Angola é uma democracia… Pois. Não nos intrometamos… Pois.

Quem defende os Direitos Humanos e a Democracia, quem procura ser justo, quem é do povo explorado e oprimido, não pode (não deve) aceitar o que está a acontecer em Angola sem que se revolte e desaprove. Sem que condene o ditatorial mas riquíssimo (alguns) e moderno regime das democracias da treta que abundam nos países da CPLP, incluindo Portugal (como está à vista). Em Angola, upa, upa.

Angola. REGIME AVISA A EUROPA: OU TÊM JUIZINHO OU LEVAM NO FOCINHO



A diplomacia angolana (ou seja o MPLA, ou seja o Governo, ou seja o Presidente da República, ou seja José Eduardo dos Santos) avisou hoje os diplomatas da União Europeia (UE) acreditados em Luanda que não volta a aceitar “ingerências” nos assuntos internos.

Isto é, o regime de José Eduardo dos Santos classifica a recente declaração daqueles embaixadores sobre a condenação de 17 activistas como uma atitude “inamistosa”. Assim sendo, cuidem-se. Os diplomatas europeus conhecem a voracidade dos jacarés do MPLA.

A posição oficial do regime foi assumida pelo secretário de Estado das Relações Exteriores, Manuel Augusto, que, em nome do Governo angolano (devidamente apoiado pelo MPLA e pelo Presidente da República), chamou hoje o embaixador da UE em Luanda, Gordon Kricke, para, disse, “prestar esclarecimentos” sobre a posição conjunta daquela delegação e das embaixadas dos Estados-membros.

“Não é normal o procedimento, o Ministério das Relações Exteriores não foi previamente contactado pela delegação da UE sobre a divulgação dessa declaração, pelo que tivemos uma conversa de esclarecimento”, explicou o governante, falando aos jornalistas no final desta reunião.

Muito bem. Desde quando os embaixadores, ou seja quem for, podem dar uma opinião livre sem antes consultarem os donos do reino? Ou será que eles julgam que estão uma democracia e num Estado de Direito?

Na declaração, emitida a 29 de Março, os diplomatas europeus – delegação da UE, embaixadas dos Estados-membros e embaixada da Noruega – afirmavam esperar que os anunciados recursos da condenação dos 17 activistas angolanos, a penas entre os dois anos e três meses a oito anos e meio de cadeia, permitam respeitar os direitos destes jovens.

“Manifestamos profundo descontentamento com uma atitude que consideramos no mínimo inamistosa”, disse o secretário de Estado angolano, admitindo ainda “grande preocupação por este tipo de actuação”.

O regime tem razão. Nas democracias que são uma referência para o reino feudal de José Eduardo dos Santos, casos da Coreia do Norte e da Guiné Equatorial, ninguém vê este tipo de actuação. Portanto, ou têm juizinho ou levam no focinho.

“Na medida em que, para além de representar uma clara violação das normas de relacionamento internacional, nomeadamente da convenção de Viena sobre as relações diplomáticas e consulares, a tal declaração traduz-se também numa clara ingerência nos assuntos internos de um Estado soberano”, apontou o autómato do regime, visivelmente (é que o “querido líder” está a ver) agastado com esta mania dos europeus acharem que sabem alguma coisa de democracia.

No final da reunião, que se prolongou por cerca de 30 minutos, na sede do Ministério das Relações Exteriores, o embaixador da UE, Gordon Kricke, não quis prestar declarações aos jornalistas.

Provavelmente os embaixadores vão, mais uma vez, comer e calar.

Na declaração conjunta dos representantes diplomáticos europeus acreditados em Luanda, estes recordavam que o caso dos activistas, e as penas divulgadas na segunda-feira pelo tribunal de Luanda – condenações de críticos do regime por actos preparatórios para uma rebelião e associação de malfeitores -, “tem vindo a suscitar reservas no que concerne o respeito pelas garantias processuais e pelo princípio de proporcionalidade”.

“A UE espera que os mecanismos legais de recurso disponíveis ofereçam aquelas garantias, em conformidade com os direitos e os princípios consagrados na Constituição angolana”, lê-se na declaração, recordando que os observadores europeus não tiveram acesso ao julgamento, que decorreu entre 16 de Novembro e 28 de Março.

“A declaração da UE vai ao ponto de qualificar as decisões do Tribunal angolano, indo ao ponto de referir a proporcionalidade ou razoabilidade da sentença ditada pelo tribunal. Dissemos ao senhor embaixador que tal atitude é inaceitável e que esperamos muito sinceramente que ela não se venha a repetir”, disse, por seu turno, o secretário de Estado.

Para desanuviar o clima, Manuel Augusto, disse também que contou uma anedota que fez o embaixador rir a bandeiras despregadas. Ou seja, o governante disse que recordou ao diplomata europeu que, tal como na Europa, em Angola há “separação de poderes” e que os “tribunais são independentes na aplicação da Justiça”.

“Não podemos aceitar que nos passem um atestado de menoridade porque este é um país que já não vive sob tutela e que não tem nenhum patrão”, avisou Manuel Augusto, acrescentando que o diplomata europeu justificou a tomada de posição sobre a condenação dos activistas com “instruções das capitais” dos países representados em Luanda.

Manuel Augusto afasta, para já, consequências deste caso nas relações entre Angola e a União Europeia, mas afirma que os angolanos “não abdicam da soberania”, do “orgulho” na independência e de serem “tratados como iguais”.

Esta é mais uma anedota. Isto porque os jovens activistas foram condenados exactamente por “não abdicam da soberania”, do “orgulho” na independência e de querem serem “tratados como iguais”.

Folha 8

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Angola. Quer Santos fazer dos “Revus” exemplo, ou vai no final mostrar-se magnânime?



Paulo Guilherme – África Monitor, opinião

Num sistema de poder altamente centralizado como o de Angola, poucos duvidam de que foi José Eduardo dos Santos, e/ou alguns dos seus mais próximos e fiéis, a decidir e/ou assentir à condenação dos 17 “jovens revolucionários”. Tanto mais que as instituições da Justiça são manifestamente débeis. Depois da fase dos recursos, o regime pode decidir levar o processo até ao fim e fazer dos “revus” um exemplo para instalar o medo. Ou despachar tudo num perdão - e magnanimidade – presidencial.

A curto prazo, Angola vai expor-se ainda mais a críticas das ONG, sobretudo daquelas que mais atenção têm dado ao processo, caso da Amnistia Internacional ou Human Rights Watch. E, claro, de angolanos independentes, dentro e fora do país. Particularmente interessante de seguir será a reação das agências das Nações Unidas, onde Angola detém atualmente a influente posição de membro do Conselho de Segurança, exercendo mesmo a presidência no mês de Março.

O coro de protestos já começou. Quase imediatamente depois do anúncio da sentença, ativistas angolanos convocaram através das redes sociais uma concentração hoje em Lisboa “pela libertação dos presos políticos”.

Será chave também a posição a assumir por alguns dos principais parceiros angolanos – os Estados Unidos serão particularmente criticados por organizações da sociedade civil, caso optem pelo silêncio. Também será o caso de alguns países da União Europeia, e da Comissão como bloco. Até porque figuras influentes da sociedade civil angolana, respeitadas no estrangeiro, têm vindo continuamente a chamar a atenção para a pouca credibilidade de todo o processo. É o caso do exprimeiro-ministro Marcolino Moco.

Para Moco, os jovens “foram detidos ilegalmente, tiveram uma série de dias em prisão preventiva com ilegalidades sucessivas e encontram-se agora em prisão domiciliária atípica, como muitas coisas atípicas que têm acontecido no nosso país, alguns anos para cá”. O processo que “pouco tem de judicial mas mais de injustamente político”.

“Não estou disposto a participar na `carnavalização da justiça´ que temos vivido, sobre tudo quando está em jogo o sofrimento de pessoas, em tempo de paz e democracia para as quais tenho contribuído”, afirmou Moco, na sequência da convocatória para depor. Também Rafael Marques, Ngola Kabango e Justino Pinto de Andrade foram chamados a testemunhar.

