“Puigdemont e Comin, deputados
eleitos na Catalunha, foram impedidos de entrar no Parlamento para "evitar
problemas políticos" com Espanha” - a "democracia" no Parlamento Europeu
Marisa Matias* | Diário de Notícias
| opinião
Dir-nos-ão que saímos agora mesmo
de um ciclo eleitoral. Saímos? Tenho sérias dúvidas. Entrámos no processo
eleitoral em tumulto. O Mediterrâneo feito cemitério, a cobardia de enfrentar
os problemas reais das vidas reais, o fantasma já pouco disfarçável do discurso
do ódio, a divisão feita de mote para campanha. Feitas as contas, aqui
continuamos e com sérias dúvidas se daqui saímos. A pergunta essencial continua
por responder: que Europa é esta?
As forças políticas ditas
tradicionais continuam hoje como ontem à procura do seu destino. Ainda não é
possível fazer balanços, mas, mais do que com respostas aos problemas que nos
trouxeram aqui, avança-se velozmente com cálculos para as maiorias possíveis.
Socialistas e Partido Popular Europeu parecem querer juntar-se a Liberais para
isso mesmo. Maioria em número, pouco importa a política que a comporta. Haverá
verdadeira disponibilidade para gerar novas políticas? Ou, afinal, trata-se
apenas de um cerco à extrema-direita mantendo o conteúdo político essencial intocável?
É da vida das pessoas que se vai tratar ou é uma operação de marketing político
que está em curso? Aprendeu-se alguma coisa com o Brexit? Haverá mesmo Brexit?
Há espaço para a redução de incerteza ou já se desaprendeu de fazer política
fora dela?
Em menos de uma semana depois de
um ato eleitoral é difícil poder ter grandes análises, mas há alguns sinais e,
para já, não são muito animadores. O primeiro "caso" traduziu a pior
das evidências. Puigdemont e Comin, deputados eleitos na Catalunha, foram impedidos
de entrar no Parlamento para "evitar problemas políticos" com
Espanha. 1,025 milhões de pessoas elegeram-nos, mas a presidência em exercício
decidiu que deveriam ser preventivamente proibidos de entrar. Independentemente
de qualquer opinião legítima que se possa ter a respeito do partido que
representam, uma posição desta natureza não é apenas uma violação dos seus
direitos políticos, é também uma violação dos direitos políticos dos cidadãos e
das cidadãs que os elegeram. Parece, pois, continuar a vigorar a lógica que nos
trouxe aqui, seja qual for o marketing a que se recorra. Dividir,
pois claro. Aparentemente, ainda não houve espaço para pensar fora da lógica da
divisão.
Sempre acreditei que há espaço
para a união dentro da União. Mas creio, sinceramente, que uma União só poderá
basear-se no respeito, na dignidade e nos direitos. Em política e não em marketing.
São vidas distintas que serão representadas dentro de quatro paredes. São
direitos que têm sido negados e merecem o reconhecimento devido. É a dignidade
de todos nós e do próprio projeto comum que está em causa. É um futuro que está
por construir e cujas bases têm ainda de construir-se. Passaram poucos dias.
Precisaremos de mais alguns para perceber se há espaço para a união dentro da
União. O recomeço não foi auspicioso.
*Eurodeputada do BE
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