Especialistas
timorenses recomendam escolas com autonomia e mais português no currículo. Ao
mesmo tempo, as agências internacionais, com agendas estruturadas, prejudicam a
implantação da língua portuguesa em Timor-Leste.
O
ensino da língua portuguesa logo no início dos primeiros anos de escolaridade, com
carga horária semanal muito mais intensa, e a existência de escolas timorenses
com mais autonomia em respeito pelos princípios de democraticidade e de
participação defendidos na lei de bases da educação, para além de fortes
críticas às agências internacionais que querem “aniquilar a língua portuguesa
em Timor-Leste”, foram algumas das recomendações e preocupações enunciadas no
Seminário que ocorreu no dia 3, no Auditório do Arquivo e Museu da Resistência
Timorense (AMRT), em Díli.
Língua
Portuguesa em Díli, sessão de abertura
A
sessão de abertura deste Seminário, promovido pela Embaixada de Portugal em
Díli, e no âmbito da Semana
da Língua portuguesa que decorre de 2 a 6 de Maio na capital
timorense, contou com a presença do Ministro da Educação de Timor-Leste,
António da Conceição, e do Embaixador de Portugal em Díli, Manuel Gonçalves de
Jesus.
O
Director da Unidade de Produção e Disseminação do Conhecimento da Universidade
Nacional de Timor Lorosa´e (UNTL), Vicente Paulino, no âmbito da comunicação
que apresentou, intitulada, «Cultura e Língua Portuguesa em Timor-Leste:
assimilação histórico-cultural, cooperação, tensões e implicações no ensino»,
teceu sérias críticas aos governantes timorenses afirmando que a falta de
“consistência política” dificulta a consolidação do português e contribui para
“a tensão linguística no país”.
Vicente
Paulino sobrepôs que os problemas começaram quando se decidiu incluir na
Constituição da República o português como língua oficial, em conjunto com o
tétum, e que ao nível do sistema educativo devia-se “ter adoptado o português
como única língua de instrução”, tendo formulado sérias críticas às
organizações internacionais que têm um programa anglo-saxónico conhecido por
S.O.S. a ser realizado em todo país.
Neo-liberalismo
prejudica países frágeis e vulneráveis
Azancot
de Menezes, Assessor Nacional do Departamento do Currículo do Ensino Superior
do Ministério da Educação, que apresentou uma comunicação com o tema «Elementos
essenciais da Escola eficaz e autónoma. Uma perspectiva em contexto global e
local», criticou de forma contundente o “neo-liberalismo hegemónico que
prejudica os países do hemisfério Sul e em particular as Nações frágeis e mais
vulneráveis como Timor-Leste”, referindo que há “agências internacionais com
agendas estruturadas a interferir nas decisões soberanas do país e a prejudicar
gravemente a implantação da língua portuguesa”.
Azancot
de Menezes, especialista em educação, e antigo pró-reitor da Universidade de
Díli, em relação à organização e ao funcionamento do sistema educativo,
sustentou que no “respeito pela descentralização da educação”, a escola
timorense deve “evoluir para uma instituição mais aberta, atenta às dimensões
fundamentais que caracterizam uma escola eficaz e autónoma”.
No
entender do assessor nacional do Ministério da Educação, o director escolar
“deve ser mais líder e menos gestor”, acrescentando que a eficácia do líder
“resulta da sua concentração nas pessoas, em ouvir, em mobilizar o contributo
dos voluntários, alargando o círculo de decisão”.
Assumindo-se
como “acérrimo defensor das teorias críticas do currículo”, Azancot de Menezes
afirmou que a decisão política que obrigou à “diminuição da carga horária do
ensino de língua portuguesa nos primeiros anos de escolaridade foi um grave
erro e teve como único objectivo aniquilar a inserção da língua portuguesa no
país”.
Tendo
recomendado que o “processo de desenvolvimento do currículo em Timor-Leste deve
ser implementado com o envolvimento de professores, alunos, família, comunidade
e outros agentes educativos porque as escolas devem estar organizadas para a
aprendizagem reflexiva”.
Benjamim
Corte-Real e Dulce Turquel
Também
foram oradores no evento Benjamim Corte-Real, Director do Instituto Nacional de
Linguística, com a apresentação do tema «O ensino da língua portuguesa em
Timor-Leste – Espaços a conquistar», e Dulce Turquel, Directora e Fundadora da
empresa ABUT, com o tema, «Percursos inclusivos e criativos de resposta a
necessidades sociais e culturais».
O
linguista Corte-Real advogou que “é preciso informalizar a língua portuguesa,
levá-la às aldeias, através da poesia, do teatro e de outras acções”, e
defendeu que a “Igreja pode e deve ter um papel mais activo” nesta matéria.
Numa
linha de raciocínio similar conducente à implantação da língua portuguesa,
Dulce Turquel, na sua comunicação, partilhou a experiência da ABUT na
divulgação e consolidação do português em Timor-Leste através de actividades
lúdicas e dos tempos livres, e na aposta e divulgação de livros em língua
portuguesa junto da população mais jovem.
Neste
Seminário, moderado pelo professor universitário senegalês Samba Ndiaye, com
auditório completo, estiveram presentes diplomatas, representantes da
Presidência da República e da Igreja, da Fundação Oriente de Díli e da Escola
Portuguesa Ruy Cinatti, professores nacionais e estrangeiros, estudantes
universitários timorenses e moçambicanos, funcionários do Ministério da
Educação, jornalistas, e o Director do Banco Nacional Ultramarino (BNU), entre
outros membros da sociedade civil e militar.
*
Professor Universitário e Secretário-Geral do Partido Socialista de Timor (PST)
* M.
Azancot de Menezes, Díli | Também colabora no Página Global
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