Pinto de Andrade, presidente do Bloco Democrático (BD), acusou o Tribunal de Luanda de ter violado os seus direitos, por o ter convocado para testemunhar através de um edital. ''A via edital é o ultimo recurso e só deve ser utilizada para pessoas com paradeiro incerto, o que não é o meu caso, o tribunal falhou e violou os meus direitos, por isso reservo-me no direito de intentar uma acção para ver reposta a minha dignidade''.

O depoimento relacionava-se com uma lista de um suposto “governo de salvação nacional”, que circulou nas redes sociais, em que diversas personalidades angolanas eram apresentadas com cargos específicos. O jurista angolano Albano Pedro admitiu publicamente a autoria da lista, mas o tribunal recusou ouvi-lo.

Em comentário à decisão, o investigador angolano Eugénio Costa Almeida defendeu a necessidade de “aguardar os recursos e, o que por certo irá acontecer, o recurso final ao Tribunal Constitucional”. “Como vamos, também, aguardar o que governantes e ex-governantes portugueses dirão deste processo onde parece haver uma sobreposição de factos jurídicos com posições políticas”. “Até lá pode ser que haja uma amnistia…”, realçou.

“Como em tudo na vida haverão os que consideram ter havido e sido feita Justiça e bem condenados; enquanto outros, talvez uma parte bem significativa face ao que se tem lido em páginas sociais e dentro dos vários quadrantes políticos que vão do MPLA a pessoas que se não se identificam politicamente, consideram que este processo estava inquinado desde o início e que nunca deveria ter ido até ao fim”, afirmou Costa Almeida.

“Sejamos honestos, é difícil, senão problemático, aceitar a ideia de que os activistas angolanos representavam – ou representam – uma ameaça objectiva ao Estado angolano. Actos e acórdãos como estes só dão força aos que consideram que o regime político que está no País não conhece devidamente o que é democracia e, por esse facto, não mais é que um regime musculado”.

Os 17 ativistas estão acusados, em coautoria, de atos preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o Presidente. Foram agora condenados a penas que vão dos 2 aos 8 anos e seis meses. Domingos Cruz, considerado pelo Ministério Público o líder do movimento e o ativista e músico Luaty Beirão foram os que tiveram penas mais elevadas - respetivamente 8 anos e seis meses e 5 anos e seis meses. Os restantes entre 2 e 3 anos.

O processo vai prosseguir, agora com os recursos. E assim arrastar-se mais alguns meses na opinião pública. Enquanto “distração” interna – de problemas mais agudos como a crise de febre amarela em Luanda (quase 200 mortos, e faltam vacinas) ou o arrastar da crise económica – este prolongamento tem utilidade para o governo do MPLA. Internamente, a imagem de “mão de ferro” perante contestatários tem um efeito dissuasor na opinião pública, conjugada com ações sobre a imprensa e iniciativas/propostas para "disciplinar" as redes sociais.

Quando chegar o momento da decisão – que será quando o regime quiser que seja – aí colocam-se duas opções: ou prisão de facto para os contestatários, impondo de facto “mão pesada” e assim “pondo em sentido” as oposições; um aligeirar e até um perdão efetivo – cenário de que o presidente sairia como magnânime (tolerante para com os que o criticam).

Ir por uma ou outra via pode ser decido consoante as conveniências do momento. É que, com pressão de tantos lados, os próximos meses são de grande imprevisibilidade mesmo para o regime. E, cada vez mais, o executivo parece navegar à vista.

Portugal. PSD, CDS, PCP "CHUMBAM" VOTOS DE CONDENAÇÃO A PRISÃO DE ATIVISTAS



As bancadas de PSD, CDS-PP e PCP rejeitaram hoje votos de PS e BE de condenação da situação de 17 ativistas angolanos condenados a penas de prisão, após julgamento por coautoria de atos preparatórios para uma rebelião e associação criminosa.

Comunistas, sociais-democratas e democratas-cristãos votaram contra o texto apresentado pela bancada socialista, a lastimar "a situação a que se assiste e que atenta contra princípios elementares da democracia e dos estados de direito, fazendo votos para que seja corrigida", o qual mereceu votos favoráveis de PS, BE, PEV e do deputado do PAN.

O documento bloquista, que "condena a punição dos ativistas", "apela à tramitação do processo" sob "princípios fundadores do estado de direito" e "à libertação dos ativistas", também foi "chumbado", apesar da abstenção do PS e dos votos a favor de 17 parlamentares socialistas como Isabel Moreira, Porfírio Silva, Paulo Trigo Pereira, Edite Estrela, Sónia Fertuzinhos ou Maria da Luz Rosinha, entre outros, enquanto PCP, PSD e CDS-PP voltaram a contrariar a iniciativa.

Os outros parlamentares do PS que votaram a favor foram Rosa Albernaz, João Paulo Rebelo, Susana Amador, Tiago Barbosa Ribeiro, Carla Sousa, Maria Augusta Santos, Pedro do Carmo, Isabel Santos, Carla Tavares, André Pinotes Baptista e Marisabel Moutela.

Após a votação, à qual assistiram desde as galerias, entre outras pessoas, uma irmã do músico e ativista luso-angolano Luaty Beirão e o humorista Ricardo Araújo Pereira, que tem manifestado publicamente apoio à causa, vários tribunos anunciaram a intenção de apresentar declarações de voto.

A bancada do PCP avançou com um texto em que "reafirma igualmente a importância do respeito pela soberania da República de Angola, do direito do seu povo a decidir - livre de pressões e ingerências externas - o seu presente e futuro, incluindo a escolha do caminho para a superação dos reais problemas de Angola e a realização dos seus legítimos anseios".

Os comunistas justificaram os seus votos contra os textos com a "objeção da tentativa de retirar do foro judicial uma questão que a ele compete esclarecer e levar até ao fim no quadro do respeito pelos direitos, garantias processuais - incluindo instrumentos legais de recurso -, normas jurídicas e princípios constitucionais da República de Angola".

Na segunda-feira, um tribunal de Luanda condenou a penas entre dois anos e três meses e oito anos e seis meses de prisão efetiva 17 ativistas angolanos - um dos quais, Luaty Beirão, - após um julgamento iniciado em 16 de novembro, por coautoria de atos preparatórios para uma rebelião e associação criminosa.

Os jovens ativistas, detidos durante um encontro, a 20 de junho do ano passado e no qual partilhavam a leitura do livro "Da ditadura à democracia", rejeitaram sempre as acusações que lhes foram imputadas e declararam em tribunal que os encontros semanais que promoviam visavam discutir política e não promover qualquer ação violenta para derrubar o regime.

A editora em Portugal da referida obra de Gene Sharp, Bárbara Bulhosa, também esteve presente na Assembleia da República, ao lado de Araújo Pereira.

Lusa, em Notícias ao Minuto

A ESTUPIDEZ DO ESCRITOR



Rafael Barbosa – Jornal de Notícias, opinião

São 17 e foram apanhados numa conspiração para derrubar o regime angolano. É certo que não tinham, no momento da detenção, nenhuma Kalashnikov. Mas esse é um argumento falacioso. Enquanto não se entendiam quanto ao modelo e ao vendedor das armas automáticas, manipulavam outro tipo de armas de destruição massiva. Um dos modelos designa-se "Da ditadura à democracia" e foi desenvolvido por um tal Gene Sharp. Pior, um dos elementos subversivos produzira a sua própria arma artesanal: "Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura. Filosofia política da libertação para Angola". Só um lunático disposto a tudo dá um nome destes a uma arma. Não serve de atenuante o facto de não ser possível medir o calibre.

Dados estes factos, não surpreende que, numa democracia como a de Angola, em que há uma clara separação entre os poderes executivo, legislativo, judicial, militar e petrolífero (eu sei que a literatura costuma referir apenas os primeiros três, mas estamos a falar de uma democracia avançada), estes subversivos, que incluem um rapper, tenham sido condenados a pesadas penas de prisão.

Argumentam os ingénuos que preparar uma rebelião não é a mesma coisa que executar uma rebelião. Que entre falar sobre uma arma e empunhar uma arma vai pelo menos a distância de uma ida prévia à carreira de tiro. Ou ainda, e lembrando o tal rapper, que quando se diz que a "cantiga é uma arma", se está apenas a reproduzir uma metáfora. Acontece que a justiça, felizmente, é cega. Não tem de se preocupar com metáforas. Uma arma é uma arma, independentemente de usar caneta e papel, ou metal e pólvora.

