Pedro Ivo Carvalho
* | Jornal de Notícias | opinião
A "geringonça" está
morta, viva a "geringonça"? Se perguntarmos a António Costa, ele
responde "nim". Dependerá do que o PS precisar. Já foi assim há
quatro anos.
Num quadro político em que os
partidos não socialistas continuam a cavalgar alegremente em direção ao abismo,
é de esperar que o PS canibalize ainda mais o espaço tradicionalmente reservado
ao Centro-Direita. Basta ver como evoluiu de "partido que devolve o que
foi tirado aos portugueses" para "partido das contas certas". Costa
abusa dessa habilidade terrível para os adversários: consegue estar em vários
lugares ao mesmo tempo e, nessa transumância estratégica, diz sempre aquilo que
esperam que ele diga.
Não é preciso ser vidente para
prever o desenho do próximo ciclo: de um lado, um PS reforçado, a precisar
menos de muletas; do outro, um presidente da República que apenas compete
consigo próprio no campeonato da popularidade a servir de contrapeso a um
António Costa com o apetite invasor de um eucalipto. Rui Rio pode esconjurar as
sondagens, o alinhamento das estrelas ou os maus fígados dos companheiros do
PSD, mas isso é trivial perante o essencial: o partido continua a afundar-se e
a revelar incapacidade de apresentar uma alternativa a este modelo de
organização do país. A sondagem do JN era paradigmática: toda junta, a Direita
(PSD, CDS e Aliança) não chega aos 30%.
Ora, é neste contexto que emerge
a figura de um presidente da República consensual entre todos os partidos e
ideologias. E isto dá-nos que pensar, porque há, nessa esmagadora proeminência
de Marcelo, uma dúvida que persiste: terá ele pulso e vontade para aumentar os
níveis de exigência junto de um Governo liderado por um António Costa mais
musculado? Terá ele a ousadia de descer do pedestal de encantamento coletivo
para comprar guerras institucionais e equilibrar os pratos da balança? Costa
depende de Marcelo para crescer e multiplicar a influência. Mas Marcelo também
depende da estabilidade garantida por Costa para se eternizar como reserva
moral e afetiva de um país que parece viver confortado com a alternância de uma
dupla que divide o palco e o lucro. Marcelo e Costa, Costa e Marcelo.
*Diretor-adjunto
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