Citgo Petroleum, filial
estadunidense da Petróleos de Venezuela (PDVSA), está sob intervenção do
governo estadunidense
Michele de Mello | Brasil de Fato
| Caracas (Venezuela)
Em janeiro deste ano, o deputado
opositor Juan Guaidó se autoproclamou presidente da Venezuela, um ato
que já sinalizava a intenção da oposição venezuelana de tomar o poder
à força, o que se tornou explícito ao mundo com a fracassada tentativa de golpe
de Estado liderada por Guaidó na última terça-feira (30).
Assim que foi divulgada a
autoproclamação de Guaidó, o secretário de Segurança Nacional dos Estados
Unidos, John Bolton, confirmou a intenção da Casa Branca com o “novo governo”.
Em entrevista
para a FOX News ele admitiu: "Estamos olhando para os ativos
de petróleo. Esse é o fluxo de renda mais importante para o governo da
Venezuela. Estamos olhando o que fazer com isso. Estamos conversando com
grandes empresas americanas agora. Isso fará uma grande diferença para os
Estados Unidos economicamente se pudermos ter companhias petrolíferas
americanas realmente investindo e produzindo as capacidades petrolíferas na Venezuela".
A Venezuela é o país com maior reserva de petróleo do mundo: 309 bilhões de barris
Mas a história não começa aí. As
sanções contra a empresa estatal venezuelana iniciaram em 2017. Em agosto
daquele ano, Donald Trump assinou um decreto proibindo a Citgo de
enviar lucros à empresa matriz, em Caracas.
Entre 2015 e 2017, a Citgo teve um
lucro de cerca de US$ 2,5 bilhões (R$ 10 bilhões). Ao total, a filial da PDVSA
tem três refinarias (nos estados de Texas, Illinois e Lousiana), três pontos de
abastecimento de combustível e vários postos de gasolina na costa leste dos
EUA. É responsável por 4% do refino de petróleo no país e um dos principais
provedores de combustível para a aviação civil.
A Citgo refina petróleo da Venezuela, do México e dos
Estados Unidos e revende para esses mesmos países, totalizando cerca de 759
mil barris diários. Outra penalidade da sanção aprovada em 2017 é justamente o
cancelamento das vendas de petróleo cru para ser refinado pela empresa,
impedindo que suas atividades centrais fossem mantidas.
"Primeiro o bloqueio da compra
de petróleo; depois o bloqueio dos seus fundos financeiros; e, por fim, o
bloqueio das contas bancárias venezuelanas em solo estrangeiro são o conjunto
de ações que deixaram clara a intenção e a tentativa dos EUA de se apropriar da
Citgo”, analisa Franco Vielma, sociólogo e analista do portal venezuelano Misión Verdad.
PDVSA minada por dentro
Em novembro de 2017, seis diretores da Citgo foram presos
em Caracas depois de uma denúncia do Ministério Público venezuelano
que atribuía a eles a responsabilidade por negócios da filial da PDVSA nos EUA
com financeiras que faziam uso de fundos de investimento de alto risco – os
chamados "fundos abutres" – sem o consentimento da direção
central da empresa.
No caso denunciado, os diretores
haviam pedido um empréstimo de US$ 4 bilhões (R$ 16 bilhões) para
o investimento nesses fundos. Como garantia, hipotecavam a própria sede da
empresa.
Todos os funcionários tinham
dupla nacionalidade, o que fez com que a Justiça estadunidense fosse acionada
para defendê-los da prisão.
Para Vielma, esse episódio
escancara a presença de infiltrados do Pentágono na empresa, com objetivo de
desestabilizá-la por dentro.
Todas as últimas guerras iniciadas pelos Estados Unidos foram contra países grandes produtores de petróleo
Ao contrário do que poderia
esperar a oposição, a tentativa de endividar e hipotecar a Citgo fracassou.
Mas, em 2019, a
empresa volta a ser alvo de ataques.
Uma das primeiras ações de Carlos
Vecchio, advogado nomeado como embaixador da Venezuela nos EUA pelo opositor
Juan Guaidó, foi solicitar um novo financiamento, para endividar a empresa,
dando as ações da Citgo-PDVSA na bolsa de valores como garantia.
A manobra só pôde ser realizada
porque tanto o Executivo quanto o Legislativo dos Estados Unidos
reconhecem Juan Guaidó e seus nomeados como representantes oficiais da
Venezuela no país.
Enquanto isso, todos os ativos da
Citgo-PDVSA estão sob intervenção do Departamento do Tesouro dos Estados
Unidos, devido a outro decreto, aprovado em 2015, pelo presidente Barack Obama, definindo a Venezuela como uma “ameaça
inusual e extraordinária à segurança dos Estados Unidos”. De acordo com o
decreto, as propriedades venezuelanas dentro do território estadunidense
devem receber o mesmo tratamento de qualquer tipo de propriedade de
organizações consideradas terroristas pela Casa Branca, ou seja, podem ser
confiscadas.
O consumo diário mundial de petróleo em 2018 foi de 98,82 milhões de barris, segundo dados da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP)
Histórico
A Citgo Petroleum Corporation foi
comprada pelo Estado venezuelano, nos anos 1980, como parte de um processo
de internacionalização do petróleo da Venezuela. A expectativa era que a compra
desse grupo de refinarias iria alavancar a indústria petroleira
nacional. No entanto, desde aquela época, já se denunciava que as
estruturas dessa empresa estariam obsoletas.
"Apesar de sua compra ter
sido parte de um episódio de corrupção da antiga PDVSA, a Citgo serviu
para comercializar petróleo refinado para o México e os Estados Unidos",
explica Vielma.
Papel social
Desde 2006, o governo venezuelano provê diesel para abastecer o
sistema de calefação de famílias de baixa renda dos Estados Unidos. O
combustível é distribuído nos postos de gasolina e refinarias da Citgo e
atende a centenas de famílias de Chicago e Nova York. Estima-se que
são distribuídos cerca de 100 mil barris de diesel durante os quatro
meses de inverno.
Edição: Rodrigo Chagas
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