Causou igualmente algum impacto em mentes suscetíveis que os 17 subversivos tenham sido acusados de associação de malfeitores. Gente como a que faz parte da Amnistia Internacional lembra que este crime não fazia parte do rol inicial e que só apareceu nas alegações finais do Ministério Público, metida a martelo, para garantir que não poderia haver suspensão das penas. Como se isso fosse uma arbitrariedade, em vez de uma demonstração de eficácia. Não estamos fartos de ver, na Comunicação Social, casos de ladrões, pedófilos e criminosos afins que, apesar de condenados, beneficiam da suspensão das penas? Não vos dá a volta ao estômago? Pois ao presidente de Angola também.

Li por estes dias que um grande escritor angolano avisou que nunca se deve subestimar a estupidez do regime. Na verdade, o que não deve é dar-se demasiado crédito a escritores. Se é escritor, publica livros. Livros são armas. Armas servem para derrubar regimes. A lógica é imbatível e é parecida com a que atirou os 17 subversivos para a cadeia. No fundo, José Eduardo Agualusa (é desse escritor que falo) não fez mais do que, estupidamente, confessar a sua culpa. Cadeia com ele.

Portugal. Jerónimo de Sousa recusa "amálgama" de quatro partidos e elogia "respeito" do PS




O secretário-geral do PCP declarou hoje que a atual solução política que viabilizou o Governo socialista "será tanto mais duradoura quanto mais respostas positivas se concretizarem" para trabalhadores e povo, rejeitando aquilo que seria uma "amálgama" de quatro partidos.

Em entrevista publicada hoje no órgão oficial comunista, "Avante!", Jerónimo de Sousa elogia "o respeito" do PS, "sempre num quadro bilateral", pela posição do PCP, apesar do questionamento por parte da comunicação social sobre "por que é que os quatro partidos (PS, BE, PCP e PEV) que permitiram a viabilidade desta solução política" não se juntaram.

"Pela nossa parte, consideramos que essa amálgama não traria mais clarificação, mas traria sim mais confusão. Nessas reuniões bilaterais mantemos as nossas propostas, as nossas reservas e o nosso combate ao que consideramos negativo", assegurou.

No depoimento intitulado "O compromisso do PCP é com os trabalhadores e o povo português" e cuja chamada de primeira página é "O PCP tem uma proposta alternativa", o líder comunista sublinha que a postura do seu partido "foi clara: não podíamos viabilizar ou inviabilizar uma coisa sem a conhecer", referindo-se ao Orçamento do Estado para 2016 (OE2016).

"Quanto à pergunta em concreto, o que dizemos é que a solução encontrada será tanto mais duradoura quanto mais respostas positivas se concretizarem. Isto é que é o fundamental e decidirá da durabilidade da solução política", afirmou, sobre o horizonte temporal de quatro anos da atual legislatura.

Jerónimo de Sousa diz ainda que "cada um não exigiu nunca que a outra parte deixasse de defender o que defende e de ser o que é", em termos de "independência", "identidade" e "convicção de que é necessária uma política alternativa patriótica e de esquerda capaz de dar respostas estruturantes aos grandes problemas nacionais".

"Quanto ao PS, também não nos iludimos, sabemos que não se liberta desses constrangimentos e dessas políticas e instrumentos da União Europeia. Há aqui uma contradição por parte do PS. No que nos diz respeito, quando afirmamos que somos um partido sério, o que estamos a afirmar é que não dizemos uma coisa nas reuniões com o PS e outra coisa em termos públicos. É com este partido que o PS dialoga e com quem procura a convergência possível, reconhecendo as diferenças e as divergências", continuou.

O secretário-geral do PCP, questionado sobre a "democracia avançada" que consta do programa do partido, "como etapa da luta pelo socialismo e pelo comunismo", define-a como parte do "processo de emancipação e de libertação dos trabalhadores e dos povos", com "respostas mais avançadas do que a própria Constituição da República", a fim de romper "com a política de direita e as imposições do capital monopolista".

"Não perdemos uma perspetiva de horizonte mais largo, a construção do socialismo e do comunismo, num processo de transformação que resultará da luta do nosso Partido mas fundamentalmente da luta do nosso povo", afirmou.

"O ideal e o projeto" do PCP "comportam esse sonho milenar do ser humano de se libertar da exploração de um homem por outro homem, um sonho que não morre nem acaba", sublinhou Jerónimo de Sousa, "mesmo numa correlação de forças tão desfavorável aos trabalhadores e aos povos, quando resistir é já vencer".

"Temos aquela confiança que nos vem da convicção de quem acredita no ser humano e no seu anseio de liberdade e emancipação. E depois, estaremos de acordo que, apesar de tudo, 'o mundo move-se'", disse, recordando os 95 anos de história do PCP.

HPG // ZO - Noticias Ao Minuto/Lusa

Portugal. SE PASSOS RENOVAR “É PARA CONTINUAR RODEADO DE YES MAN”



António Capucho saiu do PSD há dois anos, mas segue a vida política e antecipa um congresso social-democrata 'sem história', que será apenas o cumprimento do calendário num partido transformado em "rebanho fiel" que não contraria o líder.

"Sigo a vida política e de todos os congressos este é talvez o menos interessante, na justa medida em que está tudo decidido, não há alternativa à liderança ou, se há, não apareceu, não se assumiu como tal por enquanto", disse à Agência Lusa o ex-autarca de Cascais, em jeito de antecipação do 36.º congresso do PSD, que decorre entre sexta-feira e domingo em Espinho.

Com a liderança do partido decidida em diretas e uma única moção de estratégia global em discussão, António Capucho lamenta a ausência de debate, considerando que a reunião magna dos sociais-democratas será "apenas o cumprimento do calendário" e "mais nada do que isso".

"Sinceramente não tenho nenhuma expetativa que seja o que for de relevante possa acontecer neste congresso", confessa, admitindo, contudo, ter alguma esperança que o líder social-democrata renove a direção, porque "há companhias de que certamente Pedro Passos Coelho se deve querer libertar".

"Só se não tem o mínimo discernimento é que não fará alguma renovação. Mas isso em nada vai alterar, porque se ele fizer renovação é para continuar rodeado de 'yes man'", acrescenta.

Atribuindo a baixa nas sondagens "fundamentalmente a fenómenos de tiros no pé", como o apoio "desnecessário e disparatado" à ex-ministra das Finanças no caso da sua contratação pela gestora de crédito britânica Arrow Global, ou a "birra" de Passos Coelho na discussão do Orçamento do Estado para 2016 (em que o PSD não apresentou propostas de alteração), o antigo deputado disse não acreditar, contudo, que algum delegado queira levantar ou suscitar estas questões ou mesmo falar sobre o "grito de Ipiranga" do CDS-PP, que mudou a liderança.

"O CDS, como qualquer partido pequeno que esteja fora da bipolarização PSD/PS, sofre com o voto útil, evidentemente que tende a não crescer à sombra, debaixo das saias do PSD. Eu compreendo perfeitamente a atitude do CDS", sustentou António Capucho, considerando, contudo, que os sociais-democratas deviam reagir.

"O CDS deixou de estar à direita do PSD, portanto, não espanta esta atitude do CDS, julgo que é uma atitude inteligente, mas que merecia uma reposta do PSD", sublinhou.

Numa análise critica à direção de Pedro Passos Coelho, o também antigo conselheiro de Estado recusa elaborar cenários para o futuro, porque ainda "vai passar muita água debaixo das pontes", mas diz que se o atual líder social-democrata voltar ao poder "não será por mérito próprio, mas porque a outra parte ou a outra alternativa não levou a água ao seu moinho".

Quanto à ausência de opositores, António Capucho atribui a falta de alternativas ao facto do partido estar "transformado num conjunto de lideranças de âmbito distrital e concelhio que a única coisa que fazem é garantir a fidelidade ao chefe".

"Não aparece ninguém porque não vale a pena, os dados estão lançados e o partido como rebanho fiel não está ali para contrariar o líder", argumentou, lamentando, porém, se não existir pelo menos uma alternativa ao conselho nacional do partido, o órgão máximo do partido entre congressos, onde se assumisse "uma tendência social-democrata a sério".

