quinta-feira, 25 de julho de 2019

Portugal | Marcelo e Costa, Costa e Marcelo


Pedro Ivo Carvalho * | Jornal de Notícias | opinião

A "geringonça" está morta, viva a "geringonça"? Se perguntarmos a António Costa, ele responde "nim". Dependerá do que o PS precisar. Já foi assim há quatro anos.

Num quadro político em que os partidos não socialistas continuam a cavalgar alegremente em direção ao abismo, é de esperar que o PS canibalize ainda mais o espaço tradicionalmente reservado ao Centro-Direita. Basta ver como evoluiu de "partido que devolve o que foi tirado aos portugueses" para "partido das contas certas". Costa abusa dessa habilidade terrível para os adversários: consegue estar em vários lugares ao mesmo tempo e, nessa transumância estratégica, diz sempre aquilo que esperam que ele diga.

Não é preciso ser vidente para prever o desenho do próximo ciclo: de um lado, um PS reforçado, a precisar menos de muletas; do outro, um presidente da República que apenas compete consigo próprio no campeonato da popularidade a servir de contrapeso a um António Costa com o apetite invasor de um eucalipto. Rui Rio pode esconjurar as sondagens, o alinhamento das estrelas ou os maus fígados dos companheiros do PSD, mas isso é trivial perante o essencial: o partido continua a afundar-se e a revelar incapacidade de apresentar uma alternativa a este modelo de organização do país. A sondagem do JN era paradigmática: toda junta, a Direita (PSD, CDS e Aliança) não chega aos 30%.


Ora, é neste contexto que emerge a figura de um presidente da República consensual entre todos os partidos e ideologias. E isto dá-nos que pensar, porque há, nessa esmagadora proeminência de Marcelo, uma dúvida que persiste: terá ele pulso e vontade para aumentar os níveis de exigência junto de um Governo liderado por um António Costa mais musculado? Terá ele a ousadia de descer do pedestal de encantamento coletivo para comprar guerras institucionais e equilibrar os pratos da balança? Costa depende de Marcelo para crescer e multiplicar a influência. Mas Marcelo também depende da estabilidade garantida por Costa para se eternizar como reserva moral e afetiva de um país que parece viver confortado com a alternância de uma dupla que divide o palco e o lucro. Marcelo e Costa, Costa e Marcelo.

*Diretor-adjunto

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