Há crianças a receber tratamento
de quimioterapia nos corredores e as enfermarias não têm condições de higiene.
Unidade pediátrica Joãozinho funciona há quase uma década em contentores.
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Pedro Ivo Carvalho | Jornal de
Notícias | opinião
Já sei o que vão dizer-me: não
comparemos o incomparável. Pois eu não consigo deixar de comparar, porque o
país é o mesmo. E as prioridades políticas são o que nos definem como nação.
Por isso, vou comparar. De que nos serve projetar Portugal, de forma tão
alegremente pomposa, no mundo das novas tecnologias se continuamos a ser
incapazes de encontrar uma solução urgente que impeça que crianças com cancro
continuem a ser tratadas em contentores provisórios e impróprios? De que nos
serve gastar 110 milhões de euros de dinheiros públicos para garantir a Web
Summit até 2028 se não temos a capacidade de aplicar o mesmo grau de
compromisso na construção de um espaço físico definitivo (que custa um quinto
desse valor) para acolher famílias e menores da Região Norte numa nova ala
pediátrica do Hospital de S. João?
Não comparemos o incomparável, já
sei. Lamento, mas tem de ser. Porque este país bipolar é um reflexo das opções
políticas, não do acaso. E o que está a acontecer neste vergonhoso processo é
um retrato vivo da inércia e gigantismo da Administração Pública, de
burocracias espúrias e dramas concursais ininteligíveis. Do empurrar com a
barriga. De juras de amor vãs. Do mesmo pecado (da) capital de sempre. Tudo
oco. Andamos nisto há sete anos. Sete. Na melhor das hipóteses, crianças e pais
vão ficar pelo menos até 2020 esquecidos nesses contentores. Até podemos
aceitar que não seja juridicamente possível fazer a obra por ajuste direto, mas
é certamente possível que, até ao desenlaçar do nó, se encontre uma solução
melhor do que a atual. E isso só está ao alcance do hospital ou, no limite, de
uma ordem da ministra. Ou do primeiro-ministro. Ou de uma palavra mais incisiva
do sempre afoito presidente da República. Será que vamos ter de criar uma
startup da decência para otimizar o sentido do ridículo? Em caso afirmativo,
tenho uma sugestão: shameonyouportugal.com.
* Diretor-adjunto do JN
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