De qualquer forma, acrescenta António Capucho, Pedro Passos Coelho ainda tem a simpatia dos militantes, porque estiveram a gravitar à volta do Governo e têm a expetativa que possam voltar ao poder.

António Capucho, antigo presidente da Câmara de Cascais e ex-secretário-geral social-democrata, foi expulso do PSD em fevereiro de 2014, ao fim de 40 anos de militância por ter apresentado uma candidatura independente à Assembleia Municipal de Sintra, adversária à do partido.

Lusa, em Notícias ao Minuto

Portugal. PASSOS COELHO ESTÁ “SEM NADA A ACRESCENTAR”



A deputada socialista estranha a quietude do líder do PSD.

Através das redes sociais, a deputada Isabel Moreira diz que o apoio dado pelos sociais-democratas na bancada parlamentar ao líder da oposição, Pedro Passos Coelho, servem para “disfarçar a sua fraqueza”, isto porque o antigo primeiro-ministro, diz, optou por estar ausente do debate político.

“Do simbolismo: Passos Coelho está tão ausente do debate político, tão sem nada a acrescentar , que se deu o inédito - fez uma simples pergunta ao PM e metade da bancada do PSD levantou-se às palmas para disfarçar a sua fraqueza”, escreve a socialista na sua página no Facebook

João Oliveira – Notícias ao Minuto

Portugal. PCP apela à nacionalização do Novo Banco, Costa com "atitude aberta"



O secretário-geral do PCP defendeu hoje, explicitamente, a nacionalização do Novo Banco no debate parlamentar quinzenal com o primeiro-ministro, António Costa, o qual disse conservar uma "atitude aberta" para a "solução que melhore protege os contribuintes".

"Quantos mais milhares de milhões de euros é preciso o Estado injetar nesses bancos?", questionou o líder comunista, garantindo que "não haverá banca nacional se não for pública" e que "ainda há tempo e solução": através da "concretização da nacionalização, em definitivo, do Novo Banco".

O chefe do Governo socialista, sublinhando que "a preocupação sobre a estabilidade do sistema financeiro é algo que preocupa a todos", recusou, como outros executivos anteriores, "deixar andar e esperar que os problemas se resolvam por si", pois "é necessário agir", tendo em conta a conjuntura.

"Devemos manter uma atitude aberta perante as soluções que existem para tomar uma decisão com um critério fundamental - a que melhor protege os contribuintes e a estabilidade do sistema financeiro e o financiamento da nossa economia", disse.

Lusa, em Notícias ao Minuto

O SISTEMA FINANCEIRO MUNDIAL, A BANCA NACIONAL E A SOBERANIA



Carlos Carvalhas [*]

O sistema financeiro internacional foi o epicentro da crise iniciada em Agosto de 2007, com as suas toneladas de lixo tóxico e as fantásticas pirâmides Ponzi (D. Branca). Sabe-se hoje que esteve à beira da hecatombe.

A crise das dívidas públicas, que se lhe seguiu, com aspectos dramáticos e graves consequências económicas, financeiras e sociais, que estão longe de ser superadas, verificou-se no essencial na zona euro, porque ao BCE está vedado o financiamento directo aos Estados, e estes ficaram prisioneiros dos mercados, que especularam desenfreadamente, perante a passividade do sr. Trichet e o apoio e pressão do então denominado "mercozi" – Merckel e Sarkozi.

Com o agudizar da situação ficou demonstrado, com Draghi, que a especulação sobre a dívida pública dos países periféricos (bastou a ameaça aos mercados de que tudo seria feito para salvar o euro) poderia ter sido travada logo de início, pelo que o custo de toda a especulação (juros e aumento da dívida) deve ser endossado ao BCE e aos países que se opuseram à intervenção. É de recordar que em plena crise o BCE ainda aumentou as taxas de juro, em Junho de 2008 e de 2011, e que só no Verão de 2012 Draghi alterou a sua política. Foram quatro anos de especulação sobre as dívidas públicas, que não são da responsabilidade dos "países da periferia".

Sustentámos, desde o início, que a aceleração do aumento das dívidas públicas foi uma consequência da crise e, no essencial, das medidas tomadas de apoio à Banca, à sua capitalização e desendividamento, e não a consequência do aumento dos gastos com saúde, ensino, investigação, trabalhadores da função pública, o tal "despesismo" que a direita e os seus comentadores de serviço atribuíram todas as responsabilidades.

Sobre esta questão estamos agora muito mais acompanhados.

Há hoje um reconhecimento geral dos factores que levaram ao significativo aumento da dívida. A opinião pública tem agora uma melhor percepção para onde foram, e continuam a ser, canalizados os cortes, nas pensões, reformas, vencimentos dos trabalhadores da função pública, … e o tal "enorme aumento de impostos"!

Até Braga de Macedo o reconheceu recentemente, ao subscrever o "Manifesto para uma nova narrativa da zona euro", "Rebooting the eurozone: agreeing a crisis narrative", iniciativa de um conjunto de economistas de vários países (CEPR. Policy insight n.º 85).

Tivemos a dívida pública ao serviço da dívida privada.

Chegou-se ao desplante de se ver a mesma imprensa que propagandeou durante anos seguidos a tese do "despesismo", e de que a banca portuguesa estava sólida, a publicar agora, em títulos garrafais: "Dívida pública salva lucros da banca. CGD, BCP, BPI e Santander ganharam 1,4 mil milhões de euros com operações financeiras em 2015" ( Expresso, 6/Fevereiro/2016)!

O sistema financeiro mundial, passado o pânico do auge da crise, voltou às mesmas práticas de sempre.

O seu poder é tal que tem travado, ou adiado, o essencial da regulamentação proposta pelos poderes públicos e pelo Comité de Basileia.

Christine Lagarde, numa conferência sobre o "capitalismo inclusivo", foi obrigada a condenar o sector por "bloquear as reformas necessárias" ao seu restabelecimento (Christine Lagarde fustige les hobbies bancaires", Le Figaro,27/Maio/2014).

Em 2011, o G20, reunido em Cannes, acabou por reconhecer a responsabilidade do sistema bancário na crise, e definiu 29 bancos como sistémicos, depois reduzidos a 28 pela falência do DEXIS, franco-belga.

Da lista desses 28 faz parte o Santander e nenhum banco português. Dos nove bancos da zona euro a Espanha tem dois, Santander e BBVA.

Estes bancos detêm nos seus balanços uma boa parte da dívida dos Estados e o seu poder não é comparável com a fraqueza dos Estados. O accionista e ex-banqueiro Edgar Morin chama-lhes a "hidra mundial" que domina os grandes mercados monetários e financeiros e o poder político.

São eles os principais criadores e proponentes dos produtos derivados altamente especulativos, e a sua posição dominante confere-lhes poderes análogos aos das grandes instituições públicas, designadamente a capacidade de fixar o preço do dinheiro.

São os so big to fail e os seus responsáveis os so big to jail. Como se tem visto no caso da manipulação das taxas de referência (Libor, Euribor), branqueamento de capitais, falsificação de balanços.

Os produtos "derivados" foram o combustível da propagação sistémica nas crises de 1990 e 2007, e atingem hoje um volume várias vezes o produto mundial.

A montanha dos produtos derivados, capital fictício, os activos da shadow bank, banca paralela que, segundo o Finantial Stability Board, representa 120% do PIB mundial e cujo controlo é ainda muito menor do que a generalidade da banca, bem como a "bolha" das dívidas públicas, são material explosivo cuja deflagração terá consequências muito mais devastadoras do que as anteriores crises.

Em relação à "bolha" das dívidas públicas, como já alguém disse, "ou ela se resolve a frio ou ela rebentará a quente", com repercussões em todo o planeta, dada a globalização dos mercados financeiros impulsionada pela grande conquista do capital que foi a livre circulação de capitais. E afirmamos que o potencial explosivo é muito superior ao das anteriores crises porque, para acudir ao sistema financeiro, todos os bancos centrais, sendo o BCE o mais tardio, se lançaram na política de quantitativ easing (QE), injecções de liquidez com o objectivo de, através da política monetária, impulsionaram a actividade económica, combateram a deflação, ajudaram a banca (veja-se o caso do Deutsche Bank).

Se, no quadro do sistema, estas medidas foram positivas, a sua continuação, sem alteração do quadro económico global, criaram um volume de massa monetária (ver "La folie des banques centrales", de Patrick Artus) que se dirige para este e para aquele produto especulativo, aumentando o capital fictício e a sua volatilidade, sem dar resposta aos problemas da chamada economia real, à procura global e ao desemprego, que se acentua pela crise, pela robotização e novas tecnologias e aumento das jornadas de trabalho!

Se tivéssemos que sugerir algumas reivindicações e objectivos de luta e de combate à crise e que fossem comuns e transversais às diversas forças políticas e sociais progressistas dos países mais desenvolvidos, apontaríamos: o aumento do poder de compra das massas trabalhadoras e a melhoria do rendimento nacional; a redução generalizada do horário de trabalho sem perda de rendimentos e direitos; o controlo da circulação de capitais e a nacionalização ou controlo público do sistema financeiro.

A banca nacional e a soberania 

No nosso país a privatização da banca, apresentada como um factor de modernização e de desenvolvimento, foi comandada pelo poder político, e constituiu uma das maiores transferências de dinheiro público para mãos privadas. Um autêntico roubo ao erário público, formalmente legal, mas que uma séria e não golpista operação "mãos limpas" ou "lava jato", aos envolvidos nos processos de privatização da banca poucos deixaria de fora. Foi a época da criação de fulgurantes fortunas, de "novos banqueiros", de novos bancos, de um novo-riquismo que se assenhoreou do poder económico, da comunicação social e do poder político.

Um "barão" socialista chegou a afirmar na altura que bebia uma taça de champanhe por cada privatização que se fazia! (Penedos, Visão)

Hoje podemos perguntar o que é que Portugal, o povo português, os trabalhadores, os pequenos e médios empresários ganharam com a privatização da banca?

Há quem contra argumente apresentando o caso da Caixa para mostrar que um banco público é mal gerido e fica dependente do poder político.

É certo que não basta a nacionalização da banca, quando esta é feita para depois ser privatizada, como se viu com o BPN e o BANIF, ou quando o "poder político" a utiliza para financiar operações de privatização e os interesses privados, e não o interesse público, ou quando esta é gerida por gestores de "aviário" de partido, como atestam os Vara, Celestes Cardona, Fernandos Tomaz, … ou como se viu ainda na disputa de lugares na Caixa entre o CDS e o PSD no último governo.

A natureza de classe do poder político é essencial. Gestão bancária ao serviço do povo ou de oligarquias?

Mas a verdade é que, apesar disto tudo, e depois de descontados os valores dos últimos cinco anos em que a CGD deu prejuízos e as entradas de capital por parte das Finanças, os lucros entregues ao Estado só nestes últimos 12 anos são de montante muito superior (entre 2004 e 2015 a CGD teve de lucros 1552 milhões de euros, e os impostos pagos foram sempre muito acima de qualquer banco privado, que inclusivamente chegaram a criar esquemas fraudulentos para fugir aos impostos! (Ver "Operação Furacão")

Acresce que a CGD e o seu património continuam como activo nacional.

Pouca coisa dirão os analistas e comentadores serviçais dos grandes interesses. Muito dirão os que, sinceramente, defendem a soberania e o interesse nacionais.

Um país em que o seu sistema financeiro está nas mãos do estrangeiro, é um país apenas formalmente independente, e é uma evidência que o BCE "governo" não eleito e correia de transmissão do "Directório das Grandes Potências", os burocratas de Bruxelas e a Comissão com o seu "Pacto de Estabilidade", actuam no sentido de forçar as privatizações e, no caso da banca, à constituição de super bancos que dominarão os grandes espaços na União Europeia.

É necessário denunciar e combater esta política, não dar novos passos no sentido de comprometer ainda mais o nosso sistema financeiro, e não dar também por irreversível "compras feitas por estrangeiros".

Agora já há muitas almas que se inquietam ao verem sucessivos bancos a ficarem no domínio do estrangeiro!

Pelo que a imprensa diz, ficou a saber-se, ainda na semana passada, que Marcelo Rebelo de Sousa não quer que o Novo Banco fique nas mãos dos espanhóis, que Ferreira Leite alertou, justamente, para a questão da nossa soberania, que está em causa, e que o espantoso e mui socialista Murteira Nabo lamentou: "se calhar, infelizmente" os bancos "vão ficar todos estrangeiros". Porém, questionado sobre a nacionalização do Novo Banco, não teve dúvidas: "é um disparate"! E porquê? "Agora, estar a nacionalizar um banco daquela importância e dimensão, tendo o Estado já a CGD que tem 30% ou mais da quota de mercado, não tem sentido". O "infelizmente" deste socialista convertido às águas neoliberais e ao "venha a nós o nosso reino", que é como quem diz à nossa carteira, diz bem da leviandade e da hipocrisia destas personagens que nos têm conduzido ao retrocesso económico e social, e à crescente dominação pelo estrangeiro.

Agora até alguns banqueiros defendem a nacionalização do Novo Banco "por enquanto", isto é, para depois ser privatizado... convencidos que este ficará em mãos nacionais, como se viu com o BPN, BCP, Totta, e agora com o BPI. E veremos o que acontecerá com a Caixa Económica do Montepio!

Aos que se deram conta da triste e grave situação em que nos encontramos, a uns e a outros, é de lhes lembrar, está publicado, o que afirmámos aquando da adesão de Portugal à então CEE, e que mantivemos ao longo do tempo: "com a integração ainda mais se justifica que as empresas básicas e estratégicas se mantenham nacionalizadas, se não quisermos que elas venham a cair, mais cedo ou mais tarde, nas mãos do estrangeiro, alienando-se a soberania nacional"! Os factos aí estão. Agora já é claro que os bancos ou ficam na esfera pública ou vão para as mãos do estrangeiro! A questão da soberania é hoje uma questão central do nosso país. Uma soberania tutelada não é soberania, e sem soberania são a democracia, a vontade popular e as liberdades que estão em causa.

Um país com séculos de história que chegou à situação de estar dependente da notificação de uma obscura agência de certificação canadiana, um país que recebe ordens de um qualquer comissário Moscovici, este ainda por cima socialista, ou até de uma Direcção Geral de Concorrência, ou ainda por mail de uma tal Danièle Nouy, um país que tem um governador que se comporta como um funcionário subserviente do BCE, como se o Banco de Portugal fosse uma mera sucursal deste, um país que alienou a sua política monetária, cambial e até orçamental, e em que as elites no poder privatizaram e assim entregaram, directa e indirectamente, as principais empresas portuguesas ao estrangeiro, esse país, com séculos de história, é um país cada vez mais colonizado.

É tempo de dizer basta!

Basta de negociatas e de submissão!

Tenha-se vergonha!

Tenha-se dignidade!

Defenda-se a independência e a soberania de Portugal!

Ver também: 

  A nacionalização da banca em Portugal: Nove anos a construir, nove anos a destruir , Carlos Gomes, UNICEPE, Porto, 2011, 192 p., 2075 kB

[*] Economista. Intervenção no seminário "controlo público da banca, condição para o desenvolvimento da soberania nacional", em 22/Março/2016

O original encontra-se em http://www.pcp.pt/sistema-financeiro-mundial-banca-nacional-soberania

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

A EUROPA DO “APARTHEID” SOCIAL



  
Sob os nossos olhos vão desfilando os resultados últimos duma Europa de “apartheid” social, que tarda em acordar para na profundidade encontrar soluções em relação aos monstros que não parou de criar.

Dos seus bairros marginalizados, autênticos guetos perdidos nas grandes metrópoles de betão onde subsistem culturas excluídas, germinam como cogumelos fundamentalismos que a coberto e a pretexto de mal digeridas religiões escondem o emergente carácter nazi e fascista dos seus conteúdos doutrinários e ideológicos.

É nos guetos que se fabricam e de onde se expandem “jihadismos”-mercenários prontos para o caos, para o terrorismo e para os banhos de sangue dos inocentes, onde quer que seja… mas enquanto os “jihadistas” vão engrossar as fileiras do terror lá longe, no Iraque, na Líbia, na Síria, ou noutro “rincão obscuro” do mundo tornado alvo, a Europa até contribui financeiramente para o caos, fomentando “rebeldes moderados” filtrados, acicatados e apoiados por aliados como a Turquia, a Arábia Saudita, ou o Qatar…

Agora a Europa formatada por suas tão ávidas quão decrépitas oligarquias, prova na carne de seus povos o efeito “boomerang” desse “jihadismo” que por um lado recrutou jovens dos guetos europeus, fruto do “apartheid social” consentido pelas “democracias representativas” de feição, por outro é fruto de alianças com poderes ditatoriais e feudais de tão “mal parados” aliados.

Os fluxos de refugiados e o terrorismo “boomerang” nutrem-se a partir do mesmo húmus, mas a Europa dominada pelas oligarquias continua a dar prova de sua perversidade, financiando a Turquia onde Erdogan vai exercendo o poder como um ditador, para actuar no lado externo de suas fronteiras, esquecendo que a coberto do afã de fazer parar a migração dos refugiados das guerras que também incentivou (algo condenável para muitas organizações internacionais dos direitos humanos), encontrou também uma outra fórmula de financiamento permissiva ao caos e ao terrorismo para além das que antes utilizou.

Como cordeiros os povos da Europa choram vergados sobre o seu próprio umbigo sempre que as bombas explodem numa capital europeia, insensibilizados face aos guetos do “apartheid” social cuja exclusão não tem melhor solução, como em relação às explosões que vão ocorrendo fora dos muros tornados fronteiras europeias, onde quer que elas ocorram…

As poderosas oligarquias europeias aproveitadoras do capitalismo neo liberal, estão ao nível das monarquias feudais da península arábica e do carácter excludente do governo de Erdogan, pelo que os “governos representativos” europeus, ao não actuarem sobre as causas profundas que fomentam o “apartheid” social dos guetos que proliferam Europa fora, tornaram-se parte do problema e excluem-se de qualquer hipótese de melhor solução para além da cultura do medo e da repressão policial que torna possível incrementar outras indústrias que vão ganhando terreno tirando proverbial partido das novas tenologias da revolução digital.

Uma Europa que não é dos povos, está a tornar-se num domínio de oligarquias capazes de fascismo e de nazismo que vulnerabilizam os processos e as instituições democráticas e fazem uso duma constante anestesia por via dos seus próprios “média de referência”, efectivamente cada vez mais“representativos” dos interesses dessas oligarquias e cada vez menos democráticos para com os sofridos povos da própria Europa!

A antropofagia do capitalismo neo liberal está a tornar a “nova” Europa numa insensível neo colónia sujeita aos seus mais pérfidos desígnios e isso é também um sintoma do que tenho alertado, ou seja, da IIIª Guerra Mundial! 

Imagem: Mapa ilustrativo de algumas das últimas acções terroristas na Europa.

PARA ACABAR COM A LIBERDADE…



Pedro Bacelar de Vasconcelos – Jornal de Notícias, opinião

Doses massivas de informação sob a forma de imagens, reportagens, entrevistas e comentários, dilatadas e repetidas em cada bloco noticioso, continuam a ser debitadas através dos meios de Comunicação Social, a pretexto dos mais recentes atentados terroristas. Na mira de cativar audiências, esta superabundância noticiosa combina de modo perverso ingredientes diversos. Imagens das vítimas, dos supostos autores e dos lugares devastados pelas explosões. Entrevistas a familiares, vizinhos e testemunhas dos atos terroristas. Fragmentos de resultados provisórios das investigações policiais, em permanente atualização. Especulações mais ou menos sofisticadas. Inquéritos com pretensões "sociológicas" sobre os habitantes de áreas residenciais suburbanas, que agravam, inevitavelmente, a respetiva estigmatização.

Nos horários nobres, esta programação substituiu ou relegou para segundo plano toda a atualidade política nacional, as reportagens sobre os refugiados no Mediterrâneo ou a crise "golpista" no Brasil. Outros atentados, que normalmente seriam minimizados por ocorrerem em regiões mais distantes do continente europeu, merecem agora inusitada atenção, transformados em câmara de ressonância das atribulações ocidentais. A superabundância noticiosa sobre os atos terroristas cria a perceção falsa de que se trata de um fenómeno inédito no "Ocidente", o que manifestamente não é verdade.

Como todos bem sabemos, as atividades do Exército Revolucionário Irlandês - IRA -, da ETA basca, das "Brigate Rosse" italianas ou do Baader-Meinhoff alemão, para considerar apenas estes últimos 50 anos, dispensam-nos de recuar a tempos mais remotos em que o terror e a violência foram protegidos como instituição: dos autos de fé do Santo Ofício ao holocausto nazi. Sobram também os exemplos de âmbito doméstico, desde o julgamento dos Távoras - nos tempos do Marquês - ao Buíça, aos movimentos de libertação das colónias africanas, ao "ELP" ou às "Brigadas Revolucionárias".

O terrorismo é um fenómeno anterior a todas as civilizações - porventura mais antigo do que própria invenção da escrita - e, de facto, nunca a humanidade teve ocasião de se habituar a viver sem ele. O que o distingue na atualidade, não são particulares motivações religiosas, étnicas ou ideológicas, o espetáculo de brutalidade, os laços de sangue, as afinidades culturais ou sequer a sofisticação organizativa. A diferença está na generalização do acesso aos meios tecnológicos do nosso tempo e disso, não há forma de os excluir. A diferença está nas sociedades cosmopolitas do nosso tempo, numa diversidade cultural de que antes desfrutávamos como um bem mas que agora nos descrevem como um perigo.

Reclama-se a pretexto do horror, a drástica restrição das liberdades de todos, para facilitar as ações das polícias, o prolongamento indeterminado dos "estados de exceção", a resignação às violações da privacidade, a alteração radical de velhos hábitos e profundas mudanças nos nossos modos de vida. Identificam-se os imigrantes e refugiados com os terroristas. Alimenta-se a perceção sinistra de que a ameaça vem do exterior, fecham-se fronteiras e constroem-se muros como se fosse possível transformar um continente numa fortaleza inexpugnável.

E assim se evita, no plano interno, a ponderação dolorosa das consequências sociais das políticas de austeridade friamente concebidas ao gosto dos mercados financeiros. E assim se ocultam as consequências das opções de política externa "administradas" pelo "Ocidente" na Palestina, Israel, Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia e Ucrânia. De Gibraltar aos Urais, permite-se que o ódio fermente até que se confunda a vítima com o agressor, a liberdade com a xenofobia, o sofrimento com o destino. É a hora de sair em defesa das liberdades cívicas e da democracia social, da paz e da solidariedade. É a hora.

PASSOS ACABADO E OUTRAS COISAS DE PORTUGAL E DO MUNDO



Valdemar Cruz, jornalista do Expresso, trás à mesa o Expresso Curto para ser sorvido com todo o ripanço, saboreando a espuma que já é Passos Coelho. Vão dar de caras com referências ao PSD. Ao Congresso Laranja, ao peido mestre de Passos Coelho, que em português vernáculo significa que o homenzinho que infernizou a vida dos portugueses durante quatro anos está quase a acabar. 

Valdemar fala de “Uma selfie com Passos”. Será uma selfie dele a sair porta fora do PSD como o maioral, o pequeno ditador. Adeus Passos, oxalá que o inferno que causaste aos portugueses de médios, menores ou insuficientes recursos te caia em cima. Só mereces desprezo. É o que dizem os pacíficos, outros mais "escamados" até seriam mais violentos...

Passos estará acabado, se não se nota agora vai ser limpinho-limpinho daqui por mais um ano, no máximo, quando se concretizar a noção de que o governo de Costa vai continuar a ser governo. Passos anda por ali, no PSD, a par da contestação que cresce para que o poleiro seja de outros. Piores ou melhores? Por lá os javardos são clones, apesar de parecerem diferentes. Enterraram a social-democracia e nem lhe fizeram o funeral, por isso aquele cheiro nauseabundo dos que o que querem é o poder maior: serem governantes e ampliar as suas vantagens, dos familiares e amigos, da seita. Tiveram um bom professor, o Cavaco. Podem tirar todos “Uma selfie com Passos”, o Passos acabado.

Bom dia? Talvez.

Redação PG / MM

Bom dia, este é o seu Expresso Curto 

Valdemar Cruz – Expresso

Uma selfie com Passos

Aproxima-se o Congresso do PSD e Pedro Passos Coelho, voltou a demonstrá-lo ontem no debate quinzenal realizado na Assembleia da República, parece enredado no seu próprio labirinto. Num dos momentos mais acessos da discussão, o dirigente máximo do PSD teve de ouvir António Costa dizer-lhe que "sempre que falamos do futuro, o senhor vem-nos falar do passado. O senhor, em vez de falar sobre o que o país precisa, comporta-se como guardião das reformas que fez enquanto Governo". Após um período inicial, pós-eleições, de elevados índices de agressividade retórica, protagonizados pelo próprio Passos e secundado pelos restantes dirigentes do PSD, o ex-primeiro-ministro encenou uma espécie de mudança, mas há fatos desajustados a determinados corpos, por muita ginástica que seja feita. Definitivamente, este não é o fato capaz de contornar os factos que alimentam a narrativa de Passos. Marques Mendes já há dias alertou na SIC para este caminho com forte componente autodestrutiva. Hoje, em entrevista ao Público, Paulo Rangel diz entender uma inicial inércia, "mas a partir do momento em que se fechou o novo ciclo político, o PSD já devia estar (…) a fazer oposição mais ativa". Rui Rio, ausente do conclave, porque se lá fosse, prevê com a sua proverbial modéstia, ainda se arriscava "a ser um elemento central do congresso", deu ontem uma entrevista à TSF carregada de farpas dirigidas a Passos Coelho. Como quando não teve dúvidas em revelar de que lado estava na questão que tem vindo a ser colocada a propósito do futuro e da localização dos centros de decisão da banca portuguesa. Está com o primeiro-ministro e o Presidente da República e contra as posições de Passos. Sibilino, deixa escapar: "se calhar não é assim para um liberal, mas tenho uma perspetiva social-democrata".

Afogado numa lógica cuja validade depende em exclusivo de um eventual desastre da atual solução de governo, Passos segue um caminho demasiado arriscado e demasiado propício a uma perda de adesão à realidade. "El coronel no tiene quien le escriba" ("Ninguém Escreve ao Coronel" em português), foi um dos primeiros contos publicados por Gabriel Garcia Marquez. Um dos muitos oficiais de uma revolução, o Coronel fica anos e anos à espera do agradecimento traduzido numa carta que lhe anuncie a tão ansiada pensão. O problema é que o tempo passa, o mundo muda, a família altera-se, e ninguém escreve ao coronel, pelo menos a avisá-lo que não haverá pensão nenhuma. Talvez Passos esteja a precisar que alguém lhe escreva uma carta com citações da entrevista hoje dada por Rangel, até para o avisar que já não é primeiro-ministro, não há perspetiva de que o venha a ser tão cedo e, sim, o povo pode ser ingrato, sobretudo quando demasiado se valoriza o que se considera terem sido os feitos conseguidos. Marcelo, graças a uma hábil política de sedução, é hoje o homem ao lado de quem todos querem aparecer. O azedume ainda presente nos poros de Passos Coelho potencia o risco de o transformar no político com o qual ninguém quer tirar uma selfie. Há homens a quem faz falta um momento zen. Pode ser um problema de controlar a respiração.

A MINHA MORTE É MELHOR QUE A TUA

Não tencionava destacar hoje o tema do terrorismo. Porém, uma reportagem apresentada pela CNN a partir das 5h30 da madrugada deixou-me descorçoado. Centrava-se num hospital em Lahore, no Paquistão, para onde foram dirigidos grande parte dos feridos, na sua maioria crianças, na sequência do último atentado bombista ocorrido no passado domingo no parque público Gulshan-i-Iqbal, naquela cidade. Entre as vítimas mortais, num total de 72, encontram-se 29 crianças. Outras 315 pessoas ficaram feridas.

O longe é um lugar sem nome. Não o conhecemos. Não existe. Não nos comove. Não mobiliza o fluxo de notícias. Fala-se durante os instantes iniciais e depois é como se o nada constituísse o quotidiano daquela gente de quem nada sabemos. Não sabemos como riem. Não sabemos como beijam os filhos. Não sabemos como amam. Não sabemos como dançam. Não sabemos se dançam. Não sabemos nada dos homens, das mulheres, das crianças do Iraque, do Iémen, do Chade, da Costa do Marfim, do Mali, da Síria, de Kabul, de Islamabad.Não sofremos com o que não conhecemos. Não compreendemos o que não conhecemos. Não vivemos os desgostos, a dor daqueles que desconhecemos. A ignorância é um lugar muito distante. Quem vive naquele longe são pessoas. Podem morrer 70, 100, 200 e não será o mesmo que morrerem 5, 10, 20, em Paris, Londres, Bruxelas ou Washington. A contabilidade das mortes é pornográfica. Mas não há maior pornografia moral do que deixarmo-nos enredar naquela voraz máquina noticiosa que faz perceber como não somos iguais. Nem na morte. Porque a minha morte é melhor que a tua.

OUTRAS NOTÍCIAS

Os lesados do BES começam a ver luz ao fundo do túnel. Até início de maio deverá ser conhecida uma solução destinada a atenuar as perdas sofridas com o investimento em papel comercial do Grupo Espírito Santo. A proposta será financeiramente suportada pelo chamado BES "mau", mas não há qualquer garantia de recuperação dos €500 milhões aplicados.

Maria Luís, a ex-ministra das Finanças de Passos Coelho, tentou uma alteração da composição da administração do BANIFde modo a ir de encontro aos desejos da Comissão Europeia. A informação foi ontem confirmada por Luís Amado, ex-ministro e último "Chairman" do banco na Comissão Parlamentar de Inquérito.

Prossegue a novela José Sócrates. O diretor do departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Amadeu Guerra, decidiu que as investigações sobre as atividades do ex-primeiro-ministro José Sócrates devem ser prolongadas por mais seis meses e terminar até 15 de setembro. Os advogados de Sócrates consideram esta decisão "inadmissível" e demonstrativa de que "se continua à procura de indícios e provas, quando tinham antes dito que já tinham os suficientes para prender - então é porque na verdade nunca tiveram", declarou Pedro Dellile. São mais 169 diaspara acusar José Sócrates. Ou não.

Hoje é o último dia para os contribuintes verificarem todas as despesas elegíveis como dedução à coleta do IRS. A Antena 1 avançava às 7h da manhã que até ontem tinham sido apresentadas 8 300 reclamações. No Expresso Diário chama-se a atenção para um dado da maior importância. Acontece que metade dos internautas tem de mudar de navegador para conseguir entregar a declaração de IRS.

É o título principal da edição de hoje do Público. Profissionais da PSP e da GNR estão a ser obrigados a usar os telemóveis pessoais para registar os acidentes de viação. A explicação é simples: as forças de segurança portuguesas não dispõem de equipamentos fotográficos suficientes para assegurar esse registo.

O preço dos manuais escolares não aumentará no próximo ano letivo. Governo e Associação Portuguesa de Editores e Livreiros chegaram a acordo para satisfação dos pais que, ainda assim, continuam a ter razões para contestar o peso excessivo do custo dos livros.

A Visão de hoje alerta na capa para os continuados perigos do terrorismo com um título preocupante: "Europa à espera do próximo ataque". No interior, o artigo de Thomas Piketty, diretor de estudos na École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris coloca uma interrogação: "A Europa está a tornar-se islamofóbica?". Por coincidência é um tema que abordo mais abaixo na parte das minhas leituras. Destaque ainda nesta edição para um trabalho de Cesaltina Pinto intitulado "Os Glutões da Banca", no qual a jornalista começa por afirmar que "o braço de ferro entre Isabel dos Santos e os espanhóis do CaixaBank pelo controlo do BPI é a batalha mais recente entre os interesses de dois países que, aos poucos, estão a controlar quase toda a banca portuguesa".

O tema de capa da Sábado é dedicado aos novos tratamentos contra o cancro, num trabalho em que se explora uma nova vertente da investigação com as células do doente a serem treinadas para eliminar o tumor

Lá fora

François Hollande recuou. Renuncia a avançar com a sua polémica revisão da Constituição. No dia 16 de novembro anunciara a intenção de retirar a nacionalidade francesa a cidadãos envolvidos em atos terroristas.

Pablo Iglesias entreabriu uma porta para um possível entendimento capaz de levar à formação de um governo em Espanha. Afirmou-se disponível para sair de cena, mas qualquer acordo parece ainda muito distante.

Nos EUA, a campanha para a eleição dos candidatos a candidatos presidenciais é todos os dias um poço de surpresas. Agora foi preso o diretor de campanha de Donald Trump, acusado de ter agredido uma jornalista. Trump veio desculpá-lo. Como tudo aquilo é um mundo à parte, vale muito a pena ler aqui uma deliciosa e bem humorada viagem ao mundo de Donald Trump, publicada na New Republic pela poeta e humorista Patricia Lockwood. "Lost in Trumplandia" é o sugestivo título deste trabalho.

Meryl Streep é uma grande atriz e uma das grandes estrelas do cinema feito na segunda metade do século XX. Aos 29 anos fazia o luto da morte de um namorado e começava a trabalhar em "Kramer contra Kramer", com Dustin Hofman, o filme que fez dela uma estrela e lhe proporcionou o Óscar para Melhor Atriz em 1980. Michel Schulman publica na Vanity Fair publica uma adaptação da biografia de sua autoria a lançar em breve e intitulada "Her Again: Becoming Meryl Streep", onde fala das lutas físicas, emocionais e intelectuais que fizeram da atriz uma lenda.

FRASES

"A questão é que partido é que queremos que o PSD seja no futuro. Queremos que seja um partido de quadros, quase confessional, como vimos no congresso do CDS?". Paulo Rangel em entrevista ao Público

"Se não tivermos criação de emprego, este Programa Nacional de Reformas vale zero". Catarina Martins no debate quinzenal na Assembleia da República

"Acabar com os exames no ensino é pior para o ensino. O senhor está a fazer a estratégia errada". Pedro Passos Coelho no debate quinzenal na Assembleia da República

"Há aqui uma certa hipocrisia quando não entram soldados, mas entram instâncias europeias a dizer: esse banco é para ali e façam favor de pôr os constribuintes portugueses a pagar". Rui Rio em entrevista à TSF

"Já que pagamos o banco, ao menos que fiquemos com ele". Manuel Tiago, deputado do PCP sobre o Novo Banco

"O Porto ainda não tem noção do presente que ganhou com a ponte aérea". Fernando Pinto, presidente executivo da TAP em entrevista à TVI

"O Cunhal apreciava a vida. Gostava de mulheres, gostava do que era belo. Mas em relação a si próprio era austero". Manuel Alegrenuma entrevista à Sábado em que revela que o dirigente comunista lhe levou um dia o pequeno almoço à cama. Na brincadeira.

"Impeachment sem crime de responsabilidade é o quê? É golpe. Não adianta discutir que estamos discutindo em tese o impeachment".Dilma Roussef

NÚMEROS

30
Milhões de dólares é o valor da indemnização reclamada por Pelé à Samsung pela utilização indevida e sem autorização da imagem de um sósia num anúncio no New York Times

450
Mil refugiados sírios vão ter de ser realojados até 2018. Estimativas da ONU indicam que um em cada dez sírios vão precisar de realojamento

130
Mil dólares é quanto a arquidiocese de Nova Iorque espera obter com a venda do FIAT 500 Lounge, o carro usado pelo Papa Francisco durante a sua visita à cidade em setembro

54
É o número de países onde foi feita uma investigação da qual resultou a conclusão segundo a qual estar muito tempo sentado aumenta os riscos de morrer mais cedo. Os resultados do estudo são apresentados pelo American Journal of Preventive Medicine

O QUE ANDO A LER E A VER

Gosto de leituras cruzadas e aprecio muito a sucessão de acasos capazes de nos conduzirem até uma nova proposta. Há dias, em casa de um amigo em Braga, deparei com Morte na Pérsia o pequeno livro escrito nos anos de 1930 pela suíça Annemarie Schwarzenbach, mantido inédito até 1955 e utilizado pela “Tinta da China” para inaugurar a coleção Viagens, dirigida por Carlos Vaz Marques. É um pequeno, mas muito belo texto, através do qual a autora narra uma viagem transformada em fuga. Fuga do nazismo. Porventura fuga de si própria. E encontro com outras civilizações, outras culturas, sempre a partir do olhar, mas sem a arrogância, de quem chega do Ocidente a um espaço que hoje nomeamos como Irão. É nas aldeias e cidades dessa Pérsia, ou dessa ideia de oriente hoje transformado em origem do mal, território de todas as barbáries, que se embrenha Annemarie, antifascista, morfinómana e lésbica. Um dia, em Moscovo, André Malraux pergunta-lhe: “o que espera da Pérsia? (...). Só por causa do nome? Só porque fica muito longe?”. A autora, que colocara na primeira linha do primeiro parágrafo o premonitório aviso de que "este livro trará pouca alegria ao leitor. Não o poderá consolar, nem reconfortar, como muitas vezes os livros tristes sabem fazer...", contorna as interrogações do escritor para revelar um pensamento centrado "na terrível tristeza da Pérsia...”. Percorre o deserto, as planícies, os lugares mais recônditos. Vai do Mar Cáspio ao Golfo Pérsico, passa pelas escavações arqueológicas das ruínas de Persépolis ou pela cidade morta de Rages. Atravessa desfiladeiros. Débil, apaixona-se por Ialé, a filha de um turco, também ela muito doente, aventura-se por encostas íngremes e chega ao monte Damavand. Ali, naquele fim do mundo a que chamam vale de Lar, junto a um vulcão extinto, encontra o mais solitário dos lugares. Desliza sempre na mais profunda das tristezas. "O que ainda me prende aqui é a desesperança extrema", escreve já depois da morte de Ialé e logo após uma constatação poderosa: "a liberdade só existe para quem tem força para a usar". Ler este livro é como acariciar a delicadeza contida numa peça de filigrana.

Esta viagem a um mundo ao qual já não temos acesso, porque se esfumou, porque se consumiu nos conflitos contemporâneos, traduz uma muito pessoal descoberta do Oriente a partir de uma experiência de crise de valores no Ocidente de que a autora é originária. Como estas não são leituras alheias ao quotidiano vivido na Europa, na Turquia, no Paquistão, no Mali ou no Iraque, chegado ao fim impôs-se-me a irresistível vontade de regressar a uma espécie de contraponto. “Orientalismo”, o já clássico e bem mais extenso livro do egípcio Edward W. Said, publicado em 1978. Com o subtítulo “Representações ocidentais do Oriente”, apresenta uma tese dispersa por várias constatações, como essa de que a ideia de “Oriente”, muito para lá de um nome com tradução geográfica, é uma invenção política e cultural do Ocidente para se referir a diferentes civilizações situadas a leste da Europa e quantas vezes olhadas com o paternalismo próprio do vício colonial. Não será este o espaço para falar em detalhe de um livro crucial para entender a história dos preconceitos anti árabes e anti-islâmicos cada vez mais presentes no Ocidente, bem como, acentua-o Said, "a ausência quase total de uma predisposição cultural que possibilite uma identificação com os árabes e o islão e uma discussão desapaixonada sobre eles". Para compreender os porquês. Não para desculpar o que em nome do Islão possa ser feito.

Termino com uma breve referência a um documentário visto há dias, assinado por Ken Loach e disponível nas lojas a um preço acessível. Intitulado "O Espírito de '45", mostra-nos o esforço de reconstrução de Inglaterra no pós-guerra a partir de uma ideia hoje subversiva: se foi possível unir todos naquele combate, não será possível, em nome do bem da maioria da população, prolongar essa união de esforços na construção de casas dignas para os operários, criar um sistema de saúde e um sistema de transportes públicos, assumir o controlo público do carvão e da eletricidade? Era uma ideia nobre concretizada ao longo de décadas. Até que chega Margaret Tatcher e começa o mundo em que ainda vivemos. Parece que falta privatizar o ar.

Por hoje é tudo. Não perca o último 2.59, da responsabilidade da Vera Lúcia Arreigoso, através do qual, para lá de se mostrar como os números da saúde são bem melhores a Norte que a Sul, fica claro que há doentes mais iguais que outros. Amanhã terá cá o Martim Silva para lhe servir mais um Expresso Curto.

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